Adiamento da Lei anti-desmatamento ainda não foi aprovado por Parlamento e Comissão Europeia
Ao contrário do que alguns portais de notícias vêm trazendo na tarde desta quarta-feira (2), o início da implementação da EUDR (European Union Deforestation Regulation), a lei que proíbe as importações de produtos agrícolas de áreas ligadas ao desmatamento pela Europa, ainda não foi adiado. Como informou o presidente da Aprosoja Mato Grosso, Lucas Beber, o alinhamento e as discussões para o adiamento por 12 meses para grandes empresas e 18 meses para pequenas e micro empresas já aconteceram, porém, a medida ainda precisa ser votada e aprovada pelo Parlamento Europeu e pela Comissão Europeia.
"Recebemos com entusiasmo a proposta da Comissão Europeia de estender o prazo de implementação da Lei de Antidesmatamento por 12 meses para grandes empresas e um ano e meio para pequenas e médias. Isso é resultado de um bom diálogo internacional, onde o Brasil desempenhou uma posição decisiva ao levantar as preocupações de nossos produtores. Continuaremos negociando para garantir que nossos interesses sejam respeitados e que haja uma adaptação justa às novas regras. Agora, aguardamos o posicionamento final do Parlamento Europeu para consolidar essa importante conquista para o setor", afirmou o Ministro da Agricultura em exercício, Roberto Perosa.
Segundo especialistas, a lei é bastante complexa e pode impor uma série de restrições ao comércio global, em um forma bastante clara de protecionismo travestido de preocupação ambiental.
Em março, 20 dos 27 membros da União Europeia pediram que a lei fosse suspensa ou limitada, já que sua efetivação poderia, inclusive, impor aumento de custos e restrições para os próprios produtores rurais europeus. E parte destes possíveis impactos já causam tanta preocupação que promoveram protestos de agricultores por toda a Europa no início do ano, que culminaram com milhares deles em frente à porta do Parlamento Europeu pleiteando uma série de revisões nesta e em outras legislações.
As cadeias afetadas serão as de soja, carne bovina, cacau, café, óleo de palma, madeira, borracha e produtos relacionados, já que precisarão provar que seus produtos "não contribuem para a derrubada de florestas pelo mundo", sob a pena de multas severas, como algo entre 1% e 4% do faturamento da empresa que envie uma carga com suspeita de desmatamento ou o prazo de até quatro anos para a inspeção de um navio que também seja suspeito de alguma irregularidade.
Todavia, como explica o presidente da Aprosoja Brasil, Maurício Buffon, em entrevista ao Bom Dia Agronegócio, do Notícias Agrícolas, que acaba de voltar de uma rodada de negociações na Europa, "isso está aprovado no parlamento e eles não vão voltar atrás. O que está acontecendo é uma organização entre eles, com o pedido de adiamento de seis meses para que eles estejam mais organizados para começar a cobrar, porque é uma lei muito nova, que começou em 2022, em plena pandemia". Além disso, ele ainda destaca a segregação de produto, algo que o Brasil não conseguiria atender, justamente, por não estar com sua infraestrutura logística adaptada para isso.
A elevação dos preços para os consumidores e dos custos para os produtores é mais um ponto de alerta, sendo este um dos mais graves. "Você imagina no momento em que sobra um pouco de mercadoria, com uma boa safra no Brasil, eles vão explorar isso para devolver navio, não cumprir contrato, enfim, todo o jogo comercial que precisar ser analisado, bem como todos os impactos para a produção brasileira que já não está em um momento fácil", detalha Buffon.
O presidente da Aprosoja Brasil também afirma que estas negociações incansáveis que continuam acontecendo também se dão diante de um movimento de proteção dos produtores europeus por mais esta lei e que o Brasil precisa reagir.
"Estamos em um momento em que estamos contando com os deputados, contando com a FPA, e o próprio Ministério da Agricultura fez uma carta de apoio. Mas, quando se chega no Ministério do Meio Ambiente parece que eles nos querem de joelhos para a Europa, sem ver o Brasil trabalhando. Estamos em um momento de unir forças", detalha Buffon. "Mas, quando se olha para esta lei, incluindo as questões trabalhistas e fiscais, ninguém está ganhando. Estamos apenas caindo em uma fiscalização muito grande".
A sugestão, inclusive, é de que haja uma coalizão entre os países da América do Sul para que possam se proteger e combater o protecionismo excessivo.
Reveja a entrevista completa:
O presidente da Aprosoja Mato Grosso, Lucas Beber, trouxe como um dos principais efeitos desta nova lei o encarecimento em pelo menos US$ 60,00 por tonelada a soja exportada, o que limita a competitividade do produto brasileiro e, em um quadro mais grave, acabar tirando produtores da atividade. Reveja sua entrevista completa ao Notícias Agrícolas:
+ Lei Anti-Desmatamento Europeia pode aumentar em, no mínimo, US$ 60 a tonelada de soja exportada
A Europa é o principal mercado do farelo de soja brasileiro. Contabilizando todo o complexo da oleaginosa, 14% das vendas externas brasileiras foram para o território europeu, movimentando cerca de US$ 11 bilhões de dólares ao ano.
"O pedido de postergação da aplicação da Lei, originalmente 1/1/2025 – ainda será avaliado pelo Parlamento e pelo Conselho da União Europeia, e isso pode demorar dias. Os novos prazos propostos - 30/12/2025 para as grandes empresas e em 30/06/2026 para as micro e pequenas empresas – podem servir de período de introdução gradual, contribuindo para que haja uma execução mais eficaz da Lei", afirmou a Abiove (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais).
Com tantos pontos de ajuste em discussão, estes 12 meses de tempo de adiamento que pede a Comissão Europeia pode dar um fôlego aos produtores não só brasileiros, mas aos principais países que exportam commodities agrícolas para a Europa, principalmente considerando pequenos e médios produtores rurais de todos os setores envolvidos.
"O pedido de adiamento foi correto, pois tem uma série de dúvidas tanto dos exportadores quanto dos importadores sobre como a legislação seria aplicada, o que seria pedido em termos de documentação", disse o diretor de Sustentabilidade da Abiec, Fernando Sampaio à agência de notícias Reuters. "A gente acha que a legislação é ruim no geral, ela cria uma série de burocracias, aumenta custos, cria exclusão na cadeia, fere princípios da OMC (Organização Mundial do Comércio)".
REPERCUSSÃO, EXPECTATIVAS E IMPACTOS NA EUROPA
Enquanto no Brasil as lideranças seguem concentradas, buscando garantir que não só o adiamento se concretize, como mudanças na lei também possam acontecer, na Europa não é diferente. Uma reportagem da agência internacional de notícias Bloomberg aponta que, somente para o setor de proteínas animais, os custos adicionais poderiam ser acrescidos em bilhões de euros.
A lei poderia aumentar os custos com farelo de soja ou alternativos em mais de 2,25 bilhões de euros em 2025, conforme estima o grupo europeu Fefac, instituição similar ao Sindirações no Brasil. "Isto causará impactos econômicos adversos significativos no setor pecuário da UE, prejudicando seriamente a sua competitividade nos mercados não só do bloco, mas globais", trouxe um comunicado da associação.
A estimativa é de que a Europa demande cerca de 30 milhões de toneladas de farelo de soja em 2025 para alimentar seus rebanhos. E a União Europeia responde por 15% do consumo global de soja, em uma participação que vem sendo reduzida. Assim, ainda de acordo com os analistas ouvidos pela Bloomberg, "neste movimento, os exportadores poderiam facilmente buscar mercados alternativos e deixar o bloco com os seus estoques bastante comprometidos".
Mundo a fora, grandes grupos que atuam na comercialização do café estão enfretando o desafio de buscar garantir a entrega do produto já atendendo à nova legislação - mesmo ainda bastante incerta e questonável - antes do início de sua vigência. "A incerteza sobre se os comerciantes seriam capazes de cumprir as regras forçou os compradores a correr para estocar os grãos no início deste ano. Agora, os exportadores estão criando novos procedimentos para manter os embarques fluindo", complementou a agência britânica.
Em seu discurso nesta quarta-feira (2) durante o Berlin Global Dialogue, o presidente francês Emmanuel Macron fez um alerta sobre a competitividade da União Europeia estar ameaçada pelo excesso de regulamentações e pelos baixos investimentos. Ele complementou sua fala afirmando ainda que a Europa não será capaz de competir com grandes economias como Estados Unidos e Europa continue neste mesmo caminho.
Além disso, ainda pontuou que é preciso que o bloco aja rápido para concluir uma "união bancária e a garantir de regras comerciais mais justas". "A UE pode morrer, estamos à beira de um momento muito importante. Nosso antigo modelo acabou — estamos regulando demais e investindo pouco. Nos próximos dois a três anos, se seguirmos nossa agenda clássica, estaremos fora do mercado", disse Macron.
No mês passado, o alerta semelhante veio do ex-presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, e críticas já vieram também do chanceler alemão, Olaf Scholz, que também pressiona pelo adiamento da EUDR.
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