Mais de 42 mil pescadores catarinenses celebram o Dia do Pescador, comemorado em 29 de junho
Em Santa Catarina, mais 42 mil pescadores são homenageados no dia 29 de junho pela profissão que exercem, segundo dados da Federação dos Pescadores do Estado de SC. A data foi escolhida em referência ao dia de São Pedro, que era pescador. Durante o trabalho de extensão rural com o setor pesqueiro, a Epagri se deparou com três pescadoras que se destacam na comunidade em que atuam. Conheça um pouco da história de dona Naca, da Marciana e da Sal, que tiram do mar o sustento da família.
Nair Maria Cabral Mance, 71, vive da pesca há mais de 60 anos na cidade onde nasceu: Governador Celso Ramos, na Grande Florianópolis. Filha e neta de pescadores, ela se criou comendo peixe com farinha e com 11 anos começou a pescar com o pai, no município que tem a pesca como principal atividade econômica “Tomei gosto pela atividade, só estudei dois anos. A sabedoria veio com o mar e com a produção de rede”, diz dona Naca, como é conhecida por todos.
Ela também domina a arte de fabricação e conserto de redes de pesca, sabedoria que sempre repassa a outros pescadores nos cursos em que é convidada para ser palestrante. Dona Naca recebe assessoria da Epagri há anos e foi por meio da Empresa que participou de capacitações que a ajudaram a operar melhor a embarcação, como o curso de motor. Também foi por meio do órgão público que ela teve acesso a crédito para aquisição de embarcação.
No mar a pescadora captura camarão, tainha, pescadinha, borriquete, corvina, papa-terra e maria-luiza. “Não me preocupo com a quantidade, mas com a qualidade. Uso rede mais larga e pego camarão e peixes maiores”, diz. Ela sempre sai sozinha no barco e diz que não tem medo. “Tem que ter respeito pelo mar”, diz dona Naca, que sabe o dia bom de embarcar e o dia bom de ficar em solo. Hoje ela é aposentada pela pesca, mas continua na ativa para complementar a renda. “Nunca quis fazer outra coisa, é vicio. Não vivo longe do mar”. Essa coragem faz dela uma pescadora muito respeitada pelos homens e mulheres que vivem e sobrevivem da pesca artesanal no município.
O mundo acadêmico também se interessa pelo trabalho de dona Naca. Ela é personagem de duas teses de doutorado que viraram livro. Em um deles, “Pesca, turismo e meio ambiente”, de Maria do Rosário Leitão, dona Naca ilustra a capa. A obra foi lançada em 2014 e retrata a coragem e experiência da pescadora. Já no livro “Mulheres e o mar”, da extensionista rural da Epagri Rose Gerber, dona Naca tem o cotidiano retratado. A referida publicação é um trabalho inédito sobre as mulheres pescadoras do litoral de Santa Catarina, publicado em 2015.
Marciana Amado da Silva, 39, de Laguna, no Sul Catarinense, nem sabe dizer quando a pesca entrou em sua vida. A atividade vem de várias gerações de sua família. “Desde que eu me entendo por gente, eu pesco”, diz ela. Hoje ela captura principalmente camarão e siri no complexo lagunar da região. A maior fonte de renda vem da comercialização de casquinhas de siri, vendidas diretamente ao consumidor.
Ela lembra da infância, quando ia de carroça para a praia com os pais, para puxar rede. “A gente abria os peixes lá mesmo, porque era muito. O peixe diminuiu muito com o passar dos anos, não compensa mais ir pro mar, como antigamente. Já o siri não diminuiu, tem na lagoa ao ano inteiro e é mais lucrativo processá-lo e vender a carne na casquinha”, diz ela, que desenvolve a atividade com o marido Antônio, 50. Na hora do aperto, os dois filhos também ajudam.
“Não me vejo morando em outra cidade e fazendo outra coisa. Até pensei em trabalhar em outra área, mas a pesca é o que eu sei fazer”. Segundo Marciana, a atividade proporciona uma vida confortável para a família: “Tudo o que eu tenho vem da pesca”.
Em 2021 ela participou do curso Mulheres em Ação Flor-e-Ser, oferecido pela Epagri para capacitar agricultoras e pescadoras para que elas tornem a atividade profissional mais competitiva, usem o conhecimento adquirido para melhorar a qualidade de vida e sejam protagonistas nos mais diferentes segmentos da sociedade e em suas próprias famílias.
“Esse curso mudou minha vida. O fato de sair um pouco da pesca, conhecer pessoas que trabalham com a mesma coisa que você, poder trocar experiências, fez muito bem para mim. O curso também me ajudou muito na parte financeira da atividade. Foi lá que aprendi a calcular os custos de minha produção e saber quanto é de fato o meu lucro”, diz ela.
E assim Marciana segue na atividade, ao lado do marido, sempre respeitando o período de reprodução dos siris. “Os pescadores daqui sabem que capturar fêmea ovada compromete a espécie. A gente vive da pesca e se acabar o siri, nossa renda também acaba”, diz ela.
O mesmo ocorre com o camarão, espécie que por lei tem o período de defeso para que possa se reproduzir. De 1º de março a 31 de maio a pesca desse crustáceo é proibida. Por conta disso, Marciana faz muito bem a gestão dos recursos conquistados na pesca, para garantir o sustento da família quando eles não podem ir pro mar. “Somos iguais formiguinhas que trabalham no verão para ter comida no inverno”, compara ela.
A paranaense Salete Iaczinski, 47, conhecida por Sal, é filha de agricultores e até os 15 anos viveu longe do mar, quando se mudou para Florianópolis para dar continuidade aos estudos. Foi na capital catarinense que ela construiu sua família e entrou para o mundo da pesca, em 2002. Ao lado do marido Joarez, hoje ela não apenas tira o sustento do mar como também busca preservá-lo e levar essa consciência ambiental aos demais pescadores, à população e ao setor público.
“Se não cuidar, se não proteger o mar e os mangues, logo não tem mais peixe, não tem camarão. Não é apenas turismo que movimenta a economia da Ilha, mas a pesca também. Acredito que a pesca ainda mais, porque o turista vem para cá para comer o nosso peixe e ver as belezas naturais”, diz ela, ao se mostrar preocupada com a especulação imobiliária que pode impactar a pesca na região. “Temos que ter visão de futuro. Eu posso não estar aqui em alguns anos, mas terá outras pessoas usando esse ambiente”.
Sempre embarcada com o marido, Sal pesca na baía norte de Florianópolis e vende toda a produção para intermediadores. Em dias de mar ruim, ela aproveita para fazer rede de pesca. “A profissão é instável, nada garante que a pesca será boa todos os dias. Mas não posso reclamar, tudo o que eu tenho eu ganhei com a pesca”, diz ela, que criou as duas filhas – de 26 e 22 anos, com a renda proveniente da atividade.
Sal está na segunda gestão como tesoureira da Associação dos Pescadores Artesanais da Praia de João Paulo, que hoje conta com 140 associados. A entidade busca melhores condições de trabalho para os associados, como também a proteção do meio ambiente, com atuação junto ao setor público. Sua liderança é reconhecida entre os pescadores e a levou a fazer o curso Flor-e-Ser, da Epagri, que este ano abriu uma turma para pescadoras na Grande Florianópolis.
“Estou adorando, é experiência maravilhosa conviver com outras pessoas. Ao mesmo tempo em que o mar é muito satisfatório e nos dá a sensação de liberdade, ele também é solidão. Em meu trabalho, fico muito tempo sem conversar com outras pessoas. Em cada encontro do curso eu aprendo uma coisa nova e percebo que minha experiência de pescadora também pode ajudar as outras participantes”, diz ela.
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