Alvo de divergência, projeto que muda fiscalização agropecuária será votado na quinta
O presidente da Comissão de Agricultura (CRA), senador Acir Gurgacz (PDT-RO), confirmou a votação na quinta-feira (9) do projeto de lei (PL) 1.293/2021. O texto flexibiliza a fiscalização agropecuária do Ministério da Agricultura (Mapa) por meio de programas de autocontrole geridos pelas empresas do setor. Alvo de divergência entre senadores e especialistas, a matéria foi tema de audiência pública nesta quarta-feira (8).
Segundo Gurgacz, o projeto estabelece procedimentos de fiscalização e auditoria mais ágeis e modernos para a agroindústria. O parlamentar afirma que o método de certificação proposto pelo texto será menos oneroso para o setor produtivo e mais benéfico para o consumidor.
— Essas mudanças são muito necessárias para garantir crescimento e sustentabilidade do setor agropecuário e agroindustrial, bem como para assegurar produtos de qualidade para os consumidores. Esse processo também valoriza o papel do auditor fiscal, que continuará responsável pela fiscalização. Porém, de uma forma mais ágil e muito mais moderna. Sem a necessidade de estar presente diariamente, acompanhando a atividade rotineira das empresas — argumentou.
O PL 1.293/2021 foi apresentado pelo Poder Executivo e aprovado pela Câmara dos Deputados em maio deste ano. O texto promove uma ampla revisão das leis de defesa agropecuária. A principal novidade é a criação de sistemas de autocontrole nas empresas para auxiliar o poder público na avaliação da qualidade de rebanhos, lavouras e produtos.
O relator da matéria é o senador Luis Carlos Heinze (PP-RS). Favorável à proposta, o parlamentar afirma que outros países adotam o modelo proposto no texto.
—Temos que avançar. Os Estados Unidos usam esse sistema. A Austrália e a Nova Zelândia, dois países avançadíssimos na pecuária de corte e leiteira, usam esse sistema. Toda a Europa usa esse sistema. Não é uma invenção do Brasil. Não vai se inventar a roda. Isso facilita o processo. É uma evolução, não um retrocesso — avaliou.
Resistências
O projeto não é unanimidade entre os parlamentares. Para o senador Jean Paul Prates (PT-RN), que sugeriu a realização da audiência pública, o texto não deixa claro os critérios que as empresas devem adotar para promover autocontrole. Ele defende a discussão da matéria em outros colegiados do Senado, como as Comissões de Assuntos Sociais (CAS); Meio Ambiente (CMA); Constituição e Justiça (CCJ); e Fiscalização, Controle e Defesa do Consumidor (CTFC).
— Estamos desvendando as entrelinhas e as consequências desse projeto. Estamos simulando cenários de um projeto que não faz pouca coisa. Se, de um lado, alega-se que o poder público continuará mantendo os mesmo poderes, o projeto revoga 11 dispositivos ou leis que estabelecem penalidades ou sanções. Mexe muito com saúde pública, meio ambiente, constitucionalidade e principalmente fiscalização. Salta aos olhos a necessidade de passar por uma ou duas dessas comissões que destaquei — ponderou.
A senadora Zenaide Maia (Pros-RN) também cobrou a distribuição do projeto para outras comissões permanentes da Casa. Ela alertou para o risco que a aprovação do texto pode gerar à saúde da população.
— A sociedade tem que ser ouvida. Não entendo por que retirar essa vigilância sanitária (do poder público). E a segurança alimentar, gente? Essa concessão de registro automático é um absurdo. A gente está lidando com agrotóxicos, bactérias, fungos. A fiscalização tem que ser do Estado. Não é contra o agronegócio. Mas não é possível isso. Tem que haver um mínimo de segurança. Vamos discutir mais, em novas comissões — sugeriu.
Especialistas
A audiência pública contou com a presença de representantes do governo federal, de órgãos de controle e da indústria agropecuária. Para o secretário de Defesa Agropecuária do Mapa, José Guilherme Tollstadius, o projeto tem sofrido uma “distorção de interpretação” por críticos que preferem “criar fantasma onde não existe”. Favorável ao texto da forma como foi aprovado na Câmara, Tollstadius argumenta que o PL 1.293/2021 “não trata de autoinspeção ou autofiscalização”.
— O que estamos buscando, com base na teoria da regulação responsiva, é um equilíbrio entre a ação de controle e a responsabilidade do setor privado. Existe uma tendência de se falar que o setor privado faz autorregulação e resolve tudo. Não é isso. Mas também não é uma situação em que só o Estado pode controlar, só o Estado sabe. Temos papéis diferentes, e cada um tem que assumir responsabilidades — afirmou.
O presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais Federais Agropecuários, Janus Pablo Fonseca de Macedo, critica o projeto. Ele alerta para alguns “pontos críticos” do texto, que poderiam colocar em risco a saúde da população. Macedo cita como exemplo a concessão automática de registro para produtos com padrões normatizados e a possibilidade de contratação de especialistas externos para avaliar esses casos.
— Isso é um risco. Estamos falando de hormônios, de antimicrobianos, de pesticidas que deixam resíduos nas carnes que consumimos. É uma porta aberta para a terceirização de nossas atividades. É no mínimo um avanço sobre as competências das carreiras que compõem o Mapa [Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento], para não falar em usurpação. Somos os últimos guardiões do consumidor brasileiro. Se abruptamente fomos retirados de uma planta frigorífica, por exemplo, isso deixa o consumidor muito indefeso. Precisaríamos de no mínimo uma década de transição para chegar a esse modelo — argumentou.
O presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes, Antonio Jorge Camardelli, defende a aprovação do projeto. Para ele, o PL 1.293/2021 é fruto de uma parceria entre o Poder Executivo e o setor privado para tornar o Brasil mais competitivo, especialmente no mercado externo.
— Não existe exportação sem chancela do governo. Uma das dificuldades que a gente tem em relação aos grandes players é exatamente esse diferencial da agilidade com segurança. Isso dificulta um pouco a competição com outros países. A modernização dos métodos de controle em hipótese alguma tornará o consumidor indefeso — afirmou.
Quem também defende a aprovação do texto é o presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal, Ricardo João Santin. Ele entende que o projeto não estimula a autofiscalização pelas empresas, mas sim a modernização da inspeção.
— É uma evolução para a segurança alimentar. Não há nenhum risco. Pelo contrário, vai melhorar a capacidade do nosso auditor fiscal federal agropecuário em proteger a segurança das pessoas. E por que estamos fazendo isso? Porque o mundo fez. Isso é uma tendência global. A FAO [Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura] coloca que as produções de carne têm que ser feitas em abordagem mais baseada em risco. E não em fiscalização visual — justifica.
O presidente da Academia Brasileira de Medicina Veterinária, Josélio Andrade Moura, identifica méritos no projeto. Mas observa que a eventual aprovação do texto não pode servir para que o governo deixe de investir na estrutura de fiscalização do Mapa.
— Está faltando fiscal. O autocontrole vai racionalizar a atividade. Mas é preciso ter auditores fiscais, principalmente nas médias e pequenas indústrias e empresas agropecuárias, para dar uma assistência maior. Para isso, é preciso abrir concursos permanentes para esses fiscais. O orçamento do Ministério da Agricultura é muito pobre. Em torno de R$ 7 bilhões. É pouco para o maior setor da economia nacional — argumentou.
Parlamentares
O presidente da Frente Parlamentar de Ciência, Tecnologia, Inovação e Pesquisa, senador Izalci Lucas (PSDB-DF), criticou o atual modelo brasileiro de fiscalização agropecuária. Para ele, a autorregulação é uma necessidade óbvia do setor.
— Essa interferência, esse modo arcaico, essa burocracia deste país cartorial e atrasado é uma coisa absurda. Isso não era para existir. Não pode considerar todo mundo desonesto, todo mundo incompetente. Não precisava nem de lei para isso. É óbvio que tem que ter autorregulação, o que não impede que o governo fiscalize. Neste país, o governo atrapalha demais. Como é difícil produzir alguma coisa nesse país. Você vai concorrer com os outros países que não têm essa burocracia toda, e a gente acaba perdendo mercado e competitividade — pontuou.
O senador Esperidião Amin (PP-SC) disse ser “simpático ao projeto”. Mas sugeriu que o Mapa continue promovendo fiscalizações por amostragem nas empresas, como forma de garantir a eficácia dos programas de autocontrole.
— Acho que podemos, estabelecendo regras exemplares de punição, estabelecer a regra da amostragem. A Receita Federal faz isso. Alguma regra que estabelecesse uma amostra para checagem da informação. Isso daria respeitabilidade para tornar o sistema crível, legítimo e idôneo. Quem não é a favor não é a favor por quê? Porque desconfia. É uma forma de reduzir a desconfiança — disse.
A audiência pública contou com a presença de dois deputados federais: a ex-ministra da Agricultura Tereza Cristina (PP-MS) e o relator do PL 1.293/2021 na Câmara, Domingos Sávio (PL-MG). Ambos defenderam a aprovação do texto.
O projeto recebeu 29 emendas na CRA, todas rejeitadas pelo senador Luis Carlos Heinze. O texto tramita na comissão em decisão terminativa. Se for aprovado pelo colegiado sem alterações, segue direto para sanção presidencial — a menos que haja recurso para votação no Plenário.
1 comentário
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Gilberto Rossetto Brianorte - MT
Quando esse pessoal do PT, PCdoB, Rede, Psol vão parar de defender as corporações dos servidores públicos e passar a defender os brasileiros? Sem inovação o Brasil fechará as portas para a produção e para os empregos. Até parece que a oposição quer: miséria aqui e empregos lá fora.
Sr. Gilberto, o PT não defende apenas corporações de funcionários públicos, defende o corporativismo financeiro, agropecuário e muitos outros. Aqui em minha região, sul do MT, muitos "grandes", em tamanho de área ao menos, são lulistas de gastar muito dinheiro em campanha, mesmo que veladamente ainda.
Sr Gilberto enquanto esistir pessoas igual as que negativaram seu comentário mesmo sabendo que a esquerda só tira dos pobres e favorece os ricos, mesmo sabendo que o pai dos pobres hoje e multi milionário junto com seus compareças, mesmo sabendo que e só olhar a votação na camara e demais, isso não vai parar nunca o povo ficou dominado e não importa ser escravo de um bode cachaceiro e família pelo resto de suas vidas medíocres, e só vc pedir pra eles dividirem os frutos do roubo que vc já vai ver a resposta, eles querem pegar tudo o que e dos outros mas o deles ninguém pega simples assim