Choque sem precedentes no mercado de fertilizantes dá sinais importantes sobre as safras globais 2022/23
A notícia de que a Rússia irá limitar suas exportações de fertilizantes confirmada pelo Primeiro Ministro do país nesta quarta-feira (3) intensificou ainda mais as preocupações com a oferta de insumos agropecuários e deixa ainda mais explícita a dependência do Brasil da importação destes produtos. A medida vale por seis meses e entra em vigor em dezembro.
Um levantamento feito pelo analista de fertilizantes da Agrinvest Commodities, Jeferson Souza, mostrou que de janeiro a setembro de 2021 as compras brasileiras no mercado russo apresentaram um aumento considerável, especialmente entre os itens que entraram nas limitações impostas pelo governo local. Nos primeiros nove meses de 2021, as importações de MAP pelo Brasil na Rússia aumentaram 30%; as de ureia 20%, 29% de MOP e 98% de nitrato de amônio.
Os EUA também deverão sofrer com as medidas, uma vez que importam 20% de sua ureia e 40% de seu nitrato de amônio somente da Rússia.
Todos estes produtos estão na lista do decreto que remove os procedimentos alfandegários simplificados para os fertilizantes com os seguintes códigos:
• urea (3102101000, 3102109000)
• ammonium nitrate (3102301000, 3102309000)
• UAN (3102800000)
• NPKs (3105201000, 3105209000)
• DAP (3105300000)
• MAP (3105400000)
• NPs (3105510000, 3105590000)
O cloreto de potássio - KCl - ficou fora da lista e é um ponto importante para o mercado brasileiro, uma vez que é de lá que vem boa parte do item importado pelos produtores locais. E mesmo sem a Rússia colocar este fertilizante na lista de restrições, o quadro segue complicado uma vez que os outros dois maiores exportadores mundiais - Canadá e Bielorrússia passam por problemas no fornecimento deste produto e mantêm o quadro de oferta e demanda fragilizado.
NITROGENADOS X SAFRA 2022/23
A preocupação com a falta de nitrogenados é forte, grave e, segundo explica Eduardo Vanin, analista de mercado da Agrinvest Commodities, ponto determinante paraa definição das próximas safras na temporada 2022/23, principalmente pelos produtores do hemisfério norte, já que serão eles os primeiros a encarar o atual momento e custos de produção que poderão ser os mais elevados da história.
"O americano e o europeu, em fevereiro, terão que decidir o que irão plantar, tendo comprado quase nada antecipadamente. E este é o fator-chave para a definição do tamanho área do milho e da soja. Se o plantio fosse hoje, com os atuais custos de produção, valeria mais a pena a produtor americano plantar soja e reduzir a quantidade de KCl, por exemplo, porque plantar milho sem ureia a produtividade será menor. E ele precisa de uma produtividade muito grande para remunerar os seus custos. Seria mais provável plantar mais trigo de primavera - que está num baita preço - e soja, e reduzir a área de milho. Esse é o grande ponto para o ano que vem", afirma Vanin.
Os nitrogenados, todavia, são outro grande problema, afinal, parte das altas expressivas são reflexo de uma falta preocupante de produto no mercado. Segundo uma matéria trazida pela agência internacional de notícias Bloomberg, o disponível será insuficiente, ao menos até este momento, para o que os produtores precisarão na próxima safra.
Os atuais - e elevados - valores do gás natural na Europa, matéria-prima importante para os nitrogenados, ajudam a intensificar a escalada dos preços e o mercado dos fertilizantes, em seu espectro mais amplo e completo, passa pelo que os especialistas chamam de "tempestade perfeita". As altas intensas nos preços do gás forçaram, inclusive, algumas indústrias a fecharem plantas de fertilizantes em algumas partes da Europa dados os elevados custos de produção.
Os prçeos à vista do potássio e da ureia, nos Estados Unidos, já mais do que dobraram somente no acumulado deste ano e os produtores, de acordo com a consultoria internacional Green Markets, "simplesmente não conseguirão arcar com estes preços". São as máximas em nove anos nos preços da ureia no mercado norte-americano.
Os altos preços do carvão no mercado global também pesaram e continuam sendo um fator importante sobre os preços mais altos dos fertilizantes. A crise energética também exigiu que algumas indústrias paralisassem sua produção em plantas da China, por exemplo, agravando o quadro de oferta. São problemas em cadeia e os resultados aparecendo em efeito dominó.
O choque maior deverá continuar a ser sentido nos números da inflação global de alimentos. A alta nos custos de produção puxa os preços dos alimentos de todas as naturezas - do açúcar ao trigo - e segue alimentando o movimento inflacionário. Recentemente, as cotações do cereal na Bolsa de Chicago registraram suas máximas desde 2012 e, ao mesmo tempo, os canavicultores buscam altermativas para racionar ou diminuir o uso de fertilizantes na safra 2022/23.
“Os agricultores poderiam repassar o custo mais alto dos fertilizantes para os consumidores na forma de menor produção agrícola e subsequente alta nos preços dos alimentos”, disse Alexis Maxwell, analista da Green Markets, consultoria de propriedade da Bloomberg.Os levantamentos entre as culturas são os mais distintos até este momento, com impactos de todas as naturezas sendo esperados. Soja, milho, trigo, café, açúcar, arroz, feijão, frutas, demais grãos, todos estes são grupos de alimentos que já sinalizam preocupações graves.
No entanto, para o o consultor técnico na área de solos e sistema de produção, Leandro Zancanaro, este poderá ser um ano de volta aos conceitos básicos da agronomia para agricultores do mundo todo, em especial o Brasil, para buscarem garantir suas safras com bons níveis de produtividade e mitigação dos efeitos deste choque na oferta de insumos agrícolas.
"As maiores dificuldades no campo financeiro vão nos fazer resgatar alguns conceitos básicos fundamentais. O produtor terá que investir onde é preciso, resgatar conceitos básicos de agronomia, isso é tecnologia. Será um ano de mais tecnologia porque se usará mais conhecimento. Se usaremos mais ou menos insumos será consequência do conhecimento. Então, será um ano muito bom tecnicamente", acredita o especialista.
O QUE DIZ A INDÚSTRIA?
Em entrevista à Bloomberg, duas das maiores indústrias de fertilizantes do mundo - a Nutrien Ltd e a Mosaic Co., afirmaram que a alta nos preços tende a continuar, destacando o potássio e o grupo dos fosfatados. O representante da Mosaic afirmou ainda que alguns de seus clientes já estariam, inclusive, solicitando compromissos de produto até o segundo trimestre do ano que vem.
Apesar disso, a empresa ainda relatou que seus ganhos ficaram ajustados no terceiro trimestre deste diante de vendas menores de potássio e fosfato por conta dos altos preços.
Em uma das edições de outubro do programa Conexão Campo Cidade, do Notícias Agrícolas, o vice-presidente da Mosaic Fertilizantes no Brasil, Eduardo Monteiro, detalhou o cenário que provocou essa disparada nos preços dos fertilizantes, passando de fenômenos naturais chegando a governos autoritários.
Reveja:
Afinal, a Rússia vem restringindo suas exportações depois da rumores de que a China poderia fazer o mesmo. Embora a medida na nação asiática ainda não tenha sido oficializada, a oferta de produtos chineses no mercado é nitidamente menor e o país vem adotando práticas de inspeção de seus produtos destinos à exportação que dificultam os processos.
3 comentários
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Valdinei F bobato Cascavel - PR
Inicialmente o aumento de preços pelas restrições em exportar fertilizantes por parte da China e Russia, trarão consequências desastrosas na produção de grãos nas próximas safras, sem esquecer que isso resultará na escasses de produtos agrícolas com aumento de preços e ainda mais fome no mundo.
JOSE CARLOS ZINGRA Macapá - AP
No mundo globalizado, a decisão de um Pais influencia diretamente a produção de alimentos nos demais. É o preço que pagamos pela liberdade. Hoje dependemos uns dos outros...
Tiago Pandolfo Balsas - MA
É o momento do produtor fazer uma boa análise de solo e restringir o máximo que puder a demanda. Continuando nesses preços irei utilizar nada de fósforo e pouco ou nada de potássio. Usar os estoques que fiz no solo.... se todos fizessem isso. quero ver se os preços não baixariam????.
Sr. TIAGO, o Brasil deve estar consumindo anualmente (a grosso modo) algo em torno de 26 MM de TON de NPK/ANO. Sendo a relação 9:6:9 ... Ou seja, 9 MM de N : 6 MM de P2O5 : 9 MM de K2O.
Com um detalhe o Brasil consome em torno de SETE POR CENTO do TOTAL dos fertilizantes consumidos anualmente no mundo.
Veja que, se pararmos de consumir, o choque no consumo mundial COM CERTEZA não vai ser relevante. Ou seja, somos SIM o CELEIRO DO MUNDO mas, não somos relevantes com relação ao consumo mundial de fertilizantes. ...
Todo mundo fica se perguntando: Por que não produzimos os próprios fertilizantes?
Então, aí vai "algumas causas"!
Um dos principais é a concentração de mercado. Poucas empresas detêm a grande maioria da produção e comercialização do produto
no país.
O maior vilão é o ICMS, cujas alíquotas atuam negativamente na melhora da comercialização interna dos fertilizantes. Agora vem a "cereja do bolo": A importação é isenta de tributação. Tornando a concorrência mais desleal em relação ao produto nacional.
Todas essas "causas" levam ao desestimulo em produzir e, ao longo de décadas houve um desmonte da capacidade instalada da indústria de fertilizantes em solo brasileiro. Aumentando nossa "dependência" aos fertilizantes importados.