Área irrigada por pivôs centrais no Brasil atinge 1,6 milhão de hectares
Os pivôs centrais consolidaram-se como o principal sistema de irrigação brasileiro, superando o método de inundação adotado para o cultivo do arroz na Região Sul. Em 2020, 1,6 milhão de hectares do País contou com o equipamento. Esse é um dos resultados do trabalho “Georreferenciamento dos pivôs centrais de irrigação no Brasil: ano base 2020”, de autoria dos pesquisadores da Embrapa Milho e Sorgo Daniel Pereira Guimarães e Elena Charlotte Landau.
Segundo os pesquisadores, a importância de trabalhos dessa natureza está ligada à possibilidade de monitoramento em tempo quase real do status de uso, inativos ou em operação, pois fornece informações sobre a produção agrícola e o gerenciamento dos recursos hídricos. A agricultura irrigada é a principal fonte de abastecimento da água retirada dos mananciais.
Hoje, as áreas de agricultura irrigada do País correspondem a menos de 20% da área total cultivada e produzem mais de 40% dos alimentos, fibras e cultivos bioenergéticos, números que evidenciam a contribuição desse método para a segurança alimentar. Além disso, mostram aumento da produtividade por unidade de área e possibilidade de produção fora de época, o que contribui para reduzir a expansão da fronteira agrícola e abrir novas oportunidades de mercado.
Ainda como pontos positivos do sistema de irrigação, destacam-se a geração de empregos no campo, a criação de renda em pequenas propriedades e a diversificação da produção. Já para os cultivos de sequeiro, da região do Semiárido brasileiro, a irrigação proporciona melhoria na qualidade, padronização dos produtos e produção em áreas de alto risco.
Além das grandes culturas, como soja e milho, sob os pivôs centrais é produzida grande parte do tomate industrial, batata, cenoura, café nas áreas de Cerrado, cebola, alho e cana-de-açúcar. “Esses equipamentos são também indutores do cultivo das culturas de inverno como o trigo e a cevada na região dos Cerrados. Sob condições irrigadas, o trigo tem apresentado altas produtividades, inclusive no Semiárido brasileiro, indicando o potencial da irrigação para a redução das importações desse cereal”, diz Guimarães.
Sensoriamento remoto e o impacto na irrigação sustentável
A gestão racional de recursos hídricos é uma das prioridades quando se fala de agricultura irrigada no Brasil. Registros da Agência Nacional de Águas (ANA) indicam que o consumo de água resultante dessa prática é cerca de oito vezes maior que o usado para o abastecimento humano. De acordo com o pesquisador da Embrapa, se todos os pivôs centrais atualmente instalados no País fossem ligados simultaneamente, usando água retirada dos mananciais, o volume demandado seria equivalente a toda a vazão do Rio São Francisco.
Mas, na prática, isso não acontece. “Os irrigantes buscam combinar os cultivos com o ciclo das chuvas. Eles também utilizam a preservação de água nas propriedades com o uso de açudes para armazenamento no período de abundância e sistemas de cultivo que reduzem as perdas de água do solo e facilitam a infiltração. Desse modo, sistemas eficientes de irrigação podem inclusive contribuir para a mitigação da deficiência hídrica nos períodos de estiagem”, explica Guimarães.
Segundo ele, o sensoriamento remoto é a ferramenta mais adequada para esses levantamentos e abre caminhos para melhorar a eficiência na gestão dos recursos hídricos e expandir a agricultura irrigada em bases sustentáveis. “Considerando a grande extensão territorial brasileira e a dinâmica e diversidade das áreas irrigadas, é preciso melhorar o nível de entendimento sobre a variabilidade sazonal da disponibilidade hídrica nas bacias hidrográficas. Bem como mensurar a previsão da disponibilidade hídrica nos períodos críticos, a eficiência no uso da água e a determinação das áreas aptas para a expansão da agricultura irrigada no País”, pondera.
“Apesar de o Brasil ter aproximadamente 12% da água doce do planeta, nossa agricultura irrigada corresponde a menos de 2% da área global. Nos países com maiores áreas irrigadas do globo esse número é dez vezes maior que a área brasileira. Nosso clima tem condições térmicas e radiação solar condizentes com a produção agropecuária durante os 365 dias do ano”, diz o pesquisador.
Alta concentração de polos de irrigação no Brasil
Daniel Guimarães ressalta, porém, que existe alta tendência de concentração dos polos de irrigação no Brasil. “Mais da metade da área irrigada por pivôs centrais no Brasil está localizada nas bacias hidrográficas do Médio São Francisco, onde estão os polos municipais de Paracatu e Unaí, em Minas Gerais, e São Desidério, Barreiras e Mucugê, na Bahia. A essa área de concentração somam-se também o Alto Paranaíba, em Minas Gerais, e a bacia do Rio Paranapanema, em São Paulo.”
Outro fato que chama atenção é que 1/4 da área irrigada por pivôs centrais está localizada em apenas dez municípios, onde atinge mais de 400 mil hectares. Quatro municípios têm mais de 15% de suas áreas ocupadas por pivôs centrais: Itaí-SP (17,83%), Santa Juliana-MG (15,85%), Casa Branca-SP (15,39%) e Romaria -MG (15,08%).
“O que nos chama a atenção no atual levantamento é o expressivo crescimento dos pivôs centrais no Mato Grosso. Embora o clima seja favorável à produção de duas safras anuais em regime de sequeiro, ou seja, sem o uso da irrigação, os ganhos em produtividade, viabilidade de uma terceira safra e minimização de perdas pela ocorrência de veranicos têm contribuído para essa expansão. Nota-se também o aumento na implantação de pequenos pivôs centrais com áreas irrigadas inferiores a dez hectares”, pontua Guimarães.
Precisão de imagens de satélite e geração de mosaicos
A pesquisadora Elena Charlotte Landau chama a atenção para a melhoria na precisão desses levantamentos em função da disponibilidade de imagens de satélite e interfaces computacionais. “A plataforma Google Earth Engine (GEE) permite a rápida geração de mosaicos de imagens com o mínimo de nebulosidade cobrindo todo o território nacional. O uso de índices espectrais estabelecendo relações funcionais entre as bandas das imagens contribui expressivamente para a identificação dos equipamentos de irrigação no campo”, relata.
“A disponibilidade de imagens multibandas do satélite da Agência Espacial Europeia (ESA), Missões Sentinel do Programa Copernicus, com revisitas a cada cinco dias, facilita as análises temporais e a exclusão dos impactos ocasionados pela presença de nuvens. A continuidade da série de satélites Landsat com o lançamento do Landsat 9garante o monitoramento terrestre por imagens de satélite de média resolução por cerca de 50 anos ininterruptos”, explica a cientista. O trabalho contou ainda com a contribuição das imagens, gratuitas, do satélite CBERS 4A, com alta resolução espacial para a análise detalhada dos objetos-alvo, nesse caso, os pivôs centrais.
“Vale ressaltar que esse deve ser o único caso no mundo em que imagens com resoluções inferiores a cinco metros (pixel) são disponibilizadas gratuitamente. Embora as funcionalidades do Google Engine já permitam a identificação automática desses equipamentos nas imagens, a combinação dessas técnicas com a inspeção visual permitiu o descarte de pivôs inativos e erros na classificação”, afirma Landau.
A pesquisadora da Embrapa relata que a possibilidade de identificação de detalhes como o equipamento de irrigação (braço giratório), marcas deixadas pelas rodas no campo e status de uso permitiu a exclusão de cerca de 1.600 equipamentos de irrigação mapeados no levantamento realizado em 2017, no estudo em parceria entre a Embrapa e a ANA.
“As principais mudanças se deram nos estados do Nordeste em função da redução da área irrigada de cana-de-açúcar com o uso de pivôs centrais rebocáveis. Também ocorreram a exclusão de equipamentos inativos ou identificados erroneamente e a inclusão de um maior número de pequenos pivôs centrais em função da melhoria na qualidade das imagens utilizadas no levantamento atual”, conta Landau.
O estudo demonstra que, em geral, as áreas desativadas de irrigação continuam sendo cultivadas na estação das águas e apresentam alta semelhança com as áreas irrigadas nas imagens de satélite. Exceto pela ausência do braço mecânico e das marcas deixadas pelas rodas durante a aplicação da irrigação, condições impraticáveis de discriminação por processos de automação. Situação mais complexa ocorre nos sistemas de pastejos rotacionados com o uso de cerca elétrica com deslocamentos em relação ao eixo central.
“Nesse caso, o sistema pode ou não estar associado à irrigação por pivô central, e a identificação dos equipamentos de irrigação depende da visualização das marcas deixadas no campo pelas rodas do equipamento, uma vez que o braço giratório pode ser confundido com a cerca elétrica na interpretação das imagens de satélite. As imagens de satélite durante o período da estiagem ajudam a identificar as áreas irrigadas em função da resposta espectral diferenciada nos índices de vegetação”, conclui a cientista.
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