Réplica na polêmica do Fósforo a lanço: Prof Fancelli publica artigo e reafirma - "não é adequada"
Introdução
O Fósforo é um elemento químico de símbolo P, com número atômico 15 e massa atômica igual a 30,973762 u, sendo importante matéria-prima para o segmento industrial, bélico, alimentício e terapêutico, além de se constituir em nutriente essencial para a vida vegetal.
O Fósforo é um elemento que não é encontrado na atmosfera, sendo unicamente advindo de rochas específicas representadas por fontes finitas. Portanto, o citado elemento apresenta ciclo biogeoquímico truncado, com baixa chance de recuperação na natureza, exigindo uso eficiente, racional e responsável por parte dos agricultores.
Na vida vegetal o fósforo desempenha papel relevante na composição de ácidos nucléicos (DNA e RNA); é componente fundamental da membrana celular; atua na dinâmica de energia ou como transferidor de energia (AMP, ADP, ATP, UTP e GTP) na planta; bem como na regulação de diversas vias de síntese e do estímulo inicial de desenvolvimento de raízes.
Devido as suas propriedades químicas, aliado às condições predominantes em ambientes tropicais, o fósforo apresenta baixíssima mobilidade no solo, exigindo, portanto, conhecimento e estratégias adequadas que assegurem o seu pleno aproveitamento pelas plantas.
Dentro deste contexto, de forma geral, a modalidade de fornecimento de fósforo às plantas, mediante adubação a lanço ou superficial, não se constitui em procedimento adequado (salvo raras exceções), pois, além de dificultar o seu aproveitamento, pode ser considerada estratégia ineficiente e ecologicamente incorreta.
Contextualização do fato
No Brasil, em decorrência da ampliação das áreas de produção de soja, que assumiram extensões avantajadas, o produtor foi obrigado a considerar o uso de técnicas e tecnologias que aumentassem o rendimento operacional da atividade agrícola. Esse procedimento, em princípio, poderia garantir a semeadura da soja em época mais apropriada, preservando o potencial produtivo da planta, bem como propiciando o cultivo sequencial de algodão e/ou milho, na mesma gleba. Portanto, nada mais lógico e compreensivo que este tipo de pensamento se consolidasse.
Contudo, a escolha das estratégias para tal objetivo não poderia apenas privilegiar a facilidade e a comodidade, em detrimento de princípios científicos. Portanto, a escolha da técnica da adubação fosfatada a lanço, de forma simplista, poderia desencadear inúmeros problemas e a perda de potencial de produção ao logo do tempo.
Nos últimos cinco anos, inúmeras constatações confirmaram a ineficiência da referida técnica, pela evidência da estagnação do potencial produtivo e do aumento do custo de produção.
Todavia, se a adubação fosfatada a lanço fizer parte de um sistema de produção racional, sendo utilizada de forma parcimoniosa, em situações específicas, e em conjunto com o cultivo de plantas recicladoras (braquiária), aliada à reposição periódica do fósforo em profundidade, a prática poderá se constituir em estratégia de sucesso.
Avaliação correta do fósforo em glebas com adubação a lanço
Trabalhos de pesquisa demonstram que o fósforo produtivo é aquele que se encontra localizado na camada de solo entre 10 e 15 cm de profundidade. A razão para este fato diz respeito à influência da temperatura e da água na absorção deste elemento pela planta. Temperatura superior a 39oC provocam a desativação do carregador de fósforo na planta, dificultando sua efetiva absorção. Tal condição térmica inadequada frequentemente ocorrerá na camada superficial do solo.
Do mesmo modo, a combinação do mecanismo de contato íon-raiz (difusão) e a necessidade de posicionamento do nutriente na rizosfera, será amplamente favorecida pela disponibilidade de água, garantindo a sua absorção pela planta.
Neste contexto, conclui-se que a água estará, obviamente, mais disponível no solo, em profundidades superiores a 10 cm.
Por tais razões, glebas com teores de fósforo superiores a 20-25ppm ou mg/dm3, na camada entre 10 e 15 cm de profundidade, podem demorar mais tempo para que a distribuição de fósforo a lanço manifeste sinais negativos na produção. Este fato persistirá até o esgotamento do referido nutriente no solo.
Entretanto, com o conteúdo de fósforo mencionado anteriormente, a adubação a lanço pode não apresentar efeito significativo e, em algumas situações, ser totalmente dispensável.
Portanto, o resultado do uso de fósforo a lanço em glebas sem teores e localização satisfatórios de fósforo; sem fosfatagem corretiva (fósforo em profundidade) ou em glebas de primeiro ano, pode ser dramático, sobretudo em anos secos.
Assim, conclui-se que a avaliação do fósforo em glebas com adubação a lanço, objetivando a sua quantificação e localização no solo exige, obrigatoriamente, amostras estratificadas (0-5; 5-10; 10-15 e 15-20 cm).
E se no boletim de análise for observado maior concentração de fósforo na camada de 0-5 cm de profundidade, a estagnação ou a perda de produção estará prestes a acontecer.
Consequências negativas do uso de fósforo a lanço:
A adubação a lanço de fósforo, de forma simplista e exclusiva, sem a devida consideração do sistema de produção adotado, além de exigir quantidades elevadas do referido nutriente, devido à baixa eficiência do procedimento, pode provocar outros problemas relevantes, dentre os quais merecem especial destaque:
- Redução do estímulo inicial do crescimento das raízes, principalmente em profundidade, pois constata-se a diminuição da produção de raízes de 1ª e 2ª ordem (raízes rastreadoras de água) em meio com alta concentração de Fósforo.
- Redução da proliferação de fungos micorrízicos arbusculares, os quais são de fundamental importância para o desempenho das plantas e para a diversidade biótica em solos tropicais.
- Redução da taxa de absorção de água pelas plantas, pois o Fósforo distante das raízes (aplicação superficial) afeta o mecanismo de abertura e fechamento dos canais de água (composto por aquaporinas), que dependem das reações de fosforilação e desfosforilação. Portanto, o uso de fósforo a lanço em anos secos, sobretudo no início do ciclo da cultura, colocam a planta e suas raízes em situação crítica.
- Enovelamento e concentração das raízes na camada superficial do solo, facilitando o ataque de nematóides e de insetos, bem como favorecendo a infecção por patógenos de solo.
- Redução da absorção de zinco, provocando a restrição de produção de auxinas pelas plantas,desencadeando todas as consequências danosas da escassez desse nutriente e do referido hormônio no metabolismo vegetal.
- Redução da taxa de absorção do próprio nutriente (P), devido a diminuição da atividade de seu carregador, que é afetada por temperaturas de solo superiores a 39oC, cuja ocorrência é muito comum na camada de 0-7cm.
- Redução da disponibilidade de Fósforo quando o referido nutriente é distribuído a lanço em área com uso frequente de calcário superficial, devido ao alto valor de pH e da probabilidade de formação de produto insolúvel (fosfato tricálcico)
- Distribuição desuniforme do Fósforo no solo após chuvas de intensidade média à alta, mediante a reacomodação da fonte do elemento citado, nas depressões do microrelevo do solo, formando zonas (ou bolsões) de alta concentração de fósforo.
- Aumento da probabilidade da perda da fonte de fósforo quando distribuída na superfície do solo, juntamente com a água de chuva, mediante escorrimento em áreas declivosas.
Alternativas para o uso de fósforo a lanço
Inúmeras alternativas ao uso de adubação de fósforo a lanço apresentando eficiência e rendimento operacional satisfatórios, podem ser implementadas, quais sejam:
- Uso de doses de arranque no sulco de semeadura da soja (15 a 20 kg/ha de P2O5) ou na semeadura de plantas de cobertura antecedentes;
- Uso de Fósforo no sulco de semeadura a cada 2 a 3 ciclos ou, pelo menos, nas lavouras de milho ou algodão;
- Consolidação de Sistemas de Ciclagem de Fósforo, mediante o cultivo de braquiária após a lavoura de soja, por 3 a 5 meses, suprimindo a lavoura de milho de 2ª época (ou safrinha), em parte da área;
(a referida modalidade poderá ser concretizada pela divisão do total da área cultivada, em quatro partes, rotacionando a braquiária em uma das partes, ao longo do tempo, na época do milho safrinha. No final de 4 anos a reposição do fósforo no solo, em profundidade adequada, estará concretizada);
- Uso de fósforo no sulco de semeadura, mediante o emprego de adubo líquido concentrado, em baixo volume (100 a 125 L/ha), apresentando rendimento operacional satisfatório (modalidade em fase de implantação na produção de grãos, no Brasil) e
- Adubação fosfatada no sulco de semeadura de modo antecipado e incorporado, a partir de agosto, para semeadura posterior de soja na época recomendada. Essa modalidade tem garantido ganhos significativos de produtividade, de forma eficiente e racional, principalmente em áreas extensas, cuja modalidade é conhecida como “adubo plantado”.
Considerações Finais
A técnica da adubação a lanço pode ser utilizada em muitas situações, visando o fornecimento de alguns nutrientes que apresentam o mecanismo íon-raiz por fluxo de massa, o que não é o caso do fósforo.
Portanto, o presente artigo não tem por objetivo condenar a distribuição superficial de fósforo, porém oferecer subsídios para a tomada de decisão e discussão da eficiência e necessidade efetiva do uso da referida modalidade de adubação; visto que ela pode afetar o desempenho da planta, sobretudo em condições de estresse, sem contar com o aumento de risco da atividade agrícola.
A utilização contínua desse tipo de adubação, sem nenhum critério, além da contribuir para a estagnação e/ou perda de produtividade vegetal, poderá dificultar a recuperação da gleba, bem como provocar a perda significativa de fósforo, notadamente em solos argilosos.
Finalmente, cumpre salientar que o principal insumo para a consolidação de uma agricultura eficiente, produtiva e sustentável é o CONHECIMENTO.
Portanto, é imprescindível o questionamento contínuo da validade de recomendações universais (“receitas de bolo”) e de fórmulas mágicas, sem embasamento científico, bem como a valorização dos profissionais gabaritados, com relevantes experiências e responsáveis por resultados comprovados.
Pois, somente desta maneira a agricultura será fortalecida e cumprirá seus nobres desideratos.
Antonio Luiz Fancelli
Fancelli & Associados - Consultoria Empresarial
Confira a palestra na íntegra:
3 comentários
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Marcel Rondon?polis - MT
Não é bem igual o professor não, ele é bem renomado mais tem muita gente renomada com vários teste de vários anos (até 10 anos de adubo a lanço ) mostrando que não é isso aí, mais cada caso é um caso ... mai toda discussão é bem vinda.
Andre de Quadros Não-Me-Toque - RS
Com argila acima de 25% não recomendo a lanço...
Bom dia Andre. Acompanho áreas com 40 a 50% de argilia. Adubação a lanço de P e K a 12 safra, com produtividade muito boas, iguais ou superiores aos vizinhos que fazem P na linha de plantio. Textura é importante, mas é só uma parte.
Gilberto Rodrigues Freitas Mineiros - GO
Por favor, faça outra ressalva professor, senão os pecuaristas irão colocar fósforo a lanço em suas pastagens de brachiaria...