Mesmo tendo assinado manifesto, MST nega participação na invasão à Fazenda Igarashi em Correntina
O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) procurou o Poder360 após publicação nesta 4ª feira (8.nov.2017) do artigo “MST promove verdadeiro terrorismo no campo, escreve Xico Graziano”. O movimento afirma que não participou de protesto em fazendas em Correntina, no interior da Bahia, citado pelo articulista.
“O MST no estado da Bahia emitiu nota desfazendo mais esta “fake news” emulada pelo preconceito aos trabalhadores Sem Terra e a todos que lutam por direitos, em que “denuncia publicamente a má apuração dos fatos ocorrida por diversos veículos de comunicação”, disse o grupo.
Mas em nota conjunta de entidades que agem contra o agronegócio, divulgada no Oeste da Bahia, o MST aparece como um dos signatários. O Notícias Agrícolas publica as notas e o artigo de Xico Graziano para esclarecimento de seus leitores (veja abaixo).
Primeiramente leia íntegra da nota divulgada pelo MST:
“O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) denuncia publicamente a má apuração dos fatos ocorrida por diversos veículos de comunicação a respeito da ocupação e manifestação de comunidades agrícolas nas fazendas Igarashi e Curitiba, nesta última quinta-feira (2), no distrito de Rosário, em Correntina, oeste do estado.
Várias manchetes apontam o MST como participante da ação, porém, enquanto organização popular, não há envolvimento nessa mobilização.
Mesmo assim, reiteramos que apoiamos as ações de denúncia ao agronegócio, principalmente quando existe um processo de privatização de recursos naturais e investimentos antipopulares, que neste caso, afeta diretamente as comunidades camponesas localizadas nas proximidades das fazendas.
Segundo relatos, o projeto de irrigação da Igarashi e Curitiba estão secando os rios Carinhanha, Corrente e Grande, além de provocar queda de energia na região. Essa situação não é diferente de diversas outras localidades no estado que sofrem com as ações de empresas nos territórios, que para garantir uma maior margem de lucro, não levam em consideração o impacto que tais iniciativas possuem ao meio ambiente e nas populações.
Paralelo a isso, não podemos esquecer que tais projetos cumprem o papel de esvaziar o campo, ao expulsar as comunidades de seu território a partir do processo de monopolização dos recursos hídricos. Isso se apresenta muito forte nas regiões do semiárido baiano, onde toda água dos afluentes são moedas troca compactuada com o Estado.
A luta pela terra e pela soberania dos povos é parte fundamental do projeto de sociedade que defendemos e nesse sentido, reafirmamos que os recursos naturais é um patrimônio de todas e todos e não devem ser usados para atender os interesses de uma sociedade segregadora, cujo objetivo é ampliar as desigualdades e a exploração do trabalho.
Seguiremos em Luta, até que todos sejamos livres!
06 de novembro de 2017.
Direção Estadual do MST na Bahia
Salvador – Bahia”
Agora, o artigo de Xico Graziano, ao Poder360:
MST promove verdadeiro terrorismo no campo, escreve Xico Graziano
Os bandidos agrários atacaram novamente, com grande agressividade. Destruíram agora uma fazenda localizada em Correntina (BA). A polícia militar, como sempre, fechou os olhos, compactuando com o crime. Verdadeiro terrorismo no campo.
Era dia de Finados. Enquanto as pessoas de bem reverenciavam seus mortos, as do mal, carregadas de ódio, destruíam uma incrível infraestrutura produtiva destinada à produção de alimentos. Sim, produtiva. Sim, alimentos. Se você é daqueles ingênuos que ainda acredita na importância do movimento dos “sem-terra” para combater os ociosos latifúndios, esqueça seu idealismo.
É triste, mas é a realidade. Há muito tempo o MST (Movimento Sem Terra), benchmarking nessa matéria, liberou geral na invasão de propriedades agrícolas. Antes, nos anos 1990, convenceram a opinião pública de que, em suas estripulias, “ocupavam” terras improdutivas, vazias, portanto, empurrando-as para o processo da reforma agrária. Eram, assim, justiceiros. Sua ação, embora violenta, fazia a carruagem andar.
Passou-se uma década. Com o avanço das desapropriações efetuadas pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), e quanto mais se afirmava a modernização capitalista no campo, o MST, ombreado pela Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), mudou a tática. Passaram a atacar e a depredar fazendas mesmo que produtivas, argumentando que estas, ao produzirem soja ou eucalipto, por exemplo, não serviam ao povo.
Radicalizaram. Agregaram em seu discurso o combate aos transgênicos, e assim destruíram laboratórios de pura tecnologia. Demonizaram o agronegócio. No fundo, usavam um disfarce, uma senha que abria os cofres públicos mantidos pelo populismo lulopetista. Convênios suspeitos, às pencas, passaram a repassar montanhas de dinheiro às entidades, centenas delas, vinculadas ao esquema da reforma agrária. Boca livre ideológica.
Tudo começou a desmoronar com a crise financeira do Estado e o subsequente impeachment de Dilma. As verbas minguaram, como aquelas do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera), utilizada fartamente na escolarização –leia-se doutrinação– dentro dos assentamentos rurais. Perderam seu farto maná os pseudo-revolucionários.
Por que aquela turba raivosa invadiu e destruiu as instalações produtivas da Fazenda Iragashi, comandada por uma família de japoneses no distrito de Rosário, em Correntina? Não se sabe ao certo. Em sua narrativa, comprada facilmente pelos jornalistas descuidados, diziam defender os recursos hídricos da região. Balela.
Não são comprovados tecnicamente os aludidos impactos ambientais, como a suposta morte de nascentes e pequenos córregos. Nem o rio Arrojado, que serve à fazenda, teve sua vazão ameaçada. Suas águas, com a devida autorização pública, abastecem 32 pivôs de irrigação capazes de molhar 2.530 hectares de lavouras, incluindo soja, milho, batata, cenoura, feijão, tomate, alho e cebola. Comida básica, arrasada pela insanidade humana.
A destruição apavora. Torres de energia derrubadas, maquinários agrícolas incendiados, uma gritaria que deixou R$ 60 milhões de prejuízo. Alguém foi preso? Ninguém. Das favelas do Rio aos rincões da Bahia, a impunidade dos criminosos, urbanos ou rurais, campeia no país. Chama o exército?
Paradoxalmente, na mesma data o MST estampava em seu site uma matéria intitulada “A escalada da violência e da criminalização no meio rural brasileiro”. Parece uma provocação. Bem ao gosto do Bolsonaro.
A seguir, veja o manifesto de convocação da população contra as investigações (e assinado pelo MST):
"POVO DE CORRENTINA E REGIAO
Estamos sendo tratados como TERRORISTAS pelo GOVERNADOR E DEPUTADOS aos quais confiamos os nossos votos. PRECISAMOS IR PARA AS RUAS, as milhares de pessoas, união nessa hora. O AGRO NÃO É POP, o AGRO É DESTRUIÇÃO.
Salve os NOSSOS RIOS!
VENHAM PARA AS RUAS, GOVERNO NÃO PODE OPRIMIR O POVO. SE CHEGOU ISSO FOI POR DESCASO.
Vista se de preto, façam seus cartazes de repúdio a estes Deputados e Governador.
A FORÇA DO POVO SEMPRE VENCERÁ
O dia foi mudado para o SÁBADO DIA 11 as 07:00 hrs em frente o museu.
Vista se de preto e venham para as ruas.
Cansado do descaso das autoridades, o povo de Correntina reage em defesa das águas
A mídia está a noticiar que na manhã de quinta-feira, 02/11/2017, feriado de Finados, houve manifestação de populares nas Fazendas Igarashi e Curitiba, no distrito de Rosário, município de Correntina. Segundo imagens e áudios que circulam pela Internet, estas fazendas teriam sido invadidas e parte de suas máquinas, instalações e pivôs quebrados e incendiados, e que os autores destas ações são populares de Correntina. Segundo os relatos participaram da ação entre 500 a 1.000 pessoas.
O Oeste da Bahia tem se destacado como produtor de grãos para exportação, referência para o agronegócio nacional, cada vez mais de interesse internacional. Está inserido no MATOPIBA – projeto governamental de incentivo a esta produção nos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia – atual fronteira agrícola brasileira, onde estão localizados os últimos remanescentes de Cerrado no Brasil. É nesta região onde se encontram os rios Carinhanha, Corrente e Grande, suas nascentes, subafluentes e afluentes, principais contribuintes com as águas do rio São Francisco na Bahia, responsáveis por até 90% de suas águas no período seco. São estas águas que abastecem milhares de comunidades rurais e centenas de municípios baianos e dos outros estados do Submédio e Baixo São Francisco.
Os conflitos causados pela invasão da agropecuária, desde os anos 1970, no que eram os territórios tradicionais das comunidades que habitam o Cerrado, têm sido pauta de uma intensa discussão, e de dezenas de audiências públicas. A gravidade destes conflitos é de conhecimento regional, estadual, nacional e até internacional. Contudo, ao longo de décadas o agronegócio nunca assumiu a responsabilidade por sua nefasta atuação, alicerçada num tripé que tem como eixos centrais: a invasão de terras públicas por meio da grilagem e da pistolagem; o uso de dinheiro público para implantação de megaestruturas e de monoculturas de grãos e pecuária bovina; o uso irresponsável dos bens naturais, bens comuns, com impactos irreversíveis sobre o ambiente, em especial, sobre a água e a biodiversidade, além de imensuráveis impactos sociais.
A ação do povo de Correntina não é de agora. Assistindo à sequência de morte de suas águas essenciais, diante do silêncio das autoridades, ações do tipo e outras vêm sendo feitas há mais tempo. Em 2000, populares entupiram um canal que pretendia desviar as águas do mesmo rio Arrojado agora ameaçado pelas fazendas no distrito de Rosário. O canto fúnebre das “Alimentadeiras de Alma”, antiga tradição religiosa de rezar pelos mortos, passou a ser realizado para chamar a atenção para a morte das nascentes e rios às centenas na região. Romarias com milhares de pessoas vêm sendo feitas nos últimos anos em cidades da região em protesto contra a destruição dos Cerrados.
As ações do agronegócio possuem a chancela do Estado baiano e brasileiro, que age como incentivador e promotor, é insuficiente ou omisso nas fiscalizações e tem sido conivente com a sua expansão por meio da concessão de outorgas hídricas e licenças ambientais para o desmatamento, algumas sem critérios bem definidos. Estes critérios que vêm passando por intensas flexibilizações com as mudanças radicais na legislação ambiental. O Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos – INEMA concedeu à Fazenda Igarashi, por meio da Portaria nº 9.159, de 27 de janeiro de 2015, o direito de retirar do rio Arrojado uma vazão de 182.203 m³/dia, durante 14 horas/dia, para a irrigação de 2.539,21 ha.
Este volume de água retirada equivale a mais de 106 milhões de litros diários, suficientes para abastecer por dia mais de 6,6 mil cisternas domésticas de 16.000 litros na região do Semiárido. Agrava-se a situação ao se considerar a crise hídrica do rio São Francisco, quando neste momento a barragem de Sobradinho, considerada o “coração artificial” do Rio, encontra-se com o volume útil de 2,84 %. A água consumida pela população de Correntina aproximadamente 3 milhões de litros por dia, equivale a apenas 2,8% da vazão retirada pela referida fazenda do rio Arrojado.
Alegar que as áreas irrigadas no Oeste da Bahia representam apenas 8% da região, ou seja, 160 mil hectares num universo de 2,2 milhões de hectares, não minimiza seus impactos. Megaempreendimentos e suas obras de infraestrutura em plena construção com vistas à expansão das áreas irrigadas determinam uma rota de cada vez maior devastação. Alguns exemplos: Fazenda Santa Colomba, em Côcos, Fazendas Dileta; Celeiro e Piratini, em Jaborandi; Fazendas Sudotex, Santa Maria e Igarashi, em Correntina. Algumas destas fazendas estão construindo centenas de quilômetros de canais, dezenas de reservatórios (piscinões), perfuração de centenas de poços tubulares e instalação de centenas de pivôs. Quanta água está sendo comprometida com tudo isto? Se a irrigação não fosse uma tendência regional, como explicar tantos investimentos neste modelo de agricultura? Comitês e Planos de Bacia e outras medidas no campo institucional, antes promovem esta rota insana, do que preservam os bens comuns da vida, hoje e de amanhã.
A ganância do agronegócio e as conveniências dos que representam o Estado são os responsáveis pelo desespero do povo. Não há ciência no mundo que possa estimar um valor monetário para o rio Arrojado, e isso o povo de Correntina parece compreender bem. Os próceres do agronegócio agem com hipocrisia e continuam se negando a assumir o passivo socioambiental existente no Oeste Baiano. Não resistem a uma mínima comparação com o modo de produzir dos pequenos e médios agricultores, que fornecem os alimentos diversos que a população consome com impactos infinitamente menores e muito mais cuidados de preservação. Não há como evitar a pergunta: os equívocos dos processos para outorgas hídricas e licenciamentos ambientais e a falta de fiscalização eficiente dos órgãos responsáveis são garantias para a legalidade e legitimidade do agronegócio?
Diálogo com os representantes do agronegócio tem sido um simulacro de democracia e honestidade. Na audiência pública havida em Jaborandi, no dia 27/10/2017, para discutir a questão das águas, outorgas e legislação ambiental, com interessados dos municípios de Jaborandi, Coribe e Correntina, populares foram impedidos de questionar a tese, na ocasião defendida por conhecido cientista aliado do agronegócio, de que não há relação entre a ação humana e as mudanças climáticas.
Flagrantes contradições do modelo de desenvolvimento regional são inúmeras e precisam ser evidenciadas. Por exemplo, a de que é muito maior a área preservada de Cerrado em relação à explorada. Omite-se que as áreas de Reserva Legal das fazendas do Oeste da Bahia estão sendo regularizadas por meio da “grilagem verde” sobre os territórios das comunidades tradicionais, e que a função ecológica cumprida pelas Áreas de Preservação Permanente – APPs, aos longo dos cursos d’água, nas áreas de descarga, são diferentes das funções ecológicas que cumprem os chapadões responsáveis pelo abastecimento do aquífero Urucuia, áreas de recarga, que já foram dizimadas pelo agronegócio.
A luta em defesa da vida mais uma vez é marcada pelo protagonismo popular de quem faz com as mãos a história e sabe que a água não é mercadoria, como quer convencionar o agronegócio, inclusive utilizando-se da Lei 9.433/1997, a “Lei das Águas”. As águas do rio Arrojado abastecem comunidades centenárias e não podem servir apenas aos interesses dos irrigantes como o grupo Igarashi, que chega à região com a má fama de ter que migrar da Chapada Diamantina, uma das regiões da Bahia que sofrem com a crise hídrica, em especial, na bacia do rio Paraguaçu, justamente por conta dos impactos de sua exploração. Os conflitos ambientais parecem não findar com o caso das fazendas deste grupo, pois esta é apenas uma fazenda num universo de inúmeras do Oeste da Bahia. Tudo indica, portanto, que o cansaço do povo frente ao arrojo do agronegócio e ao descaso das autoridades e a urgência da defesa da vida seja o argumento que impõe esta reação.
Deste modo e diante da notória crise hídrica, somada à irresponsabilidade arrogante do agronegócio e à incompetência do Estado, tal cenário coloca o povo em descrença e desespero, ao ver o rio Arrojado, base para sua convivência e modo de vida, com tamanhos sinais de morte, assim como inúmeros riachos, nascentes, veredas e rios da região. E, então, partem para alguma reação concreta, que chame a atenção dos responsáveis públicos e privados. Não há palavras para descrever o sentimento coletivo que tomou conta do povo de Correntina, que num ímpeto de defesa agiu para defender-se, pois sabe que se não mudar o modelo de “desenvolvimento”, baseado no agronegócio, estarão comprometidas as garantias de vida das populações atuais e futuras.
Novembro de 2017.
Comissão Pastoral da Terra – CPT/BA
Associação de Advogados/as de Trabalhadores/as Rurais da Bahia – AATR-BA
GeograFAR/UFBA
Articulação Estadual dos Fundos e Fechos de Pasto da Bahia
Movimento dos Trabalhadores Sem Terra – MST
Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA
Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB
Movimento Estadual dos Acampados, Assentados e Quilombolas da Bahia – CETA
Pastoral da Juventude do Meio Popular – PJMP – Diocese de Bom Jesus da Lapa
Pastoral do Meio Ambiente – PMA – Diocese de Bom Jesus da Lapa".
Veja mais:
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