A falta de uma política de abastecimento interno custa caro ao País

Publicado em 07/04/2016 07:45

A ciência econômica recomenda pouca ou nenhuma intervenção estatal, em face da constatação histórica de que a intervenção do Estado cria mais distorções do que benefícios para o conjunto da sociedade: aparentes benefícios aos cidadãos e consumidores se transformam em pesadelo diante da deterioração dos fundamentos econômicos.

Esses conceitos são relativizados quando entram em jogo o abastecimento nacional e a segurança alimentar. A fome que grassou na Europa do pós-guerra levou o bloco a priorizar a produção de alimentos com privilégios e proteções mantidos até hoje. No Brasil, nunca chegamos a esse estágio, mas, acredito que o papel do Estado na questão da segurança alimentar deve ir um pouco além da garantia de liberdade econômica e igualdade de oportunidades aos agentes econômicos.

Num momento em que a crise econômica vergasta a economia nacional, o agronegócio se mantém como baluarte de produção, geração de divisas e garantia de emprego. Porém, uma distorção episódica ameaça o setor mais proeminente, a agroindústria da carne: a súbita e violenta majoração de preço de seu principal insumo – o milho – com consequências catastróficas para centenas de indústrias e milhares de produtores rurais que, nesse momento, estão ameaçados de falência e de insolvência. Repete-se o mesmo quadro de 2009, quando os danos sociais foram severos para milhares de famílias.

O Brasil constituiu há mais de 25 anos um instrumento estatal para evitar essa situação – só que não funciona. Em abril de 1990 foi criada a Companhia Nacional do Abastecimento (Conab), empresa pública vinculada ao Ministério da Agricultura, encarregada de gerir as políticas agrícolas e de abastecimento, visando assegurar o atendimento das necessidades básicas da sociedade, preservando e estimulando os mecanismos de mercado. Entre seus objetivos estão executar as políticas oficiais de formação, armazenagem, remoção e escoamento dos estoques reguladores e estratégicos de produtos agropecuários e encarregar-se da execução das políticas do Governo Federal nas áreas de abastecimento e regulação da oferta de produtos agropecuários, no mercado interno.

Não quero cair no pecado da generalização inconsequente, mas é patente que a Conab não consegue cumprir sua missão. Parece ignorar que há um perigo real e iminente assustando o agronegócio catarinense, representada no grave quadro de superencarecimento de milho que assola violentamente as maiores cadeias produtivas de Santa Catarina e ameaça causar pesados e irreversíveis prejuízos à avicultura e à suinocultura. Desemprego na indústria, insolvência de criadores e quebradeira de empresas são os efeitos temíveis se a crise não for contornada. Nesse cenário, a intervenção estatal via Conab seria benéfica e necessária: ela deveria ofertar o grão no mercado, trazer o preço aos níveis normais e impedir o desastre econômico. Nem se sabe se, ao menos, a Conab detém estoques reguladores em volumes suficientes, mas, o fato é que o milho ofertado pela empresa, nos poucos leilões que fez, foi vendido nos mesmos altíssimos níveis do mercado. Em resumo: a Conab não cumpriu seu papel.

Nem as indústrias nem os produtores rurais querem privilégios, apenas, que as estruturas estatais – sustentadas pelo suado dinheiro dos contribuintes – funcionem. Acredito que é hora de se criar uma estrutura leve e eficiente, formada por cérebros e não por burocratas, no modelo de uma “agência nacional de inteligência agrícola”. Ela poderia evitar, por exemplo, que o Brasil exportasse sua produção de grãos e, depois, pequenos e grandes complexos industriais agonizassem pela falta de sua principal matéria-prima.

Já segue nosso Canal oficial no WhatsApp? Clique Aqui para receber em primeira mão as principais notícias do agronegócio
Tags:
Fonte:
MB Comunicação Empresarial

RECEBA NOSSAS NOTÍCIAS DE DESTAQUE NO SEU E-MAIL CADASTRE-SE NA NOSSA NEWSLETTER

Ao continuar com o cadastro, você concorda com nosso Termo de Privacidade e Consentimento e a Política de Privacidade.

1 comentário

  • Rodrigo Polo Pires Balneário Camboriú - SC

    Lastimo a quebra dos produtores de carne brasileiros, e lembro que Kátia Abreu (a nossa "competenta" ministra) é responsável pela Conab, e se aproveitando dessa posição colocou um filho seu lá... Mas da Kátia Abreu não espero nada, nem acredito em "estoques reguladores", pois se o governo garante o preço, a produção só aumenta, de forma que nenhum governo ou burocrata é capaz de "regular" o mercado de grãos. Essa falácia escrita ai em cima não fala que a exportação recorde dos grãos é efeito da desvalorização cambial, provocada pelo déficit do governo. Quando desvalorizações acontecem, toda a indústria sofre, em parte pelo aumento do custo de matérias primas importadas, em parte pela inflação como um aumento geral no nivel dos preços. E um aviso aos defensores do governo, e mesmo do Lula que quer aplicar de novo as 10 medidas do consenso de Washignton, para garantir o pagamento da divida: continuem defendendo os socialistas e suas politicas, e ainda veremos filas para comprar comida no Brasil, exatamente como está ocorrendo na Venezuela.

    1
    • Paulo Roberto Rensi Bandeirantes - PR

      Sr. Rodrigo, quebram os "integrados", mas os integradores vão muito bem... Obrigado !! Toda essa engenharia cambial, de alguma forma privilegia os intermediários entre o produtor e consumidor da proteína animal, pois essa é a lógica do mercado. A proteína animal, como o mercado de grãos é um oligopólio e, muitos desses grupos têm unidades em vários países de muitos continentes, imagine as informações que têm sobre as tendencias nas diversas regiões do mundo e, as possibilidades de tomarem as medidas para aumentar seus lucros. Essa é a realidade.

      1
    • Luiz Alfredo Viganó Marmeleiro - PR

      A ganância desmesurada das grandes empresas frigoríficas do Brasil (leia-se BRF) é que levaram a esta situação do mercado de milho. Nós produtores de milho de Santa Catarina sempre nos beneficiamos da concorrência regional Perdigão/Sadia/Seara na compra do milho da safra de verão, sendo que os compradores dessas empresas buscavam o produto nas lavouras, disputando os primeiros lotes que entravam em fins de janeiro e meados de fevereiro de cada ano. Mas nos últimos 4/5 anos a chamada "safrinha" do CO foi se tornando uma pressão sobre a safra de verão do Sul, com cada aumento de plantio no CO e essas empresas dizendo : "vamos ter milho sobrando", "o milho do CO é mais barato", "o governo subsidia o frete", "o milho daqui pouco nos interessa". Tanto que vendemos milho no balcão entre 2012 e 2014 na média de R$ 25,00 a saca de 60 quilos. Associado a isso temos a concentração nas mãos da tal BRF, com a quebra da Sadia, história até hoje bem mal contada (a Perdigão era uma bodega de interior perto da gigante Sadia), e que manda no preço do milho no oeste /sudoeste do Paraná e Santa Catarina. Resumindo, com a safrinha se tornando safrona, praticamente suplantando a safra de verão do Centro-Sul, e com as oportunidades de exportação do milho , o estoque interno minguou, sem falar no menor plantio das últimas décadas na região Sul, e a famosa lei da oferta e procura do Adão Smith levando ao choramingo das coitadinhas BRFs e Marfrigs da vida. Mas como sempre vai sobrar pro elo mais fraco, o produtor de frango e suínos, é do lombo desses que vai sair o milho a R$40,00, enquanto as grandes players se socorrerão nas tetas estatais (quase secas pelas bocas petebas) em subsídios ou isenção de impostos (pra preservar os empregos eles dizem) no famoso capitalismo de compadres do Brasil, mantendo uma ótima lucratividade pois exportam em dólares. Como já dizia um economista: O lucro fica pra nós e o prejuízo socializamos, e viva o Brasil!!!!

      0