Carne no prato: FPA reforça necessidade da Reforma Tributária corrigir a cesta básica brasileira

Publicado em 09/07/2024 17:35
Tributação de proteínas pode aumentar em R$17,49 bilhões a arrecadação anual da Receita Federal e exclui a população mais pobre do consumo de carne

Desde o início das discussões sobre a reforma tributária, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) tem se manifestado a favor de um projeto que beneficie toda a sociedade, especialmente as famílias brasileiras que precisam de acesso a alimentos baratos e de qualidade. A bancada é contra o aumento da carga tributária e a favor da cesta básica zero, combatendo assim a inflação de alimentos.

Em razão disso, o presidente da FPA, deputado Pedro Lupion (PP-PR), destacou nesta terça-feira (9), durante a reunião da diretoria da frente, que o relatório apresentado pelo Grupo de Trabalho na Câmara dos Deputados, na última quinta-feira, ainda precisa de ajustes. Ele ressaltou que a bancada já apresentou mais de 20 emendas ao texto preliminar da regulamentação da Reforma Tributária.

“O que foi apresentado nós não concordamos, principalmente sobre o impacto das proteínas na cesta básica. Temos agora comprovado que a inclusão das proteínas na cesta básica teria um impacto menor que 0,3 ponto percentual na alíquota,” afirmou Lupion. Ele acrescentou que o objetivo principal é manter uma reforma tributária neutra para o produtor rural, sem impacto negativo na produção de alimentos. 

Sobre o potencial impacto de 0,57 ponto percentual na alíquota geral do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) com a inclusão da proteína animal, apontado pelo governo, Lupion observou que há divergências nos números apresentados. “Cada um tem um cardápio diferente. A Receita apresenta os números de um lado, nós buscamos os números de outro. Queremos uma reforma tributária que não limite o consumo, que possa aquecer o mercado e ter um resultado positivo para a economia,” explicou Lupion.

Tributação das carnes

A FPA apresentou ao Grupo de Trabalho da Câmara dos Deputados dados de consumo real do setor produtivo com impacto significativo na arrecadação federal. 

O estudo revela que, caso seja aplicada uma alíquota de 40% em relação à alíquota geral do Imposto sobre Valor Agregado (IVA), a arrecadação com a tributação das carnes pode aumentar em R$17,49 bilhões/ano a receita do governo federal. O cálculo foi feito com base em dados da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) e da Associação Brasileira de Supermercados (Abras).

O setor informou que movimenta R$199,23 bilhões por ano. Com uma alíquota projetada de 10,6% sobre as proteínas animais, a arrecadação de tributos do governo sobre as vendas de carnes subiria para R$21,12 bilhões por ano, comparado aos atuais R$3,63 bilhões anuais.

Impacto econômico e social

O ex-secretário-executivo da Camex e ex-diretor da Fiesp, Roberto Giannetti da Fonseca, criticou os números apresentados pelo governo. Segundo Giannetti, a elevação da alíquota seria de apenas 0,2 ponto percentual, significativamente menor do que a estimativa governamental (0,57 p.p.).

“Proteína animal vai aumentar 0,6 ponto percentual? Mentira. Não vai aumentar 0,6, é 0,2. Isso cria uma informação falsa que coloca um ônus sobre a proteína animal, como se fosse algo que distorce a estrutura tributária no Brasil,” afirmou Giannetti.

O economista destacou a falta de transparência do governo em relação aos dados de impacto. Ele relatou que, apesar de várias solicitações, a planilha utilizada pelo governo para calcular os impactos nunca foi divulgada. “A planilha do governo nunca ninguém viu, simplesmente há um número fechado. E você pede a planilha, como pedimos várias vezes durante as reuniões do Grupo de Trabalho, e a planilha não aparece,” enfatizou.

O economista explicou a metodologia que utilizou para chegar aos seus números. Segundo Giannetti, a arrecadação total dos impostos de consumo hoje é de R$1,2 trilhão. Ele calculou a tributação atual sobre os alimentos e, com a nova tarifa, mediu a diferença ao considerar a redução de 60% para a proteína animal e, em seguida, ao aplicar uma alíquota zero. A diferença encontrada foi de 0,18%, o que, segundo ele, torna o impacto insignificante.

“Quem decide a média ponderada das alíquotas não é o governo, é o Congresso Nacional. Se a população quer alimentos com alíquota zero, e isso é absolutamente claro, nítido, então vamos colocar os alimentos com alíquota zero,” disse ele.

De acordo com Giannetti, o governo está errado ao afirmar que alimentos com alíquota zero aumentarão a alíquota básica. Ele argumentou que a alíquota básica subirá sobre produtos manufaturados, consumidos principalmente pela classe média e alta, e não pelos mais pobres. “A população pobre gasta mais de 30% da renda em alimentos. Isentar a proteína animal é valorizar a nutrição do povo brasileiro, como previsto no artigo 8º da Constituição,” afirmou.

Giannetti concluiu que a decisão de tributar ou não a proteína animal não é apenas uma questão econômica, mas também humana e jurídica. “Não colocar proteína animal na alíquota zero é desrespeitar a decisão tomada em dezembro do ano passado por este mesmo Congresso ao aprovar a PEC. É uma visão fiscalista, desumana e ilegal. Isentar a proteína animal é absolutamente essencial para melhorar a nutrição da população brasileira,” finalizou.

Cashback é utopia

Giannetti questionou também a viabilidade do sistema de cashback proposto na reforma tributária. Ele classificou a medida como uma utopia, afirmando que, embora a intenção seja boa, sua implementação prática enfrenta sérios desafios.

“Vamos cobrar o imposto e depois devolver para os mais pobres. Agora, como vamos fazer isso? Primeiro, você vai ter que definir uma linha de corte. Vamos supor que sejam dois salários mínimos. Quem ganhar R$100 a mais não recebe; quem ganhar R$100 a menos recebe. É justo? São tão pobres quanto. Então, o problema já é definir essa linha de corte. Vai haver milhões de pessoas logo acima da linha de corte que serão tremendamente prejudicadas,” argumentou Giannetti.

Além disso, ele destacou a dificuldade de incluir todos os beneficiários potenciais no sistema de cashback, citando dados do IBGE que indicam a existência de 10 milhões de brasileiros “invisíveis” – pessoas sem CPF ou certidão de nascimento. “Quero ver como essas pessoas que não têm documentos vão se virar para ter cashback. Pedintes de rua, população ribeirinha da Amazônia, comunidades isoladas no Nordeste, como eles vão receber? Em alguns casos, não há nem agência bancária na cidade. Então, vão pagar imposto sobre alimentos? Os mais pobres que precisam ter isenção serão os punidos,” enfatizou.

Custos administrativos e eficácia

O economista também alertou para os custos administrativos do sistema de cashback, que não foram dimensionados nas planilhas apresentadas pelo Grupo de Trabalho. “Você pergunta qual é o custo de administrar o cashback, o governo não sabe, não sabe até porque nunca fez e nem sabe como vai fazer. Então, essa história de cashback é para enrolar, é uma utopia”, declarou Giannetti, afirmando que o imposto de consumo deve diferenciar produtos pela sua essencialidade, enquanto o imposto de renda deve diferenciar pessoas pelo seu nível de renda.

“Se colocar diferenciação de pessoas dentro do imposto de consumo, nunca dá certo, porque vai haver fraude, desvio, injustiça, iniquidade. O cashback, portanto, não é nem de perto um mecanismo que poderia resolver esse problema,” disse ele.

Próximos passos

Um novo texto deverá ser apresentado após a reunião com os líderes partidários nesta terça-feira, 9. O plano do Grupo de Trabalho é iniciar a discussão e concluir a votação do projeto principal que cria o Imposto Sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) no plenário da Câmara dos Deputados ainda nesta semana.

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Fonte:
Agência FPA

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