Commodities e mais ativos despencam nesta 6ª com recessão batendo à porta da economia global
Depois de uma semana já muito agitada e de mercados "azedos", a sexta-feira (23) trouxe a conclusão de dias de crescente aversão ao risco, enormes cautela e incerteza para os investidores, além da possibilidade de uma recessão global cada vez mais palpável. Índices de inflação no mundo todo e as medidas que vêm sendo tomadas para que sejam controlados também chamam a atenção. Assim, ativos mais sensíveis acabam sentindo de forma mais agressiva o impacto dos temores e o resultado são baixas generalizadas como as que se observaram nesta última sessão da semana.
E ao chegar ao seu sétimo mês, a guerra entre Rússia e Ucrânia registrando diversas escaladas nos últimos dias também ganharam mais espaço nos radares. Vladimir Putin, somente nesta semana, ameaçou elevar ainda mais o conflito com a possibilidade do uso de armas nucleares, convocou mais de 300 mil reservistas e iniciou referendo para a anexação de quatro regiões ocupadas em território ucraniano.
"Isso tudo gera muita apreensão no mercado e um selloff generalizado", explica o analista de mercado da Agrinvest Commodities, Marcos Araújo. "E os bancos centrais ao redor do mundo estão fazendo um trabalho coordenado de aumento de taxa de juros para forçar uma recessão para reduzir o consumo e amenizar a questão da segurança alimentar. Então, essa alta de juros mascara o plano de fundo, que é a segurança alimentar a nível mundial, que será um problema muito sério em 2023, na minha opinião. Caso se confirme a recessão mundial e houver uma redução de consumo, mais a pouca oferta que há, atenderia a demanda recessiva", complementa.
Esta semana foi tão cheia de novas informações no macrocenário que contabilizou reajustes para cima em taxas básicas de juros de nove banco centrais, os quais variaram entre 0,50% e 0,75%, ainda de acordo com um levantamento da Agrinvest. Mais do que isso, os últimos dias ainda registraram o dólar nas máximas de 20 anos, as taxas de juros nos EUA nas máximas de 15. O dólar index rompeu a barreira dos 110 mil pontos e, nesta sexta, a dos 112 mil, com altas superiores a 1%.
Somente frente ao real, a moeda americana subiu 2,62% para fechar com R$ 5,25.
Além das commodities - agrícolas, metálicas e energéticas - marcando baixas intensas, de mais de 4% em alguns casos somente neste e lideradas pelo petróleo marcando suas mínimas em oito meses - índices acionários também caem agressivamente. O S&P 500 bateu em suas mínimas desde junho, com uma perda acumulada na semana de quase 4% e no ano de 22%. O euro testou suas mínimas desde 2002 e a libra-esterlina seu menor nível em 37 anos. Até mesmo o dólar, considerado um 'porto seguro' para os investidores, caiu forte nesta sexta-feira frente à alta intensa do dólar.
"Parece que traders e investidores vão jogar a toalha nesta semana. Quando todos pararem de dizer que 'uma recessão está chegando' e aceitarem o fato de que ela já está aqui, então a psique do mercado mudará", afirmou o estrategista-chefe da SlateStone, à Bloomberg.
E diante disso tudo e de números que podem ser ainda mais graves e intensos, "a grande pergunta que os investidores estão se fazendo agora não é se haverá recessão, mas sim quão profunda", afirma a equipe da Agrinvest. Em seu discurso depois da divulgação do aumento da taxa de juros, na quarta-feira (21), o chairman do Federal Reserve, Jerome Powell disse "Os tempos ficarão mais difíceis a partir deste ponto".
"Esse risco de recessão envolve grande parte da reestruturação de investimentos hedge funds, de fundos de pensão, que hoje são alocados em commodities, mas quando vêem um risco começam a se realocar em ativos de mais segurança e rentabilidade mais garantida, como é o caso de títulos da dívida do governo norte-americano. Então, estamos tendo muita evasão de títulos de risco médio, que são commodities, para títulos de renda mais segura. Hoje, o mercado está tomado pela macroeconomia", explicou o diretor da Pátria Agronegócios, Matheus Pereira.
Sobre o movimento das moedas, o executivo alerta sobre as baixas do yuan, que está em suas mínimas em dois anos, uma vez que acaba tirando parte do poder de compra dos chineses, o que traz certa preocupação sobre as importações de commodities. Porém, como a influência do governo sobre o mercado cambial é considerável, as mudanças logo podem aparecer.
"Se hoje o governo chinês decidir que precisa retomar a valorização da sua moeda, ele vai procurar mecanismos para tal. Então, apesar de trazer preocupações no curto prazo, no médio prazo sabemos que a China possui a capacidade de uma influência maior no câmbio do país, diferente do que acontece no Brasil, por exemplo", detalha Pereira.
DESPENCADA DOS GRÃOS e DO COMPLEXO SOJA
Entre os grãos, as baixas mais agressivas se deram entre os futuros do trigo, que terminaram o dia com perdas de mais de quase 4% - ou ficando entre 25,25 e 30,25 pontos - nos principais vencimentos, levando os dois primeiros contratos a operarem novamente abaixo dos US$ 9,00 por bushel. O dezembro terminou a sexta com US$ 8,80 e o março com US$ 8,93 por bushel. A soja cedeu de 30,25 a 31,25 pontos, levando o novembro a perder o patamar importante dos US$ 14,50, fechando com US$ 14,25 por bushel. No milho, perdas de 11,50 a 12,75, com o dezembro concluindo os negócios a US$ 6,76.
"Inflação alta, taxas de juros crescentes e temores de recessão provaram ser uma combinação mortal em Wall St., e a liquidação (de posições) se espalhou para um amplo conjunto de outras commodities. Os preços dos grãos não ficaram imunes, com a maioria dos contratos perdendo de 2% a 3% no fechamento", afirmaram os analistas do portal The Farm Futures.
Além da soja em grão, óleo e farelo também despencaram na CBOT. Os futuros do óleo caíram até 4,2%, como foi o caso do contrato dezembro, que fechou os negócios cotado a 63,68 cents de dólar por libra-peso. Além da liquidação própria, o mercado do óleo de soja ainda acompanhou as perdas agressivas do petróleo, que conclui a sexta-feira com perdas superiores a 5% no WTI e o barril abaixo dos US$ 80,00, e de mais de 4% no brent, abaixo dos US$ 90,00.
Para a soja, além da pressão vinda do mercado financeiro, os traders ainda observam o avanço da colheita nos EUA e do plantio na América do Sul, ambos com boas condições de clima para que continuem. As vendas aceleradas na Argentina - motivadas pelo 'dólar soja', medida que já estimulou a comercialização de 9 milhões de toneladas de 5 a 19 de setembro - também está na conta.
O que traz certo equilíbrio ao mercado ainda é a demanda. As compras - em especial as da China - deverão seguir pulverizadas entre as três principais origens globais, cada uma a seu tempo.
Milho
Por Guilherme Dorigatti
A semana foi marcada por pressão nos preços do milho tanto na Bolsa de Chicago (CBOT) quanto na Bolsa Brasileira (B3). Entre os fatores que empurram as cotações para baixo estão o avanço da colheita do milho nos Estados Unidos e o cenário econômico global.
Segundo o analista de mercado da Grão Direto, Ruan Sene, os principais estados produtores norte-americanos estão colhendo suas lavouras que, mesmo com perdas certas na produtividade, garantem uma maior oferta entrando no mercado neste momento. Do lado financeiro, é o temor por uma recessão mundial e os recentes aumentos de juros por parte alguns dos Bancos Centrais nacionais que seguram os preços.
ALGODÃO LIDERA AS PERDAS ENTRE AS SOFT COMMODITIES
Na Bolsa de Nova York, quem liderou as baixas foi, mais uma vez, o algodão, que conclui a sexta-feira cedendo mais de 4% entre as posições mais negociadas. O dezembro/22 fecha o dia com 92,54 cents de dólar por libra-peso. Entre os futuros do café e do açúcar, as perdas foram de mais de 1% em ambos os mercados.
"O cenário de forte aversão ao risco por conta do panorama macro leva o mercado a apostar em um menor consumo de matérias primas, como o petróleo. O WTI apresentou uma forte queda de 5,23% e cotado a US$ 78,9 por barril, menor valor desde janeiro de 2022. Visto que o algodão é diretamente afetado pelo movimento do petróleo, o impacto foi forte", explica Bruna Stewart, analista do mercado de algodão da Agrinvest Commodities.
Ainda para o algodão, as vendas semanais para exportação pouco expressivas nos EUA nesta semana, de acordo com dados do USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos) divulgados na quinta-feira (22).
"As novas vendas do algodão norte-americano totalizaram 32,4 mil fardos, baixíssimo volume ante a expectativa de 100 a 250 mil. Na semana passada, o montante foi de 71 mil fardos. O motivo é a ausência da China nas compras da pluma americana", complementa Bruna.
Açúcar
Por Jhonatas Simião
Os contratos futuros do açúcar perderam os 18 cents/lb na Bolsa de Nova York nesta sexta-feira, com quedas expressivas sendo registradas também em Londres. Os preços acompanharam a queda do petróleo, além da valorização do dólar sobre o real e informações sobre a oferta.
"Os temores de recessão, novos aumentos nas taxas e a consequente força do dólar superam a tensão geopolítica", disse à Reuters Tamas Varga, analista de petróleo da PVM Oil Associates.
No Brasil, as usinas de cana-de-açúcar têm a opção de produção de açúcar ou etanol, com base no que estiver mais rentável. Com o petróleo em baixa, o biocombustível, um substitutivo da gasolina, tende a sentir impacto também e a produção do adoçante aumenta, elevando a oferta.
Café
Por Virgínia Alves
Apesar dos fundamentos continuarem sólidos e a preocupação com a demanda permanecer no radar, o mercado sentiu a pressão da preocupação com a recessão global nesta sexta.
Para o café, o mercado entende que a recessão poderia trazer impactos diretamente no consumo da bebida, sobretudo com destaque para os dados da inflação nos Estados Unidos - justamente o maior parceiro comercial do Brasil. Do outro lado, estão as preocupações com o consumo da Europa, destino de boa parte das exportações brasileiras.
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