Agro brasileiro tem de estar atento ao redesenho da nova ordem mundial, diz especialista

Publicado em 27/02/2022 13:48

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O agravamento do conflito entre Rússia e Ucrânia segue intensificando também as preocupações com o futuro da economia global, bem como com o comércio internacional. As últimas sanções impostas a Moscou, anunciadas neste sábado (26) deixaram os sinais de alerta ainda mais intensos com a Rússia fora do sistem SWIFT de pagamento. "Essa é considerada a bomba atômica das sanções", afirma a equipe da Agrinvest Commodities. 

Ainda assim é importante salientar que alguns bancos-chave, que já haviam sido sacionados há alguns dias, passam pela medida. Fora do SWIFT, estas instituições terão maior dificuldade e limitada capacidae para operar globalmente. 

"Essas medidas são mais pesadas. Vai ficar mais difícil comprar da Rússia. Mais demanda porque pode migrar para os EUA. Eu diria que a chamada de abertura para o noturno de domingo vai ser de forte alta. Além disso, o fato de a Alemanha ter 'saído de cima do muro', enviando até mesmo armamentos para a Ucrânia é um importante passo de pressão sobre a Rússia", explica Eduardo Vanin, analista da Agrinvest. 

Um dos movimentos mais agressivos e que mais repercute neste domingo é a informação de que o presidente russo Vladimir Putin ordenou que seu comando militar coloque as forças com armas nucleares em alerta máximo. 

"Como você pode ver, não só os países ocidentais tomam medidas hostis contra nosso país na dimensão econômica - quero dizer as sanções ilegais que todos conhecem muito bem - mas também os altos funcionários dos principais países da Otan se permitem fazer declarações agressivas com respeito ao nosso país", disse Putin na televisão estatal.

Como explica o economista especializado em eocnomia internacional e professor do Insper, Roberto Dumas Damas, é preciso se atentar à informações que aparecem nas entrelinhas dos comunicados oficiais dos governos todos envolvidos no conflito. "O mundo todo vai sofrer", diz. 

E um desses pontos de atenção é o futuro do fornecimento de gás natural da Rússia para a Europa. "Se eles param ou diminuem o envio de gás natural, sobe o custo de tudo, além do petróleo. Isso faz com que a Europa vá crescer bem menos, tendo uma estagflação, ou uma recessão, ainda não se sabe, mas crescendo bem menos do que o projetado e a inflação de 5% vai aumentar, antecipando, provavelmente, a alta de juros pelo Banco Central Europeu", afirma Dumas. 

Os impactos inflacionários e as possibilidade de aumentos nas taxas de juros não deverão ficar restritos somente à Europa, mas também entram na pauta dos Estados Unidos. 

"E quando falamos de nos juros falamos do preços dos alimentos, e isso vai afetar o Brasil, principalmente a mesa do mais pobre. E a mesa do mais pobre é aquele que tem a maior propenção marginal a não consumir. Então, o consumo, que já vinha fraco, piora, e piora o crescimento do Brasil. Assim, tudo isso prejudica muito o crescimento de 2022, que já seria menor do que o de 2021, mas com a guerra será ainda menor", detalha o professor. 

Assim, as atenções agora se dão também sobre a permanência ou não da Ucrânia como estado. "A Ucrânia vai cair, mais cedo ou mais tarde, e a Ucrânia caindo estas sanções vão continuar. A questão seria a Rússia desistir da Ucrânia, e essa possibilidade é próxima de zero", afirma Dumas.

O impacto sobre os preços dos alimentos será ainda mais agressivo e duradouro. Embora o poder militar e de contingente ucraniano seja muito menor do que o russo, a resistência segue e, consequentemente, o conflito vai se arrastando e também se aprofundando. 

Como explica o professor de geopolítica da ESPM Leonardo Trevisan, "mesmo militarmente derrotado, o governo Zelensky vai prolongar o conflito para ter uma espécie de moeda de troca para sobrevivência política na Ucrânia", pois o presidente ucraniano sabe que uma vez que uma presença russa se estabeleça de forma política, isso pode significar muito tempo longe do poder para os ucranianos. 

E mesmo que essa ocupação se consolide, levará dias para que o mundo, principalmente no Ocidente, se acostume com essa ideia, com essa nova ordem.

Tudo isso aquece as discussões em torno do preço dos alimentos. A Rússia é o maior produtor e exportador global de trigo, enquanto a Ucrânia ocupa o posto do quarto lugar, além de ambos serem importantes players no quadro global do milho. Além das relações comerciais e transações estarem comprometidas e limitadas pelas sanções, os portos de ambos os países estão fechados, o que agrava ainda mais uma crise logística global já conhecida.

"E isso afeta também os países mais pobres, que são grandes importadores de trigo, por exemplo. O Egito, por exemplo, já está muito preocupado", afirma Trevisan, que complementa sua análise dizendo que, por hora, ainda não há no horizonte uma possibilidade de efetiva solução para o conflito. E lembrando ainda que o Brasil é franco importador de trigo. 

O professor explica também que os últimos dias foram marcados por uma ausência de parâmetros para os preços e, consequentemente, para os negócios. As últimas sessões nas bolsas internacionais foram de extrema volatilidade paras as cotações dos grãos e as próximas não deverão ser diferentes. 

"Isso deve continuar acontecendo nas próximas semanas, essa ausência de parâmetros deve ser uma variável bastante presente, o que dificulta a percepção dos cenários", diz o professor de geopolítica da ESPM.

Na última sexta-feira (25), ainda de acordo 
com Trevisan, a Argentina interrompeu seus embarques de trigo para o Brasil para renegociar preços diante das mudanças nas referências internacionais e nas redefinições que se dão para o quadro mundial de oferta e demanda. 

E não só ailmentos estão em jogo, mas também isumos agrícolas muito importantes, uma vez que a Rússia é a maior fornecedora de fertilizantes para o Brasil. 

"A Ucrânia não é qualquer país. E é até mesmo um concorrente quase que direto do Brasil. Mas o comércio global sendo administrado por relações mais politizadas podem impactar o setor (...) O agronegócio brasileiro tem que estar muito atento a esse redesenho da nova ordem mundial", explica Leonardo Trevisan, que ainda adiciona à sua análise todo o papel da China no atual cenário, que está sendo definido e também trará mudanças importantes para o rumo dessa guerra e de seus desdobramentos. 

Os preços dos alimentos já vêm, há meses, registrando altas expressivas e alcançando patamares recordes. Os impactos de adversidades climáticas de todas as naturezas já provocaram perdas expressivas entre os grãos nas últimas temporadas - incluindo o trigo nos principais países produtores e a soja 2021/22 da América do Sul, que perdeu mais de 30% - e o conflito Rússia x Ucrânia vem para intensificar ainda mais o processo. 
 

Inflação dos alimentos
Inflação dos alimentos - Gráfico: Bloomberg + ONU/FAO
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Por:
Carla Mendes | Instagram @jornalistadasoja
Fonte:
Notícias Agrícolas

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2 comentários

  • Antonio Nascimento campo mourão - PR

    Meio prematuro em citar a NOM, a não ser pra quem o interessa a sua implementação, pintar a Rússia como agente é justamente o contrário.... Como agricultores nos resta tirar proveito dessa situação: produzindo (com a criatividade que temos de sobra) e ficarmos atentos a essa manipulação comercial, ... a demanda é a rainha em tempos de escassez!!

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  • Alvaro Iruhan Ishida Santana Lagarto

    Credo, todo mundo sabe que NOM é o fim do mundo.

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