Presidente do BC diz que crise pode ser mais longa e desvio fiscal pode ser maior

Publicado em 21/05/2020 05:29 e atualizado em 21/05/2020 08:41

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, reconheceu nesta quarta-feira, 20, que a crise econômica gerada pela pandemia do novo coronavírus "pode ser mais longa e o desvio fiscal pode ser maior". Durante evento virtual, ele ressaltou que o governo, atualmente, está fazendo um "desvio fiscal", mas com a indicação de que voltará para "os trilhos".

Em função da crise, o governo federal lançou nos últimos meses uma série de programas de auxílio a famílias e empresas. Boa parte deles aumenta as despesas do Tesouro, o que prejudica o controle fiscal. No início de maio, por conta dos gastos com a crise, o Ministério da Economia estimou um rombo de R$ 601,2 bilhões para o setor público em 2020, o que equivale a 8,27% do Produto Interno Bruto (PIB). Neste cenário, a dívida bruta do País pode terminar o ano em 90,8% do PIB.

"Estamos fazendo um desvio fiscal, mas indicamos que voltaremos para o trilho", disse Campos Neto, para depois ressaltar: "A crise pode ser mais longa e o desvio fiscal pode ser maior".

Questionado sobre qual seria o piso para a Selic (a taxa básica de juros), atualmente em 3% ao ano, Campos Neto pontuou que o tema do limite da política monetária (redução dos juros básicos) é dinâmico. "Depende um pouco do que está acontecendo no mundo - tivemos uma saída de recursos (dólares, do Brasil) - e temos a parte da condição interna", afirmou.

Segundo ele, há hoje no Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central "pessoas com visões diferentes sobre o limite da política monetária". Em seu último encontro, ocorrido no início de maio, o Copom reduziu a Selic em 0,75 ponto porcentual, para 3,00% ao ano, e sinalizou a possibilidade de novo corte de até 0,75 ponto em junho.

Um dos membros do colegiado, no entanto, chegou a argumentar que não há razão para a existência de um limite para a Selic. E dois membros ponderaram que poderia ser oportuno cortar a taxa de uma só vez, já em maio. O Copom é formado por Campos Neto e por oito diretores do BC.

"Há visão diferente do mundo acadêmico puro e de quem se dedicou mais ao mercado", afirmou, em referência aos membros do Copom. "O grande debate é se quero passar por uma desorganização para encontrar este limite. O processo de achar o equilíbrio (da Selic) tem um custo."

O presidente do BC, ao avaliar a questão do nível de juros, afirmou que os países com dívidas maiores encerram o processo de corte de juros com taxas "um pouco maiores também".

Campos Neto participou hoje do evento virtual "Infra para crescer - Caminhos para superar a crise", organizado pela Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib).

BC tem amplo espaço para vender reservas e pode aumentar atuação no câmbio, diz Campos Neto

(Reuters) - O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou nesta quarta-feira que a autarquia tem espaço amplo para a venda de reservas internacionais e poderá aumentar sua atuação no câmbio se considerar necessário.

"Brasil tem muita reserva, inclusive em percentual do PIB (Produto Interno Bruto) a reserva subiu porque desvalorizou mais do que o que foi vendido", afirmou ele, a respeito do estoque que está hoje em 343 bilhões de dólares, frente a 357 bilhões de dólares no início do ano.

Em live promovida pela Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Campos Neto pontuou que, nos últimos dias, o BC aumentou um pouco o nível de intervenção cambial por entender que o Brasil estava descolado de outros países emergentes.

Campos Neto ressaltou que o Brasil tem espaço fiscal menor do que alguns países que anunciaram programas grandes de enfrentamento à crise e reconheceu que, em meio a esse quadro, o risco ligado ao país acabou subindo.

Ele destacou que o Brasil não tem o luxo de ter muito espaço fiscal, razão pela qual há piora rápida nos preços dos ativos quando o mercado entende que a saída dos trilhos não vai ter volta.

"Se for tentada uma solução onde você vai atingir um novo equilíbrio fiscal muito pior permanente, os mercados vão punir, os investidores vão punir o Brasil de uma forma que a gente vai voltar para o equilíbrio antigo, que é um equilíbrio de juros altos", disse.

Segundo Campos Neto, esse cenário será mais desafiador do que no passado, já que o equilíbrio de juros altos foi alcançado antes em meio ao crescimento da dívida. Agora, ele seria vivido com a dívida em patamar já muito maior.

Mesmo assim, ele ponderou preferir dar dinheiro para todos no país conseguirem honrar seus contratos, o que pioraria as contas públicas, a um cenário de quebra indiscriminada de contratos.

O presidente do BC alertou que há projetos parlamentares sobre o tema e decisões judiciais que respaldam essa prática, mas que o caminho seria extremamente danoso para a retomada.

MAIS MEDIDAS

De acordo com Campos Neto, o BC deve anunciar nas próximas semanas novas medidas, mais voltadas para o direcionamento do crédito. Ele avaliou que o sistema está com liquidez, mas que é preciso fazer com que o dinheiro chegue na ponta.

Sem dar detalhes, ele afirmou que haverá uma iniciativa voltada para o mercado imobiliário.

Em relação a ações já adotadas, Campos Neto reconheceu que não está havendo saída muito grande nos Depósitos a Prazo com Garantia Especial (DPGE), e que o BC está fazendo ajuste no programa.

Ele também disse que haverá modificações no programa de financiamento à folha de pagamento das empresas, que não teve o alcance esperado pela autoridade monetária.

Campos Neto rebateu críticas de que os bancos não estão emprestando, ao afirmar que as instituições financeiras estão sim aumentando concessões. Mas ele admitiu que esse crescimento se dá mais para as grandes empresas.

Em outra frente, ele ponderou que, como a demanda de crédito saltou pela falta de previsibilidade de fluxo de caixa das empresas, mesmo que os bancos fechem mais financiamentos elas seguirão com a sensação de não estarem sendo atendidas.

"Se a gente fizer uma conta de quanto a gente precisaria ter de crédito para atender toda demanda de crédito, provavelmente você ia chegar numa conclusão de que ia ter que dobrar a base de capital dos bancos", afirmou.

Segundo o presidente do BC, a atuação da autarquia na compra de títulos públicos, possibilidade aberta pela Proposta de Emenda à Constituição do Orçamento de Guerra, será pautada pela estabilização de mercado no tocante à curva de juros, balanceando a negociação de papéis curtos e longos.

"A gente acha que não deveria embarcar em nada além disso até termos certeza que não temos mais potência em política monetária", afirmou. "E se, em algum momento, for entendido que não tem mais potência em política monetária e que nós precisamos fazer algo além, aí vai surgir a conversa do que podemos fazer além disso com os instrumentos que nós temos."

ECONOMIA

Sobre a profunda queda na economia esperada para este ano, Campos Neto disse ser difícil traçar projeções em função do cenário de grandes incertezas com os desafios impostos pelo surto de Covid-19.

Para o desemprego, contudo, ele adiantou expectativa de uma taxa acima de 15% como consequência da crise.

Campos Neto destacou que tanto entre países que não adotaram lockdown quanto entre aqueles que já estão relaxando medidas restritivas a volta ao consumo de serviços está "bem lenta", já que o medo ainda é predominante e tem sido uma variável importante no comportamento das pessoas.

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Fonte:
Estadão Conteúdo/Reuters

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