Pandemia ameaça emprego na indústria
A pandemia de coronavírus criou incertezas sobre a continuidade no movimento de geração de vagas formais de trabalho na indústria neste início de ano. Em 2019, o avanço no emprego mais qualificado foi puxado pelo setor de alta intensidade tecnológica, segundo levantamento do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) obtido com exclusividade pelo jornal O Estado de S. Paulo e pelo Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado.
Para Rafael Cagnin, economista-chefe da entidade, a virada de ano mais robusta para o emprego nos ramos industriais mais tecnológicos sinalizava uma "preparação de terreno" para desempenho mais forte da produção este ano. Só que a pandemia do novo coronavírus, que tem alimentado forte volatilidade no mercado financeiro, valorização do dólar e interrupções nas cadeias globais de valor, pode afetar essa previsão.
"Essa sinalização que me parecia ser uma preparação de terreno para um desempenho mais robusto em 2020 fica agora com um ponto de interrogação com os efeitos do coronavírus. Ninguém sabe exatamente os efeitos reais", diz Cagnin.
O economista Rodolpho Tobler, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), acredita que a pandemia de coronavírus vai travar uma recuperação na geração de vagas com registro em carteira na indústria, mas ele ainda não vê ondas de demissões.
"Não imagino que as empresas vão começar a demitir agora, porque é uma questão passageira, não deve deixar marcas e sequelas", afirma Tobler.
Embora tenha registrado estagnação na produção no ano de 2019, a indústria de transformação brasileira apostou na contratação de novos trabalhadores, movimento que ganhou força no último trimestre do ano. A criação de vagas formais no setor ajudou na recuperação ainda incipiente da qualidade do emprego no País.
Conforme dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), compilados pelo Iedi, o número geral de trabalhadores da indústria de transformação cresceu 1,4%, em média, em 2019, após ter avançado 0,9% em 2018.
Já no quarto trimestre de 2019, foram criados 311 mil postos de trabalho na indústria de transformação, o que representou um aumento de 3% em relação ao mesmo período do ano anterior - a terceira taxa positiva consecutiva, o que não ocorria desde 2017.
Se considerada só a geração de vagas com carteira assinada, houve um aumento de 2,6% no emprego formal na indústria de transformação no quarto trimestre de 2019, ante o quarto trimestre de 2018. Em números absolutos, isso significou 168 mil vagas a mais com carteira no período, o primeiro avanço após três trimestres de estabilidade ao longo do ano.
Essa melhora foi puxada, justamente, pelos ramos industriais de maior intensidade tecnológica. A indústria de alta tecnologia aumentou em 9% o total de ocupados com carteira no quarto trimestre de 2019, em relação a igual período de 2018.
Contágio
A recuperação do emprego industrial nos ramos de maior intensidade tecnológica poderá ser abortada porque esses são os segmentos da indústria mais afetados pela crise econômica decorrente da pandemia do novo coronavírus.
A primeira forma de contágio se reflete no comércio exterior, especialmente por causa da importação de componentes da China, de onde o novo coronavírus se espalhou pelo resto do mundo. E a dependência de componentes chineses é maior nas fabricantes de produtos tecnológicos, como celulares e computadores.
Os impactos negativos vêm piorando desde o início de fevereiro, conforme sondagem da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee).
Na terceira edição da pesquisa, divulgada na semana passada, 70% das empresas entrevistadas relataram problemas no recebimento de materiais, componentes e insumos da China. Na primeira edição da sondagem (5 de fevereiro), o número de empresas com problemas havia sido de 52% e, na segunda edição (20 de fevereiro), de 57%.
Diante disso, de 20 mil a 30 mil funcionários de empresas do ramo devem ter a rotina de trabalho alterada no curto prazo, com redução de jornada e férias coletivas, estimou o presidente da entidade, Humberto Barbato, como mostrou o jornal O Estado de S. Paulo no fim de fevereiro. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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