A economia como sintoma de uma sociedade doente, por Vinícius Montgomery de Miranda
Não é difícil perceber que a situação da economia de um país reflete entre outras coisas a disposição de seu povo para criar, produzir, consumir, estocar e negociar os diferentes tipos de bens que lhe possa ser útil, hoje ou no futuro. Tudo que interfere nessa disposição afeta a economia. Aspectos culturais, alterações no ambiente natural, mudanças sociais, ou decisões de governos, por exemplo, geram impactos importantes no nível de atividade econômica de um país.
Isso porque alteram a ação das pessoas, que em última instância, é o que define os rumos da economia. Adam Smith, em A Riqueza das Nações, mostra que a livre interação entre os indivíduos, cada um buscando seu interesse particular, resulta em uma ordem capaz de satisfazer necessidades e produzir riqueza. Tudo espontaneamente, sem nenhum dirigismo. No fundo, o direito do homem a sua individualidade, que Smtih chamou de laissez-faire, é que move o mundo.
Com efeito, se os indivíduos têm necessidades diferentes, habilidades e interesses específicos, é natural que a aptidão de cada um seja usada para produzir os bens e serviços que todos demandam. Assim, o motorista conduz o cozinheiro que lhe prepara o almoço, e o sapateiro confecciona o calçado de ambos. Essas trocas valorizam a capacidade e o diferencial de cada profissional e maximizam a satisfação de todos. É por isso que a especialização da mão de obra e a consequente divisão do trabalho são fatores fundamentais para aumentar a produtividade de uma economia. Quando eles estão presentes, a produção de bens torna-se eficiente e os escassos recursos naturais são mais bem aproveitados.
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Portanto, qualquer arranjo social que altere a naturalidade da ação individual resulta em menor produtividade, economia débil e satisfação material hipossuficiente; prognóstico mais que ratificado pelos autores da Escola Austríaca e duramente vivenciado por povos cuja individualidade é atropelada em nome de uma suposta igualdade. Pura ilusão. A realidade tem mostrado que a imposição do ideal de igualdade a qualquer custo resulta em miséria, dependência e em um grau de assimetria intrapopulacional ainda maior que aquele que se pretende combater.
O economista Ludwig von Mises, em sua obra mais importante, Ação Humana, explica que o homem está constantemente inconformado com seu estado atual e que, por isso, toda ação humana é voltada para melhorar o seu bem-estar. Ele faz isso, avaliando de forma subjetiva as alternativas que possam lhe trazer mais benefícios que custos. Se a individualidade da escolha não é respeitada, os custos superam os benefícios, afinal, ninguém nunca poderá saber o que é melhor para o indivíduo em cada uma de suas decisões, além dele próprio.
Desse princípio decorre a ineficiência da ação estatal. Quando o Estado se torna responsável pela saúde, educação, segurança e todo o resto, elimina a opção de escolha do cidadão, inibe a possibilidade de empreendedorismo e ainda reduz a geração de riqueza por tributar a produção e o consumo. Não é sem razão, portanto, que quanto maior a interferência estatal na economia, menor sua capacidade de prosperar e elevar a qualidade de vida de seus cidadãos, conforme atesta a relação entre o Índice de Liberdade Econômica (ILE) e o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).
No socialismo, ao contrário do pensamento liberal, não há espaço algum para a individualidade. Os interesses de classe devem prevalecer a qualquer custo e todos os problemas nacionais precisam da tutela do Estado para sua solução. Nele, os burocratas se enchem de poder e a iniciativa estatal se torna absoluta, esmagando a liberdade individual em favor do coletivismo. O embate político pelo controle do Estado se torna perene uma vez que este garante privilégios econômicos, que facilitam a manutenção do poder. Empreendedores, produtores e trabalhadores são taxados e os recursos arrecadados são redirecionados, na forma de subsídios, para grandes empresas, grupos de interesses e para os polpudos salários dos burocratas. Apenas uma pequena parte desses recursos retorna na forma de serviços para os agentes tributados e para a parcela menos próspera da população. Trata-se de um arranjo surreal, que ao longo do tempo exaure todas as energias da galinha dos ovos de ouro, o setor produtivo da economia. Não é casual, portanto, que todo projeto de governo socialista requer tirania e se esgota em penúria, sofrimento e morte.
Evidências não faltam para que a sociedade esteja atenta, a fim de evitar que o Estado se torne onipresente. Não é saudável que atividades econômicas como a produção de energia e combustíveis, a gestão de portos, aeroportos e rodovias, e dos sistemas de saúde e educação, entre outros, sejam estatais. A iniciativa privada faz tudo isso com mais eficiência, qualidade e inovação. Porém, quando o Estado cria leis que violam a liberdade individual, como é o caso da lei da palmada, o alerta da sociedade civil precisa soar. É certo que o Leviatã saiu do controle, e ainda que oficialmente o país não seja socialista, caminha celeremente para tal. Por que, nesse caso, é tão difícil perceber que os alicerces da estrutura social livre estão sendo corroídos?
Um vislumbre da Teoria Crítica da Sociedade permite compreender a estratégia da revolução cultural proposta pela Escola de Frankfurt. O objetivo é o de moldar a mentalidade e a visão política das pessoas, abalando os alicerces da civilização Ocidental. Para tanto, é necessário cooptar aliados nas associações de trabalhadores (sindicatos), nas escolas, na mídia e até nas igrejas. Assim, aos poucos, sem alarde, geração após geração, a resistência contra a dissolução da liberdade e da individualidade vai sendo minada.
Ocorre que a instituição da liberdade individual, com seu sistema de escolhas e consequências, funciona como anticorpos em defesa da coletividade. Quando os indivíduos são convencidos a abrir mão de sua liberdade em favor do coletivismo, a sociedade perde esse escudo e se torna presa fácil do totalitarismo. A dignidade humana é aniquilada e o indivíduo renuncia à soberania de sua própria vida. Friedrich Hayek, em O Caminho da Servidão, destaca que não há nada mais desesperador e intolerável para um homem que saber que nenhum esforço próprio poderá mudar uma situação desfavorável. Prevalece o sentimento de resignação e impotência. Logo, há espaço para a tirania e a submissão, com todas suas consequências em termos de privação material e falta de perspectiva.
Quais seriam então, as estratégias do coletivismo para desestruturar as defesas naturais da sociedade? O escritor francês Victor Hugo alertou que um povo pode resistir à invasão de um exército, mas não ao propagar das ideias. Assim, o filósofo marxista Antonio Gramsci propõe que a hegemonia coletivista seja conquistada pela mudança no plano da consciência. Ou seja, na ideologia e no discurso. Daí o sentido de afrontar as tradições (que inclui a família, o trabalho e a religião), subverter a lógica, relativizar o rigor científico e dominar a linguagem. Para alcançar esse propósito, os coletivistas lançam mão de instrumentos como o controle dos meios de comunicação, a infiltração de aficionados nas instituições constituídas e o domínio da educação das novas gerações.
Nesse contexto, quando a análise crítica e a divulgação dos fatos são substituídas pela versão progressista, no jornalismo; quando a ética e a lógica econômica são atropeladas pelo casuísmo, na aplicação do direito; quando a meritocracia e o bom senso são ignorados em favor da inépcia e do coitadismo, na educação e no trabalho; a sociedade já se encontra em elevado grau de acometimento. A estagnação econômica decorrente é apenas reflexo dessa disfunção social, que óbvio, reduz a disposição para assumir riscos. Sem a ousadia para experimentar o novo, não há qualquer possibilidade de alcançar o desenvolvimento sustentável. Significa reconhecer a incapacidade de evoluir.
Evidente que não há produção que resista à ausência de liberdade para pensar, agir, tentar, errar e recomeçar. Logo, se a produção é obstruída, revela-se negligência pela necessidade humana de consumir. A própria vida é desprezada. O desfecho não poderia ser diferente do completo fracasso da existência humana. Não surpreende, portanto, que todas as vertentes do pensamento marxista, de alguma forma, afrontem os fundamentos da civilização Ocidental. A saber, a liberdade, a democracia, a família e a fé cristã. São valores que até aqui permitiram o progresso material da humanidade, o domínio das forças da natureza e em última análise, a sobrevivência do homem na Terra.
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Eduardo Lima Porto Porto Alegre - RS
Artigo brilhante!