Suspenso o Projeto dos defensivos agrícolas na Comissão Especial da Câmara
Nesta terça-feira (19), deputados foram obrigados a suspender a votação do novo substitutivo ao PL 3200/2015, que moderniza a legislação de defensivos agrícolas apresentado pelo relator Luiz Nishimori (PR-PR), em função do início da ordem do dia do Plenário da Câmara dos Deputados. As comissões da Câmara não podem funcionar enquanto houver votação no plenário.
A suspensão aconteceu devido a uma manobra dos opositores do projeto, que apresentaram diversos requerimentos para postergar a discussão e adiar a votação. A previsão da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) era de que a proposta fosse aprovada nesta terça. Devido à suspensão, a discussão será retomada nesta manhã, às 11 horas.
Acompanhe, AO VIVO, as discussões na Comissão Especial PL 6299/02
Os deputados contrários ao projeto trataram o adiamento como uma vitória, e prometem questionar o projeto no Supremo Tribunal Federal (STF) caso o relatório do deputado Luiz Nishimori (PR-PR) seja aprovado.
Esta é a quarta vez que a votação é adiada. A bancada ligada ao Meio Ambiente tem encontrado apoio de artistas, intelectuais e de órgãos públicos como a Anvisa e de entidades como o Instituto Nacional do Câncer. Também há forte rejeição ao projeto dentro do Ministério da Saúde e do Ministério do Meio Ambiente.
O novo parecer de Nishimori modifica a proposta apresentada no fim de abril, substituindo a nomenclatura “defensivos fitossanitários” por "pesticidas" “A alteração atende a nomenclatura utilizada pelos principais países membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e comumente utilizada no mundo para substâncias químicas de combate a pragas. Agrotóxico só é usado no Brasil”, explicou o relator da Comissão.
O documento modificado também garante a continuidade da participação a Anvisa e do Ibama no processo de análise de produtos e aumenta o prazo de registro de produtos novos de 12 meses para 24 meses.
Deputados favoráveis ao projeto defendem que o novo marco legal irá desburocratizar o processo de registro de defensivos agrícolas, aumentar a produtividade do setor agrícola e movimentar a economia. “Nós temos tecnologias novas, precisamos de uma legislação nova. Retrocesso é não estar abertos a novas tecnologias”, disse Evandro Roman (PSD-PR).
O deputado Sergio Souza (MDB-PR) apresentou dados que refutam o discuso apresentado pela oposição. “Encontrei uma informação publicada pela Anvisa, em 2016, onde 99% de 12.051 amostras não contem nada de resíduos. Precisamos acabar com um dos mitos, dizem que o Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos. De 2007 a 2017, 84 mil casos de notificações de intoxicações, somente 5% refere-se a agrotóxicos e 43% são por remédios, 0,7% diz respeito a uso, o restante é acidente ou suicídio”, esclareceu.
Debate científico
O médico toxicologista Ângelo Zanaga Trapé, que pesquisou defensivos agrícolas por mais de 40 anos, acompanhou a sessão da Comissão Especial. O pesquisador estudou os efeitos de defensivos em populações que trabalham em áreas rurais em todas as regiões do Brasil e não encontrou evidências científicas que relacionem o uso dessas substâncias ao desenvolvimento de doenças como câncer, Alzheimer ou malformações genéticas.
“Realizei pesquisas com mais de 25 mil trabalhadores rurais e não pude detectar evidências que liguem o surgimento de doenças com o uso de agroquímicos. É preciso sair do debate ideológico e entrar na discussão científica”, defende o pesquisador.
Um dos principais avanços da nova proposta é a inclusão do critério de risco em complemento à avaliação de perigo utilizada atualmente para o registro de novos produtos. Esta avaliação prevê a análise das condições em que os produtos são utilizados para calcular os riscos que as substâncias podem oferecer.
“Trata-se de uma avaliação moderna, utilizada nos países mais modernos e que leva em consideração que, quando utilizados dentro das normas corretas, esses produtos auxiliam na produção e garantem a segurança do alimento que chega às nossas mesas”, garante o especialista.
Com adição de agrotóxicos, por favor (por CARLOS ANDREAZZA, em O GLOBO)
A rapaziada manifestante indignada não leu, não estudou, mas é contra; porque, se trata de agrotóxico, só pode ser ruim, nocivo, opressor, golpe de latifundiários
Tramita no Congresso, lentamente, a alcunhada Lei dos Agrotóxicos. Urgentíssima, para substituir a legislação de 1989, cuja defasagem põe em risco não o interesse de Blairo Maggi, mas o do brasileiro que compra milho no mercado. Desnecessário dizer, porém, que a proposta vai longamente amaldiçoada. Em trânsito de lesma na Comissão Especial da Câmara, ensejou, nas últimas semanas, novos protestos apaixonados dos bem-intencionados de sempre — aquela espécie humana peculiar que tanto mais esbraveja quanto mais desconhece o assunto.
Sim, sei que é exercício difícil para os exemplares dessa praga, mas a leitura do texto do projeto — geralmente é assim (vale experimentar) — explica seu objetivo: em suma, agilizar o registro de pesticidas mais modernos aqui. Bom, né? Não. A rapaziada manifestante indignada não leu, não estudou, mas é contra; porque, se trata de agrotóxico, só pode ser ruim, nocivo, opressor, golpe de latifundiários multinacionais, e pronto: arma-se a gritaria. A cena seria surrealista não tivesse pilares metodológicos clássicos a serviço da confusão e da ignorância tragicômicas: aqueles que lutam historicamente contra o uso, no Brasil, de defensivos agrícolas já superados em outras nações são os mesmos que ora lutam contra a lei que permitiria a rápida modernização dos defensivos agrícolas utilizados neste país.
Que tal?
Curioso e triste torrão é o Brasil, este cuja principal vocação econômica, a agropecuária, desenvolvida pari passu com a melhor tecnologia, distribuidora de riqueza e geradora de milhões de empregos, muitos dos quais com altíssima especialização, é criminalizada pelos mistificadores senhores do discurso da “oportunidade para todos”. Não é incoerência, porém. Há método — insisto.
Sob a mobilização de poderosos grupos de pressão ideológicos, a militância dos hábitos virtuosos encontra fluente caminho para se impor e transtornar quando consegue infiltrar sua cultura de desinformação, via de regra alarmista, nos costumes da população. Quase sempre consegue, com luxuosa contribuição de artistas, jornalistas e outros patriotas do apocalipse. Sobre a produção de alimentos, a deturpação é especialmente depravada. Amedrontado pela propaganda mentirosa do onguismo mais lucrativo, o brasileiro médio foi convencido de que a comida que lhe é oferecida é ruim, talvez mesmo envenenada. Não é isso? Quem nunca se deparou com a impostura segundo a qual aqui se consumiria, individualmente, cerca de cinco litros de pesticidas por ano?
Em que espécie de hortinha mental-moral elitista vive essa gente leviana que propaga a produção quimérica de alimentos orgânicos em larga escala como salvação de uma humanidade contaminada? Quando se deu a perversão de valores por meio da qual hábitos individuais de ricos, não raro exóticos (talvez fanáticos), práticas matematicamente insustentáveis para o conjunto da sociedade, tornaram-se ativismo autoritário — para muitos entre os religiosos da pureza razão da própria existência — vendido em nome da saúde alheia ainda que sem a mais mínima comprovação científica?
O que se sabe, seguramente, sobre o alimento orgânico: que não tem vantagem, nutricional ou de sabor, sobre o produto convencional, e que é muito, muitíssimo, mais caro, isso como consequência da produtividade fundamentalmente menor, de crescimento representativo impossível, daí por que, por definição, coisa de abastados — que semearia a fome caso dele dependesse a subsistência mundial. Ou seja: o pobre, para comer, para se nutrir, precisa de pesticidas, e isso — atenção — não lhe faz vítima, mas cidadão plenamente, como só raramente, beneficiando-se da inclusão, da inclusão prática, objetiva, permitida pela tecnologia.
Só no Brasil, aliás, defensores agrícolas, glórias da ciência, são chamados de agrotóxico, palavra essencialmente enviesada, criada e difundida para distorcer — para plantar na percepção das pessoas a ideia farsante de que pesticidas são instrumentos garantidores da expansão produtiva irresponsável decorrente da ganância da máfia dos grandes produtores rurais. Não é assim? A verdade, no entanto, é outra: a química aplicada no campo dominou pragas antes consideradas invencíveis, trouxe estabilidade, previsibilidade, às safras, que batem sucessivos recordes, e criou as condições para que o cultivo, por exemplo, de arroz e feijão precisasse hoje de três vezes menos terra que há 40 anos — e tudo isso para entregar comida barata, farta e de boa qualidade.
Curioso e triste país é o Brasil, este cuja gente que concebeu o Bolsa Família, e que zela pela renda do pobre, investe na narrativa que demoniza a agropecuária — atividade cuja excelência leva comida saudável e em conta à mesa do brasileiro real, aquele para quem programa de culinária na tevê é obra de ficção tão distante quanto o reino da Dinamarca, “nação mais orgânica do mundo”, onde a fatia desses produtos do mercado, contudo, não chega a 8%, e a alimentação das pessoas não é aparelho para terrorismo ambiental.
Carlos Andreazza é editor de livros
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