Acerto geral (editorial da FOLHA) + A gerentona diferentona ("Até quando?")

Publicado em 13/01/2016 02:14

Gerentona diferentona ("Até quando?")

Por VINICIUS TORRES FREIRE, na FOLHA DE S. PAULO

Quanto vale a Petrobras? Segundo os donos do dinheiro grosso, que negociam ações, a petroleira é aquela empresa pequena, que não tinha pré-sal, do início do século.

Uma empresa menor, de um país de economia também muito menor, mal saído de uma saraivada de crises: apagão, restos e rescaldos dos anos FHC, o medo da eleição de Lula. A vitória do PT provocaria uma desvalorização enorme da moeda, o dólar chegaria a custar mais de R$ 8 em 2002, a preços de hoje.

Feitas as contas certas, aliás, a ação da Petrobras vale muito menos do que no primeiro ano de governo de Lula, 2003.

Ontem, a empresa anunciou seus planos até 2019. Também ontem, o preço do barril do petróleo triscou os US$ 30. No mercado, se vendia ação da empresa às baciadas. De tão liquidados, os papéis preferenciais da Petrobras baixaram à casa do dólar e pouco. Nos EUA, um hambúrguer custa três ações da Petrobras.

Em termos relativos, a dívida da empresa é dez vezes a de grandes irmãs, Chevron, Exxon e Shell (trata-se aqui da relação entre dívida e a geração de caixa anual). A fim de sobreviver, a empresa tem de diminuir, vender partes, pois não consegue arrumar dinheiro bastante para bancar um mínimo de investimento e pagar suas dívidas. Não fatura o bastante e, além de tudo, está sem crédito, crédito a preço razoável.

Em resumo, a empresa corta investimentos, também em produção, e encolhe, vende ativos. Como vai sair da crise?

Tão importante quanto, como vai investir no pré-sal, supondo que os preços ainda compensem? Como a empresa vai participar de pelo menos 30% em sociedades de exploração de campos do pré-sal, tal como a lei o exige, se vive nessa penúria?

Não vai conseguir fazer nem uma coisa nem outra. O assunto ora parece algo distante e abstrato, pois o corte de investimentos em petróleo é geral. Mas, em se tratando de energia, dois, três anos são uma piscadela.

Enfim, vamos ficar mais cinco anos sem leilão de áreas de exploração do pré-sal, como de 2008 a 2013, quando os governos do PT e Dilma Rousseff se dedicavam a desgraçar o setor de energia?

A Petrobras e o setor de petróleo precisam de reforma urgente. Divirtam-se os especialistas a descobrir ou discutir em qual direção. Mas não é mais possível fingir que tudo vai se resolver, que o caso é de "business as usual". A Petrobras é importante demais para ser deixada ao método Dilma de administração, no qual, entre outros problemas, apenas se tomam decisões à beira da ruína final.

Convém sempre relembrar que tamanho desastre se deveu à lambança amadora, incompetente, irresponsável, fraudulenta e corrupta que engoliu a empresa, em especial de 2010 para cá, desde quando a dívida quadruplicou.

Mesmo que se desconte a queda de 70% do preço do petróleo, desde meados de 2014, mesmo com as desgraças sem fim da crise mundial de 2008, a Petrobras padeceu muito mais que suas grandes irmãs petrolíferas. Mais grave, não tem como reagir, tais como muitas das grandes petroleiras, livres para refazer suas estratégias.

No Brasil, a Petrobras, empresa mais importante do país, vive sob o tacão das intervenções diferentonas do governo, inspirada pela gerentona da energia, mãe do PAC e do grão-estelionato eleitoral de 2014. Até quando?

 

Acerto geral (editorial da FOLHA)

Vai-se comprovando não ter limites –como também tem sido sem limites a prática da corrupção no Brasil– o potencial de escândalos aberto pela Operação Lava Jato.

Em poucos dias, sucederam-se acusações contra Jaques Wagner, chefe da Casa Civil do governo Dilma Rousseff (PT), contra Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado, contra os ex-presidentes Lula (PT) e Fernando Collor (PTB-AL), contra o senador Aécio Neves (PSDB-MG) e contra figuras não identificadas do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB).

Nunca é demasiado lembrar, não valem como prova as alegações feitas por quem já está comprometido na investigação em curso.

Na medida em que o recurso das delações premiadas ganha a adesão de mais e mais interessados, os personagens retardatários entregam-se a uma corrida para se valorizarem como portadores de informação nova e impactante.

De Nestor Cerveró, ex-diretor da Petrobras, partem indicações do envolvimento de Lula nas negociatas e a afirmação de que o governo FHC teria se beneficiado de US$ 100 milhões em propinas decorrentes da compra de uma empresa argentina pela petrolífera.

Nada, a esta altura do escândalo, é implausível. Ainda que o PT, tudo indica, tenha amplificado a exploração dos recursos públicos com a típica voracidade dos neófitos, poucos estariam dispostos –haja vista o caso do mensalão mineiro– a pôr a mão no fogo por seus antecessores no poder.

Resta que, por enquanto, Cerveró não especificou que funcionários e políticos durante a presidência do tucano terão recebido o montante estipulado.

Quanto ao ex-presidente Lula, há também muito a esclarecer. Cerveró sustenta que sua própria indicação a um cargo na BR Distribuidora representaria uma recompensa pelo papel que desempenhou na contratação da Schahin Engenharia, num negócio de US$ 1,6 bilhão.

O grupo teria concedido empréstimo, nunca quitado, para que o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula, repassasse verbas ao caixa dois do PT –em uma movimentação que se ligaria ao obscuro assassinato do prefeito Celso Daniel, ocorrido em 2002.

Sem dúvida faltam a essa narrativa dados palpáveis de uma direta participação de Lula, para além da sua responsabilidade presumida. Mais circunstanciado é o relato das reuniões periódicas de "acerto geral" e de disputas entre representantes de Collor e do PT, além de Renan Calheiros em pessoa, em torno das cotas de corrupção.

Enquanto isso, o ex-deputado Pedro Corrêa, do PP, negocia há meses seu acordo de delação premiada; os primeiros nomes de políticos, dentre os cerca de cem que promete, vêm à tona.

Acerto geral, com efeito. Talvez não sejam necessários tantos nomes assim para colocar todo o sistema político brasileiro em estado de falência ética generalizado; só a persistência nas investigações e na punição justa dos envolvidos, entretanto, será capaz de recuperá-lo.

'É a ausência de estratégia, estúpido!'

Por MARCOS TROYJO

Num recente texto publicado no UOL, o professor Carlos Primo Braga, do IMD (Suíça), relembra uma conhecida ação de marketing político que se notabilizou durante a disputa pela Casa Branca no início dos anos 1990 entre George Bush, que buscava reeleição, e o jovem governador do Arkansas, Bill Clinton.

Um dos estrategistas de Clinton, James Carville, explorou a conjuntura de estagnação do produto norte-americano ao propor o bordão "É a economia, estúpido!".

A frase viralizou e, mais que isso, ajudou a criar a contraposição entre um governante de perfil "velha economia" (Bush) e uma estrela ascendente da política (Clinton) que já se associava à nascente revolução da internet e suas empresas "pontocom".

Primo Braga compõe uma interessante analogia com o atual momento brasileiro. No nosso caso, para além de uma conjuntura internacional adversa –aumento das taxas de juros internacionais, desaceleração da China etc –, contribuem também o esgotamento da modalidade brasileira de capitalismo de Estado, tal como implementada pelo lulopetismo, e as barbeiragens na condução macroeconômica dos últimos seis anos.

Para agravar ainda mais a desarrumação, acirrou-se a "guerra" entre o Planalto de Dilma e a Câmara de Eduardo Cunha, cuja principal batalha se afigura com a abertura do processo de impeachment.

Por isso tudo, a melhor interpretação do quadro brasileiro viria com um "É a política, estúpido!".

  Zhang Duo - 30.nov.2015/Xinhua  
A presidente Dilma Rousseff e o líder chinês Xi Jinping se cumprimentam durante encontro em Paris
A presidente Dilma Rousseff e o líder chinês Xi Jinping se cumprimentam durante encontro em Paris

Longe de mim minimizar a complexa gestão macroeconômica cotidiana ou a importância do diálogo construtivo entre Executivo e Legislativo. Tampouco se deve subestimar uma conjuntura global adversa para exportadores de commodities.

A questão é que, caso se prolongasse o período de "largesse" do afrouxamento monetário no Ocidente, o preço das commodities agrícolas e minerais continuasse lá em cima e Planalto e Congresso trabalhassem em harmonia, isso não bastaria para pavimentar o caminho brasileiro a tornar-se um país de renda per capita superior a US$ 20 mil no espaço de uma geração.

Realisticamente, se consideramos o intervalo 1980-2020, o Brasil terá acumulado duas décadas perdidas em quarenta anos. É tempo demais relegado ao ferro-velho da história.

E vale ressaltar que, na década passada, ainda fomos extremamente beneficiados por reformas empreendidas na segunda metade dos anos 1990 e pela ascensão dramática da China, com seu robusto apetite pelas matérias-primas de que dispomos em abundância.

MUITO SOFRIMENTO, POUCO SACRIFÍCIO

O Brasil já conheceu o céu e o inferno em termos de conjunturas internacionais mais ou menos propícias; já se governou com mais ou menos coesão entre os Poderes. O que o país jamais adotou foi uma estratégia de economia política que lhe permitisse a inserção competitiva no cenário global.

Ter uma estratégia não é prerrogativa de sociedades politicamente fechadas. É bem verdade que podem se observar diferentes graus de "consenso forçado" nas experiências históricas de Cingapura, Chile ou China.

Também é correto, contudo, enxergar movimentos (muitas vezes corretivos) de estratégia para a prosperidade em sociedades abertas de diversas filiações culturais, como Espanha, Reino Unido, Coreia do Sul ou EUA.

Também não demanda poderes extraordinários de visão ou ensaios de futurologia. Exige uma liderança capaz de arregimentar uma boa equipe, diagnósticos minimamente corretos sobre a direção em que o mundo está indo, planos de ação e eficiente execução.

E, no limite, estratégia exige algum grau de sacrifício –um esforço em nome do que é sagrado. No Brasil, historicamente há muito sofrimento e pouco sacrifício.

Essas não são apenas transposições de manuais de administração de empresas para o campo do desenvolvimento internacional. São as inescapáveis precondições que se exigem para que os países decolem.

No novo jogo global em que estamos entrando –e que durará ao menos um quarto de século– os pontos cardeais da "reglobalização" encontram-se bem delineados. Fortalecimento dos acordos plurilaterais, proeminência da "Chíndia", a volta da geopolítica e novo ciclo de prosperidade movido pelo talento.

Para isso bastam ajustes na política cambial ou de juros? É suficiente o estabelecimento de alianças que permitam ao Planalto maioria no Parlamento? Tudo se obtém com mudanças de governo que favoreçam a volta da "confiança"?

Essas características, todas com considerável peso relativo, nem de perto englobam o tamanho dos desafios do país.

O melhor slogan a explicar o impasse brasileiro talvez seja "É a ausência de estratégia, estúpido!"

 

Os mascarados estão soltos

Por ELIO GASPARI

Há algum parafuso solto no sistema nacional de manutenção da ordem pública. Marcelo Odebrecht, dono da maior empreiteira do país, completa sete meses de prisão preventiva na próxima terça-feira (19), e todas as 17 pessoas detidas durante as desordens ocorridas em São Paulo no inicio da noite de sexta-feira (8), foram libertadas no dia seguinte. Em poucas horas, foram depredados oito ônibus e cinco agências bancárias. Pode-se dizer que uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa, mas essas duas situações acontecem no mesmo país. Juntas, não fazem sentido.

Tem gente que fica feliz com a hipótese de os presos endinheirados mofarem na cadeia pelas malfeitorias que praticaram, mas não é assim que funciona a coisa. A prisão preventiva de um cidadão só se justifica pelo flagrante de delito ou para impedir que ele continue praticando um crime. Admita-se que esse é o caso para todos os empresários, políticos e espertalhões que estão presos em Curitiba e em Brasília. O mesmo deveria valer para os desordeiros.

Ao contrário do que acontecia no mundo das empreiteiras, onde as roubalheiras eram dissimuladas, a ação dos mascarados deu-se às claras e foi registrada ao vivo e a cores. A polícia de São Paulo mobilizou centenas de PMs, sua tropa de choque e veículos blindados para acompanhar a manifestação contra o aumento de tarifas de ônibus. Para quem quer dar uma manifestação de força, serviço perfeito. Durante mais de uma hora, mascarados tumultuaram o centro da cidade. Só 17 pessoas foram detidas. É pouco, mas vá lá. O relaxamento das prisões em flagrante foi determinada pela Justiça. Uma juíza considerou inconclusivas as provas apresentadas contra os cidadãos. A força foi exibida, mas deu em nada. De duas uma: a polícia prendeu quem não devia ou a Justiça soltou quem deveria continuar preso. Ao final das contas, não prenderam uma só pessoa com provas que a juíza considerasse irrefutáveis. Há apenas um desordeiro recolhido. Está na Fundação Casa, por ser menor de idade, e foi levado a uma delegacia na segunda-feira pelo pai policial, ao vê-lo num vídeo de quatro minutos na cena do espancamento de um PM.

A ação dos mascarados foi demorada. Num incidente eles pararam dois ônibus, obrigaram os passageiros a desembarcar e ordenaram aos motoristas que manobrassem os veículos para que obstruíssem uma avenida. Em seguida, quebraram vidros e picharam a lataria dos veículos. A polícia é treinada para intervir em situações desse tipo e dispõe de equipamentos para registrar a cena.

Um cidadão mascarado no meio de uma manifestação pacífica é pelo menos suspeito de estar ali para provocar alguma desordem. Quem já viu alguma dessas explosões de violência sabe que elas partem de grupos perfeitamente identificáveis antes, durante e depois das manifestações. Desordeiro não é ativista, nem um sujeito quebrando vidros de ônibus está manifestando uma opinião.

Se a prisão dos empreiteiros tem a virtude de desestimular futuras traficâncias, o fato de não haver um só desordeiro na cadeia torna-se um estímulo a novas violências, cuja principal consequência é a inibição de manifestações pacíficas.

O RETRATO DO CAPITALISMO PETISTA

O ano que passou e este que está começando entrarão para a história do capitalismo petista. A repórter Natália Cacioli revelou que pela primeira vez desde 2002, quando foi criado o Tesouro Direto, um supermercado de papéis do governo, o número de pessoas que protegeu seu dinheiro com pouca intermediação financeira superou o de investidores na Bolsa de Valores. Em apenas um ano o número de clientes do Tesouro Direto cresceu 72%, chegando a 587 mil.

Em tese, quem aplica na bolsa brasileira investe na produção. Quem vai para o papelório do Banco Central remunera-se à custa do endividamento do governo. Com a taxa de juros a 14% (e vem mais por aí), quem foi para o Tesouro Direto deu-se melhor do que a clientela da caderneta de poupança (137 milhões de contas). A aplicação preferida do andar de baixo, onde está o dinheiro de quem se previne contra o desemprego, teve rentabilidade negativa, pois pagará 7,95% contra uma inflação de 10,48%.

A Bolsa foi pior, voltou ao nível 2008, acumulando uma queda de 29% no ano. Isso se deveu em parte à gestão dos comissários na Petrobras e à queda das ações da Vale, produto da conjuntura internacional, bem como da irresponsabilidade de sua sócia Samarco, a mãe do desastre de Mariana.

O PT produziu a maior taxa de juros do mundo e o pior desempenho internacional do mercado de ações. Vive-se melhor emprestando dinheiro ao governo e aplicando-o diretamente no Tesouro do que investindo na produção de seja lá o que for. Sempre que isso acontece, a vida dos brasileiros piora.

A expansão dos fregueses do Tesouro Direto reflete uma cautela dos investidores. Além de buscar remuneração nos papéis da Viúva, preferiram evitar aplicações mais sofisticadas em fundos de instituições financeiras. Fugiram de todos os riscos, no que fazem muito bem.

(Por ELIO GASPARI)

 

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Fonte:
Folha de S. Paulo

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