Cerrados: a salvação na lavoura (Por Evaristo de Miranda)

Publicado em 21/11/2015 07:32 e atualizado em 23/11/2015 07:31

A primeira iniciativa para garantir a preservação do cerrado no Brasil foi a criação de áreas protegidas. Agora, cabe à agricultura assegurar o futuro do bioma e de sua biodiversidade.

A primeira iniciativa para garantir a preservação do cerrado no Brasil foi a criação de áreas protegidas. Agora, cabe à agricultura assegurar o futuro do bioma e de sua biodiversidade. Essa tendência é especialmente verdadeira no Matopiba, região geoeconômica de 73 milhões de hectares, com 91% de área coberta por vegetação de cerrado, englobando partes do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. Ali, há investimentos privados e recentes políticas públicas voltadas para o desenvolvimento sustentável.Nos c errados brasileiros, as áreas protegidas totalizam 12%. No Matopiba, elas representam 17%. Em nenhuma outra região geoeconômica com essa vegetação existem tantas áreas protegidas. Esse valor é 42% superior à média nacional de áreas protegidas nos cerrados. São 42 unidades de conservação e 28 áreas demarcadas como terras indígenas.

A ocupação do Matopiba é antiga: começou no século 17, intensificou-se com a criação pombalina da Companhia Geral de Comércio do Grão-Pará e Maranhão e culminou com o desenvolvimento agroindustrial de São Luiz, no século 19. Boa parte dos babaçuais resulta dessa antropização secular, marcada pelo uso do fogo. Ela prosseguiu no século 20 com cidades, estradas, infraestruturas logísticas, atividades energético mineradoras, barragens etc. Ganhou impulso com a construção da Belém-Brasília, da Transamazônica e da ferrovia Carajás-São Luiz.

Até 2002, 20% dos cerrados do Matopiba estavam antropizados, ou seja, transformados pelo homem. Em 2 009, che gou-se a 26%, segundo o Projeto de Monitoramento do Desmatamento dos Biomas Brasileiros por Satélite do Ministério do Meio Ambiente. Os dados apontam crescimento anual da ordem de 1% das áreas antropizadas desde 2002. A taxa está bem abaixo do crescimento anual da população e da economia regional. Entre 2008 a 2009, por exemplo, o bioma perdeu 0,37% de sua cobertura vegetal remanescente (7.637km²).

A agricultura é parte da antropização. A expansão da produção de grãos no Matopiba cresceu nas últimas décadas. Pela primeira vez, desde o século 19, em 2015, o Nordeste produziu mais alimentos do que o Sudeste: 18,6 milhões de toneladas de grãos (arroz, feijão, milho, soja...), segundo a Conab e o IBGE. O Matopiba é o responsável por tal desempenho. Ali, a ocupação agrícola mais intensiva não é sinônimo de desmatamento. Estudos de sensoriamento remoto, realizados entre 2002 e 2010, mostraram que 'grande parte da expansão da agricultura ocorreu em locais previamente des matados, indicando a utilização de áreas já antropizadas', sobretudo pela pecuária, na produção de alimentos (ver https://www.dsr.inpe.br/sbsr2015/files/p0697.pdf).

Nas áreas de expansão da agricultura, o Código Florestal determina uma reserva legal de vegetação de 20% nas regiões de cerrados. Tal percentual aumenta para 35% quando esse tipo de vegetação se encontra na Amazônia Legal. É o caso de 60% da área do Matopiba. Essa exigência, além dos 19% já preservados de forma absoluta nas áreas protegidas, estende potencialmente essa proteção para mais de 11 milhões de hectares ou 28% da área total. Se toda a cobertura de cerrados do Matopiba na Amazônia Legal (32 milhões de hectares) fosse, um dia, ocupada apenas pela agricultura, o que está muito longe de ser o caso, mais de 11 milhões de hectares seriam preservados nas áreas de reserva legal (28%). No restante, os 20% de preservação dos cerrados em imóveis rurais potencialmente representam 4,6 milhões de hectares e 17% da área tot al.

Existem potencialmente mais cerrados a serem preservados como reserva legal das propriedades rurais do que em todas as áreas protegidas existentes no Matopiba. Assim, legalmente, apenas 59% da cobertura de cerrados do Matopiba são passíveis de ocupação. Dos 41% restantes, 17% já são áreas protegidas. E a exigência de manter a vegetação em áreas de reserva legal representa mais 24% do total. Isso, caso um dia tudo fosse ocupado pela agricultura. Graças ao Código Florestal, qualquer que seja o cenário futuro, áreas agrícolas no Matopiba cumprem e cumprirão o mais relevante papel na preservação. Isso se deve à extensão de cerrados preservados no interior dos imóveis, à ampla repartição espacial e à conexão ecológica viabilizada entre os blocos isolados de áreas protegidas pelas fazendas. No Matopiba, como em outras regiões, a salvação dos cerrados está na lavoura.

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Fonte:
Evaristo de Miranda

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2 comentários

  • Rafael Antonio Tauffer Passo Fundo - RS

    Além de unidades de conservação e reservas indígenas, é preciso observar que para abrir uma área nova hoje são exigidos 35% de reserva, mais APPs e 5% de reserva permanente. Em média vc consegue abrir 57% da área. Tenho certeza que por falta de mata ou cerrado é que não vai diminuir a chuva.

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  • adegildo moreira lima presidente medici - SC

    A exploração intensiva dos cerrados, principalmente no Piauí e Maranhão, tem destruído a caatinga e exposto imensa área a períodos intensos de seca e deterioração do solo...., a ótica hoje deve ser cautelosa no tocante às novas expansões, sob pena de sermos cobrados pela natureza.

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    • diogo patua barreiras - BA

      Cerrado não é caatinga e vice versa. Estude um pouco sobre ciclos solares e entenderá porque existem anos que chove mais ou menos. Não tem nada haver com desmatamento. Se fosse assim a Holanda seria um deserto pois só tem 3 porcento de áreas nativas.

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    • Rodrigo Antonio Noro Ipiranga do norte - MT

      bla ,bla ,bla,o produtor sempre é o culpado quero ver quando a fome apertar para quem vão pedir por favor

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    • carlo meloni sao paulo - SP

      Sr ADEGILDO achei o seu comentario um tanto contraditorio--Explico o porque-----As areas citadas vem sofrendo periodos intensos de seca ha' seculos, ---Portanto o ser humano nada tem a ver com isso, todavia se alguns agricultores mostram interesse por essas areas, havera' uma melhora ambiental porque toda e qualquer cultura proporciona uma troca de umidade extraida do solo e evaporada para o meio ambiente-----Portanto plantando culturas em areas sem vegetaçao e' benefico ao meio ambiente.

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    • adegildo moreira lima presidente medici - SC

      Carlos, teu comentário tem conteúdo respeitável principalmente onde afirma que plantar em áreas desprovidas de vegetação, mas meu comentário se referia a áreas ocupadas por cerrados e caatingas

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    • Paulo Roberto Rensi Bandeirantes - PR

      Senhores, o "todo" é muito mais do que podemos imaginar. Há um artigo que li tempos atrás neste link: ... http://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2016/10/1825723-pesquisadores-conseguem-desvendar-misterio-sobre-as-chuvas-da-amazonia.shtml ... Acho que dá para mostrar (um pouco), acho que um nanoésimo do que o assunto tem a nos desvendar. ... Boa Leitura !!!

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    • carlo meloni sao paulo - SP

      Sr ADEGILDO o cerrado ocupa 78% do Tocantis, 94% do Maranhao, 100% de Goias parte de Minas, Mato grosso e sao Paulo.Este bioma e' representado por poucas arvores quasi sempre com tronco retorcido e capim grosseiro e amarelado-----

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    • Jair Chiele Bom Jesus - PI

      Caro Adegildo, o Piauí com área de 251.577,738 quilômetros quadrados, tem sua vegetação praticamente virgem, peço que venha conhecer e viajar por centenas de kilometros no meio do mato, se não tivéssemos agricultores guerreiros que enfrentassem isso para produzir o arroz e o feijão de cada dia...de repente o mundo consiga viver se alimentando de folhas secas..

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