"CADA VEZ PIOR", editorial da FOLHA
"CADA VEZ PIOR", editorial da FOLHA
Presidente vê impopularidade atingir 62%, um dos maiores índices já registrados, como consequência de seus próprios erros no 1º mandato
A queda vertiginosa de popularidade da presidente deveria ser encarada como um chamado à sobriedade e ao comedimento. E não só por Dilma Rousseff e pelo PT. É do interesse geral que os canais de negociação permaneçam abertos.
Numa quadra em que a aprovação da mandatária despenca para 13% e a rejeição salta para 62% --aproximando-se das piores avaliações já medidas--, a própria autoridade presidencial se esgarça. Uma chefe do Executivo isolada e enfraquecida, mas com 45 meses de governo à frente, não traz bons presságios para a difícil travessia que a economia nacional inicia.
Reeleita com 54,5 milhões de votos (51,6%), a margem mais apertada da história, Dilma vira seus índices de ruim e péssimo disparar de 24% em dezembro para 44% em fevereiro, segundo o Datafolha. O avanço de 38 pontos em três meses mostra a que nível chegou o desgaste de sua imagem.
O último solavanco captura e espelha a enorme insatisfação que tomou as ruas em 15 de março. A amplitude atingida --na desaprovação da presidente e no número de manifestantes contra ela-- reduz a pó a interpretação petista de que se trata de orquestração da elite inconformada com a derrota eleitoral do PSDB em outubro.
É bem mais que isso. Pela primeira vez em 30 anos de normalidade democrática, articula-se um movimento de massa que não teme defender ideias conservadoras.
De acordo com o Datafolha, 47% dos que tomaram a avenida Paulista no domingo se declaram de centro-direita ou de direita (e 12% de esquerda ou centro-esquerda) --e é um sinal de vitalidade da democracia que se sintam livres para levantar suas bandeiras.
Aqui e ali, é verdade, despontam aberrações como a defesa de um golpe militar. Mas 85% dos manifestantes do domingo afirmaram que a democracia é sempre a melhor forma de governo (e 86% externavam a mesma opinião na marcha da sexta-feira, a favor da administração petista).
O combustível dessa revolta de classe média deriva da desastrosa gestão da economia no primeiro governo Dilma e do doloroso ajuste das contas públicas que ora impõe.
Após uma década de melhora no acesso a bens e serviços, parcelas crescentes da população são afrontadas com uma inversão de expectativas tão súbita quanto mal justificada. Um contingente recorde --e crescente-- teme pelas condições econômicas futuras.
Já não seria pouco, mas a isso ainda se somam a mentirosa promessa de continuidade da bonança, feita na campanha eleitoral, e o aprofundamento do escândalo de corrupção da Petrobras.
As tentativas de Dilma Rousseff de dar respostas convincentes a tamanho descontentamento foram até aqui frustradas. Com a deterioração da situação econômica, a insatisfação dificilmente deixará de permear todos os estratos sociais. A Presidência da República, mais do que nunca, precisa saber ouvir --e se fazer ouvir, cabe acrescentar-- toda a população.
A cruz e a espada (coluna Painel)
O tesoureiro nacional do PT, João Vaccari Neto, resiste à pressão da cúpula do partido para deixar o cargo imediatamente, como forma de preservar a legenda. Vaccari passou a terça-feira reunido com seus advogados em São Paulo. Foi orientado a permanecer na Secretaria de Finanças do PT. A tese dos advogados é que a demissão poderia parecer uma "admissão de culpa", o que prejudicaria sua defesa. A direção petista, no entanto, insistirá na renúncia ainda nesta semana.
Logo mais Vaccari, que nega participação no esquema de desvios na Petrobras, já admite o afastamento tão logo "baixe a poeira" da denúncia feita contra ele pelo Ministério Público Federal.
Redemoinho No PT, no entanto, o temor é que, em vez de o quadro se acalmar, o tesoureiro tenha a prisão preventiva decretada.
Foco Vaccari é uma das principais esperanças da oposição de encontrar elementos para pedir o impeachment de Dilma Rousseff. A ideia é aprovar na próxima terça sua convocação para depor na CPI da Petrobras.
Chassi Na reunião de líderes da oposição convocada por Aécio Neves (PSDB), deputados disseram que Vaccari pode ter a "a Elba de Dilma" --referência ao caso concreto que possibilitou a abertura do processo de impeachment de Fernando Collor.
Septicemia 1 O Datafolha mostra o pessimismo com a economia atingiu o eleitor de Dilma Rousseff. Entre os que dizem ter votado nela, 70% acham que a inflação vai crescer (24% diziam o mesmo antes do segundo turno).
Septicemia 2 A expectativa de crescimento do desemprego foi de 22% para 63% entre os que votaram em Dilma. No grupo, a sensação de que a economia vai piorar saltou de 8% para 50%.
Dito... Antes mesmo dos números da pesquisa, Lula já tinha dito a aliados que os atos de domingo não foram socialmente segmentados, como insistia o PT, e sim da sociedade "como um todo".
... e feito O ex-presidente narrou queixas de movimentos sociais e disse que era preciso responder rápido às ruas para que não atingissem quem votou em Dilma.
ANÁLISE DE ELIO GASPARI:
Doutora, ouça o Carvalhosa
Dilma admitiu corrigir erros. Se ler o livro do advogado, verá que sua lei anticorrupção é 'para inglês ver'
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse que a lei anticorrupção sancionada pela doutora Dilma há 19 meses ainda não foi regulamentada porque exige delicadas compatibilizações. Tudo bem, isso dá trabalho, mas a Constituição de 1988 fez seu serviço em vinte meses. Durante a Constituinte os parlamentares fizeram 19 mil intervenções. É difícil acreditar que regulamentar uma lei pega-ladrão dê mais trabalho que redigir uma Constituição. O comissário Miguel Rossetto certamente achará que cabe ao povo esperar que os guias geniais de sua vanguarda trabalhem em paz pela construção de uma nova sociedade mais justa. (Se ele der um trato no cabelo antes de ir a uma entrevista coletiva, a aliança operário-camponesa agradecerá.)
Felizmente, tendo ouvido o ronco da rua, a doutora Dilma disse que está pronta para reconhecer erros cometidos pelo governo e fez isso numa entrevista em que mostrou inédito desembaraço. Poderia fazer mais. O advogado Modesto Carvalhosa acaba de publicar um livro ("Considerações Sobre a Lei Anticorrupção de Pessoas Jurídicas") com uma triste conclusão: ela é produto da "malfadada cultura de legislar para dissimular, 'para inglês ver'".
Carvalhosa diz e prova: o artigo 8º da lei diz que, havendo uma denúncia, caberá à "autoridade máxima de cada órgão" tratar do assunto, nomeando uma comissão formada por dois servidores. Tudo o que eles precisam é ser "estáveis". Em suma: Surgida a denúncia de roubos na refinaria Abreu e Lima, o comissário Sérgio Gabrielli nomeia os doutores Pedro Barusco e Renato Duque para cuidar do caso. Seria muito mais lógico e eficaz colocar a Controladoria-Geral da União no lance desde a primeira hora. (Em São Paulo, numa construção radical desse mesmo ralo, vigora um decreto pelo qual pode-se recorrer da decisão dos Baruscos e Duques. Recorrer a quem? Ao prefeito que os nomeou.)
Como a lei é para inglês ver, o seu artigo 9º diz que competirá à CGU a "apuração, o processo e o julgamento" quando as ladroagens forem praticadas "contra a administração pública estrangeira". Ou seja, se estiverem roubando dinheiro da Petrobras, Barusco e Duque investigarão, cabendo à CGU apenas "competência concorrente". Se estiverem roubando do companheiro Teodoro Obiang, da Guiné Equatorial, a CGU entrará logo em cena, apurando, processando e julgando, sem Baruscos nem Duques.
Se a doutora Dilma der uma lida no final do livro de Carvalhosa, poderá achar pelo menos mais dez aberrações na lei que sancionou. Algumas são espertas, outras são produto da inépcia, até da preguiça. Quando trata dos cartéis, a lei praticamente copia dispositivos da legislação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Coisas semelhantes não são iguais. O Cade mira na proteção do mercado, uma lei contra a corrupção deveria mirar na defesa da bolsa da Viúva. Num caso (inciso 3º do artigo 16), a simples cópia de um dispositivo de leis americanas chega a ser constrangedora. Diz que a empresa acusada deve comparecer "sob suas expensas, sempre que solicitada, a todos os atos processuais". Isso é coisa de americano, no Brasil ninguém cuidou do táxi de alguém que é chamado a depor num processo.
análise de VINICIUS TORRES FREIRE>
Aperte o cinto, mas não viaje
País reduzirá consumo fora para se adaptar às vacas magras aqui e à estiagem de capital no exterior
MENOS CONSUMO vai ser o mote ou o resultado médio da economia brasileira no biênio 2015-2016, pelo menos. Devemos gastar menos também no exterior. "Devemos" é tanto previsão como necessidade.
Consumimos menos lá fora quando o preço dos importados em geral fica mais alto: quando o real se desvaloriza. De quanto teria de ser a desvalorização do real, a "alta do dólar", para a economia do país se readequar sem sustos ou riscos de solavancos graves ao novo ambiente mundial e às nossas novas precariedades? Isto é, qual a taxa de câmbio compatível com um deficit externo "sustentável"? Os economistas do departamento de pesquisa do Itaú fizeram uma estimativa (na verdade, eles e parte da torcida do Flamengo, mas passemos).
No cenário básico, médio, "caminho suave", o real deslizaria para R$ 3,10 ao fim deste ano, para R$ 3,40 em 2016 e R$ 3,60 em 2017, não sem antes alguns solavancos na taxa de câmbio ("overshootings", exageros). Assim, o deficit externo baixaria dos atuais 4,2% do PIB para algo na faixa entre 2,5% e 3% do PIB (sendo de 2,5% o nível "sustentável" estimado pelos economistas).
Trocando em miúdos grossos, trata-se de uma redução de 1,5 ponto percentual da demanda doméstica --em resumo pitoresco, menos viagens no exterior, menos gasto de cartão de crédito no exterior, menos produtos importados e, mais importante e a princípio, menos investimentos, pois máquinas e equipamentos estarão mais caros e, por ora, sem uso.
Mas, ainda assim, nessa estimativa o caminho é suave; posto assim não parece muito dramático, em especial para a inflação.
Vai haver menos recursos disponíveis para o Brasil financiar seu excesso de consumo e investimento, seu deficit externo (grosso modo, a diferença entre o que consumimos e o que produzimos, que deve ser importada e, de algum modo, financiada). Por quê?
Na opinião dos economistas do Itaú, primeiro, a recuperação da economia americana e a decorrente alta de juros por lá vão reduzir a oferta de capital no mundo, ampla e barata faz quase dez anos.
Segundo, há menos confiança na economia brasileira, que prejudica a atração de investimentos "na produção" e de aplicações financeiras.
Terceiro, os sinais do governo de que seriam contidas as intervenções no câmbio, com o que o dólar subiria de preço mais rapidamente (o que, a princípio, afasta investidores externos).
O ano seria particularmente difícil também porque, por exemplo, haverá mais dívida externa a vencer neste ano. Porque as captações (empréstimos) de empresas no exterior serão menores: as empreiteiras flagradas na Operação Lava Jato estão sem crédito, esse rolo afetou o crédito de outras empresas e o custo dos empréstimos.
Se a transição para esse deficit externo menorzinho dependesse apenas de nós, a tarefa não seria lá fácil, mas seria administrável. O problema é que os donos do dinheiro grosso do mundo não se entendem sobre o que será de juros e preços de moedas de países centrais (dólar, euro). Menos ainda, se haverá tumulto na transição. Tudo depende de como e quando o BC dos EUA, Fed, vai começar a elevar seus juros. Outra temporada dessa série, novela, começa hoje, dia de decisão do Fed.
0 comentário
Dólar se reaproxima dos R$6,20 com temor fiscal e exterior; BC não atua
Índice europeu STOXX 600 sobe com impulso da Novo Nordisk no início da semana de Natal
Zelenskiy diz que Coreia do Norte pode enviar mais soldados e equipamento para Rússia
Wall Street opera sem direção comum em início da semana com feriado
Ibovespa recua com pacote fiscal ainda no radar antes de fechar para o Natal
Dólar sobe mais de 1% no início da sessão acompanhando exterior