O clarão da lua cheia, por Osvaldo Piccinin
“Até a lua nesses tempos agitados, já não é dos namorados, romantismo não tem mais”. Lua cheia de luz, de sonhos, lua cheia de noite -, noite de lua cheia! Há quanto tempo tem sido ela contemplada, por gerações e mais gerações? - Desde que o mundo é mundo meu filho, seria a resposta do meu avô.
Quantos sonhos você despertou e de quantos nascimentos e mortes foi e será protagonista! Você é a testemunha mais encantadora e vigilante do nosso planeta e é a dona da noite assim como o sol é o dono do dia. Você inspirou poetas e seresteiros. Talvez por esta razão more no céu, ao contrário do vento que não tem morada certa.
Assistiu guerras, brigas e reconciliações sem nunca perder o encanto. Você nasceu para brilhar e nos trazer esperanças por dias melhores. Sua energia nos fortalece a alma. È poderosa. É a lua de todos os povos e rainha do nosso planeta!
Nas noites de lua cheia, o terreiro de nosso sítio ficava iluminado quando você, glamourosamente, surgia no horizonte. Na minha inocência, era logo ali atrás da colina do sitio vizinho a sua morada ou talvez, nascia e se escondesse nas entranhas da terra.
Incrível vê-la surgir todas as noites no mesmo lugar do horizonte. Até hoje tenho dificuldade em entender o conceito de rotação e translação da terra. Que prevaleça minha inocência! Durante sua fase “de cheia” a molecada aproveitava para fazer suas peraltices e dormir um pouco mais tarde, exaustos, mas felizes.
Por muito tempo acreditei que somente iluminava nosso pequeno sítio, mas em seguida descobri ser seu encanto universal -, sem discriminação de poder, religião, raça ou cor.
Entristecia-me vê-la se posicionar quase no meio do céu, com seu tamanho reduzido diminuindo a intensa luminosidade. A mesma sensação eu sentia quando se escondia atrás de uma nuvem negra, nos dando a impressão de abrupto apagão. Em torcida dizíamos em voz alta: - ela vai voltar, ela vai voltar! Às vezes sim, outras só tornaríamos a vê-la na noite seguinte ou alguns meses após.
Com frequência podia ver seu clarão pelas frestas do nosso velho telhado desalinhado pelo tempo, quando já deitado, aguardando o sono chegar excitado pela adrenalina das brincadeiras no terreiro. Embrulhado no cobertor sentia-me seguro, e o medo das noites escuras ficavam para trás.
Ouvíamos ao longe, o uivar dos lobos selvagens rondando nosso galinheiro. Meu pai não pregava os olhos e mantinha sempre sua espingarda dois canos de prontidão. A fama desse animal, como voraz devorador de galinhas, era temida, mas como habilidoso caçador fazia suas vítimas sem deixar rastro e sem que fosse disparado um único tiro.
Quando o homem pisou em seu solo, pela primeira vez, custei a acreditar e me alinhei com os céticos e matutos da cidade, que também diziam ser esta uma montagem filmada em alguma parte rochosa do mundo. Como seria possível pousar na superfície lunar, se a cada minuto mudava de lugar numa velocidade incrível?
Ao contemplar sua majestade cruzando o céu, ouvi um “causo” contado pelo meu tio, que nunca mais esqueci. Eis que o caipira e sua namorada, sentados num banco da praça sob os encantos da lua cheia, comiam uma pipoca animadamente quando ela disse: - olha amor a lua no horizonte como está linda! E ele sem pestanejar emendou: - deve ser prenúncio do nosso amor, ela está com ciúmes de mim!
Passados alguns anos, já casados, sentados no mesmo banco um numa ponta outro na outra, só que com quatro pirralhos entre eles brigando por um pirulito quando ela novamente, tentando resgatar o romantismo de outrora, disse - lhe: - Zé olha aí de novo a lua cheia igualzinha quando a gente namorava nesse banco, só que agora ela se escondeu atrás da nuvem, que sinal será esse? E ele de forma ríspida respondeu: - não tá vendo que vai chover “muié”?
E VIVA A LUA CHEIA!
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