Da porteira para dentro: a revolução que vem do agronegócio, por Gustavo Foz
Ano após ano, o agronegócio brasileiro não para de surpreender. Além de bater sucessivos recordes, como os US$ 120 bilhões de receitas cambiais de 2021, com alta de 19,9%, o setor tem agora outra métrica para se orgulhar: somos campeões de produtividade rural. De acordo com um levantamento realizado pelo Economic Research Service, órgão do Departamento de Agricultura dos Estados (USDA, sigla em inglês), o país só fica atrás da China no que diz respeito ao ganho de produtividade e eficiência do setor agropecuário.
De 1961 até 2019, a atividade no campo teve um salto de produtividade médio de 3,75% ao ano e, segundo o estudo, isso se deve à introdução de novas técnicas de cultivo e à recapacitação da mão de obra, seja por meio da implementação de novas tecnologias dentro e fora das propriedades. Com efeito, de acordo com outro levantamento, realizado pelo Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), Produção de Alimentos no Brasil: Geografia, Cronologia e Evolução, esse ganho de eficiência no campo foi acentuado nas culturas de arroz e café. Em ambas, apesar da redução na área das plantações tiveram um ganho de produtividade, em especial a cafeicultura, que entre 1988 e 2017 quase dobrou sua produção, mesmo ocupado 40% menos espaço.
Agricultura de precisão, transformações tecnológicas e ESG
Não é mera coincidência. O ganho de produtividade “da porteira pra dentro” tem motivos e causas bem conhecidas. Entre elas, está a chegada da agricultura de precisão às propriedades rurais, conceito que representa mais do que a introdução de novas máquinas e reconfiguração de novas técnicas na agropecuária. Presente no país desde 1989, o conjunto de práticas traduz a mudança de cultura, mentalidade e, sobretudo, de parâmetros aceitáveis para o mercado consumidor. Com efeito, segundo pesquisa feita pela consultoria Markets and Markets, esse mercado tem expectativa de crescer 60% e movimentar nada menos do que U$ 21 bilhões até 2026.
À primeira vista, a previsão parece muito otimista, principalmente para o Brasil, país que historicamente tem problemas com o escoamento de sua produção. No entanto, não faltam exemplos nacionais da aplicação de práticas e tecnologia para o aumento de produtividade em propriedades. Este é o caso do projeto Fertisystem, iniciativa com apoio do Instituto Senai, que utiliza a inteligência artificial e o sensoriamento para descobrir o momento certo e a quantidade de adubo exata para cada pedaço da plantação. Segundo a empresa, a estimativa é que o uso da tecnologia reduza, em média, cerca de 20% do fertilizante utilizado.
Mas como conectar essas ideias? — Você deve estar se perguntando. A resposta está nos céus, ou melhor, nas nuvens de informação que eu, você e todos nós recebemos e compartilhamos. A despeito da baixa cobertura de internet em centros agrícolas, o avanço das telecomunicações, principalmente por intermédio do 4G e da consolidação do modelo híbrido de quinta geração, encurtou as distâncias entre produtores, comerciantes e desenvolvedores da tecnologia. Não à toa, segundo a 8º Pesquisa Hábitos do Produtor Rural, realizada pela Associação Brasileira de Marketing Rural e Agronegócio (ABMRA), 76% dos agropecuaristas utilizam plataformas digitais para se atualizar das novidades do setor e fazer negócios.
Além de unir agricultores dos quatro cantos do Brasil, essa reaproximação entre diferentes segmentos do agronegócio trouxe uma diversidade de pontos de vistas e opiniões cujo o intuito é otimizar a safra e facilitar o escoamento da produção. Nesse sentido, a principal mudança que surgiu entre produtores foi a chegada dos conceitos de ESG (práticas relacionadas para reduzir o impacto ambiental, social e da governança) em fazendas, aquaculturas e pastos em território nacional.
Mais do que criar o senso de urgência entre agropecuaristas, a prática é encarada como um desafio mundial para governantes, gestores, empresas e, sobretudo, cidadãos, para a transformação da sociedade por meio de políticas coletivas e individuais. Agora, se o desafio e a responsabilidade são grandes, a recompensa é farta: segundo levantamento Bloomberg, até 2025, espera-se que organizações e empresas movimentem cerca de U$ 53 trilhões em ações relacionadas à preservação do meio ambiente, à redução da pobreza e ao ganho de produtividade em atividade agrícolas. Uma verdadeira mina de ouro.
Porteira aberta, mentes férteis
A tecnologia que garantiu o aprimoramento de técnicas no campo, a introdução de novos dispositivos e o ganho produtivo no setor por várias gerações tem um nome: comunicação. Por mais fundamentais que máquinas e práticas sejam para propriedades rurais, elas não fazem a primavera — sozinhas. A chegada dos aperfeiçoamentos “da porteira para dentro” só é possível porque essas inovações foram comunicadas, discutidas e divulgadas Brasil afora, principalmente via internet. Tanto é assim que, de acordo com uma pesquisa feita pela Esalq/USP, no ano passado, o aumento de conectividade entre agricultores e empresários poderia gerar até R$ 100 bilhões em valor agregado para o agronegócio.
O mesmo pode se dizer acerca do rejuvenescimento do empreendedor e trabalhador do campo. Segundo artigo do Farming First, ONG internacional com o intuito de semear a agricultura sustentável, com o advento das novas dinâmicas das telecomunicações, o produtor do Brasil é hoje mais jovem, integra mais mulheres e abraça mais a diversidade cultural. Como se isso fosse pouco, a maioria desses jovens agricultores têm formação universitária e busca aplicar seus conhecimentos, muitas vezes aprendidos em centros urbanos, no meio rural.
Em outras palavras, da porteira para dentro e do Brasil para fora, a troca de conhecimentos e experiências entre empreendedores, gestores e agricultores em ambientes abertos, inclusivos e contemporâneos será o fertilizante mais assertivo para nutrir novas e produtivas safras no futuro.
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