Fertilizantes continuarão a subir de preço para safra 22/23, mas produtor brasileiro deve garantir boas margens de renda
Os preços dos fertilizantes continuarão altos. Até quando e quanto mais ainda poderão subir são as dúvidas que ainda rondam os analistas e consultores de mercado, o setor produtivo e os representantes das indústrias destes produtos no mundo todo. E como o quarto maior consumidor mundial de fertilizantes - em sua maior parte importados - os reflexos das recentes altas deverão ainda aparecer de forma mais nítida para os agricultores brasileiros, exigindo uma tomada de decisão assertiva e estratégica para garantir uma boa safra 2022/23.
Durante o 8º Congresso Nacional de Fertilizantes realizado nesta semana pela ANDA (Associação Nacional para Difusão de Adubos), esse foi o destaque entre os principais painelistas. Entre todos os líderes reunidos a máxima era de que os fundamentos para os preços dos fertilizantes permanecem consistentes e deverão manter forte a escalada das cotações.
A pandemia motivou discussões e estratégicas ainda mais focadas na garantia da segurança alimentar mundial - tratada particularmente em cada país, seja como grande produtor, seja como forte consumidor - o que promoveu uma demanda intensa por commodities agrícolas e, naturalmente, uma escalada nos preços, como explicou a CEO da IFA (International Fertilizer Association), Alzbeta Klein. E essa escalada nos preços das commodities puxou a mesma escalada entre os preços dos insumos, liderada pelos fertilizantes.
Nos últimos 12 meses, todos os grupos de produtos marcaram altas históricas e muitos alcançaram os valores mais altos de todos os tempos frente a um consumo recorde. Além dos valores altos refletirem uma procura maior, responderam ainda a uma oferta bem menor de quase todos os produtos. "São várias crises colidindo ao mesmo tempo, acompanhando as disrupções físicas de abastecimento", disse Corrine Ricard, sênior VP e presidente da Mosaic Fertilizantes.
O gráfico abaixo, da Agrinvest Commodities, mostra que desde meados de 2020 os preços das matérias-primas - considerando custo frente (CFR) Brasil - têm dado saltos expressivos, com destaque para a ureia e o cloreto de potássio (KCl).
E as altas são sentidas com ainda mais agressividade pelo produtor brasileiro dada sua maior dependência das importações, como explica Alzbeta. Afinal, o atual momento não se desenha tão somente por questões de oferta e demanda, mas passa ainda por problemas macroeconômicos e geopolíticos, como as questões ainda não resolvidas na Bielorrússia, terceiro maior fornecedor de KCl para o Brasil, que pode passar por uma nova rodada de altas com as sanções que podem ser impostas pelos EUA ao país.
São disrupções, como relata a CEO da IFA, físicos, econômicos e políticos. "A maior parte do mundo não entende o que os fertilizantes fazem, quais são os problemas e como eles ajudam a nos alimentar e como temos que lidar de forma sustentável. Então, essa comunicação e educação sobre os fertilizantes são importantes e sendo enfatizadas aos políticos mostram as consequências não intencionais de suas decisões. E isso é um ponto muito importante", afirma.
Também por conta do presente momento político, os líderes reunidos no congresso foram questionados sobre a capacidade de aumento da oferta de fertilizantes e todos convergiram em suas perspectivas de um aumento, ao menos no médio prazo, de produto disponível no mercado. A capacidade de incremento de oferta é limitada também, em partes, pela crise energética. E há ainda uma série fatores além das cadeias de valor e de produção do setor que se colidem e também impedem que o aumento de oferta de matérias-primas aconteça rapidamente e logo chegue ao mercado.
Como explicou a representante da Mosaic, há alguns projetos no horizonte da indústria, mas também insuficientes para promover um crescimento expressivo o suficiente para mudar o quadro atual. Assim, como explicou Corrine, os preços continuarão acompanhando seus fundamentos e dependendo da demanda, que segue dando sinalizações de que permanecerá aquecida.
Entretanto, a executiva acredita que apesar de preços ainda bastante elevados, eles serão acessíveis para os produtores globais.
OTIMIZAÇÃO DE RECURSOS
Apesar de acessíveis, os primeiros estudos já sinalizam que nos EUA, onde essa onda de alta dos insumos vai impactar primeiro para a safra 2022/23, as margens de lucro dos agricultores ficará bastante apertada ou se aproximará de zero, como é o caso do milho em Illinois, por exemplo. Assim, o que terá de ser monitorado o movimento do produtor rural para otimizar seus recursos - de insumos e financeiro - e sua capacidade de pagar produtos com preços tão elevados. Em meados de outubro, o Notícias Agrícolas já informava sobre este cenário. Relembre:
"Há instituições falando sobre a redução do uso de fertilizantes ou até a mesmo a eliminação e nós somos frontalmente contra isso", frisou Carlos Cogo, sócio-diretor da Cogo Inteligência em Agronegócio, durante o evento. "Só se consegue compor uma margem de lucro com o uso intensivo de tecnologia, principalmente fertilizantes. E os preços subirão em todos os países".
Cogo afirma que em seus quase 40 anos de experiência no agro jamais vivenciou um momento como este. E mesmo diante do risco iminente de abastecimento de algumas matérias-primas para a próxima temporada, afirma que os fertilizantes continuam sendo um dos mais importantes investimentos do setor produtivo. Foi esse investimento, inclusive, que permitiu um expressivo aumento de produtividade em diversas culturas com um crescimento de área mais contido e muito mais consciente.
De 1990 a 2021, a área plantada no Brasil com grãos cresceu apenas 1,7% ao ano, mas com a produtividade crescendo 3,3%/ano, no mesmo intervalo, é o que faz com que a produção tenha um aumento de 5,4% ao ano, como explicou o executivo. "A base disso tudo, dentro da tecnologia, é o uso intenso de fertilizantes, que tem sido na ordem de 5,5% por ano na sua taxa anual composta de expansão, devemos chegar a um consumo de 44 milhões de toneladas de fertilizantes para atender a demanda de 80 milhões de hectares plantados hoje", diz.
Assim, Cogo faz simulações em que mostra que ao se cruzarem os atuais preços dos fertilizantes com as cotações futuras da soja na Bolsa de Chicago, os valores resultantes são favoráveis aos produtores brasileiros contabilizando o preço da saca em reais. E essa remuneração, em partes, vem do favorecimento trazido do mercado cambial. Nos EUA, por exemplo, o quadro não é o mesmo.
O executivo mostra que as simulações apontam para a utilização de 14 sacas por hectare de soja para a compra do pacote de fertilizantes para a safra 2022/23 nas operações via barter. Na safra 2021/22 a média foi de 6,4 scs/ha. "Esse é um valor, praticamente, duas vezes e meia maior do que usou nesta safra", diz. "E nessa simulação vemos que mesmo que fosse necessária a aquisição destes insumos aos preços mais elevados do que os praticados atualmente ainda haveria uma margem líquida positiva e um EBITDA na casa dos 37%. Ou seja, o produtor brasileiro, mesmo no pior ambiente possível, ainda teria margens brutas e líquidas muito maiores do que os produtores norte-americanos".
E mais uma vez, as análises se voltam à demanda. Segundo Cogo, as decisões tomadas pelos produtores dos Estados Unidos serão um importante termômetro sobre como irão se comportar os fertilizantes. Na sequência, a demanda pelas matérias-primas por parte de outros grandes produtores do hemisfério norte - Canadá, China, Rússia, Ucrânia, entre outros - também deverá trazer sinais importantes.
"Os produtores americanos serão os primeiros a sentir os impactos, principalmente no grupo dos nitrogenados, que são os que têm uma das altas mais fortes. Então, um movimento que podemos ver é uma migração de área de milho para paraa soja, já que a soja utiliza menos insumos (e tem custo menor)", explica o analista de mercado.