Uma questão de paladar

Publicado em 18/04/2011 09:56

A imensa quantidade de propostas, sugestões e notícias que circulam pela internet todos os dias é capaz de causar todos os tipos de reações.   Com certeza inúmeras reações de indignação ocorreram quando da leitura de estudo divulgado pela FAO, onde a mesma surge como incentivadora do consumo humano de insetos, como fonte protéica em futuro próximo.
O consumo de insetos apesar de ser muito estranho para a maioria das pessoas já ocorre em alguns locais.  Aqui mesmo no Brasil, em algumas regiões do nordeste, a formiga saúva é consumida de maneira frequente, torradinha como se fosse um amendoim.  Alguns países orientais possuem o hábito de consumir escorpiões e na Europa os apreciadíssimos “escargots”, são considerados uma iguaria acessível somente aos mais endinheirados.  Os tailandeses consomem, entre outros insetos, grilos (sopas), larvas de besouros e crias de abelhas, estas possuidoras de elevados níveis protéicos.  Esta nova matéria chama-se antropoentomofagia e, segundo consta, já relacionou mais de 1.400 espécies de insetos comestíveis.  Como informação necessária aos novos comensais, deve-se dar preferência aos insetos de coloração verde, preta ou marron, pois os de coloração muito intensa, como vermelhos e alaranjados podem ser venenosos.
Alguns insetos são até simpáticos, gastronomicamente falando.      Gafanhotos, por exemplo, parecem muito limpinhos e até onde sabemos alimentam-se apenas de folhas verdes.  Quem sabe se, de fato, seriam uma boa opção protéica para o futuro?   A FAO acredita que sim.  Não me consta que gafanhotos possuam picanha, o que poderia converter alguns aficionados do churrasco, entre os quais me incluo, a saborearem este animalzinho nos finais de semana.
Entretanto, a preocupação com o incremento no consumo de carnes decorrente do maior poder aquisitivo das populações de baixa renda é válida e necessária, pois ainda segundo a FAO, poderá haver, num futuro próximo, uma limitação física à produção de proteína animal, principalmente no que se refere à carne bovina.  Já faz algum tempo que o boi tem sido considerado inimigo da preservação ambiental, notadamente pelos adeptos da alimentação vegetariana.   Preocupados em monitorar as eructações e flatulências do gado bovino, alguns “verdes” esquecem que os ruminantes são verdadeiras máquinas de transformar celulose e lignina em proteínas assimiláveis pelo organismo humano, o que é uma característica extremamente positiva do ponto de vista econômico e nutricional.
De qualquer sorte, esperemos que esta moda de consumir insetos demore a pegar, pois acredito na tese de que os seres humanos desenvolveram seu cérebro quando começaram a consumir carnes.  Além disso, agora que o Brasil tornou-se o maior exportador de carne do planeta é importante que este consumo seja incentivado.   Nos últimos vinte anos a produção de carne brasileira aumentou 83% e a lotação em UA/ha (Unidades Animais por hectare) passou de 0,5 para 1,0 UA/ha entre 1970 e 2006.   
Atualmente são destinadas às pastagens 172 milhões de hectares em todo país.   A lotação de 1,0 UA/ha apesar de estar aumentando é extremamente baixa e poderia facilmente, através de tecnologias disponíveis como Integração Lavoura- Pecuária e manejo rotacionado de pastagens, ser aumentada para 2,0 UA/ha.  Com isto, praticamente 70 milhões de hectares de pastagens seriam disponibilizados para agricultura, o que significa uma área maior do que a atualmente explorada no país (em torno de 60 milhões de ha).
Desta forma existem grandes possibilidades de aumento na produção de carne bovina, principalmente pelo aspecto preservacionista e sustentável da produção a pasto, uma característica da pecuária brasileira.  A perspectiva de aumento na produção de carnes suína, ovina e avícola também são imensas, pois a agregação de valor aos grãos é medida inteligente e propulsora de empregos e renda nas regiões onde tem ocorrido.
É muito cedo, portanto, para que se substitua a qualidade e o sabor das carnes atualmente produzidas pelo consumo de insetos, por mais ecologicamente correto que isto possa parecer.  De qualquer forma, aos adeptos da sugestão faoniana, poderíamos oferecer como opção gastronômica as lagartas (verdes) e percevejos (marrons) que insistem em prejudicar as lavouras do Mato Grosso.

Rogério Arioli Silva
Engº Agrº e Produtor Rural

 

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Fonte: Rogério Arioli Silva

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