Gestão ambiental da violência urbana, por Antonio Fernando Pinheiro Pedro

Publicado em 30/07/2019 10:26
A falta de humanidade na gestão ambiental urbana gera distorções e também dá origem à violência.

Desumanização da gestão pública

O biocentrismo (do grego βιος, bios, "vida"; e κέντρον, kentron, "centro")  é uma concepção segundo a qual todas as formas de vida são igualmente importantes - a humanidade não é o centro da existência e sim mais um componente dentre os elementos e forças diversas do universo. 

Como toda concepção humana, no entanto, o biocentrismo não é fórmula perfeita e, não raro, produz comportamentos messiânicos com efeitos perversos e desumanizadores - principalmente quando "a iluminação" se projeta nos componentes da burocracia, da tutela de interesses difusos e da gestão ambiental brasileira.

É o que ocorre hoje com algumas lideranças ambientalistas, encasteladas nos Conselhos de Estado, técnicos e peritos públicos, promotores e juízes que admitiram  a doutrina biocentrista sem críticas e, dessa forma, tornaram-se vítimas da droga imbecilizante  do messianismo, que torna insensível todo indivíduo que a consome.

No caso dos "ecologismos" da vida, como concepção moralmente confortável, o biocentrismo atua como verdadeiro alucinógeno social - deixa seus consumidores embevecidos com a ilusão de estarem praticando um bem para um mundo utópico, limpo, preservado e... desprovido de gente. 

Essa postura é geradora de impasses e perenizadora de conflitos. Torna praticamente insuportável a convivência democrática entre partes interessadas, gestores responsáveis e operadores do direito.


A perda de foco sobre o objeto a ser tutelado

De fato, o biocentrismo e impede a busca por uma justiça humana, na resolução dos conflitos humanos, mormente quando decorrem da aplicação de nossas leis "ambientalmente corretas" à dura realidade brasileira.

Ocorre algo como um autismo social, cujo efeito é complexo - distorce o sentido hermenêutico e exegético da norma legal. Ou seja, a alienação ocasionada pela contaminação do fenômeno doutrinário, desvirtua o cenário, o contexto em que a lei se insere (sujeita aos principiologismos de bolso), o escopo da ação da autoridade, o objetivo social do Estado de Direito e a aplicação do próprio direito. 
Essa distorção ideocrática destrói o conceito jurídico de ambiente ecologicamente equilibrado, como um bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, que devemos proteger para as presentes e futuras gerações (humanas)- como reza nossa Constituição Federal.
Em verdade, é preciso resgatar a essencialidade do equilíbrio - inserido na norma constitucional, sem o qual o texto legal se perde. 

De fato, e isto é fisicamente incontroverso,  todo equilíbrio é dinâmico. O universo não para. Nem a morte representa equilíbrio. 

Em verdade, a dinâmica está inserida no complexo processo de interação da atividade antrópica com os recursos naturais e artificiais por ela consumidos, impactados ou modificados.
O patrimônio legal tutelado, portanto, constitui-se de dinâmicos e complexos processos de interação, cujo "equilíbrio ecossistêmico"  há de admitir todos os elementos - não os excluir. Esse patrimônio é material vivo,  não se confunde com um meio ambiente idílico, um processo ecológico de aquário, visto isoladamente, segregado do mundo, da tecnologia, da economia que o cerca. O bem jurídico ambiental, portanto, não é o quadro bucólico pintado academicamente – pregado na parede da sala de trabalho do promotor de justiça, nem o aquário na redoma de vidro na mesa de centro na sala do juiz...

Aliás, tocando na aquariofilia, o bem jurídico ambiental muito menos se confunde com o equilíbrio biológico de um aquário, mantido a custo de energia e esforço humano dedicados,  ainda que quem o observe entenda tratar-se de algo preservado e não conservado.
Não há, também, eternidade. Assim como os dinossauros já dominaram o mundo, por milhões de anos, o ambiente que hoje presenciamos também desaparecerá inexoravelmente, por ação antrópica, cósmica, geomórfica, química ou biológica. É da vida, é da física, estejam elas onde estiverem… Não será uma norma escrita no papel que eternizará um bem, contra algo universalmente inevitável.

O que nos compete é buscar uma melhor qualidade de vida para todos nós – humanos, pois não fazemos e nem pretendemos fazer leis para a natureza em que estamos inseridos - isso é tarefa sobre-humana, é prerrogativa de Deus.
Essa postura de humildade ante os fatos sempre caracterizou a Organização das Nações Unidas, que em todas as declarações de princípios estatuídas sobre a causa ambiental, sempre asseverou a preocupação humanista com a questão, ainda que se objetivasse pontualmente nos seus diplomas a preservação de espécies, da biodiversidade ou da conservação de matas.


Os efeitos nefastos para a ordem pública

Biocentristas costumam propositadamente confundir o viés humanista estatuído pela ONU, com o que entendem ser um famigerado “antropocentrismo” - intentando datar e estigmatizar o humanismo desenvolvimentista, opondo-o à causa globalista e desumanizadora. Com isso, os biocentristas constroem uma falsa polêmica.
Na verdade, não há como excluir a preservação das espécies e a conservação da natureza, da busca pelo Desenvolvimento Sustentável. Também, não há Desenvolvimento Sustentável sem humanismo e Democracia.
Nisso reside a ruína do biocentrismo: desprezar a diversidade de ideias e posicionamentos humanos e não reconhecer o pluralismo democrático como esteio para a resolução dos conflitos.
Vem daí a ação nefasta de grupos organizados que corroem diuturnamente as bases do desenvolvimento econômico e social brasileiro, impedindo melhorias essenciais na infraestrutura do país, alterações urbanísticas que permitam a mobilidade e a regularização fundiária nas cidades e, principalmente, ações que efetivamente reduzam a violência.
o exemplo nefasto está na infraestrutura

A crise do apagão na Índia, em 2012, deveria ter servido como exemplo para demonstrar que, no que depender de nossos biocentristas, nossa situação caminhará aqui, no Brasil, para algo similar.

Falhas na rede elétrica deixaram mais de 370 milhões de moradores da Índia - mais do que a população de Estados Unidos e Canadá juntas - sem energia. O desastre ocorreu por problemas de infraestrutura crônicos, que atrasaram a terceira maior economia da Ásia, vários deles por conta de conflitos teóricos quanto à preservação ambiental - destacados do contexto grave das demandas sócio-econômicas existentes naquele populoso país.

O Brasil corre risco similar. De fato, o atraso absurdo na composição de novas estruturas projetadas para a geração de energia nacional e sua distribuição, se deveu em grande parte às indefinições de ordem ambiental - provocadas pela infestação de preocupações biocêntricas no bojo da nossa Administração Pública - seja no que tange à reservação de água, uso de tecnologias variadas, conflitos etnico-culturais, etc. Quase sempre observados fora do contexto das demandas e circunstâncias neles incidentes. 

o efeito nefasto na questão fundiária indigenista

O conflito provocado pela insistência de organizações indígenas, Ministério Público e FUNAI, por exemplo, em desobedecer ao entendimento constitucional já estatuído pelo próprio Supremo Tribunal Federal,  quanto aos limites da demarcação de terras, é outro exemplo.

A pretexto de “preservar Nações Indígenas” (em evidente negativa à doutrina de Rondon estatuída na lei, e implicitamente negando valor à comunhão nacional do Brasil),  as autoridades federais do ministério público e da Funai, feriram de forma sistemática o princípio do respeito às terras tradicionalmente ocupadas e, contrario sensu, desprezaram propriedades já consolidadas, ainda que constituídas em terras “pretendidas” - embora não ocupadas, de fato, por índios.

Ainda que neguem seus protagonistas, esse movimento sempre atentou contra a própria soberania nacional e constitui outra faceta perversa da mesma moeda biocentrista.
O fato é que o exemplo acima em nada ajudou à causa indigenista e apenas expôs populações indígenas à violência,  tudo a troco de verbas e ingerências internacionais – cujas motivações muitas vezes são inconfessáveis.

o efeito nefasto na produção agrícola 

No campo da produção agrícola, verificou-se uma batalha intensa, a partir da famigerada Medida Provisória de 2001, que desfigurou completamente o Código Florestal, levando o Congresso Nacional a tentar pôr as coisas em ordem em uma batalha legal de mais de uma década, visando implementar um novo código florestal a partir da necessidade de converter em lei a medida teratológica urdida no passado. 

O resultado foi combatido por hordas de Biocentristas, pouco interessadas em resolver o conflito e, sim, preocupadas em incendiar o agronegócio brasileiro, favorecendo interesses internacionais de grande monta, em desfavor de nossa economia – simples assim...


O Incremento à violência urbana
Por fim, nas cidades brasileiras é que o biocentrismo leviano e fascista provocou e ainda provoca os maiores danos.
O maior exemplo vem do combate sistemático dos biocentristas a administradores urbanos.

Com efeito, após doze anos de luta intensa no Congresso Nacional e mais doze anos de busca por sua implementação, ainda observamos o Estatuto da Cidade engatinhar, pulverizado por conflitos judiciais e administrativos de toda ordem, querelas mesquinhas e disputas por “incompetências concorrentes e comuns", advindos de interpretações histriônicas e desprovidas de qualquer sensibilidade social.

O efeito é a obstrução da autonomia municipal para gerir o meio ambiente urbano, regularizar ocupações em áreas ambientalmente sensíveis, instituir programas habitacionais, rasgar ruas e avenidas, retificar cursos d´água, implantar aparelhos urbanos essenciais, alterar modais logísticos, implantar soluções de saneamento básico ou destinar corretamente os resíduos,  ou mesmo operar melhorias urbanísticas para combater a degradação social e humana.
O resultado da luta insana de promotores engajados, juízes ativistas, parlamentares demagogos, fiscais militantes e ongueiros radicais, em prol da causa biocentrista urbanoide,  está na degradação social e na corrupção endêmica - ocasionadas principalmente pela falta de diretrizes claras, objetivas e aplicáveis no planejamento urbano. 

A febre legiferante ambientalista, com efeito, é paradoxal. Pereniza a venda de facilidades, por criar contínuas dificuldades, atrapalhar o desenvolvimento de atividades de toda ordem e burocratizar ao máximo a vida do cidadão comum.

A judicialização dos conflitos administrativos urbanos deforma o equilíbrio dos Poderes da República, transfere a vontade política para o judiciário e, com isso, despreza absolutamente a vontade da soberania popular.

Terminamos todos, não mais exercendo a gestão ambiental e, sim, gerindo a violência urbana.

Destarte, graças aos quixotes biocentristas de plantão, presta hoje a gestão pública um excelente desserviço à causa do Desenvolvimento Sustentável.
É hora de repensarmos tudo isso…

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Por: Antonio Fernando Pinheiro Pedro
Fonte: The Eagle View

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