Um fenomeno acontece no pais e alguns insistem em nao ver

Publicado em 06/09/2018 16:38
(PS.: comentário feito antes do atentado)
João Batista Olivi - Jornalista

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ANÁLISE DA REUTERS:

Atentado a Bolsonaro eleva incerteza em corrida presidencial e põe campanhas em compasso de espera

Por Eduardo Simões e Maria Carolina Marcello

SÃO PAULO/BRASÍLIA (Reuters) - O atentado com uma faca na quinta-feira contra o candidato do PSL à Presidência, Jair Bolsonaro, lança ainda mais incerteza sobre a mais imprevisível disputa pela Presidência da República desde a redemocratização, e coloca em compasso de espera as campanhas dos demais candidatos que vinham centrando ataques no postulante do PSL, o líder da disputa.

Analistas ouvidos pela Reuters avaliam que o ataque contra o capitão da reserva, durante ato de campanha em Juiz de Fora (MG) que o levou a passar por uma cirurgia de emergência ainda na quinta, pode gerar uma comoção que beneficie Bolsonaro eleitoralmente.

Lembram, no entanto, que o candidato do PSL é uma figura controversa, com elevado patamar de rejeição segundo as pesquisas de intenção de voto, e terá um tempo limitado até as eleições para consolidar seu discurso após o ataque.

"Um evento como esse pode significar uma virada? Pode. Mas tudo depende da narrativa que vai ser construída a partir daí", disse à Reuters o cientista política Creomar de Souza, da Universidade Católica de Brasília.

"Eu acredito que nas próximas semanas, o que a gente vai ter que se atentar com muita calma é como a campanha do Bolsonaro vai internalizar o fato, que tipo de narrativa eles vão construir a partir desse fato e como os concorrentes vão internalizar a questão", acrescentou.

Na avaliação de Carlos Melo, cientista político do Insper, é provável que o episódio renda votos a Bolsonaro, especialmente entre eleitores que pendiam para o militar da reserva, mas que ainda estavam constrangidos em assumir essa posição. Ele ressalta, entretanto, que o tamanho deste crescimento é incerto.

"Não vejo, porém, como e por que eleitores que antes o rejeitavam passem automaticamente a apoiá-lo. Não se deve confundir a solidariedade natural de momentos assim com a automática transferência de votos. É plenamente possível repudiar o atentado e ao mesmo tempo rejeitar o candidato", disse.

Após o atentado, e depois de Bolsonaro passar por uma cirurgia de emergência que pode impedi-lo de fazer campanha até o primeiro turno, marcado para daqui a um mês --o tempo mínimo de internação segundo os médicos é de uma semana a 10 dias--, aliados e filhos do candidato do PSL têm afirmado que o episódio o levará a vencer já no primeiro turno.

O analista Danilo Gennari, sócio da Distrito Relações Governamentais, acha difícil prever os efeitos do caso na eleição, ao mesmo tempo em que vê potencial para Bolsonaro consolidar sua força entre os já "convertidos". Isso porque o atentado não deve ajudar o candidato do PSL entre críticos de declarações polêmicas que fez recentemente, como a de que iria "fuzilar a petralhada do Acre".

"Por outro lado, pode dificultar um pouco ele a ampliar votos onde ele ainda não tinha. Eu arriscaria dizer que a gente vai ter pouco variação nos votos dele que podem ser creditadas a isso", disse Gennari.

Diante de um episódio tão imprevisível e de um cenário ainda muito nebuloso, todos os olhos dos envolvidos na eleição e daqueles que a acompanham deverão estar voltados ao levantamento que o Datafolha fará e divulgará na próxima segunda-feira sobre a corrida presidencial.

CAMPANHAS RIVAIS

Além de mirar no candidato do PSL, a facada desferida em Bolsonaro por um homem que foi preso e confessou o crime na própria quinta-feira também teve impactos nas campanhas dos rivais do deputado.

Os principais adversários de Bolsonaro repudiaram o atentado, criticaram a violência na política, desejaram pronto restabelecimento do candidato do PSL e cancelaram suas agendas de campanha para esta sexta, feriado do Dia da Independência.

Bolsonaro era alvo constante de ataques da campanha do candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, que nesta semana, antes do atentado, disse que o candidato do PSL é o mais despreparado entre os postulantes ao Palácio do Planalto, e que faria o possível para impedir sua eleição.

O candidato do PDT, Ciro Gomes, disse, também nesta semana e antes do ataque, que eleger Bolsonaro seria um suicídio coletivo, e a postulante da Rede, Marina Silva, teve duro embate com Bolsonaro em um debate televisivo recentemente, de olho no eleitorado feminino, onde o militar da reserva enfrenta dificuldade.

Após o ataque contra a vida de Bolsonaro, no entanto, o tom dos adversários contra o candidato do PSL deverá ser modulado e as campanhas agora devem estar em compasso de espera.

"Eles (adversários) estão tentando ver o que está acontecendo, olhando mapa de palavra na internet, tentando fazer algum levantamento, alguma pesquisa, para saber para onde a campanha vai", disse Creomar de Souza, que aponta a estratégia de Alckmin como a com maior potencial de ter a estratégia revista.

"Como é que você vai fazer campanha batendo no Bolsonaro, tendo em vista que ele sofreu um atentado? Isso pode pegar muito mal. Nesse exato momento. Eu imagino que a equipe do Alckmin, por exemplo, que tinha modulado uma estratégia de desconstruir o discurso de violência do Bolsonaro, está tendo que às pressas refazer material."

Já a campanha de Bolsonaro, na avaliação do cientista político da Universidade Católica de Brasília, terá o desafio de fazer escolhas corretas para transformar o atentado em impulso eleitoral ao candidato do PSL.

"Na verdade, a bola está com a campanha do Bolsonaro. Agora é saber se eles vão conseguir jogar o jogo", disse.

GAZETA DO POVO: "Ataque a Bolsonaro tem potencial para gerar comoção. E isso pode mudar a eleição"

"A tentativa de homicídio contra o candidato Jair Bolsonaro (PSL), que levou uma facada enquanto fazia campanha em Juiz de Fora (MG) na tarde desta quinta-feira (6), vai impor uma readequação das estratégias de campanha dos adversários do deputado e pode mudar o rumo da eleição presidencial. A comoção em torno do ataque tende impulsionar as intenções de voto em favor do capitão da reserva e causar uma queda em sua rejeição, além de fortalecê-lo para chegar ao segundo turno.

Para o cientista político Marcio Coimbra, o choque causado pelo atentado pode ter um efeito significativo no voto dos indecisos – que representam 28% do eleitorado, entre os que disseram que não sabem em quem votar e votos nulos, segundo a última pesquisa Ibope. “Vai ter um aumento de intenções de voto porque muita gente que estava indecisa acaba tendendo a votar no Bolsonaro nesse momento pela comoção que isso gera”, analisa.

Segundo o Ibope, Bolsonaro tem 44% de rejeição entre os eleitores. O cientista político aposta em uma oscilação de cerca de 5% nas intenções de voto no candidato do PSL. “Muitas pessoas que tinham vergonha de dizer que votam no Bolsonaro agora vão ter coragem de admitir”, aposta.

Candidato à vice de Bolsonaro, o general Antonio Hamilton Mourão (PRTB) tem uma interpretação parecida. “Ele sairá disso aí maior do que entrou. Talvez aquelas pessoas que tinham dúvida [em votar ou não nele] agora não terão dúvida”, disse o militar em entrevista à Folha de S. Paulo algumas horas depois do ataque. 

O cientista político da PUC-PR, Mario Sergio Lepre, também acredita que a candidatura de Bolsonaro pode ter um impulso. “Ele vai ganhar visibilidade, vai aparecer mais nas televisões”, diz Lepre. O cientista ressalta a importância da exposição, uma vez que Bolsonaro tem pouco tempo de TV para fazer campanha: apenas oito segundos. 

Além de conquistar o voto do indeciso, o ataque também pode ter um efeito na militância do candidato, que deve trabalhar mais em prol da candidatura a partir de agora. “A militância do Bolsonaro recebeu uma injeção de adrenalina”, ressalta Coimbra.

Atentado vai tirar Bolsonaro das ruas

O professor do curso de Relações Públicas da PUC-PR e especialista em marketing político, Marcos Zablonsky, alerta para a possibilidade de um efeito contrário na campanha de Bolsonaro. “Dependendo de quantos dias ele ficar [em recuperação], pode ser que a campanha vá mais devagar”, diz.

A equipe médica responsável pelo atendimento do capitão da reserva em Minas Gerais estima que Bolsonaro deverá ficar em repouso entre 7 e 10 dias para se recuperar. “Ele vai ficar isolado em termos de visibilidade”, diz Zablonsky. Para o especialista, apenas o boletim diário com o estado de saúde de Bolsonaro não será suficiente para mantê-lo em evidência nesse período.

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“Bolsonaro vinha criando um fato novo todo dia. Todos os dias tinha uma fala dele, uma imagem, ele participava de sabatinas”, explica o especialista. “Ele tem o prejuízo da visibilidade”, analisa. Como tem pouco tempo de TV para fazer campanha, Bolsonaro vinha apostando em uma campanha corpo a corpo para se apresentar ao eleitorado. Agora, vai precisar fazer uma pausa para se recuperar do atentado.

Ainda tem campanha pela frente

Nos próximos dias, Bolsonaro pode crescer nas pesquisas de intenção de voto por causa da comoção em torno do atentado sofrido em Juiz de Fora. Mas Zablonsky ressalta que, para esse crescimento ser determinante na eleição, o presidenciável do PSL vai precisar saber manter esses novos eleitores a seu lado.

“Se [o atentado] fosse véspera de eleição, nos teríamos um resultado. Mas ainda faltam muitos dias, vai dar tempo de amadurecer isso, fazer a contra informação”, ressalta o especialista. Daqui até o primeiro turno são exatos 30 dias de campanha – tempo suficiente para que o atentado fique para trás na discussão eleitoral.

Episódio afeta estratégias de campanha de adversários

Não é só a campanha de Bolsonaro que vai ser impactada pela repercussão do atentado. Alguns presidenciáveis vinham apostando na crítica ao capitão da reserva como estratégia para conquistar votos. Ciro Gomes (PDT), Marina Silva (Rede), João Amoêdo (Novo) e Geraldo Alckmin (PSDB) são exemplos de candidatos que vinham apostando em um confronto – mesmo que indireto - com Bolsonaro para conquistar eleitores.

A campanha mais afetada, porém, vai ser do tucano. Alckmin tinha como principal estratégia de campanha a desconstrução do capitão da reserva, mas vai ter que rever o plano, pelo menos em curto prazo. “Se ele continuar veiculando ataques ao Bolsonaro, enquanto ele está no hospital convalescendo, vai se indispor com parte do eleitorado”, adverte Coimbra.

Lepre tem uma opinião parecida, mas com uma ressalva. “Ele está batendo no que diz respeito à opinião do Bolsonaro”, ressalta. “Mas se isso gera uma vitimização, tem que dosar bem”, adverte.

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 Segundo a Folha de S. Paulo, as peças publicitárias da campanha de Alckmin com críticas ao capitão reformado do Exército serão suspensas até nova avaliação dos coordenadores que assessoram o tucano. As inserções serão substituídas por material que já está pronto.

Os demais candidatos devem ter menos problemas na readequação da campanha, segundo os especialistas. Para Lepre, a tendência é que eles se posicionem sobre o assunto quando perguntados por jornalistas, mas deixem o assunto fora da campanha na TV. “Tem que tratar isso como algo que não pode acontecer no país. Não pode falar ‘olha, ele plantou isso’. Tem que repudiar”, alerta Lepre.

Para Coimbra, como os candidatos já se manifestaram sobre o ataque, a melhor estratégia agora é tocar a campanha adiante sem tocar no assunto. “Esse assunto vira um trunfo para o Bolsonaro. Qualquer pessoa que relembre esse assunto vai estar dando palanque para ele”, diz. “Como esses candidatos não escolheram como estratégia de campanha antagonizar com Bolsonaro, estão em uma situação confortável”, analisa.

Depois de se manifestarem sobre o ataque, os presidenciáveis Marina Silva (Rede), Geraldo Alckmin (PSDB) e Ciro Gomes (PDT) cancelaram as agendas de campanha do dia.

PT pode acabar beneficiado

Para Coimbra, o fato de Fernando Haddad não ter apostado em um antagonismo com Bolsonaro pode trazer benefícios para a campanha petista. Haddad tem se concentrado em conseguir a transferência de votos de Lula – barrado pelo TSE – para si e não partiu para o ataque ao candidato do PSL.

“O PT tem apostado na narrativa positiva, com o mote ‘quero o governo Lula de volta’”, ressalta Coimbra. “Esse atentado delineia muito mais o resultado de primeiro turno onde o Haddad vai ter pista livre para crescer e o Alckmin vai ter uma pista com obstáculos para poder decolar”, concluiu.

O potencial da comoção: o caso de Eduardo Campos e Marina Silva em 2014

A morte do então candidato Eduardo Campos (PSB) durante a eleição presidencial de 2014 é um exemplo de como a comoção popular em torno de um fato fora do comum durante a campanha tem potencial para mudar (ou quase mudar) o rumo de uma disputa presidencial. É o que pode vir a ocorrer com Bolsonaro, caso a população (ou parte dela) sinta-se tocada pelo atentado contra o candidato.

Eduardo Campos morreu em 13 de agosto, num acidente aéreo. Imediatamente, começou-se a especular que sua vice, Marina Silva (que à época também estava no PSB), iria assumir a candidatura. A oficialização do nome dela como candidata à Presidência só viria a ocorrer uma semana depois do acidente aéreo, em 20 de agosto.

Dois dias antes, contudo, o Datafolha divulgou pesquisa em que Marina já aparecia com 21% das intenções de voto, atrás apenas da então candidata à reeleição Dilma Rousseff (PT), com 36%. Aécio Neves (PSDB), com 20%, estava tecnicamente empatado com Marina. O curioso é que Marina figurou com mais intenções de voto que o próprio Eduardo Campos – que tinha apenas 8% no levantamento Datafolha imediatamente anterior a sua morte.

OPINIÃO DA GAZETA DO POVO: O ataque a Bolsonaro e a doença da nossa política 

Em 29 de agosto, Marina deu um salto para 34% – numa situação de empate técnico com Dilma (35%). Aécio ficava bem atrás, com 14%. Analistas políticos, à época, atribuíram o rápido crescimento de Marina à comoção provocada pela trágica morte de Eduardo Campos e à maior exposição que a sua substituta teve na mídia por causa do acidente. 

Os mesmos números de 29 de agosto se repetiram no Datafolha de 3 de setembro. A partir de 10 de setembro, Marina começou a oscilar levemente para baixo. Mas ainda mantinha-se num empate técnico com Dilma. Ou seja, durante quase um mês após a morte de Eduardo Campos, Marina manteve-se com força na corrida presidencial – entre outras razões, por causa da comoção popular. 

Mas a candidata do PSB virou alvo da campanha de Dilma, que deflagrou uma bem-sucedida desconstrução da imagem de Marina. E ela foi caindo nas pesquisas. Quando foram apurados os votos do primeiro turno, em 5 de outubro, Marina teve 21,32% dos votos válidos. Ficou na terceira posição. Dilma conquistou o primeiro lugar, com 41,59%. Aécio, com 33,55%, disputou o segundo turno com a petista." 

(Por Kelli Kadanus e Fernando Martins. Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/eleicoes/2018).
 

Uma situação de ruptura

POR MERVAL PEREIRA, em o globo

A radicalização da política brasileira teve seu ápice até agora com o ataque sofrido ontem pelo candidato à presidência da República Jair Bolsonaro, que lidera a corrida eleitoral quando o quadro real é apresentado ao eleitor, sem a presença de Lula por decisão da justiça eleitoral. É uma situação de ruptura que se agrava pela crise econômica e social do pais.

Temos presenciado nos últimos tempos radicalizações diversas de ambos os extremos em luta pelo poder. A caravana de Lula foi atingida por tiros, o acampamento em Curitiba, depois de sua prisão, foi atacado por adversários políticos. No outro extremo, Jair Bolsonaro, que cansou de estimular a população a se armar, e chegou a ensinar uma criança a atirar, acabou atingido por um radicalismo aparentemente de fundo religioso, uma novidade perversa na disputa política brasileira.

A divisão da sociedade por Lula entre “nós”, os que são a favor do povo, e “eles”, os adversários, definidos não por questões ideológicas, mas interesses eleitoreiros, levou o país a uma radicalização que desmente a fama do brasileiro cordial, conceito definido pelo historiador Sérgio Buarque de Hollanda no sentido de passional, mas deturpado popularmente por uma cortesia que a cada vez mais é desmentida pela realidade da violência nossa de cada dia em todos os setores da sociedade, sem distinção de ricos e pobres, de quem é a favor ou contra o povo, como se fosse possível existir só pessoas boas de um lado e más do outro.

Desde as manifestações de 2013, o ano que, tal como definiu Zuenir Ventura o de 1968, não terminou, o país vive essa tensão latente que fez desabrochar uma direita extremista para se contrapor a uma esquerda radical. Sem Lula na disputa presidencial por determinação da Justiça, por ter sido condenado em segunda instância por corrupção e lavagem de dinheiro, o seu oposto Bolsonaro, que cultiva a imagem de anti-Lula, aparece como a solução rápida dos problemas do país.

Assim como a saudade de Lula leva milhões de brasileiros a sonharem com um país que só existiu por breve período e em bases precárias, outros tantos acreditam que somente alguém como Bolsonaro pode dar jeito na situação. Os dois são salvadores da Pátria a seu jeito, e agora, esfaqueado e em grave situação, Bolsonaro iguala-se a Lula como martirizado na visão de seus eleitores, Lula preso injustamente para não fazer um governo a favor do povo, e Bolsonaro esfaqueado porque é o homem providencial que resolveria os problemas do país.

Cada qual a seu jeito manipula a opinião pública com estilos populistas de fazer política, e agora se colocam na mesma situação de isolados pelas “forças do mal” e mártires devido à defesa dos pobres e desvalidos, um da cadeia, outro do hospital.

O debate político deixará de girar em torno das últimas tentativas vãs de Lula de concorrer à presidência da República e passará a se centralizar na situação física de Bolsonaro, que dificilmente terá condições de prosseguir na campanha eleitoral.

O que, se de um lado reduz sua movimentação, amplia a capacidade de proselitismo. A pesquisa do DataFolha que será divulgada na segunda-feira pode já captar os primeiros movimentos em consequência do atentado ao candidato do PSL, no mesmo momento em que o PT terá que decidir quem substituirá Lula na urna eletrônica.

O ex-prefeito Fernando Haddad, o substituto previsível, sofre resistências dentro do próprio PT, e agora deverá ter essa pressão aumentada porque é considerado “ruim de voto”. A comoção provocada pelo atentado a Bolsonaro poderá destampar um sentimento que domina parte importante da população, e pode reforçar no imaginário popular o papel de vingador de Bolsonaro, esvaziando a influência de Lula nas classes menos favorecidas.

A estratégia do PT talvez tenha que mudar, colocando na chapa um politico mais popular como Jaques Wagner, ex-governador baiano, em detrimento de Haddad, que Lula considerava ter “cara de tucano”, o que foi apropriado para uma disputa na capital paulista mas pode ser insuficiente numa disputa nacional com um adversário populista que aglutinou o sentimento anti-PT.

"Desolado após o atentado a Bolsonaro, Paulo Guedes afirma: “Este país merece estar onde está”, por MÁRIO VITOR RODRIGUES, na GAZETA DO POVO

"Marcar uma simples entrevista com o assessor econômico do candidato Jair Bolsonaro, o economista Paulo Guedes, não foi simples. Além da agenda para lá de apertada, para mim sempre ficou clara uma grande desconfiança da parte dele. E isso não melhorou quando nos encontramos em seu escritório no Leblon, ontem, pouco antes das onze da manhã.

“É um prazer conhecê-lo”, me disse enquanto apertava a minha mão e eu procurava fazer as mesuras habituais em momentos como aquele. A cordialidade da parte dele terminou ali.

A cada pergunta que eu fazia, mesmo após os comentários mais óbvios, Paulo Guedes retrucava com uma resposta rascante. Chegou até a pedir para que eu desligasse o gravador. E mais de uma vez. Aliás, três vezes. Intercaladas, sempre, por queixas a respeito da imprensa e de sua preferência por pautas menores e com o objetivo claro em constrangê-lo, usando para isso o descompasso entre as suas convicções econômicas e as do candidato.

Lá pelas tantas, foi a minha vez de argumentar. Sim, eu não deixava de ser um cidadão e obviamente também tinha as minhas preferências políticas (acusação que fez seguidamente), mas isso não significava que eu estivesse ali para criar uma espécie de arapuca. Contudo, claro, eu tinha total interesse em fazer uma entrevista útil e, portanto, não faria sentido deixar de questioná-lo da maneira mais franca possível.

O acordo finalmente se deu e a entrevista fluiu. Paulo Guedes reafirmou o seu compromisso com toda a sua trajetória. Assegurou, inclusive, que sempre estará disposto a conversar com qualquer um se for para o bem do País. Ao ser provocado a comentar sobre a proximidade entre a sua agenda e a do Partido Novo, admitiu que chegou a dialogar com a legenda de João Amoêdo. E enxerga as privatizações como a senha para um ajuste negligenciado há décadas. “O Plano Real não foi tão bom assim”, chegou a ponderar.

Passada uma hora de conversa gravada, houve então uma pausa. “Nós não terminamos”, me disse ele, antes de nos despedirmos e combinarmos que eu voltaria ali por volta das cinco da tarde.

Na minha cabeça, o alívio já era enorme. Mesmo se a entrevista já tivesse terminado ali, o material era bom. Ótimo. Paulo falou ininterruptamente sobre como enxergava o cenário político e inclusive sinalizou a possibilidade de novas estratégias no segundo turno.

De todo modo, a oportunidade de gravar mais material era alvissareira. Pensei em explorar aquele que talvez fosse o gatilho para o acerto da parceria entre ele e Jair Bolsonaro: uma espécie de amargor quase palpável. Sensação de perseguição. Como se todos — no caso, a parte da sociedade liberal nos costumes e tão fortemente representada no mainstream para um, e a mídia e os setores da comunidade econômica para o outro — os tivessem unido em uma santa batalha.

Quando voltei ao seu encontro, porém, o inimaginável já havia acontecido.

Devo admitir, ao tomar conhecimento, ainda no táxi, sobre o atentado à vida de Jair Bolsonaro, fui invadido por duas sensações fortes em igual medida: raiva e vergonha.

A primeira, é claro, pela repulsa a um ato tão abjeto e tão convarde; pela aversão à hipótese de que um sujeito pudesse sair de casa decidido a enfiar uma faca em alguém pelo simples fato de este alguém ver o mundo com outros olhos.

A segunda, porque o fato de ansiarmos acabar com a vida de um indivíduo que busca democraticamente comandar o país, e obtém inequívoco sucesso nessa empreitada, significa que atingimos o fundo do poço. Episódios anteriores, como os tiros na caravana em favor do ex-presidente Lula, a execução da vereadora Marielle Franco e a do cinegrafista Santiago Andrade justamente quando documentava o nosso nível de selvageria, não me deixam mentir.

As eleições não serão suspensas por conta do atentado a Jair Bolsonaro. Tampouco o candidato do PSL deixará de representar o que sempre representou para os seus seguidores e detratores, ainda que estes últimos, até por uma questão de empatia, possam não se sentir muito à vontade de externar suas opiniões agora. O foco principal desse período, portanto, já mudou.

De uma vez por todas, não temos condição alguma de arrotar respeito ou até predileção pelos valores democráticos. Na hora H, e isso a história comprova, viramos bichos. Animais. Bestas-feras ávidas para resolver o problemas na base do coice, se preciso for.

Ou, por outra, como me disse Paulo Guedes antes de nos despedirmos pela segunda vez no dia, desta feita a derradeira, eu atônito e ele visivelmente devastado: “Este país merece estar onde está”."

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Fonte: NA/REUTERS/GAZETA/O GLOBO

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