Açúcar: Brasil cede à pressão da OIA para aumentar fatia financeira, mas pede tempo

Publicado em 03/11/2020 11:46

Por Célia Froufe

Brasília, 03/11/2020 - Com fama de mau pagador nos órgãos internacionais, o Brasil teve de sucumbir à pressão da Organização Internacional do Açúcar (OIA) para ampliar sua participação no orçamento da instituição que tem sede em Londres. Membros da entidade tentam, há alguns anos, reformular a fatia que cabe a cada participante, de acordo com a importância da commodity para a economia do País. O Brasil é o maior produtor e exportador de açúcar do mundo e tinha no caixa da OIA uma participação semelhante à de países com produção muito menor.

Nas negociações que se arrastam há alguns anos, que o Broadcast tem acompanhado, o Brasil tentou se esquivar de ser responsável por uma fatia financeira maior na entidade. “Há anos o Brasil colocava dificuldades para essa proposta”, lembrou uma fonte a par das negociações. Mas a divisão das parcelas de cada país, acertada há quase três décadas, era considerada obsoleta pela instituição e o Brasil teve de ceder. Até porque, de lá até hoje, a produção doméstica e a participação no comércio internacional quadruplicou.

De acordo com o Observatório da Cana, uma base de dados que reúne números de várias instituições do setor, a safra de açúcar em 1989/1990 foi de 7,4 milhões de toneladas e a do ciclo 2019/2020, de 29,6 milhões de toneladas. “O Brasil aumentou vertiginosamente sua atividade no setor desde então e a contribuição doméstica vai praticamente dobrar”, comentou a fonte.

Foi justamente a partir desse período, de acordo com um documento do Ministério da Agricultura, que a venda da commodity passou a ter destaque fora do País. “Desde o início dos anos 90, o Brasil tem aumentado sistematicamente suas exportações de açúcar e, de uma participação pouco expressiva neste mercado, passou a representar uma parcela acima de 43% nesse comércio nos últimos anos e com tendência de ampliar este índice”, comparou o Ministério em relatório de sete anos atrás.

Na realidade, nos últimos anos, o Brasil perdeu participação no mercado internacional de açúcar em meio à expansão das exportações de países como Índia e Tailândia. Para o especialista global em açúcar do Rabobank, Andy Duff, no entanto, o País tem tudo para reassumir a liderança em 2020. Pelos cálculos do analista, a participação nacional nesse mercado será ampliada em 10 pontos porcentuais este ano, para 44% das vendas internacionais. Já os produtores tailandeses devem sofrer com más condições climáticas no país neste e no próximo ciclo.

Mais tempo - Na reunião do conselho da OIA em abril, o País apresentou uma contraproposta à entidade que vai ao encontro do que a Organização deseja, mas também dá um tempo para que o Brasil se prepare para arcar com um volume maior de recursos. A sugestão foi a de que os aumentos da colaboração orçamentária seriam de, no máximo, 20% por ano pelos próximos cinco anos. A ideia foi acatada pelo conselho em sua última reunião, no mês passado, mas tem que passar por um trâmite ainda extenso, o que dá mais tempo para o Brasil, de fato, começar a desembolsar de forma mais robusta para o caixa da entidade.

Apesar do aumento, a aceitação dos demais países foi considerada uma “vitória” pelo governo brasileiro. O novo acordo orçamentário precisa ser ratificado por pelo menos dois-terços dos membros da OIA, o que deve ocorrer em apenas três ou quatro anos, conforme a estimativa de pessoas que estão próximas ao processo.

O argumento da Organização é o de que, dado o tamanho da produção nacional de derivados da cana-de-açúcar, o Brasil precisava ter um papel de mais proeminência na entidade. A quantidade de cotas orçamentárias na OIA define o peso dos votos de cada membro e, portanto, também mais ou menos influência nas decisões sobre temas do setor no âmbito internacional. Pelo acordo em vigor hoje, o Brasil tem uma participação de 9% no total do caixa da entidade, atrás da União Europeia, que, em seu conjunto, colabora com uma fatia de 27%. A parcela doméstica é hoje praticamente idêntica a da Austrália (8%) e Rússia (7%), players bem menos relevantes na cadeia produtiva de açúcar.

Devo, não nego - Apesar do rateio até agora ser proporcionalmente favorável ao Brasil, o País estava em dívida com a OIA e também com muitos de outras organizações internacionais das quais participa, como bancos multilaterais, fundos internacionais e organizações intergovernamentais. No caso da instituição do açúcar, a contribuição doméstica está entre uma e duas centenas de milhares de libras por ano. O Brasil tinha duas prestações atrasadas referentes a 2020, mas graças a uma intermediação da Secretaria de Assuntos Internacionais do Ministério da Economia e do Itamaraty uma parte da dívida foi honrada, sobrando apenas uma parcela em haver. “O Brasil está inadimplente com praticamente todas as instituições”, lamentou a fonte.

Fonte: Estadão Conteúdo

NOTÍCIAS RELACIONADAS

Produtores de cana e industriais do Nordeste reiteram durante evento em Maceió importância da inclusão da classe produtiva no Renovabio
Chuva na colheita do Brasil dá suporte de alta após grande pressão no açúcar
NovaBio: Brasil precisa urgente definir políticas que incentivem e privilegie a produção de combustível limpo
Açúcar avança mais de 2% após Unica informar retração na safra do Centro-Sul
Unica: Chuvas impactam o ritmo de colheita na primeira quinzena de julho
Após dias de pressão, açúcar tem leve respiro e avança mais de 1%