Brasil pode ganhar mais com a soja se priorizar a qualidade do grão
O teor médio de proteína da soja brasileira, entre as safras 2014/15 a 2016/17, foi aproximadamente 2% superior ao dos grãos produzidos nos Estados Unidos. Por outro lado, os grãos defeituosos causaram prejuízos anuais de R$ 1 bilhão à sojicultura nacional. Os resultados são de um estudo feito pela Embrapa Soja(PR) sobre aspectos econômicos relacionados à qualidade de grãos no Brasil a partir de dois atributos: teor de proteína e percentual de grãos avariados (defeituosos). “Esse trabalho pretende introduzir a discussão sobre os aspectos relacionados à qualidade da soja para que se possa realizar a devida valoração de atributos qualitativos na comercialização”, explica o analista econômico da Embrapa Marcelo Hirakuri.
O estudo foi feito em dez estados: Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Minas Gerais, Bahia e Tocantins, que juntos são responsáveis por cerca de 93% da produção nacional.
Perdas grandes
Em relação aos grãos avariados, grande parcela da soja colhida excedeu a tolerância de 8% de grãos defeituosos permitida por lei. Algumas regiões apresentaram amostras de até 30% de grãos avariados, que representam a soma dos mofados, ardidos, queimados, fermentados, imaturos, chochos, germinados e danificados por percevejo. “Esses casos representam prejuízo para o produtor, porque o armazenador pode descontar o percentual que estiver avariado, já que esse material tem baixa qualidade para a indústria”, avalia o pesquisador Irineu Lorini, da Embrapa.
“No caso de grãos avariados, a perda econômica estimada alcançou um valor superior a R$ 1 bilhão, considerando o percentual da produção que excedeu o limite de 8%, a quantidade excedida e o preço da soja pago nos estados”, calcula Hirakuri. Os principais defeitos observados foram os grãos fermentados e danificados por percevejos, que responderam por 84,6% dos defeitos existentes nos grãos de soja avariados.
As menores perdas econômicas foram observadas nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, uma vez que pequena parcela da soja colhida excedeu o limite tolerado. Os estados de Minas Gerais, São Paulo, Bahia e Tocantins tiveram perdas econômicas entre R$ 10,4 milhões e R$ 19,5 milhões.
Teor de proteína é diferencial competitivo
A soja é valorizada principalmente por seu alto teor de proteína, que é superior ao de outras oleaginosas. Por isso, o grão tornou-se matéria-prima indispensável para produção de farelo proteico, utilizado principalmente na fabricação de rações para aves, suínos, bovinos e animais de pequeno porte. “A qualidade é um aspecto favorável, tanto para a indústria brasileira consumidora de soja quanto para países que importam o grão em larga escala, como é o caso da China”, explica Hirakuri.
Enquanto o teor médio de proteína da soja brasileira nas três safras analisadas foi de 36,69%, o da soja norte-americana foi de 34,70%, entre 2006 e 2015, caindo para 34,1% na safra 2017, segundo a United States Soybean Export Council. “O Brasil poderia explorar comercialmente esse fato, porque cada tonelada brasileira exportada tem 2% a mais de proteína, se comparada à soja americana”, frisa Lorini. Em 2017, a China, por exemplo, importou quase 65% da soja em grão mundialmente exportada para produzir farelo internamente, em vez de importar o produto derivado. “No entanto, a valoração do grão é quantitativa e medida em toneladas e não se considera a proteína embutida”, explica.
Proteína por estado
Na safra 2016/17 o teor médio de proteína nos grãos de soja variou de 32,03% a 41,35% nas 903 amostras analisadas. O estado que apresentou a maior média no teor de proteína foi a Bahia, com 38,16%, e o Paraná foi o estado com a menor média: 36,74%.
Teor de proteínas (%) em grãos de soja das diferentes microrregiões dos estados do Brasil na safra 2016/17. As cores representam a intensidade da característica nas diferentes microrregiões brasileiras.
A Embrapa fez um cálculo do valor pago por percentual de proteína na soja e as médias variaram entre R$ 25,57 e R$ 28,79 por tonelada, considerando o preço pago em cada estado e o teor de proteína obtido. O menor valor médio pago por percentual de proteína no grão em 2017 foi observado no estado de Mato Grosso, onde a tonelada da soja teve o preço de venda mais baixo no ano: R$ 938,06. Hipoteticamente se for considerado um valor único em todo o Brasil para a tonelada de soja, quanto maior o teor proteico obtido em cada região, menor seria o valor pago pelo percentual de proteína no grão.
Por exemplo, embora a cotação da soja na Bahia (R$ 1.006,47/t) tenha sido levemente inferior àquela verificada para Minas Gerais (R$ 1.017,75/t) em 2017, o valor pago por percentual de proteína na tonelada do grão no estado do Nordeste foi significativamente inferior. Isso porque a Bahia apresentou a maior média no teor de proteína brasileira com 38,16%.
Quanto mais alto for o teor de proteínas nos grãos, tanto melhor será para a produção de farelos com teores de proteína mínimos exigidos pela legislação, atingindo-se até o ideal para a produção do farelo com alto teor de proteína. “Quanto maior o teor de proteínas nos grãos utilizados para produzir farelos, menores serão os processos industriais necessários para se adequar aos padrões”, explica o pesquisador José Marcos Gontijo Mandarino, da Embrapa Soja.
Lorini explica que, no momento, o Brasil não faz a valoração econômica da proteína de soja porque o produtor recebe por tonelada entregue, independentemente do teor de proteína. “Caso venha a ser valorizada a qualidade, o produtor teria um bônus, se o teor de proteína for superior à média ou a um referencial mínimo”, explica. “Por outro lado, o preço sofreria um deságio se o teor de proteína fosse menor que esse referencial. O importante é que temos informação sobre a qualidade da soja produzida no País e que ela pode fazer parte da valoração do produto no mercado”, conclui.