Com risco para economia e popularidade em queda, Bolsonaro é convencido a mudar tom sobre vacinas

Publicado em 27/01/2021 07:45

Por Lisandra Paraguassu e Ricardo Brito

BRASÍLIA (Reuters) - A decisão do presidente Jair Bolsonaro de mudar o discurso, adotado por meses, e passar a defender a vacinação contra Covid-19 para ajudar na retomada da economia foi fruto de um trabalho de convencimento do ministro da Economia, Paulo Guedes, e de outros integrantes do governo, e comemorada pela equipe do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, disseram à Reuters fontes com conhecimento do assunto.

Em uma conferência a investidores mais cedo nesta terça-feira, Bolsonaro fez uma defesa enfática da vacinação.

"Já somos o sexto país que mais vacinou no mundo. Brevemente, estaremos nos primeiros lugares, para dar mais conforto à população, segurança a todos e de modo que a nossa economia não deixe de funcionar", disse ele.

Na verdade, de acordo com o site Our World in Data, que tem acompanhado a aplicação de vacinas no mundo, o Brasil é, com pouco mais de 700 mil doses aplicadas, o 13º no mundo. Já na comparação por 100 habitantes, é o 18º.

A despeito da falta de precisão, nos últimos meses, o presidente sempre falava --de forma evasiva-- que iria garantir vacina para todos, mas sempre fazendo questão de ressalvar que ela seria voluntária e enfatizando que ele próprio não tomaria o imunizante.

Ele chegou a falar também que "menos da metade" da população iria se vacinar e menosprezou a eficácia da CoronaVac, vacina da chinesa Sinovac, que começou a ser envasada e será produzida no Brasil pelo Instituto Butantan, ligado ao governo paulista, que virou o principal imunizante no Programa Nacional de Imunizações (PNI).

Nos bastidores, segundo uma fonte, o presidente foi convencido por Guedes e outros integrantes do governo a modular o discurso. O titular da Economia, que já vinha defendendo vacinação em massa antes de tirar férias, defendeu a Bolsonaro que ele tinha de fazer um discurso nessa linha a investidores e também apoiar o pleito de empresários que querem comprar imunizantes contra Covid-19.

No entorno de Pazuello, a mudança de tom presidencial foi bem recebida no momento em que o país deu largada há uma semana no programa de vacinação contra a doença, segundo outra fonte. "Foi ótimo o discurso", disse.

O governo Bolsonaro foi pressionado por governadores e prefeitos a acelerar a vacinação contra Covid-19. Em um dado momento, mesmo diante de mais de 40 países já tendo iniciado a imunização, chegou a estimar que a vacinação só começaria em março.

Contudo, antecipou o processo após o movimento do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), potencial adversário de Bolsonaro na sucessão de 2022, que prometia iniciar a vacinação em São Paulo no dia 25 de janeiro, antes do governo federal.

No final, Doria conseguiu a foto da primeira pessoa vacinada no país no dia 17, mas o governo federal a essa altura já tinha incorporado a CoronaVac ao PNI e iniciou a vacinação nacional no dia seguinte.

Em meio a isso, ocorreu também a recente queda de popularidade do presidente registrada por institutos de pesquisa e um aumento na pressão, ainda que sem grande apelo popular, por uma abertura de um processo de impeachment contra ele no Congresso Nacional --nesta terça, foi a vez de lideranças religiosas apresentarem novo pedido ao Legislativo.

Aliados de Pazuello acreditam que a mudança de tom de Bolsonaro poderá ajudar na massificação das vacinas no país e avaliam que, dessa forma, vão conseguir reverter avaliações negativas do governo no enfrentamento da pandemia, disse a fonte.

O governo lançou uma campanha publicitária nos meios de comunicação para incentivar a vacinação contra Covid-19. No momento, o principal grupo prioritário na vacinação são profissionais de saúde, idosos e indígenas, sob determinadas circunstâncias.

A aposta do governo, segundo a fonte, é que a virada vai ocorrer no momento em que o registro definitivo das vacinas for autorizado pela Anvisa --até o momento nenhum laboratório requisitou-- e se atingir as condições para se fabricar no país 30 milhões de doses por mês para aplicar na população, conforme projeções já feitas publicamente por Pazuello.

O ministro da Saúde, aliás, tem como desafio adicional lidar com o colapso no enfrentamento ao Covid-19 em Manaus, para onde retornou no final de semana. Na véspera, o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou a abertura de inquérito contra Pazuello pela atuação no enfrentamento à pandemia na capital do Amazonas, atendendo a pedido do procurador-geral da República, Augusto Aras, por provocação de oposicionistas.

Na equipe do titular da Saúde, entretanto, a investigação por suposta omissão de Pazuello não preocupa, segundo essa fonte, porque a avaliação é que toda a atuação no Estado e na capital manauara está documentada e que o governo federal atuou de forma auxiliar aos poderes locais.

Fonte: Reuters

NOTÍCIAS RELACIONADAS

Ações sobem após dados de inflação, mas acumulam queda na semana
Dólar cai após BC vender US$7 bi e Senado aprovar pacote fiscal
Taxas futuras de juros voltam a ceder com aprovação do pacote fiscal e comentários de Lula
Transição com Galípolo mostra que BC técnico permanece, diz Campos Neto
Ações europeias têm pior semana em mais de três meses, com queda no setor de saúde
Presidente do Fed de NY diz que BC dos EUA segue no caminho certo para cortes de juros
undefined