Brasil e China firmam acordos; Paulo Guedes quer livre comércio com a China
BRASÍLIA (Reuters) - O presidente Jair Bolsonaro afirmou nesta quarta-feira, depois de reunião bilateral com o presidente chinês, Xi Jinping, que o governo e os empresários brasileiros querem ampliar e diversificar o comércio com a China e que todos têm a ganhar com essa relação.
"Essa relação bilateral em várias áreas, inclusive com aceno de agregarmos valor ao que produzimos, é muito bem-vinda", disse Bolsonaro ao lado de Xi.
A China é o principal destino das exportações brasileiras, mas o comércio até hoje é basicamente concentrado em commodities, especialmente soja e minério de ferro. O governo brasileiro tenta há bastante tempo ampliar a pauta para incluir mais manufaturados e aumentar o valor agregado das exportações.
Segundo o secretário de Comércio Exterior do Ministério da Economia, Marcos Troyjo, o governo brasileiro tem conversas para ampliar o número, o escopo e o valor agregado dos produtos que o Brasil hoje exporta para a China.
"Precisa aumentar o número de produtos que você manda e o montante de valor agregado. Mas também precisamos fazer nossa lição de casa, os chineses não vão comprar os produtos só porque são brasileiros", disse.
Em sua fala, Xi Jinping defendeu a parceria com o Brasil e disse esperar um intercâmbio em "pé de igualdade" com o país.
"A China atribui grande importância à influência do Brasil na América Latina e no Caribe. Está disposta a trabalhar junto com o Brasil para promover um intercâmbio em pé de igualdade e de confiança mútua", disse o presidente chinês.
Um dos pontos ressaltados por ele é a intenção de alinhar as iniciativas Cinturão e Rota e o Programa de Parcerias em Investimentos (PPI) do Brasil.
Propostos pela China em 2017, Cinturão e Rota representam investimento na América do Sul em projetos de infraestrutura - especialmente estradas, ferrovias, hidrovias e portos - para facilitar a circulação de mercadorias que interessam às empresas chinesas.
A primeira conversa sobre o assunto aconteceu na viagem do vice-presidente Hamilton Mourão a China, em maio deste ano. Ao voltar da viagem, o vice-presidente afirmou em entrevista à Reuters que o Brasil estava aberto aos investimentos chineses, desde que seguissem as regras brasileiras.
"A empresa chinesa não pode chegar aqui e trazer 100.000 chineses para trabalhar no Brasil. Então, foi uma coisa que eu falei para eles. As empresas chinesas geram emprego para os chineses lá na China e queremos emprego para brasileiros no Brasil”, afirmou na época.
O encontro com o presidente chinês acontece à margem da Cúpula dos Brics --grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul-- e foi a primeira das quatro bilaterais que Bolsonaro terá com os países do bloco.
Durante o encontro foram assinados oito protocolos e memorandos de entendimento. A China é o maior parceiro comercial do Brasil. Em 2018, o fluxo de comércio entre os dois países alcançou a marca de US$ 98,9 bilhões. O país asiático também é um dos principais investidores em áreas cruciais, como infraestrutura e energia.
Acordos
Entre os atos assinados hoje estão protocolos sanitários para exportação de pera da China ao Brasil e de melão do Brasil para a China. Também foi firmado um plano de ação na área de agricultura, de 2019 a 2023, nas áreas de políticas agrícolas; inovação científica e tecnológica; investimento agrícola; comércio agrícola; entre outras.
No setor de transporte, foi assinado memorando de entendimento para o compartilhamento de boas práticas, políticas públicas e estratégias para o seu desenvolvimento. Prioritário para o Brasil, o governo entende que pode se beneficiar da experiência dos chineses, considerando que a China é uma das líderes mundiais no setor.
Saúde
O Ministério da Saúde e a Administração Nacional de Medicina Tradicional Chinesa também pretendem estabelecer cooperação ampla no campo de saúde, com foco em medicina tradicional, complementar e integrada. As Práticas Integrativas e Complementares (PICS) são tratamentos que utilizam recursos terapêuticos baseados em conhecimentos tradicionais, voltados para prevenir diversas doenças como depressão e hipertensão. Em alguns casos, também podem ser usadas como tratamentos paliativos em algumas doenças crônicas.
Ambiente favorável
Brasil e China querem ainda criar um ambiente favorável para o comércio e investimento no setor de serviços e encorajar o investimento do setor privado. Outro ato assinado hoje estabelece uma plataforma de intercâmbio de informações e cooperação para fomentar investimentos. A China é uma das principais origens de Investimentos Estrangeiros Diretos (IEDs) no Brasil, que se concentraram nas áreas de energia (geração e transmissão elétrica, além de óleo e gás) e infraestrutura (portuária e ferroviária).
Também foi assinado um tratado que permitirá a transferência de pessoas condenadas para o território do outro país. Nesse caso, cumpridos certos requisitos, brasileiros condenados na China poderão cumprir a pena no Brasil e vice-versa.
Na área cultural, o Ministério da Cidadania e o China Media Group (CMG) querem promover o intercâmbio de filmes e programas televisivos, bem como festivais de cinema brasileiro na China e festivais de cinema chinês no Brasil, para divulgação recíproca de filmes. De acordo com o governo brasileiro, pretende-se, ainda, iniciar conversas sobre a possibilidade de se estabelecer um canal de televisão por assinatura dedicado exclusivamente a programas e filmes sino-brasileiros.
Brics
A bilateral entre Bolsonaro e Jinping acontece no âmbito da 11ª reunião de cúpula do Brics, grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. A programação do evento começa nesta tarde com o encerramento do Fórum Empresarial do Brics. Antes, Bolsonaro também se encontra, no Palácio do Planalto, com o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi.
À noite, de volta a Itamaraty, o governo brasileiro oferecerá um jantar em homenagem aos líderes do bloco e amanhã, também na sede do Ministério das Relações Exteriores, serão feitos as sessões plenárias e o almoço de encerramento da cúpula.
Presidida pelo Brasil, a reunião do Brics tem como lema “Crescimento Econômico para um Futuro Inovador”. Segundo o Itamaraty, serão discutidos, prioritariamente, temas relacionados à ciência, tecnologia e inovação, economia digital, saúde e combate à corrupção e ao terrorismo.
Esta é a segunda vez que Brasília sedia a conferência – a primeira vez foi em 2010. Em 2014, o Brasil também organizou a cúpula, que aconteceu em Fortaleza, no Ceará. Juntos, Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul (cujas iniciais, em inglês, deram nome ao grupo) reúnem uma população de cerca de 3,1 bilhões de pessoas, o que equivale a aproximadamente 41% da população mundial, e responde por 18% do comércio mundial.
Guedes defende integração econômica e livre comércio com China
O ministro da Economia, Paulo Guedes, disse ontem (13) que o Brasil precisa buscar maior integração com o mundo e apontou possíveis caminhos para uma nova atuação no cenário mundial, como as negociações em torno de uma área de livre comércio com a China, um dos principais parceiros comerciais do país. As declarações foram feitas durante a abertura do seminário NDB e o Brasil: Parceria Estratégica para o Desenvolvimento Sustentável, em Brasília. O NBD é o banco de desenvolvimento do Brics, grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.
"Estamos conversando com a China sobre a possibilidade de 'free trade' [livre comércio] ao mesmo tempo que falamos sobre entrar na OCDE [Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico]”, disse o ministro. Guedes evitou detalhar as tratativas com o governo chinês, mas destacou o crescente volume de trocas comerciais registratadas nos últimos anos entre os dois países. “O fluxo de comércio com a China era de US$ 2 bilhões mais ou menso na virada do século. Hoje estamos negociando US$ 100 bilhões. É o nosso mais importante parceiro comercial”, disse.
O ministro ainda citou as relações com a Índia, considerada “um gigante da economia global”, que ainda revelam fluxo pequeno de comércio com o Brasil. “Com a China estamos bastante próximos nessa dimensão de comércio. Já na Índia, estamos distantes. Nosso fluxo é US$ 3 ou US$ 4 bilhões”, disse.
Para Guedes, o Brasil deve seguir exemplos de integração de países da Europa e da Ásia que têm elevado o “padrão de vida” das populações. “Os chineses, indianos, malásios, filipinos, está todo mundo subindo o padrão de vida. Enquanto isso, do lado de cá, particularmente a América Latina, o Mercosul, fez o contrário: cabeça de avestruz, enfiamos a cabeça no chão. Ficamos fechados. Nosso padrão de vida está piorando", afirmou.
Durante o seminário sobre o NDB, Guedes defendeu que a mudança de postura do Brasil ocorra na área comercial, de investimentos e de desenvolvimento de tecnologias do mundo digital.
“O NDB é uma peça fundamental nesse jogo. Queremos não só pelo dinheiro [emprestado pelo banco], queremos pela experiência na produção de infraestrutura eficiente como a China fez. A China fez extraordinário trabalho de infraestrutura”, afirmou Guedes.
Segundo o ministro, o Brasil ficou isolado por 40 anos e, agora, o governo pretende agilizar a abertura da economia. “Vamos fazer 40 anos em 4”, afirmou. Guedes garantiu que não há interesse do país em guerras ou tensões comerciais. “Queremos ser amigos de todos. Estamos abertos para os negócios”, completou.
Empresários entregam propostas aos líderes do Brics
Os pontos que se destinam a facilitar o comércio entre os integrantes do Cebrics envolvem necessariamente a aplicação das seguintes medidas: reconhecimento mútuo de operadores econômicos autorizados; adoção de certificado fitossanitário eletrônico e estabelecimento de pontos focais nacionais para investidores do Brics.
Já o financiamento para projetos de energia, os integrantes do Cebrics sugeriam que os recursos devem vir do Novo Banco do Desenvolvimento (o banco do Brics).
O estabelecimento da aviação regional como um dos pontos prioritários a serem apoiados pelo Brics é proposta que faz parte de um conjunto de 12 ações sugeridas pelo Cebrics. Também constam dessas ações medidas visando desenvolver a biotecnologia, a economia digital, a indústria e a infraestrutura
“O Brics é muito importante para a indústria. A pauta que interessa ao setor produtivo é a do comércio, do investimento e da inovação”, disse o diretor de desenvolvimento industrial da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Carlos Abijaodi. “Percebemos que a inovação é um ponto de encontro entre as cinco economias.”
Lista de propostas:
– 3 ações para facilitar o comércio entre os BRICS: reconhecimento mútuo de operadores econômicos autorizados; adoção de certificado fitossanitário eletrônico; e estabelecimento de pontos focais nacionais para investidores do BRICS
– 3 ações relacionadas ao Novo Banco de Desenvolvimento: financiamento a projetos de energia; financiamento a projetos de integração energética com países fronteiriços aos membros do BRICS; e criação de um Painel de Especialistas em Finanças, em parceria com o Conselho Empresarial do Brics (Cebrics)
– 4 ações para ampliar o financiamento às seguintes áreas: desenvolvimento de competências; desenvolvimento sustentável; infraestrutura; e pequenas e médias empresas
– 12 ações para cooperação nas seguintes áreas: aviação regional; biotecnologia; desenvolvimento de competências; economia digital, incluindo conectividade de áreas remotas, alfabetização e educação digital, e plataformas digitais; energia; indústria 4.0; infraestrutura, incluindo PPPs, tecnologias avançadas e logística; e mobilidade.