Bolsonaro, o antipetista com ideias de esquerda (no ESTADÃO)

Publicado em 03/09/2017 12:51
Opiniões de Bolsonaro não seguem agenda liberal, (por Gilberto Amendola, O Estado de S.Paulo)

Liberal, populista ou velho nacionalista? As contradições políticas de Bolsonaro

Opiniões do deputado fluminense não seguem agenda liberal. Apesar de se considerar um antipetista de carteirinha, ele defende algumas ideias de esquerda que assustam o mercado

Quem é ele? Provável candidato à Presidência da República, crê em um Estado forte e intervencionista, tem sérias restrições ao capital estrangeiro, nunca foi um entusiasta da independência do Banco Central, absteve-se na votação da lei da terceirização, tem restrições à Reforma da Previdência, se eleito pode rever a PEC do Teto e é chamado de “mito”...

Segundo cientistas políticos e economistas, Jair Messias Bolsonaro, deputado federal pelo PSC do Rio de Janeiro e que está de malas prontas para o PEN (que já anunciou que vai trocar de nome para Patriota), guardaria mais similaridades com o campo da esquerda e com o próprio PT do que poderia supor um “bolsominion” (como são chamados seus apoiadores). “Com ele, o país caminharia, sem dúvida, para a velha tradição populista e nacional-desenvolvimentista, cujo último exemplo foi o governo de Dilma Rousseff. O contrário do que, no meu entender, o Brasil precisa”, disse o cientista político Bolívar Lamounier.

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Embora venha repetindo o mantra do estado mínimo, Bolsonaro não consegue tocar no assunto sem fazer ponderações que costumam colocar liberais em alerta. Já declarou ser “favorável, de modo geral, às privatizações”, mas que faz ressalvas para setores estratégicos, como energia. Em relação à privatização da Petrobras, enviou sinais trocados. Declarou que antes seria preciso recuperar a empresa e que não se pode “sair entregando”. Mesmo em relação a exploração do nióbio (mineral que o deputado costuma citar em suas entrevistas), ele já declarou que ela deve se dar com “empresários brasileiros”.

 

 

Na avaliação do cientista político Christian Lohbauer (USP), Bolsonaro representaria “o velho nacionalismo”. “Ele se ampara na burocracia militar-desenvolvimentista. Não fala sobre concorrência e representa um nacionalismo de proteção. Não fala em integração comercial, das cadeias produtivas, não fala em inserir a economia nas cadeias internacionais....”

Na Câmara dos Deputados, Bolsonaro se absteve a votar a lei da terceirização com o argumento de que sofreria uma “enxurrada de críticas”. Votou pela PEC do Teto, mas já disse que poderia mudar o texto se fosse eleito presidente. Sobre reformar a Previdência, não é claro, mas afirmou ser contra qualquer mudança na aposentadoria dos militares. O cientista político Rogério Battistini, da Universidade Mackenzie, diz que Bolsonaro é representante de “um liberalismo sem consistência teórica”.

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Mercado apreensivo

O deputado, que não gosta de falar de economia mas já declarou não ser favorável à independência do Banco Central, é visto com apreensão por especialistas.

Para o analista político da XP investimento, Richard Back, ele significa volatilidade nos mercados. André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos, diz que já na campanha Bolsonaro deverá pregar contra reformas que interessam ao sistema financeiro. “Ele tem um modelo nacional-desenvolvimentista, um pouco antimercado.” O professor da FGV Joelson Sampaio considera que o mercado “reagiria mal a uma vitória de Bolsonaro” porque significaria incertezas.

Bolsonaro reage às críticas. “Os economistas que dizem entender muito de economia são os mesmos que levaram o Brasil para o buraco”, afirma o deputado. Sobre definições de direita e esquerda, diz ser “bobagem”. “Mas acho que posso ser definido como alguém que faz oposição à esquerda.”

O Brasil no espelho (EDITORIAL DO ESTADÃO)

Ninguém presta no Brasil, a julgar pelo mais recente Barômetro Político, pesquisa do instituto Ipsos noticiada no Estado. O levantamento indica uma profunda insatisfação dos brasileiros com os rumos do País e com o modo como se comportam quase todas as pessoas que frequentam com algum destaque o noticiário político. Mesmo aqueles tidos como heróis, como o juiz Sérgio Moro, enfrentam queda de popularidade. Em seu conjunto, os números mostram o grau de hostilidade dos cidadãos em relação àqueles que, de uma forma ou de outra, os representam ou pretendem encarnar a opinião pública e as aspirações da sociedade.

É como se os brasileiros, diante do espelho, não se reconhecessem nesse reflexo – ou, pior, como se a imagem ali refletida lhes causasse engulhos. Esse ambiente de total rejeição e negação é o húmus propício ao populismo – o que nos levou ao desastre, pelas mãos do lulopetismo, e o que nele nos conserva, pela prevalência do ceticismo e da inação –, pois o discurso dos demagogos só se dissemina em sociedades com alto grau de desencanto com as lideranças tradicionais.

A pesquisa mostra que a desaprovação ao presidente Michel Temer chegou a 93%, contra 68% em agosto de 2016, quando ele assumiu definitivamente o cargo depois do impeachment de Dilma Rousseff. A impopularidade passou de 86% em maio para 93% em junho, momento em que repercutia a bombástica delação do empresário Joesley Batista, que baseou denúncia de corrupção da Procuradoria-Geral da República contra Temer. Some-se a isso o fato de que a economia demorou a apresentar sinais de melhora e tem-se como resultado a baixa popularidade do presidente.

Mas não se pode fazer a leitura desses números sem considerar que Temer nunca foi exatamente popular e, além disso, padece por ter a responsabilidade de conduzir o País em meio ao desastre político, econômico e moral legado por Dilma e os petistas. Tampouco se pode analisar a pesquisa sem considerar que, de uma forma ou de outra, semelhante repúdio é reservado a outras personalidades, mesmo aquelas que são vistas como a vanguarda da luta contra a corrupção.

A aprovação ao juiz Sérgio Moro, por exemplo, caiu de 69% em maio para 55% em agosto, enquanto sua desaprovação subiu de 22% para 37% no mesmo período. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, é desaprovado hoje por 52%, contra 36% em maio. A desaprovação à presidente do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, saltou de 24% em maio para 47% em agosto. E o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato, viu a desaprovação a seu trabalho subir de 25% em maio para 41% em agosto.

Ou seja, quem tem vida pública, ou como protagonista de escândalos ou porque funciona como contraponto aos políticos corruptos, sofre as consequências do desencanto geral do País. E esse desencanto ficou particularmente agudo depois que a delação de Joesley Batista foi divulgada em maio, mês a partir do qual, conforme mostra a pesquisa, a desaprovação de quase todas as personalidades analisadas aumentou de forma sensível.

A delação de Joesley, que fundamentou uma denúncia inepta contra o presidente Temer, é um bom símbolo dessa época de irresponsabilidade generalizada. Enquanto atirava o País no torvelinho de uma profunda crise política, Joesley saía livre, leve e solto – uma afronta que seguramente colaborou para desmoralizar, aos olhos de muitos brasileiros, o trabalho dos que estão à frente da luta contra a corrupção.

O caso Joesley foi, por assim dizer, a gota d’água, mas não se pode atribuir ao bem-sucedido açougueiro a culpa pelo desencanto dos brasileiros. Só se chegou a esse tenebroso estado de coisas, não é demais lembrar, em razão da infame era lulopetista. Foi o sr. Lula da Silva – que hoje, como um saltimbanco, passeia pelo Nordeste a “vender sonhos e esperanças”, como ele mesmo disse – quem prometeu o paraíso na Terra e entregou o purgatório de Dilma Rousseff e o inferno da corrupção desenfreada.

Que o atual ceticismo dos brasileiros sirva para impulsionar mudanças que resgatem o verdadeiro sentido da democracia e restabeleçam a responsabilidade como parâmetro da vida pública. Do contrário, o País continuará à mercê dos astutos camelôs de sonhos.

Para que lado? (por VERA MAGALHÃES)

Sacudidos pela tempestade Harvey representada pela Lava Jato na última quadra, os partidos e políticos brasileiros tentam achar nos escombros um figurino com o qual se apresentar ao eleitor zangado em 2018.

A inundação parece ter levado junto a bússola: siglas e postulantes se movimentam em zigue-zague da esquerda à direita, ora ocupando um centro instável, sem saber também para qual dos pontos cardeais do espectro político-ideológico vai pender o eleitorado no ano que vem.

Assim vê-se João Doria Jr. – identificado com a centro-direita e detentor de um potencial de votos nesse espectro – se apresentar confusamente como o “novo Macron”, inclusive fazendo questão de ser literal, ao visitar o recém-eleito e já impopular presidente da França. Ora, Macron tinha uma trajetória mais à esquerda e caminhou para a centro-direita para se viabilizar como candidato diante do ceticismo geral dos franceses com os partidos tradicionais.

Doria teria de fazer o deslocamento contrário, da direita à esquerda, justamente num momento em que a debacle do projeto lulopetista aponta para uma chance de que um candidato mais à direita emplaque no Brasil depois de décadas. 

O cavalo de pau embaça a imagem de Doria: de anti-Lula radical, ele já começa falar em conciliação, a dizer que o “nós contra eles” não ajuda. Afinal, com que roupa de seu vasto figurino o prefeito de São Paulo pretende posar para fotos desta vez?

Não é mais nítida até aqui a demarcação político-ideológica que o adversário direto e mais próximo de Doria procura fazer. Geraldo Alckmin, que em São Paulo sempre foi identificado com a ala mais à direita do PSDB – mas que em 2006 pagou o mico de vestir uma jaqueta de garoto-propaganda do estatismo nacional – agora diz ter ao seu lado o liberal DEM e o socialista PSB.

Tal como num cabo de guerra, os dois partidos, em tudo diferentes quanto ao que pregam sobre modelo de Estado e de economia, por exemplo, disputam a primazia de compor a chapa com o governador paulista.

Alckmin tem feito mais deferência ao “esquerdista” PSB. Seja em visitas constantes ao enclave pernambucano do partido, seja em elogios a seu vice, Márcio França.

Assim, avança o projeto de um pessebista como postulante a vice de Alckmin. E um nome surpreendente desponta: o do ex-comunista do Brasil Aldo Rebelo, que ensaia uma filiação ao PSB com a missão oficial de ajudar na montagem de palanques estaduais do partido, mas já está “escalado” como possibilidade para dar um perfil mais nordestino à chapa do superpaulista Alckmin.

E o que essa eventual dobradinha mostra? De novo, uma guinada à esquerda. Será este o figurino que o eleitor vai buscar em 2018? Ou o populismo econômico, ancorado em altas doses de paternalismo social, do lulopetismo esgotou seu ciclo?

A surpreendente falta de gritaria com o pacote de concessões anunciado pelo governo demonstra que o fantasma das privatizações não terá o peso nas urnas que teve em 2002, 2006 e até 2010. A roubança desenfreada promovida pelo PT e seus asseclas nas estatais causou ao menos esse efeito desmistificador. Seria esse um sinal de uma eleição com vetor mais de centro-direita? 

Faltam pesquisas mais aprofundadas sobre o que, depois de tanta lama e tanto trauma, o eleitor busca num candidato em 2018. O novo, como parece crer Doria? Tranquilidade e experiência, como martela Alckmin? Rigor e segurança, como vai tentar vender Jair Bolsonaro? Bravata e gogó, como oferecem Lula e Ciro Gomes? 

Cada um desses atributos tende a deslocar o ponteiro para a direita ou a esquerda. Por ora, os pré-candidatos se movimentam feito baratas tontas num mapa devastado pela crise, sem bússola que os oriente.

Lula e a caravana da hipocrisia (EDITORIAL DA GAZETA DO POVO)

No Nordeste, Lula afaga Renan Calheiros e se apresenta como a solução para a crise criada pelas próprias políticas petistas

O ex-presidente Lula já está em campanha para voltar ao Planalto em 2018. Só não está pedindo às pessoas que votem no 13, e por isso escapa das punições da legislação eleitoral, mas todos os atos da caravana pelo Nordeste têm gosto de campanha eleitoral, cheiro de campanha eleitoral e cara de campanha eleitoral, não há como negar. Às vezes Lula até desconversa, como em Salvador, quando disse que “ainda falta muito tempo” para 2018 e “não existe candidato”, mas o conjunto da obra mostra quais são as reais intenções de Lula e seu séquito.

Trata-se de uma viagem marcada pela hipocrisia. Não apenas por ser campanha eleitoral sem o declarar abertamente, mas por tudo o que Lula vem dizendo e fazendo. Como o encontro com o senador alagoano Renan Calheiros (PMDB), às margens do Rio São Francisco. Calheiros é réu no Supremo Tribunal Federal e tem quase 20 investigações contra si; é a perfeita “raposa”, para evocar um discurso de Lula feito dias antes, em Feira de Santana (BA). Mas ganhou elogios do ex-presidente no Twitter. Houve mal-estar até mesmo dentro do PT; afinal, Calheiros pode até ter costurado o absurdo fatiamento do julgamento no Senado que cassou Dilma Rousseff preservando-lhe os direitos políticos, mas o alagoano votou pelo impeachment, o que faz dele um “golpista”, na novilíngua petista. Mas parece haver golpistas e golpistas, a julgar pelas palavras da presidente do PT, a senadora paranaense Gleisi Hoffmann, à Folha de S.Paulo: “Não podemos levar essas coisas tão a ferro e fogo”.

 

Condenado a nove anos e seis meses de prisão pelo juiz Sergio Moro no caso do tríplex do Guarujá, Lula tem poupado o magistrado em seus discursos – uma mudança de estratégia às vésperas do novo depoimento do ex-presidente (agora no caso do sítio de Atibaia), já que as críticas abertas feitas por Lula a Moro antes do depoimento de maio não o ajudaram em nada. Mas a força-tarefa da Lava Jato, segundo o petista, é responsável até pela morte da ex-primeira dama Marisa Letícia. “Esses meninos da Operação Lava Jato têm responsabilidade com a morte dela”, chegou a afirmar o petista – o mesmo Lula que não teve a menor vergonha de jogar nas costas da esposa falecida toda a responsabilidade pelas decisões envolvendo o apartamento no litoral paulista.

Hipocrisia é Lula se apresentar como a solução para a crise criada não pela Operação Lava Jato – como chegaram a afirmar líderes sindicais, repetindo a lorota segundo a qual o combate à corrupção prejudica a economia –, mas pelas próprias políticas petistas. Lula, é preciso lembrar, recebeu um país estabilizado pelo Plano Real e, enquanto ele se manteve fiel ao tripé macroeconômico e às políticas de seu antecessor, o país cresceu, ajudado pela forte demanda por commodities. Mas a implantação da “nova matriz econômica”, nos anos finais do governo Lula e em todo o governo Dilma, colocou o país na rota da gastança irresponsável e das fraudes fiscais que culminaram na maior recessão da história do país e nos quase 14 milhões de desempregados. Lula é a última – ou talvez a penúltima, se considerarmos Dilma Rousseff – figura a quem uma pessoa responsável confiaria a tarefa de retirar o país do buraco em que ele mesmo o colocou, com a ajuda de seu “poste”.

Leia também:A condenação de Lula é a redenção do Brasil? (artigo de Rodrigo Valverde, publicado em 19 de agosto de 2017)

Rodrigo Constantino: Quem são seus heróis? (2 de agosto de 2017) 

Também não tem faltado na caravana a repetição do surradíssimo discurso de ataque à imprensa livre – “Se por acaso um dia eu voltar a ser presidente da República, certamente algumas coisas precisam acontecer”, disse, em referência a “jornalistas desonestos” – e do igualmente surrado “nós contra eles”, em que “a elite” (ou seja, qualquer um que ganhe um pouco mais de um salário mínimo) não suporta Lula “porque o pobre passou a ocupar aeroporto, frequentar shopping. Ele deixou de comer acém para comer filé, contrafilé; porque deixou de comer pescoço e pé para comer coxa, sobrecoxa e peito de frango. Os pobres começaram a comprar computador, laptop” – como se algum empresário de qualquer dos ramos citados estivesse espumando de raiva por ter mais pessoas comprando seus produtos.

Mas, assim como o desempenho nas urnas não absolve ninguém dos crimes cometidos, retórica vazia não livra ninguém de, mais cedo ou mais tarde, prestar contas de seus atos. Lula roda o Nordeste como a “alma mais honesta do país”, mas já tem uma condenação judicial em primeira instância e acumula outras cinco ações penais contra si. E nesse campo o embate se dá apenas em torno das provas; ainda pode haver incautos cativados por seu discurso, mas ele não o ajudará em nada diante da Justiça.

Fonte: O Estado de S. Paulo/Gazeta

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