"Precisamos falar de mais impostos" (??!!), por VINICIUS TORRES FREIRE, na FOLHA

Publicado em 10/04/2017 06:48
e mais: Saldo comercial contribuirá para o menor déficit cambial da década (no ESTADÃO)

O próximo presidente vai chegar ao segundo ano do mandato, 2020, com as contas no vermelho. Além do mais, mesmo com reforma, a despesa da Previdência comerá parte crescente do Orçamento. Para piorar, a dívida federal crescerá até 2021, enquanto o dinheiro disponível para investimento, "obras", vai cair.

Na prática, o próximo governo ficaria engessado, de resto com dívida e "mercado" pesando no cangote. Isso não vai prestar.

Essa parece a perspectiva para o presidente "X" (2019-22), dadas algumas previsões que o governo divulgou na sexta (7), no anúncio das linhas gerais do Orçamento de 2018.

A não ser que venha logo um "milagre do crescimento", as projeções otimistas do ano passado, quando se criou o "teto" de gastos, estão adiadas por uns dois anos. E daí? Daí que:

1) A pressão pela derrubada precoce do "teto" tende a aumentar, mais cedo;

2) Será cada vez mais intragável a alta da dívida do governo, em termos financeiros, sociais e políticos.

Seria prudente, pois, discutir aumento de imposto já, para o ano que vem. Quanto mais se adiar o assunto, maior a chance de conflito crítico sobre como se vai pagar a conta da dívida/deficit, entre outros.

A despesa do governo em tese não vai aumentar no ano que vem: é limitada pelo "teto". Na verdade, descontada a Previdência, o gasto federal tem caído. Falta é receita, que vai crescer menos do que a economia em 2018, se prevê. Assim, no ano que vem o governo deve tomar R$ 129 bilhões emprestados, em vez dos R$ 79 bilhões previstos.

Em vez de fazer ainda mais dívida e, portanto, pagar ainda mais juros (para os mais ricos), por que o governo não cobra mais impostos (afora os motivos políticos)? A resposta não é trivial, mas o debate é inadiável.

Um aumento de imposto pode afetar a miúda recuperação econômica, pois mexe em preços e consumo, daí talvez no emprego, para não mencionar outras distorções.II

Um aumento de imposto, por outro lado, pode conter logo o aumento da dívida e, assim, taxas de juros e a conta de juros; pode talvez distribuir melhor o peso social do ajuste.

Imposto não seria a única fonte de receita. Mesmo uma CPMF das antigas, gorda, daria 1,3% do PIB (prevê-se déficit de 1,8% do PIB). Seria preciso completar o pacote com privatizações, por exemplo, do que não se ouve falar, aliás.

O torniquete de gastos teria de continuar, mas pouco sobrou onde apertar, a não ser por meio de trabalho de formiga, demorado. No mais, há Previdência e gastos com servidores, protegidos pela Constituição ou por decisões do Supremo.

No entanto, essas economias, se possíveis, bastariam apenas para destinar mais dinheiro a investimento, educação, saúde: para redistribuir o gasto, limitado pelo "teto". Não abateriam o deficit. Caso seja necessário usar o dinheiro sob o "teto" para abater o deficit, o conflito tende a ficar explosivo.

Note-se que a alta de imposto não serviria para aumentar o gasto (há o "teto"), mas apenas para elevar a receita de modo a conter deficit e dívida. Haverá ainda disputa pela divisão do dinheiro limitado pelo "teto". O conflito pode ficar mais azedo quanto mais se perceba o custo da dívida pública, em termos de crescimento e de redistribuição de renda.

A encrenca é grande. (por VINICIUS TORRES FREIRE).

Tributar com justiça, EDITORIAL DA FOLHA

Se não resta dúvida de que os brasileiros pagam muito para custear seu governo, tampouco parece realista imaginar que a carga de impostos possa ser reduzida ao longo dos próximos anos.

Tributos federais, estaduais e municipais consomem quase 35% de toda a renda nacional, patamar só igualado ou superado em países mais ricos e menos populosos, europeus em sua maioria.

Nem por isso, entretanto, os serviços públicos são satisfatórios, como se sabe —e nem por isso o dinheiro arrecadado é suficiente.

Nos três níveis de governo, as despesas ultrapassam com folga a casa dos 40% do PIB. Como a dívida está em alta e ainda há áreas vitais subfinanciadas, como a saúde e a infraestrutura, a possibilidade de abrir mão de receitas não está no horizonte visível.

Dada a carga tributária como um fardo inevitável, cumpre torná-la menos nociva. É necessário, sem dúvida, simplificar a cobrança de impostos e contribuições, intento básico da reforma esboçada pelo governo Michel Temer (PMDB).

Mas não só: a tributação brasileira precisa ser mais justa —com redistribuição da conta de maneira proporcional à capacidade de pagamento dos contribuintes.

Para os dois objetivos deverá concorrer a tão debatida fusão dos múltiplos tributos hoje incidentes sobre a venda de mercadorias e serviços, que compõem, além de um emaranhado burocrático infernal para as empresas, um ônus desmesurado para os consumidores —sobretudo os mais carentes.

Metade da arrecadação do país provém do gravame do consumo, uma fatia muito superior à recomendada pelas melhores práticas internacionais. No mundo desenvolvido, o percentual varia de 15%, nos Estados Unidos, a cerca de 30%, na Europa ocidental.

Em contrapartida, menos de um quinto das receitas brasileiras origina-se da taxação direta de lucros, salários e outras fontes de renda, enquanto mesmo emergentes como Chile e México apresentam proporções acima dos 30%.

Sem elevar a carga total —e esta deve ser uma condição imperativa—, deve-se caminhar rumo a um sistema tributário que contribua para reduzir a desigualdade entre ricos e pobres.

Para tanto, não bastará reduzir o número de tributos indiretos, embutidos nos preços dos produtos e pagos igualmente por todos os consumidores; há que, gradativamente, depender menos deles e mais do Imposto de Renda, cujas alíquotas aumentam conforme a remuneração percebida.

Não se duvide de que o objetivo é politicamente espinhoso e impossível de ser atingido com uma única reforma. No momento, as ambições oficiais limitam-se a harmonizar, gradualmente, a cobrança do PIS, da Cofins e do ICMS, todos incidentes sobre o consumo.

Nesse processo, tendem a ser revistos incentivos e regimes especiais, o que ajudará a tornar o sistema mais equânime.

A taxação das mercadorias, ademais, também deve obedecer a critérios de progressividade, com isenção para artigos essenciais e carga extra sobre itens cujo consumo se pretenda coibir.

Quanto ao IR, a alíquota máxima da tabela das pessoas físicas, de 27,5%, é baixa para os padrões internacionais. Países de estágio de desenvolvimento semelhante usualmente cobram entre 30% e 40% dos rendimentos mais elevados.

Outra área em que se pode avançar é a tributação dos dividendos distribuídos pelas empresas a seus sócios. Nos EUA e na Europa há imposto sobre os lucros e a distribuição destes, numa soma de até 50%; aqui, tributa-se só o lucro da pessoa jurídica, em 34%.

Nos Estados e municípios, há espaço para ampliar a tributação sobre o patrimônio —ainda que esta seja menos representativa em todo o mundo, devido ao objetivo de estimular a formação de poupança.

O imposto sobre heranças e doações, estadual, só nos últimos anos vem sendo cobrado com maior pertinácia; já o IPTU continua negligenciado por grande parte das prefeituras, dada a comodidade das verbas recebidas da União.

Trata-se, sem dúvida, de uma agenda ampla e complexa —que, aliás, perderá sentido e legitimidade se o esforço reformista não for estendido ao controle e à eficiência das despesas públicas.

O teto estabelecido para o gasto federal é apenas um primeiro e importante passo. A sociedade precisa, além de serviços de maior qualidade, da garantia de que o governo não permanecerá um sorvedouro insaciável de recursos.

Um novo país emerge da crise, por RONALDO CAIADO

Quando a sociedade brasileira começou a se manifestar nas ruas, a partir de 2013, não se tratava, como alguns pensaram, de protestos pontuais contra a corrupção e a má governança.

Se assim fosse, tudo se encerraria com o impeachment de Dilma, cujo governo, sob a égide do PT, mesclou administração temerária com roubalheira sistêmica, em magnitude sem precedentes, levando o país à ruína econômica, moral e política.

Ali, no entanto, apenas se inaugurava uma nova e irreversível fase na história do país, ao que parece ainda não devidamente percebida pelos agentes públicos. E aí reside o cerne da atual crise, que é, sobretudo, de representatividade.

A sociedade não se reconhece no Estado, que, por sua vez, continua a vê-la como se nada houvesse mudado. As manifestações, no entanto, mostram que a sociedade descobriu o poder transformador das ruas. E de lá não mais sairá.

Organiza-se para tornar efetivo o parágrafo único do artigo 1º da Constituição, segundo o qual "todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente (...)".

Esse termo "diretamente" está deixando de ser letra morta. As redes sociais são extensões digitais da vida pública, que banem de vez a figura do Estado torre de marfim.
O recado é claro: o papel passivo da sociedade, como mera provedora de um Estado caro e inoperante, chegou ao fim.

O governo Temer, se não se der conta disso, não terá êxito nas reformas que precisa realizar. Não o conseguirá se continuar supondo que lhe basta obter maioria no Congresso.

Há 28 partidos no Congresso, nenhum com vínculos efetivos na população. Em tal contexto, cogitar voto em lista, uma reforma para esconder a cara dos maus políticos, é aumentar o fosso que separa o país oficial do país real.

Foi-se o tempo em que o povo terceirizava seus problemas. Hoje, cobra lógica e coerência dos governantes; quer retorno de seus impostos. Reforma da Previdência, sim, desde que extensiva a todos, sem privilégios —e desde que devidamente explicada e debatida. E debate não é propaganda.

Aumento de impostos, sem que o Estado contenha os seus gastos, não. E assim por diante.

A agenda de temas em discussão no Congresso mostra a distância que o separa da sociedade. Neste momento, em que há cerca de 14 milhões de desempregados, a recuperação da economia exige sua desregulamentação e medidas de incentivo ao emprego, não reforma política e medidas defensivas contra a ação da Justiça na Lava Jato, entre as quais a preservação do foro privilegiado.

O país está atento, de olho nos políticos. Isso é bom. Há futuro e esperança e já se vê crescente parcela de jovens imunes à doutrinação esquerdista, em busca de projeto de prosperidade, baseado no estímulo ao empreendedorismo e à meritocracia, sem os quais não há justiça social.

O Brasil possui reservas minerais estratégicas incomparáveis. Com todas as dificuldades que já viveu e as que ainda vive, é o segundo maior exportador de alimentos, com uma das agriculturas mais sofisticadas e produtivas.

Mas possui potencial para ir muito mais longe. O país tem sido refém de uma mentalidade política retrógrada, calcada no paternalismo estatal, que o debilitou ainda mais nesses 13 anos de desastrosa hegemonia petista. A cada eleição, sob o estímulo do marketing político, ansiava por um salvador da pátria.

Lula prestou este serviço: sepultou o ciclo messiânico. O país que emerge da crise se despoja de mitos e equívocos do passado, disposto a refundar a república em bases morais e racionais.

Saldo comercial contribuirá para o menor déficit cambial da década (no ESTADÃO)

O superávit recorde registrado pela balança comercial em março – de US$ 7,1 bilhões, maior para o mês da série histórica iniciada em 1989 – decorreu tanto do aumento das exportações quanto da fraqueza das importações. O resultado confirma que a recuperação da economia segue a passos lentos, o que vem reduzindo a demanda por importações.

Os números do comércio exterior superaram as expectativas dos analistas. As estimativas para o superávit de 2017 passaram de US$ 47,7 bilhões para US$ 50,7 bilhões, segundo a consultoria Tendências, e de US$ 40 bilhões para US$ 60 bilhões, segundo a Rosenberg.

Se as tendências do primeiro trimestre persistirem, o déficit das transações correntes poderá ser o menor da década – de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB), ante 3,4% em 2015 e 1,3% no ano passado. O maior responsável pela evolução positiva do balanço de pagamentos será a conta de comércio.

As exportações de março, de US$ 20 bilhões (+20,1% em relação a março de 2016), foram lideradas por produtos básicos como minério de ferro, petróleo em bruto, carne suína e soja em grão, beneficiados pela valorização das commodities no mercado global.

Salvo para as empresas produtoras, foram limitados os efeitos da Operação Carne Fraca, porque a demanda no mundo continua vigorosa, razão pela qual em poucos dias foram suspensos os embargos à carne brasileira nos principais mercados.

Também avançaram as vendas de manufaturados, como automóveis de passageiros e veículos de carga, açúcar refinado, óleos combustíveis e tubos flexíveis de ferro e aço.

A recuperação da economia global e, em especial, de grandes importadores de produtos brasileiros, como a China, tem sido decisiva para o crescimento das vendas externas. O aumento da demanda da Argentina é observado com atenção, pois a retomada portenha apenas começa.

Se o saldo anualizado e dessazonalizado até 17 de março se repetisse até dezembro, o superávit atingiria US$ 77 bilhões, calcula o Bradesco. Não se trata de estimativa, mas de exercício aritmético. De qualquer forma, o vigor do superávit continua dependente de importações contidas, inclusive porque as tarifas brasileiras são altas, não acompanhando a queda de tarifas praticada nos últimos anos pela maioria dos países avançados e emergentes.

 

Fonte: Folha de S. Paulo + Estadão

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