Na VEJA: Madrinha de bateria, cantor e filhos de ex-tesoureiro do PT receberam propina

Publicado em 04/07/2016 14:59
Esquema desmontado pela 31ª fase da Lava Jato movimentou mais de 39 milhões de reais, POR Laryssa Borges, de Brasília.

As investigações da Operação Abismo, deflagrada nesta segunda-feira e que corresponde à 31ª fase da Lava Jato, apontam que o ex-tesoureiro do PT Paulo Ferreira utilizou uma madrinha de bateria, um cantor de escola de samba e seus próprios filhos como destinatários de dinheiro sujo de um esquema que movimentou mais de 39 milhões de reais em propina. Amigos de Ferreira na escola de samba Estado Maior da Restinga, agremiação da zona sul de Porto Alegre, receberam depósitos de dinheiro que, diz o Ministério Público, foram recolhidos a partir de propina cobrada de empreiteiras que participavam de obras no Centro de Pesquisas da Petrobras.

Segundo o ex-vereador Alexandre Romano, que fechou acordo de delação premiada e já havia incriminado o casal de petistas Paulo Bernardo e Gleisi Hoffmann, seu escritório de advocacia repassou cheques e fez transferências bancárias para pessoas ligadas à Estado Maior da Restinga. Entre elas, Viviane da Silva Rodrigues, contato do ex-tesoureiro do PT no samba e madrinha de bateria da agremiação. Conhecido como Chambinho, Romano apresentou documentos bancários para comprovar o dinheiro enviado a Viviane: foram 18 repasses entre 2010 e 2012, totalizando quase 62.000 reais. Para a escola de samba foram outros 45.000 reais.

O cantor Sandro Ferraz, ligado à escola de samba, também recebeu dinheiro sujo de Chambinho, por orientação de Paulo Ferreira, assim como a antiga secretária do ex-tesoureiro, Silvânia Gomes, que era lotada no gabinete do então senador Tião Viana (PT-AC), mas na verdade trabalhava diretamente com o ex-secretário de Finanças do partido. Também camuflaram propina a mando de Ferreira o blogueiro Júlio Garcia, responsável por produzir notícias favoráveis ao PT, e os próprios filhos do ex-tesoureiro Ana Paula Ferreira e Jonas Ferreira. "Há comprovação de cheques nominais a Ana Paula Ferreira e Jonas Ferreira, identificados pelo colaborador [Alexandre Romano] como filhos de Paulo Ferreira", diz o Ministério Público.

A avalanche de provas contra Paulo Ferreira, sucessor do notório Delúbio Soares no caixa do PT, foi providenciada na maior parte por Chambinho, que se tornou delator da Lava Jato e, por consequência, uma ameaça constante aos segredos guardados pelo partido. No esquema de pagamento de propinas, Alexandre Romano contou que, a partir de 2009, começou a contabilizar, por meio de seu escritório de advocacia, "dívidas" que Paulo Ferreira ou o PT tinham a receber. Para disfarçar a origem criminosa do dinheiro - nada mais do que propina recolhida de empresas que participavam de disputas na Petrobras - Chambinho providenciava contratos superfaturados ou simulados com empresas indicadas pelo ex-tesoureiro. Na transação, os valores eram depositados na conta do escritório de advocacia Oliveira Romano Sociedade de Advogados ou de uma empresa controlada por ele. Depois, o dinheiro passava para a conta de Nathalie Romano, esposa do delator, e ao final, a propina chegava a Paulo Ferreira ou a pessoas indicadas por ele, como a madrinha de bateria e o cantor da Estado Maior da Restinga. Chambinho ficava com 40% de "taxa de serviço" se tivesse de simular contratos superfaturados e 30% se precisasse apenas simular negócios para lavar o dinheiro da propina.

"O colaborador trouxe uma série de documentos que comprovam as transferências bancárias e pagamentos que efetuou a pedido de Paulo Ferreira, detalhando ainda o vínculo entre os recebedores e o ex-tesoureiro", disse o Ministério Público ao pedir a prisão preventiva de Paulo Ferreira na Operação Abismo.

"Paulo Adalberto Alves Ferreira figurou como destinatário de vantagens indevidas oriundas de contratos públicos na esfera federal, notadamente na Petrobras, e provavelmente como representante do Partido dos Trabalhadores na negociação de propinas, havendo contundente demonstração de que recebeu, por intermédio de operações de lavagem, valores das empresas Construbase, Schahin e Construcap, integrantes do Consórcio Novo Cenpes", disse o MP. "Há suficiente demonstração, tanto oral quanto documental, dos repasses efetuados pelas integrantes do Consórcio Novo Cenpes aos funcionários corrompidos Barusco e Duque [Pedro Barusco, ex-gerente da Petrobras, e Renato Duque, ex-diretor da petroleira], bem como de alguns dos mecanismos utilizados por essas mesmas empresas para a "geração" do dinheiro em espécie usado para os pagamentos indevidos. Nesse sentido, tratando-se de contrato vinculado à Diretoria de Serviços da estatal, foram encontradas evidências de que uma parte da propina foi entregue ao Partido dos Trabalhadores, por intermédio de Paulo Adalberto Alves Ferreira", conclui.

PF deflagra nova fase da Lava Jato e mira ex-tesoureiro do PT Paulo Ferreira

A Polícia Federal deflagrou nesta segunda-feira a 31ª fase da Operação Lava Jato. Batizada de Abismo, ela tem como um dos alvos o ex-tesoureiro do PT Paulo Ferreira, que foi preso recentemente na Operação Custo Brasil e ainda estava detido. Ao todo, estão sendo cumpridos 35 mandados judiciais, sendo quatro de prisão temporária, um de preventiva, a de Paulo Ferreira, 23 de busca e apreensão e sete mandados de condução coercitiva. O esquema movimentou mais de 39 milhões de reais em propina.

A nova fase tem como foco de investigação fraudes e o pagamento de vantagens em licitação no Centro de Pesquisas da Petrobras (Cenpes), no Rio de Janeiro. Segundo a Polícia Federal, o nome Abismo faz referência à tecnologia de exploração de gás e petróleo em águas profundas. "Esquemas como estes identificados levaram a empresa aos recantos mais profundos da corrupção e da malversação do dinheiro público", disse a corporação. O esquema de cobrança de propina em obras do Cenpes já havia sido detalhado pelo ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco, delator da Lava Jato.

"O povo brasileiro já não aguenta mais agentes políticos que flertam, namoram ou mesmo se casam com a corrupção. É preciso que as duas principais causas da corrupção descobertas na Lava Jato, as falhas do sistema político e a impunidade, sejam atacadas", disse o procurador da República Roberson Pozzobon.

Segundo os investigadores, em 2007, a OAS, Carioca Engenharia, Construbase Engenharia, Schahin Engenharia e Construcap CCPS Engenharia saíram vitoriosas na disputa fraudulenta do Cenpes, tendo abocanhado um contrato de 848,98 milhões de reais. Acordos de leniência fechados com empresas investigadas na Lava Lato e depoimentos de delação premiada de executivos da Carioca Engenharia detalharam o esquema: depois de as empreiteiras terem acertado os termos do cartel para fraudar a licitação no Cenpes, a empresa WTorre Engenharia e Construção S/A (WTorre), que não havia participado dos ajustes, apresentou proposta de preço inferior, colocando em risco o esquema criminoso.

Foi então que as companhias combinaram propina de 18 milhões de reais para retirar a WTorre do certame. Além de repasses de dinheiro sujo para a diretoria de Serviços da Petrobras, feudo do PT à época comandado por Renato Duque, foram identificadas propinas, entre 2007 e 2012, para diversos agentes: 16 milhões de reais para o operador Adir Assad, alvo recente da Operação Custo Brasil, 3 milhões para Roberto Trombeta e Rodrigo Morales, 711.000 dólares para o operador Mario Goes, responsável por gerir propinas da Andrade Gutierrez e também delator da Lava Jato, e 1 milhão de reais para o ex-vereador Alexandre Romano, delator que colocou o casal de petistas Paulo Bernardo e Gleisi Hoffmann na mira dos investigadores do petrolão.

Nas delações premiadas da Lava Jato, Alexandre Romano, conhecido como Chaminho, confessou que repassou propina para Paulo Ferreira por meio de contratos falsos. Segundo o delator, as empresas Oliveira Romano Sociedade de Advogados, Link Consultoria Empresarial e Avant Investimentos e Participação Ltda. foram utilizadas para receber mais de 1 milhão de reais em propina de construtoras que participavam da concorrência no Cenpes. O dinheiro, então, foi enviado a Paulo Ferreira e a destinatários indicados por ele, como familiares, blogs com linha editorial favorável ao PT e até uma escola de samba.

Custo Brasil - Embora na última semana o ministro José Antonio Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), tenha determinado a soltura da maior parte dos alvos da Operação Custo Brasil, entre os quais o ex-ministro do Planejamento Paulo Bernardo, sob a alegação de que a detenção do petista foi um "flagrante constrangimento ilegal", Paulo Ferreira permaneceu preso porque o juiz Paulo Bueno de Azevedo considerou que ele poderia atrapalhar as investigações se fosse colocado em liberdade.

"Três operações da última semana, SaqueadorCusto Brasil e a de hoje, são ramos de uma mesma árvore. Juntas formam um ícone da recente articulação da Justiça que começa a cercar em diversas frentes de investigação megaesquemas criminosos de desvio de dinheiro público que se interconectam. É expressão disso o fato de que há alvos em comum entre Lava Jato e as demais, como Adir Assad, no caso da Saqueador, e Paulo Ferreira, na Custo Brasil", afirmou o coordenador da força-tarefa da Lava Jato Deltan Dallagnol.

O rastro da propina na Operação Abismo

O ex-tesoureiro do PT, Paulo Ferreira, é levado dentro do carro da Polícia Federal após prestar depoimento, em São Paulo(Aloisio Mauricio/Fotoarena/Folhapress)

A enxurrada de provas reunidas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público contra o ex-tesoureiro do PT Paulo Ferreira mostram, documentalmente, o que o juiz federal Sergio Moro classifica como "rastro da propina" na Operação Abismo, a 31ª fase da Operação Lava Jato deflagrada nesta segunda-feira. Os investigadores consideram que apenas uma parcela do dinheiro sujo movimentado no esquema foi identificado, mas ainda assim já conseguiram mapear uma transferência de 711.000 dólares da carioca Engenharia para o ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco, em 2012, transferências de 1.287.501 reais e de 820.000 reais da Carioca para o operador Adir Assad em 2008 e 2009, repasses de 807.537 e 1.044.943, em 2010, da Construcap para Assad, pagamentos de 10,24 milhões de reais da Schahin Engenharia também para Assad, 2,15 milhões de reais pagos pela OAS a Assad, 2,19 milhões de reais do Consórcio Novo Cenpes por meio de contratos falsos, 700.000 reais do mesmo consórcio para ser lavado pelos advogados Roberto Trombeta e Rodrigo Morales, transferências de 2 milhões de reais, 200.000 reais e 700.000 reais da Construbase, Schahin Engenharia e Construcap para o ex-vereador petista Alexandre Romano e, por fim, repasses dele para pessoas indicadas por Paulo Ferreira, entre as quais uma madrinha de escola de samba e o dono de um blog favorável ao PT. (Laryssa Borges, de Brasília)

Fonte: veja.com

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