Com passado em suspenso, Lula adia o futuro, por JOSIAS DE SOUZA (UOL)

Publicado em 08/06/2016 00:08
no BLOG DO JOSIAS

Em 2010, quando Lula deixou o Planalto com mais de 80% de popularidade, seu futuro seria radioso. Agora, o futuro do ex-soberano é a ameaça da denúncia, a ameaça da ação penal, a ameaça da condenação.

Nesta segunda-feira, Lula ressurgiu no Rio de Janeiro. inquirido sobre 2018, respondeu que “é cedo” para pensar em sucessão presidencial. Disse que há pessoas “boas” e “novas” para se apresentar como alternativas.

Lula acrescentou que já está em idade para se “aposentar”. Já não se faz mais futuro como antigamente. Hoje, Lula não tem condições de prever se seus direitos políticos estarão intactos em 2018. Reza para estar solto no mês que vem.

Silêncio de Michel Temer diante do apodrecimento do PMDB diz muito 

Após analisar com auxiliares as consequências do pedido de prisão dos cardeais do PMDB, Michel Temer decidiu que o melhor a fazer por enquanto é não comentar o tema. Convém dar ouvidos a esse silêncio do presidente interino.
 Até os surdos conseguem ouvir a eloquência da mudez de Temer.

Há pragmatismo no silêncio de Temer. Se subisse no caixote para fazer barulho contra os candidatos a presidiário Renan Calheiros, Eduardo Cunha, José Sarney e Romero Jucá, o substituto de Dilma viraria um presidente popular. As palavras não-ditas gritam que Temer não tem condições de se dissociar do lixão.

Há utilidade no silêncio do Temer. Ele facilita a audição dos delatores. Muito já foi dito sobre os métodos dos caciques do PMDB. Mas nada soou tão desconcertante quanto as vozes da conspiração contra a Lava Jato nas gravações de Sérgio Machado, o silvério da Transpetro. A certa altura, o delator disse a Sarney: “Eu contribuí para o Temer…”

Há Higiene no silêncio de Temer. Em vez de reclamar do odor, Temer confraterniza com o lixo, entrega o comando do PMDB ao lixo, coloca o preposto do lixo na liderança do governo na Câmara, confia nos votos do lixo para aprovar as reformas.

O apreço de Temer pelo lixo aguça a fome de limpeza da sociedade. Viva o silêncio de Michel Temer.

CCJ adiou votação de manobra que abre caminho para livrar Cunha de cassação

A Câmara não é feita apenas de cinismo e cumplicidade. Mas 90% dos deputados dão aos 10% restantes uma péssima reputação. Ao suspender Eduardo Cunha do exercício do mandato e da presidência da Câmara, o STF transformou os parlamentares em pequenas criaturas. Hoje, basta que um deputado se agache no plenário para que o considerem um ser de grande altivez.

Num instante em que Eduardo Cunha executa sua penúltima manobra (veja aquiaqui, vale a pena reler um trecho da decisão do STF, redigida pelo ministro Teori Zavascki e refendada por unanimidade no plenário do tribunal. O texto anota que Cunha, “além de representar risco para as investigações penais […], é um pejorativo que conspira contra a própria dignidade da instituição por ele liderada.”

O documento prossegue: “Em situações de excepcionalidade, em que existam indícios concretos a demonstrar riscos de quebra da respeitabilidade das instituições, é papel do STF atuar para cessá-los, garantindo que tenhamos uma República para os comuns, e não uma comuna de intocáveis…”

O que o Supremo afirmou, com outras palavras foi o seguinte: “A permanência de Eduardo Cunha no comando da Câmara ameaça a Lava Jato e avacalha o Legislativo. Se os deputados não conseguem se livrar de um personagem que torna a Câmara indigna de respeito, não resta ao Supremo senão intervir, para preservar a instituição e demonstar que ninguém está acima da lei.”

O que parecia ser um favor do STF transformou-se num suplício. A Suprema Corte afastou Eduardo Cunha, mas manteve nas mãos dos seus pares a obrigação de remover o entulho. Decorridos 33 dias, o Conselho de Ética da Câmara se reúne nesta terça-feira para votar um parecer que recomenda a cassação do mandato de Cunha. E a infantaria do lixão manobra para arrancar do colegiado uma pena alternativa —algo como uma suspensão. Que seria inócua, já que o STF já suspendeu o acusado.

O processo já é o mais longo da história do Conselho de Ética. Arrasta-se há mais de sete meses. O arsenal de manobras de Cunha parece inesgotável. Nesta terça, em sessão realizada numa sala ao lado, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ) votará parecer de um aliado de Cunha, o deputado-petroleiro Athur Lira (PP-AL), que altera as regras do jogo aos 45 minutos do segundo tempo.

Mal comparando, é como se as manobras tornassem o processo de cassação semelhante a uma partida de futebol. Com algumas diferenças: o campo não é demarcado, vale impedimento, canelada marca ponto a favor, a bola é quadrada e o juiz é o próprio acusado, um ladrão que expulsa do jogo quem bem entende e cria suas próprias regras sem dar satisfação a ninguém.

O deputado Betinho Gomes (PSDB-PE), que joga no time da cassação, ainda não se deu por vencido. Ele diz que a Comissão de Justiça, onde Cunha executa sua manobra, “não é um colegiado feito de cartas marcadas.” Para Betinho, “não há segurança de que as mudanças que favorecem Eduardo Cunha serão aprovadas.”

Os partidários da interrupção mandato de Cunha planejam obstruir a votação na CCJ. “Queremos ter primeiro o resultado do Conselho de Ética, que sairá até quarta-feira'', afirma o tucano Betinho. “Obstruindo, a gente expõe um pouco mais a manobra, de modo a elevar a pressão da opinião pública sobre a CCJ.”

Do lado de Eduardo Cunha o problema é saber de que tamanho precisa ficar o embaraço para que a opinião pública, já tão habituada ao papel de tolo, possa considerá-lo aceitável. A tarefa não é simples. Mas a Câmara, depois de perder o poder para o STF, não parece se importar com a crescente perda do pudor.

Os deputados flertam com o risco de o Supremo intervir novamente na cena, moralizando-a. A imagem da prisão de Delcídio Amaral em pleno exercício do mandato de senador flutua na atmosfera como um aviso para Eduardo Cunha.

Quem ri de uma grande orelha até a outra com o pedido de Janot é o PT (por REINALDO AZEVEDO)

A menos que haja coisas cabeludas, que desconhecemos — e não há evidência disso —, é claro que Rodrigo Janot, procurador-geral da República, atravessa o samba ao pedir a prisão do ex-presidente José Sarney e dos senadores Romero Jucá (PMDB-RR) e Renan Calheiros (PMDB-AL), que preside o Senado e, portanto, o Congresso. Quem ri de orelha a orelha é o PT.

O partido comandou o petrolão, mas o político até agora mais enrolado por causa da Lava-Jato é Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Sempre chamei atenção aqui para esse despropósito. Vocês sabem disso. Janot não está entre os meus heróis.

Os companheiros chefiaram o maior assalto aos cofres públicos de que se tem notícia no mundo, mas Janot pede a prisão da cúpula do PMDB. Acho que a Lava-Jato, assim, dá um tiro no pé, além de optar pela tática dos incendiários: meter fogo em tudo para que só as almas puras se salvem da fogueira. Mas e os próprios incendiários? Serão eles assim tão puros?

Vamos ver. Eu tenho a convicção, dados os testemunhos, de que Renan, Jucá e Sarney acabaram se beneficiando com o pagamento de propina. Mas isso precisa ser devidamente comprovado, de acordo com o processo legal. Se e quando acontecer, cana, além das outras punições. Por enquanto, Janot está pedindo a prisão do trio por algo que pode ser caracterizado como delito de opinião.

Insisto: se o pedido de prisão está assentado em alguma outra denúncia feita por Sérgio Machado, com a apresentação de provas, ninguém sabe, não consta. O que se tem como certo é que o Ministério Público Federal considerou que as conversas do trio que vieram a público caracterizam uma forma de obstrução da investigação e da Justiça. É claro que se trata de um exagero, de um destrambelhamento.

Ao fazer essa opção, o Ministério Público Federal parece querer assustar os políticos, colocando-os contra a parede, demonstrando que existe um poder soberano no país — e soberano ninguém é. Desafia-se alguém, jurista de qualquer perfil e posto em qualquer lugar no escopo das opiniões, a apontar onde está o crime cometido por Renan, Jucá ou Sarney nas conversas divulgadas. Não há. De resto, meras intenções vazadas em diálogos privados não podem ser confundidas com o cometimento de crime.

Há outra coisa muito incômoda, imprópria e incompatível com o regime democrático: Janot havia encaminhado o pedido a Teori Zavascki. O ministro é de tal sorte discreto que não havia comentado sobre o assunto nem mesmo com seus pares, no cafezinho. Isso costuma acontecer num colegiado tão pequeno. Nada! Os demais ministros desconheciam absolutamente a matéria.

Logo, o vazamento saiu de onde? Ora, do Ministério Público Federal. É uma forma de constrangimento evidente, não? Trata-se de uma ação para tornar o Supremo refém do MPF. É sabido que a sociedade, justamente indignada com a sem-vergonhice, é simpática a atalhos legais para que se faça justiça com celeridade.

Trata-se de uma escolha brutalmente errada. No Brasil e em qualquer parte do mundo, políticos tendem a se proteger mutuamente, sabemos disso. Mesmo quando as culpas são evidentes. Contam os interesses objetivos, claro!, mas também certa solidariedade de categoria. E assim é mesmo quando as culpas são evidentes. Vejam a patuscada na Câmara para proteger Eduardo Cunha. Se e quando a iniciativa do órgão investigador atropela a ordem legal, aí, convenham, tanto pior.

Não! Não estou reivindicando leis de exceção para proteger o trio. Estou é destacando que não existem leis de exceção para prendê-lo. Que a Lava-Jato investigue tudo, livre, sem interdições e interferências. Mas que ela não seja livre das regras do estado de direito.

Os hipócritas
Se querem a evidência da hipocrisia de parte considerável do jornalismo, mesmo o da grande imprensa, que tem o nariz vermelho, eis a chance: vive a gritar que a Lava-Jato é autoritária e, com frequência, não respeita certos limites. Quando, no entanto, os alvos são peemedebistas, aí tudo lhe parece de uma absoluta normalidade.

“Ah, e você? Não faz a mesma coisa?” Não! Faço jornalismo analítico, não torcida de estádio. Critiquei a condução coercitiva de Lula, por exemplo. E já deixei claro, mesmo quando o alvo é o PT, que não endosso vazamentos de material que está sob sigilo, e isso nada tem a ver com o direito — e o dever — que tem a imprensa de divulgá-los.

Minha régua nas questões públicas é o estado de direito. Não apoio esse ou aquele procedimentos a depender de quem seja o alvo. Acho que é uma questão de honestidade intelectual.

Esse destrambelhamento geral de querer meter todo mundo na cadeia, de baciada, por razões erradas, só serve a quem está apostando no clima do “quanto pior, melhor” para justificar novas eleições.

Esse, definitivamente, não é um bom caminho.

A Lava-Jato tem de ser livre. Mas não pode ser arbitrária. Ou ganham os inimigos da democracia. Ou ganha o PT.

Fonte: UOL + VEJA

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