Fiat Elba virou Ferrari. A Era petista acelerou a corrupção no Brasil, por FELIPE MOURA BRASIL
Fiat Elba virou Ferrari. A Era petista acelerou a corrupção no Brasil
Em 1992, o então presidente Fernando Collor de Mello caiu por causa de um carro Fiat Elba comprado com dinheiro sujo do esquema de Paulo César Farias, usado em sua residência oficial conhecida como “Casa da Dinda” – e hoje avaliado em pouco mais de 15 mil reais.
Na manhã desta terça-feira, 23 anos depois, a Operação Politeia, da Polícia Federal, apreendeu na mesma “Casa da Dinda” os automóveis de luxo do senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL), entre eles um Porsche, uma Ferrari vermelha e um Lamborghini - só este último avaliado em 3 milhões de reais.
Na delação premiada do empreiteiro Ricardo Pessoa, dono da UTC Engenharia e amigão do Lula, Collor foi citado como destinatário de 20 milhões de reais em propina, pagos pela construtora entre 2010 e 2012, para que o senador defendesse interesses da companhia com a BR Distribuidora.
Na delação do doleiro Alberto Youssef, Collor também foi citado como beneficiário de propina na subsidiária da Petrobras.
Seu antigo Fiat Elba, com motor 1.5, acelerava de 0 a 100 km/h em 14,8 segundos.
Sua Ferrari 458 Italia, com motor de 4,5 litros e 8 cilindros em “V”, acelera de 0 a 100 km/h em apenas 3,4 segundos, ou seja: quatro vezes mais rápido que o Fiat Elba.
A amostra é clara.
A Era petista acelerou a corrupção no Brasil.
Felipe Moura Brasil ⎯ https://veja.abril.com.br/blog/felipe-moura-brasil
No EL PAÍS: Lava Jato tem aval do Supremo para investigar Collor e outros políticos
Com o avanço da Lava Jato, chegou a vez de os políticos entrarem na mira da investigação que está ativa há pouco mais de um ano e que já recuperou 570 milhões de reais aos cofres públicos. Nesta terça-feira, a Polícia Federal e a Procuradoria Geral da República começam a cumprir 53 mandatos de busca e apreensão em sete estados brasileiros, incluindo Alagoas, onde será indagado o ex-presidente e senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL).
A atual fase da operação, batizada de Politeia (que significa, em grego, “cidade perfeita” e se refere ao livro A República, de Platão), é a primeira no âmbito do Supremo Tribunal Federal – a que estão submetidos os políticos – e foi autorizada pelos ministros Teori Zavascki, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski. No alvo da investigação neste momento, além de Collor, estão também Ciro Nogueira (PI), presidente do PP, o deputado Eduardo da Fonte (PP-PE) e o senador Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE).
Ao todo, 47 políticos estavam sendo investigados com autorização do Supremo. Entre eles, há 22 deputados federais, 12 senadores, 12 ex-deputados e uma ex-governadora, pertencentes a cinco partidos – encabeçados pelo PP, com mais políticos que responderão a inquéritos (32), seguido por PMDB (sete), PT (seis), PSDB (um) e PTB (um). A eles, juntam-se o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, e o lobista Fernando Soares.
As buscas acontecerão nas residências dos investigados, em escritórios de advocacia, órgãos públicos e sedes de empresas, como o canal de televisão de Collor, em Alagoas. Segundo a Polícia Federal, “o objetivo é evitar que provas sejam destruídas pelos investigados”. Algumas das medidas, expedidas pelo procurador geral da República, Rodrigo Janot, visam também à apreensão de bens adquiridos com recursos do esquema de corrupção na Petrobras. Janot defendeu a ação da PF em uma nota oficial, ao afirmar que “as medidas são necessárias ao esclarecimento dos fatos investigados no âmbito do STF”
Em Pernambuco, oito mandados de busca e apreensão já foram cumpridos esta manhã, envolvendo o senador Fernando Bezerra de Coelho (PSB-PE) e o líder do PP na Câmara dos Deputados, Eduardo da Fonte. Outros 12 mandados estão em curso no DF, 11 na Bahia, sete em Alagoas, cinco em Santa Catarina, cinco no Rio de Janeiro e cinco em São Paulo.
O nome de Bezerra foi citado no depoimento do ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa. O senador pernambucano, que era secretário de Desenvolvimento do Estado, teria pedido 20 milhões de reais para a campanha de reeleição de Eduardo Campos ao Governo do Estado em 2010. No caso do ex-presidente Fernando Collor e do presidente do PP, Ciro Nogueira, foi Alberto Youssef, um dosdelatores da Lava Jato, quem os implicou como beneficiários do esquema de desvios da estatal.
Operação Lava Jato, uma investigação grande demais para ‘acabar em pizza’?
Não há garantias de que a Lava Jato venha a ter um destino diferente dessas outras operações, mas o grande trunfo da investigação que levou os maiores empreiteiros do país para a cadeia pode estar exatamente no seu tamanho monumental. Com pouco mais de um ano de existência, a Lava Jato já recuperou 570 milhões de reais, abriu 20 ações criminais contra 103 pessoas e baseou tanto a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre a Petrobrasquanto a de uma apuração sobre os recursos da campanha de reeleição da presidenta Dilma Rousseff no âmbito do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Pela amplitude, a operação teria se tornado "too big to fail", ou grande demais para ser anulada. Como voltar atrás após tantos executivos assumirem culpa no cartório? Mas não falta vontade aos advogados de defesa que atuam no caso de tentar derrubar toda a Lava Jato. Criminalistas como Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que defende três senadores no caso, enxergam abusos nas prisões preventivas decretadas pelo juiz Sergio Moro e na forma como foram negociadas as delações premiadas de 19 dos acusados até agora.
Doutora em Direito Penal pela Universidade de São Paulo (USP), Marina Coelho Araújo explica que, por ser tão grande, a Lava Jato disseminou vários processos, que podem tomar rumos diferentes, mas acredita que "alguma coisa vai ser anulada". A advogada criminalista, que atuou em casos como o da Operação Satiagraha, lembra que, na época da investigação sobre o dono do grupo Opportunity, também se imaginava que o caso era grande demais para ser anulado.
Sobre a Lava Jato, ela acredita que "os procuradores não tomaram todos os cuidados para evitar a anulação" e que o futuro da operação vai depender da interpretação das cortes superiores sobre a forma como o dispositivo da delação foi utilizado. “Entendo que existem algumas questões graves, mesmo de procedimentos menores. E o caso do Banco Santos, por exemplo, foi anulado por causa da audiência de interrogatório. Uma coisa pequena. A anulação não vem só de coisas muito grandes. Não seguiu a lei, tem de anular”, comenta. Em maio deste ano, a Justiça anulou a condenação a 21 anos de prisão imposta em 2006 ao ex-banqueiro Edemar Cid Ferreira, do Banco Santos, pelos crimes de gestão fraudulenta de instituição financeira e lavagem de dinheiro, entre outros.
O ministro Marco Aurélio Mello é um dos juízes do Supremo Tribunal Federal (STF) que mais tem comentado o caso, e nem sempre de maneira abonadora. Em uma de suas últimas declarações sobre a Lava Jato, dada ao jornal Valor Econômico, Mello descartou a anulação da operação como um todo, mas criticou a colocação de escutas clandestinas na cela dodoleiro Alberto Youssef na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba. O ministro lamentou a " discrepância" que "coloca em xeque" um "trabalho que vem sendo feito com tanta seriedade", acrescentando que "é possível separar a parte comprometida, se houver".
Política
Membro da força-tarefa da Operação Lava Jato, o procurador Diogo Castor de Mattos evita comentar diretamente a investigação, mas lança até o final do ano um livro que joga luz sobre os caminhos que a Justiça brasileira tem percorrido para levar à anulação todas as grandes operações contra crimes de colarinho branco. Para ele, as decisões que levam à nulidade são essencialmente políticas. Assegurando que os investigadores da Lava Jato procuram "trabalhar sempre na legalidade", Mattos disse ao EL PAÍS que não acredita que os responsáveis por operações como Satiagraha ou Castelo de Areia foram menos cuidadosos.
Em sua dissertação A seletividade penal na utilização abusiva do habeas corpus dos crimes de colarinho branco, defendida em fevereiro na Universidade Estadual do Norte do Paraná, o procurador constata que "pela via do habeas corpus, há decretação da nulidade de provas de diversas ações penais envolvendo pessoas abastadas economicamente, autores de crimes do colarinho branco”. Segundo Mattos, “o objetivo nodal da pesquisa é demonstrar que essa utilização abusiva do habeas corpus vem reforçando o caráter seletivo do direito penal nos crimes cometidos pela elite econômica”.
Em seu trabalho, o procurador lembra que “até o início do julgamento da AP [Ação Penal] n°470, também conhecido como'Mensalão', a Corte Suprema do país registrava apenas quatro condenações criminais, nenhuma com trânsito em julgado, e onze absolvições", e analisa: "Certamente, o notório assoberbamento do STF, como também a benevolência dos julgadores com as teses da defesa, admitindo a análise de inúmeros recursos manifestamente protelatórios de uma decisão que deveria ser irrecorrível, demonstra um sistema pouco eficiente”.
Para embasar sua análise, Mattos destaca que, no caso da Satiagraha, crimes financeiros e lavagem de dinheiro, foram anuladas "todas as provas da operação, independentemente daquelas em que não houve a 'suposta' participação dos agentes de inteligência [ABIN]". Já a Operação Castelo de Areia, que investigava subornos a agentes públicos para fraudar licitações, foi anulada por seu inquérito se basear em denúncia anônima. O procurador aponta uma incoerência, pois "existem aparatos estatais bem sucedidos e institucionalizados como 'disk denúncia' que visavam justamente contar com a contribuição da população para elucidação de crimes e preservam a identidade do delator".
O procurador conclui sua pesquisa dizendo que “no atual momento histórico, a pressão e o controle social exercem papéis fundamentais para a efetiva fiscalização do cumprimento efetivo do papel das instituições", destacando que "acontecimentos recentes como o próprio julgamento do Mensalão têm demonstrado como a pressão popular ainda é uma das formas mais efetivas de controle da democracia”. Sem citar a Lava Jato diretamente, Mattos diz no trabalho que "o Brasil vive atualmente um momento histórico único", pois "o maior escândalo de corrupção da história sangra os cofres da maior empresa estatal do país e põe à prova novamente a eficácia de um sistema processual penal de uma duvidosa eficácia e crônica benevolência com crimes econômicos que envergonham o país”. E finaliza: “É nos tempos de crise e dificuldade que surge a coragem para a mudança e inovação, tendo o país uma chance única de renovação na confiança das instituições públicas". A dissertação do procurador terá sua prova de fogo nas cortes superiores do país.
Sérgio Moro cita Homem-Aranha: “Mais poder, mais responsabilidade”
Alçado ao status de celebridade nacional e super herói antipetista, o juiz federal Sérgio Moro (Maringá, 1972) diz que não tem prazer em condenar criminalmente ninguém. Responsável por mandar para a cadeia, ainda que temporariamente, dezenas de empreiteiros, lobistas e políticos, o jovem magistrado paranaense não se vê como uma referência nacional e até demonstra um certo desconforto com isso. “Não sou uma celebridade”, disse nesta sexta-feira para uma plateia com quase 500 jornalistas e estudantes de comunicação do Congresso da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), em São Paulo.
OPERAÇÃO LAVA JATO
- Operação Lava Jato chega à ‘joia da coroa’ e se aproxima de Lula
- Ex-diretor da Petrobras preso fecha cerco sobre núcleo duro da Lava Jato
- Juiz nega habeas corpus preventivo para impedir prisão de José Dirceu
- Um vendaval para a economia
- UTC, a construtora que cresceu e multiplicou doações eleitorais
- Acareações de delatores e contra-ataque do PT turbinam Lava Jato
Ao vivo, não soa vulcânico como nos despachos em que dialoga com o noticiário e defende as prisões que faz. Optou por um discurso de humildade ao tratar da importância de seu papel na Operação Lava Jato: “Sou uma peça dentro de um processo muito mais amplo”. De fato, é. Magistrado de primeira instância, Moro só age em resposta à rígida atuação de uma força-tarefa formada por procuradores da República e policiais federais. Além disso, por mais que suas decisões tenham tido repercussão internacional, já que raramente se vê tanta gente endinheirada atrás das grades, elas ainda poderão ser revistas em dois ou três tribunais superiores.
Em pouco mais de uma hora de conversa, Moro não tratou especificamente da Lava Jato porque é um caso que vai julgar futuramente e não quer ter sua decisão tecnicamente questionada. Apenas negou que seu objetivo seja prender o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Durante um descontraído bate-papo com os participantes do evento, ele evitou dar detalhes de sua vida pessoal. Não falou quantas horas trabalha por dia, se gosta de ler livros ou assistir à televisão e muito menos tratou de sua segurança pessoal. “Não falo sobre segurança por questões de segurança”. Evitou também opinar sobre questões que não são de sua esfera de atuação – lavagem de dinheiro –, como a redução da maioridade penal aprovada em primeira votação pela Câmara dos Deputados nesta semana. Analisando o sistema judiciário nacional o classificou como moroso, especialmente quando se trata de crimes de colarinho branco.
Sou uma peça dentro de um processo muito mais amplo
Sergio Moro, juiz federal
Sobre as críticas (algumas bastantes duras) que recebe por conta de suas decisões e rígidos despachos foi categórico: “Não sou nenhuma besta-fera”. Disse que atua de maneira reativa e, em outro momento, afirmou que julga sempre de acordo com as provas que constam do processo e nem sempre consegue responder a tudo que se fala sobre a operação. “Não se pode jogar uma pedra em todo cão que ladra.”
Economia
Desde que a Lava Jato estourou, representantes do Governo Dilma Rousseff (PT) se adiantaram numa operação para tentar resguardar a atuação das empresas investigadas em obras públicas. O principal argumento utilizado era que, sem elas, a economia do Brasil poderia sofrer um retrocesso porque boa parte da infraestrutura brasileira que está em construção depende dessas construtoras.
Diante desse argumento e questionado pelo mediador do evento, o apresentador Roberto d’Ávilla , Moro usou uma metáfora que ele próprio não considera tão feliz, mas válida. “O policial que descobre o cadáver não é culpado por homicídio. Acho que uma série de problemas vinham se acumulando há tanto tempo sem uma resposta adequada por parte de nossas instituições e, de repente, esses problemas apareceram de maneira bastante clara e o custo de solução deles é bastante grande. Mas eu indago: qual seria o custo se esse esquema tivesse continuidade?”.
Num outro momento, usaria uma frase do Homem-Aranha (mais precisamente, do tio de Peter Parker, Ben) para criticar o foro privilegiado — a possibilidade de que políticos sejam julgados em tribunais superiores — que, segundo ele, é "o contrário da igualdade". “Como eu gostava muito de revista em quadrinhos, lembro daquelas frases do Homem-Aranha onde dizia ‘quanto maior o poder, maior a responsabilidade’”
O pouco que falou de si foi que a operação Lava Jato o colocou em um processo de intenso estresse. Até por isso, quando tem de planejar sua vida a longo prazo, só consegue pensar uma coisa. “Quero tirar longas férias depois disso tudo."
Por que vocês não desistem, comunas?
Gosto quando Arnaldo Jabor traz à tona as reminiscências de sua juventude utópica e comunista. São seus melhores textos, ao contrário de quando resolve falar da política americana, quando ainda deixa transparecer o ranço ideológico dessa época, ao elogiar os Democratas esquerdistas e demonizar a direita Republicana. Em sua coluna de hoje, Jabor foi preciso ao retratar a insistência dogmática dos comunas no erro: são incapazes de aprender com eles, e a cada nova experiência fracassada, concluem que é preciso redobrar os esforços na mesma direção. Há definição melhor de estupidez?
A chegada dos velhos comunas ao poder expôs o vácuo de ideias dessa turma, assim como sua incapacidade administrativa. Se antes a esquerda era romântica e utópica, hoje passou a ser apenas cínica, defendendo o banditismo, o lulopetismo, em troca de cargos ou esmolas. Como Jabor reconhece, o romantismo de antanho era “meio babaca”, mas era a única forma que essa gente tinha para enxergar o mundo na época da Guerra Fria.
Claro, não é exatamente verdade isso, pois mesmo naquele contexto não foram poucos os que viram o embuste do socialismo revolucionário, e em vez de terem orgasmos com a chegada dos barbudos ao poder em Cuba, tiveram calafrios. Mas, naturalmente, havia um atenuante para quem se encantou com a alternativa socialista antes de todos os seus fracassos se tornarem públicos e notórios. Hoje, qual a desculpa? Como alguém ainda consegue defender o socialismo? A tentativa de monopolizar as virtudes continua sendo uma das principais explicações, como reconhece o próprio Jabor:
Nós éramos mais “puros”, mais poéticos, mais heroicos que os meus colegas de PUC, todos já de gravatinhas adultas. Como era bom se sentir acima dos outros, não por competência ou cultura, mas por superioridade ética. Os operários eram nossa meta existencial. Para nós eles eram o futuro da Humanidade. Nas oficinas do jornal estudantil que eu fazia, crivavam-nos de perguntas e agrados, sendo que os ditos operários ficavam desconfiados e pensavam que nós éramos veados e não fervorosos “revolucionários”.
Naquele tempo não era possível pensar de outro jeito. De Sartre a Brizola, não havia outra ideologia disponível. A guerra fria dividia o mundo em duas facções, e a tomada do poder de Fidel Castro inebriou nossos desejos. Mesmo delirando em utopias, queríamos verdadeiramente, romanticamente salvar o país, contra o “imperialismo americano, o latifúndio e a direita espoliadora”. Não havia espaço para outras ideias, e quem ousasse pensar diferente era canalha, lacaio dos americanos. Por exemplo, Raymond Aron era de “direita” porque discordou do Sartre, pois esse incitava seus leitores para agir; Aron ensinava-os a pensar. Como acreditávamos nessa dualidade, ela virou uma verdade incontestável. E essas “verdades” criaram uma nova linguagem que praticávamos com fé e determinação. Em vez dos fatos, a linguagem bastava e nos movia. A linguagem ignorava o mundo real, chato e complexo demais para a mutação histórica que faríamos pois, afinal, éramos os “sujeitos da história”. Só as palavras simplistas explicavam nossa visão de mundo: alienação, massa atrasada, massa avançada, conscientização, sectarismo, aventureirismo, reacionarismo, entreguismo, proletariado, democracia burguesa e a palavra sagrada que tudo justificava: o “povo”.
Eis aí uma bela definição do que ainda move muito comuna: eles desejam se sentir superiores, só por serem de esquerda. Eles acham que entenderam melhor o mundo, em vez dos “alienados” da classe média, os burgueses, pois eles têm mais “consciência política”. Eles estão do lado “certo” da História, pois condenam as “injustiças” do mundo capitalista, a ganância (dos outros), o lucro (dos outros), e resumem tudo a um simplismo dicotômico pra lá de infantil: os virtuosos de esquerda, e os malvados capitalistas. Como é simples e confortante essa visão de mundo! Esses “intelectuais” estão em contato pleno com o “povo”, enquanto abstração. É uma droga poderosa, um entorpecente e tanto.
O que espanta Jabor, que foi um deles, é sua incapacidade de mudança, de aprender com os próprios erros. Isso também sempre me espantou, apesar de jamais ter sido de esquerda. Como pode esse pessoal repetir a mesma ladainha meio século depois, como se nada tivesse acontecido nesse período que derrubasse cada bandeira socialista? Como alguém pode defender Cuba hoje? Como alguém pode manter o mesmo discurso idiota contra o capitalismo, o lucro, a ganância, o “imperialismo ianque”? “Eles não mudam nunca”, desabafa Jabor. Persistem na mesma marcha da insensatez. Jabor conclui, usando um grande pensador brasileiro:
Nunca me esqueço de um debate do grande intelectual “aroniano” José Guilherme Merquior com dois marxistas na TV. Os dois falavam sempre dos erros da esquerda, mas considerados apenas como “percalços” de uma marcha triunfal para o futuro. Eles diziam, batendo no peito: “Erramos no stalinismo, na Hungria, em Praga, aqui erramos em 1935, 1964, em 1968, mas continuaremos lutando.” Merquior respondeu na lata: “Por que vocês não desistem?”
Uma boa pergunta: por que vocês não desistem? Talvez a resposta seja dura: porque não conseguem ser diferentes, por falta de inteligência, ou de caráter. Porque necessitam desse ópio como um viciado necessita da pedra de crack. Porque sem esses dogmas, eles se sentem totalmente desamparados. Porque são covardes. Porque são muito vaidosos e amam a autoimagem de “altruístas” refletida no espelho quebrado de suas casas. Porque são oportunistas. Porque são burros mesmo. Enfim, temos algumas alternativas, mas a pergunta permanece: por que vocês não desistem, comunas?
Rodrigo Constantino