"O Brasil está atônito e envergonhado, incrédulo"..., por Juan Árias, do EL PAÍS

Publicado em 17/11/2014 21:09
À Dilma não bastará remover as pedras da corrupção da Petrobras; terá que começar a cortar em sua própria carne...

Acossada pelas denúncias de corrupção na Petrobras, a então candidata Dilma Rousseff prometeu, durante as eleições, que não deixaria “pedra sobre pedra” nas investigações.

Com a eleição ganha, o tsunami sobre a empresa – hoje humilhada e despojada de boa parte de sua riqueza – continua amontoando novas pilhas de pedras de acusações, segundo denúncias da polícia federal. É o que revelam as últimas prisões de altos funcionários das maiores empresas brasileiras que trabalham para a petroleira e que seria o grande exército de “corruptores” e não só de corruptos que ainda deverão ser revelados.

O esforço hercúleo de Rousseff para derrubar o muro cada vez mais alto da corrupção na Petrobras se torna cada dia mais árduo e difícil, e ameaça sepultar a presidenta e seu novo Governo antes mesmo de começar.

O Brasil está atônito e envergonhado, incrédulo. O país até pouco tempo atrás admirado por sua vitalidade econômica aparece interna e externamente como objeto de um dos maiores escândalos políticos de corrupção de sua história democrática.

É possível que a atávica passividade e resignação dos brasileiros com a corrupção esteja acabando e que a sociedade, desta vez, exija do novo Governo medidas rápidas, exemplares, sem ambiguidades, sem dissimulações, sem se refugiar na página bíblica de Pilatos lavando as mãos.

O Brasil não é mais o mesmo dos tempos do escândalo de corrupção do “mensalão”. A sociedade cresceu e amadureceu, e se tornou mais sensível aos excessos desse casamento mafioso entre a política e o grande empresariado.

Já não adianta tentar convencer a população a engolir qualquer desculpa. Até os que preferiram votar em Rousseff como reconhecimento aos avanços sociais realizados pelos Governos do PT hoje exigem dela medidas concretas. Ela terá que cumprir com sua promessa de “não deixar pedra sobre pedra” para chegar ao fundo do poço dessa enxurrada de corrupção que hoje está à vista de todos e que não admite deturpações possíveis.

Se nos tempos do “mensalão”, diante de um Brasil que não era o de hoje, Lula conseguiu sair ileso ao afirmar para a nação, quase com lágrimas nos olhos, que desconhecia o escândalo e que tinha sido “traído” por alguns de seus companheiros de partido que acabaram na prisão, hoje essa receita não será suficiente para Rousseff.

Como ela poderá negar desta vez à sociedade o que está diante de seus olhos? Como desmontar, pedra por pedra, essa montanha de granito de ilegalidades com cifras milionárias subtraídas à Petrobras, que ofendem e humilham os milhões de trabalhadores que vivem honestamente de seu trabalho e mal conseguem terminar o mês sem endividar-se?

Difícil imaginar outro modo que não seja “dizer a verdade”. Que ela, que sempre esteve na antessala das operações da empresa e a conhecia como poucos, e que não é suspeita de ganhos pessoais ilícitos, conte a verdade nua e crua. Se estava disposta a não deixar pedra sobre pedra antes de ser eleita, agora tem de começar a retirar essas pedras sem mais demora.

Como fazê-lo? Sem querer, por exemplo, “carregar água na peneira“, como escreveu o poeta do assombro Manoel de Barros, recém-falecido, que seria, segundo sua obra antológica, como “criar peixes no bolso”.

Para que o novo Brasil mais exigente que o de ontem acredite na presidenta, não bastará que ela remova as pedras da corrupção, ela terá de começar por cortar na própria carne. Isso poderia significar um sincericídio, uma confissão aberta. Se for necessário, um pedido de perdão. E se ainda for indispensável, denunciar os possíveis judas que não tiveram escrúpulos em vender a credibilidade da maior empresa do país, velho orgulho dos brasileiros, não por 30 moedas de prata como no relato bíblico, mas, ao que parece, por dez bilhões de reais, o que representa o salário de um milhão de anos de um trabalhador com salário mínimo.

Não é uma tarefa fácil, mas é realmente indispensável para acalmar e limpar desta vez as águas agitadas e envenenadas da opinião pública. O Brasil moderno e democrático necessita e merece superar essa página dolorosa para recuperar sua credibilidade nas instituições e iniciar uma nova página de crescimento econômico e moral.

É o que merecem os brasileiros honestos, que são a grande maioria deste país invejável e com clara vontade de regeneração política e social.

 
DENÚNCIAS DE CORRUPÇÃO

Dilma busca as saídas do labirinto de seu Governo

O caso Petrobras fragiliza a presidenta, pressionada a fazer a reforma ministerial e negociar com o Congresso, enquanto a oposição tenta estender o clima de campanha (por Carla Jimenez, do El País)

Foi-se o tempo em que o problema mais urgente do Governo Dilma Rousseff era controlar a teimosa inflação, ou correr para explicar que a recessão técnica, detectada no segundo trimestre, não viraria recessão de fato. Ao desembarcar nesta segunda-feira no Brasil, depois da reunião do G-20 em Brisbane, na Austrália, a presidenta Dilma terá de encarar um país ‘estarrecido’ – adjetivo amplamente usado por ela durante a campanha – com as investigações da operação Lava Jato, que prendeu dezenas de executivos na última sexta-feira, além de fazer busca e apreensão de documento em diversas empresas fornecedoras da Petrobras.

Um fato novo para um país onde a Justiça se fazia, até pouco tempo atrás, sobre três ‘Ps’ – só prendia preto, pobre e puta, como disse o procurador-geral da República Rodrigo Janot, em entrevista à Folha de S.Paulo, nesta segunda. A nova rota da investigação ainda está sendo digerida no país que coloca agora sua instituições à prova com este novo julgamento.

Por ora, a presidenta tenta se mostrar tranquila diante das notícias de corrupção na Petrobras, que já adiaram a divulgação do resultado da empresa para minimizar o clima de desconfiança diante das informações de desvios de dinheiro que vieram à tona com a investigação da Polícia Federal.

Rousseff encara também a pressão pela reforma ministerial, assim como as desconfianças em torno da sua liderança, depois que a ministra da Cultura, Marta Suplicy, saiu pisando forte do Governo, com direito a uma carta de demissão pública e constrangedora, em que torcia para que a presidenta fosse “iluminada” ao escolher sua nova equipe de trabalho, a começar por uma equipe econômica independente”. Mais que o descontentamento de uma integrante da equipe, a agora senadora Suplicy, um grande quadro do PT, expôs um partido dividido a um mês do final do primeiro mandato. A fratura exposta dentro da principal companhia do país, a Petrobras, atormenta lideranças petistas que precisam defender um Governo que vive um momento de grande impopularidade.

Além do aumento de juros promovido pelo Banco Central logo após o resultado da eleição, o Governo deixou às claras o que todos já sabiam ao propor, na semana passada, um projeto modificando o cálculo do superávit primário – diferença entre receitas e despesas do Governo para pagar juros de dívida – de modo a cumprir a meta estabelecida pela Lei de Responsabilidade Fiscal brasileira. Em outras palavras, o Governo gastou mais do que arrecadou, e não fechará as contas se o Congresso não permitir uma manobra contábil, que tiraria da rubrica de despesas os investimentos públicos em infraestrutura e os subsídios concedidos ao setor industrial ao longo do mandato de Dilma.

Tudo isso com uma oposição que solta rojões a cada nova pedrada contra a presidenta. Alguns integrantes passaram a brincar com fogo, segundo alguns observadores, criando um clima de instabilidade que passaria por incutir responsabilidade jurídica sobre a presidenta caso ela não cumpra o superávit seguindo os preceitos da Lei.

“Neste momento, a margem de manobra dela é pequena”, diz o cientista político Rudá Ricci. As brechas para se movimentar são estreitas, e à Dilma caberia transformar 1% de chance em 100% de sucesso. Para o caso Lava Jato, por exemplo, uma garantia de que o massacre ao seu Governo não pode ser desenfreado é o fato de a investigação ter em destaque, por ora, apenas o Partido dos Trabalhadores. Mas, já há evidências de que a corrupção se estende para quase todos os partidos, inclusive os de oposição.

Já para a negociação do projeto do superávit, o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, disse na semana passada que se as mudanças não forem aprovadas, o Governo cumprirá sim a meta estabelecida em lei, mas o efeito colateral será a paralisação de obras e o desemprego. E essa responsabilidade deveria ser assumida pelo Legislativo, segundo Mercadante.

Fonte: El País

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