Diante das altas do preços, mercado já se questiona sobre a volta da "inflação dos alimentos"
Na imprensa mundial retorna o assunto da volta da inflação dos alimentos. Este termo foi criado durante o ano de 2008 quando, por diversos fatores nos quais estavam incluídos uma boa dose de especulação financeira, os principais grãos (trigo, milho e soja) apresentaram uma grande valorização nas bolsas de commodities (que foi seguida por uma queda brusca que gerou uma crise no setor agrícola mundial). Alguns sinais se repetem. Os preços do milho, da soja e do trigo se encontram em um patamar somente inferior ao pico alcançado no ano de 2008. Outros produtos, como o açúcar e o algodão, que não apresentaram os picos de preço do ano de 2008, se encontram em níveis recordes em termos históricos. A diferença está em que existem razões mais fortes no mundo real para suportar este crescimento dos preços. A primeira delas está no crescimento da demanda por alimentos, que se localiza principalmente nos países em desenvolvimento e é potencializada pelo crescimento da economia chinesa, que gera grande parte do aumento da demanda pelas commodities de qualquer tipo (a China consome hoje mais petróleo do que os Estados Unidos, por exemplo). Outro fator refere-se a frustrações de safras que ocorreram em diversas partes do mundo, em países-chave para o abastecimento regional ou mundial. Neste caso temos as seguidas frustrações de safra de açúcar na Índia (grande produtor e exportador mundial) e de trigo na antiga União Soviética, que é chave para o abastecimento europeu, que por sua vez desencadeou o crescimento de preços do milho, como efeito colateral.
Para finalizar, o crescimento da produção de etanol a partir do milho gera uma pressão crescente sobre a produção americana deste cereal, reduzindo os estoques e criando um ambiente propício para incertezas sobre a capacidade da próxima safra americana em atender esta demanda. Como os estoques estão muito baixos em relação ao consumo interno (a relação estoque/consumo está em 5,5%, a mais baixa desde 1995/96), cada nova safra é um recomeço.
No caso específico do milho, os preços na Bolsa de Chicago estão ao redor de US$ 6,50 por bushel (algo ao redor de US$ 256,00 por tonelada) e apenas cerca de US$ 1,00 abaixo do nível recorde de 2008. Com o crescimento do preço do barril de petróleo, que aparentemente se firmou acima do patamar dos US$ 90,00 após ficar um longo período abaixo dos US$ 80,00, aumenta a viabilidade econômica à produção de etanol a partir do milho e, consequentemente, aumenta a demanda pelo milho para esta finalidade (a previsão é de um crescimento de 7% no consumo do milho para produção de álcool neste ano agrícola em relação a 2009/10).
Fora dos Estados Unidos, a grande definição está por conta da situação climática na Argentina. Após um início muito desfavorável, nas últimas semanas algumas chuvas ocorreram, o que pode reduzir o prejuízo em termos de rendimentos nas lavouras de milho. Entretanto, perdas generalizadas de produtividade são previstas, chegando a até 50% em algumas regiões (o que poderá anular o crescimento em cerca de 11% verificado na área plantada). Este acontecimento, no país que é o segundo maior exportador de milho do mundo, se constitui em motivo de alerta nos mercados mundiais. Isto é particularmente grave se considerarmos que o abastecimento do mercado internacional no primeiro semestre recai principalmente sobre o hemisfério Sul, até que a safra do hemisfério Norte comece a ser colhida, no segundo semestre. Os tradicionais embates entre os agricultores, que tentam aproveitar as excelentes condições de preços no mercado internacional comercializando o que foi colhido na safra passada (e de certa forma compensar os prejuízos potenciais desta safra) e o governo, que tenta controlar a subida dos preços internos retendo parte da safra passada para atender ao mercado interno já estão em andamento. Como o governo argentino tem utilizado as mais variadas medidas para segurar a inflação (inclusive alterando o processo de cálculo dos índices inflacionários) novas restrições poderão ser impostas à exportação de milho na Argentina.
Situação Interna
No Brasil a safra de verão de milho está bem encaminhada e a expectativa de problemas climáticos, por conta da influência do La Niña, não se concretizou nas principais regiões produtoras do Sul do Brasil. Nas principais regiões produtoras do Rio Grande do Sul, as condições foram relativamente favoráveis, o mesmo ocorrendo nos outros estados do Sul do Brasil, que teriam maior potencial de serem afetados de forma negativa por restrições climáticas.
Nos estados da região Sul, a redução esperada na produção se verificará por conta da redução na área plantada. No caso específico do Paraná, a área com milho recuou em cerca de 17%, segundo a Conab, em função dos baixos preços vigentes na época do plantio.
Embora não ideal, em decorrência da redução na área plantada, esta situação na região Sul fornece certa tranquilidade ao abastecimento interno no próximo ano, visto que esta região é a principal consumidora de milho no Brasil e já começa 2011 com uma sinalização de normalidade no abastecimento.
A próxima definição está por conta da safrinha, que deverá ter seu plantio adiado em função do atraso na implantação das lavouras de soja no verão, principalmente em Mato Grosso (no Paraná, o início do plantio da safrinha de milho já se iniciou).
A novidade são os preços do milho que têm sido afetados pelos preços internacionais e se encontram em um nível elevado em relação ao verificado no ano anterior. Esta situação tende a se modificar na medida em que a nova safra vai chegando ao mercado (no Rio Grande do Sul e Santa Catarina os preços já iniciaram o processo de queda).
Estes preços altos são decorrência da evolução dos preços internacionais, mas também das medidas do Governo Federal que possibilitaram o escoamento da safra do Centro-Oeste. Se em Mato Grosso as medidas do governo foram mais importantes, a situação do mercado internacional possibilitou que estados como Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e Goiás, que não são exportadores tradicionais de milho, viabilizassem embarques do cereal para o exterior.
Ao final do ano, o quantitativo superior a 10,7 milhões de toneladas de milho foram exportadas, o que se constituiu na segunda maior exportação de milho do Brasil.
Em resumo, a situação do abastecimento de milho no Brasil se mostra bastante favorável. Vamos esperar a safrinha, que começa a ser definida em meados de fevereiro.