La Niña e greening tiram potencial de super produção de laranja do Brasil no médio prazo
A safra de laranja do Brasil está estimada em 316,95 milhões de caixas, de acordo com o primeiro levantamento divulgado pelo Fundecitrus. Apesar da safra ser considerada como recuperação para o setor, os números continuam chamando atenção já que há poucos anos o Brasil tinha capacidade e produzia mais de 350 milhões de caixas.
Segundo dados do Fundecitrus, a última vez que o Brasil produziu cima de 350 milhões de caixas foi no ciclo 2019/20. As condições climáticas fora o ideal, assim como a migração do produtor para culturas mais rentáveis neste momento, como por exemplo soja e milho, estão entre os fatores que justificam a queda na produção.
Para Vinicius Trombin, Coordenador da Pesquisa de Estimativa de Safra do Fundecitrus, o grande desafio do produtor hoje continua sendo as condições climáticas, já que os modelos mais recentes mantêm a atuação do evento climático nos próximos meses.
Fazendo um comparativo com a última grande safra, Vinicius explica que em termos de número de árvores o parque citrícola ainda tem a mesma realidade, porém o rendimento da safra tem sido duramente afetada já que sem a precipitação necessária, os frutos vêm apresentando tamanho abaixo do ideal, além da taxa de queda que também aumentou no último ano em decorrência do greening.
"Estamos projetando uma safra de La Niña e a atuação do fenômeno até o final do ano, com isso o volume de chuva é menos que a média histórica e os frutos não crescem muito, enquanto a gente estiver com atuação do La Niña é realmente acho difícil uma safra superar os 350 milhões de caixas", afirma.
A projeção para este ciclo é de um fruto médio com 158 gramas, em anos de alta produção os frutos chegaram a atingir tamanhos de 180 gramas. "Se projetar um número maior de 174 gramas, por exemplo, se a gente tivesse esse fruto nessa safra, já teríamos uma safra em torno de 350 milhões de caixas, mas não vai chegar, a safra é de La Niña, não vamos ter esse fruto. Tem muito fruto na árvore, mas não vai chegar no tamanho fora do comum. Geralmente safras grandes, também são de frutos maiores", acrescenta.
O parque citrícola ainda se recupera da seca prolongada e até de geadas, e Vinicius destaca que o investimento na tecnologia de irrigação pode ser bom aliado do produtor. "O que conta a favor é a área irrigada, e essa área dos pomares que já estão em produção somam 39%. E na irrigadas os frutos também são maiores", complementa.
Os dados do Fundecitrus mostram que o produtor de laranja vem de fato investindo na tecnologia, sendo uma tendência observada pelo setor. Em 2015 apenas 25% da área irrigada, em 2018 o número passou para 30% e agora se aproximam dos 40%.
"As safras de 350 milhões de caixas ficam mais difíceis? Ficam por conta dessas condições climáticas que nós estamos tendo, mas falar que a gente não vai mais produzir uma safra de 350 milhões, eu não diria isso, mas elas estão mais distantes, mas tem outros pontos que são positivos, principalmente a área irrigada", complementa.
Os números mostram o empenho do produtor no investimento, porém vale lembrar que a irrigação, além do custo elevado para uma cadeia fragilizada com o clima, não é uma opção para todas as áreas de produção, o que também vem promovendo, aos poucos, mudanças nas áreas de cultivos com o produtor buscando por áreas possíveis de receber a tecnologia, mas principalmente com condições menos favoráveis para incidência do greening.
"Tem produtos procurando outras áreas, eles acabam migrando de fazenda que tenham condições mais favoráveis, tanto em relação à água, mas também ao grenning. Se ele tem condição de ir para outra região, ele está mudando, é o que fez por exemplo o plantio aumentar no sudoeste de São Paulo. Os pomares em formação, a maior parte deles está na região sudoeste, que tem região mais favorável", complementa.
INDÚSTRIA
Do lado da indústria, Ibiapaba Netto - diretor executivo da CitrusBR destaca que vem acompanhando a redução da produção brasileira nos últimos anos, e apesar do cenário entre oferta e demanda ser de equilibrio neste momento, o estado é de atenção principalmente quando se fala em produtores migrando para o cultivo de outros produtos.
"É possível uma safra acima de 350 milhões, mas hoje precisaria de condições muito especiais para isso. É possível? É. É plausível? Neste momento não. Há duas safras nós estavámos em uma safra de quase 400, veja a mudança de patamar e hoje a gente usa 350 e sabe que vai ter que acontecer muita coisa para isso realizar. O patamar do que a gente considera safra grande mudou", comenta.
As commodities em alta, assim como o câmbio tem incentivado a produção de grãos no país, já que o produtor tem a oportunidade de entrar em um ciclo que permite até a produção de duas safras no ano. "Isso é uma coisa que não está no controle da cadeia do suco de laranja, assim como não está no controle de nenhuma outra cadeia, está no controle do produtor. Algumas regiões do estado de São Paulo, que estão se tornando mais incidentes de greening, vai ficando mais complicado de manter a laranja", comenta.
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O greening é a principal doença da citricultura e que inclusive devastou a produção da safra da Flórida, antes referência para o Brasil quando se fala em produção de laranja. Ibiapa alerta, no entanto, que o grande diferencial é que enquanto nos Estados Unidos o produtor não tem outra opção de plantio nessa área, no Brasil é possível implementar outras culturas, inclusive além dos grãos, partindo para cana-de-açúcar e gado.
"O portifólio de produtos que o produtor de São Paulo tem, é diferente do portifólio que o produtor da Flórida tem, então isso acaba trazendo uma concorrência para cadeia do suco de laranja que é bastante considerável", complementa.
Pontua ainda que a diminuição do potencial produtivo caminhou junto com a queda na demanda, o que trouxe condição de estabilidade entre as duas pontas da citricultura. "É um ponto de atenção, obviamente as indústrias estão olhando e no final das contas acho que é natural que se olhe isso tanto para o lado do físico, quanto pelo lado da oportunidade", acrescenta.
MERCADO INTERNO
Para Antônio Carlos Simonetti, presidente da Associação Brasileira de Citrus de Mesa, os números mais recentes indicam leve recuperação na produção de ano, mas a atualidade continua sendo bastante desafiadora para o Brasil produzir em patamares mais elevados.
"Os pomares estão passando por momento bem delicado de aparecimento de greening. Qualquer produtor que você conversar vai te falar que está assustado com a presença do greening. Na citricultura não é fácil mais passar das 300 milhões de caixas, creio que para o próximo ano não cresça muito. Todo mundo está parado de investimento, ninguém está investindo em nada de plantio por conta dos altos custos", afirma.
Comenta ainda que o setor está praticamente paralisado seja nas vendas, mas também na iniciativa de realizar novos plantios. "Todo o processo está difícil, então eu creio que no curto ou médio prazo, nós não temos uma produção de citros tão grande", complementa.
Antônio também destaca a migração para outras culturas como ponto de atenção. "Cada vez que passa está diminuindo as vendas, produtor está sem dinheiro, é questão de tempo para normalizar tudo também. Tudo isso vem retraindo um pouco. Acredito que vá acontecer como em outras regiões, antes de produção de citros e acabou virando cana porque não conseguia produzir mais sem ser pomar irrigado", afirma.
GREENING NO BRASIL
De acordo com o último relatório divulgado pelo Fundecitrus,regiões de Limeira – berço da laranja em São Paulo –, Brotas e Porto Ferreira, localizadas no centro-sul do estado, apresentam incidências muito altas de greening, a mais preocupante doença da citricultura mundial atualmente, de acordo com levantamento anual realizado pelo Fundecitrus – Fundo de Defesa da Citricultura.
Enquanto a média no parque citrícola é 22,37%, em Limeira a doença já afeta 61,75% das plantas; em Brotas, 50,40%; e em Porto Ferreira, 37,84%. Nas regiões de Avaré e Duartina, ao sudoeste do estado, as incidências são consideradas altas, 29,41% e 26,15%, respectivamente. Essas cinco regiões reúnem 51% das laranjeiras do cinturão citrícola de São Paulo e Triângulo/Sudoeste Mineiro, a principal área produtora de laranja e suco de laranja do mundo.