Soja & Milho: Safras cheias nos EUA ainda serão insuficientes para equilibrar relações de oferta e demanda

Publicado em 29/04/2022 17:27 e atualizado em 29/04/2022 18:09
Plantio na Dakota do Sul - Foto de Chet Edinger

A nova safra de grãos do hemisfério norte tem estado muito em evidência nas últimas semanas, em especial a dos Estados Unidos. O mercado global espera por uma produção saudável e uma colheita cheia em um dos maiores exportadores mundiais de grãos para que haja um começo de equilíbrio nas relações de oferta e demanda. No entanto, o início do plantio da temporada 2022/23 norte-americana já sinaliza algumas preocupações com o clima no Corn Belt, que se unem à crise de insumos que alcança produtores rurais no mundo todo, e continuam dando espaço a uma incerteza crescente sobre a oferta de alimentos. 

O plantio desta nova safra registra, de fato, alguns atrasos em função do clima adverso em pontos específicos do cinturão, porém, Carlos Cogo, sócio-diretor da Cogo Inteligência em Agronegócio, lembra que é nos Estados Unidos que está a maior e mais moderna frota de máquinas agrícolas que pode compensar esse atraso e trazer a semeadura de volta a uma 'condição de normalidade'. 

"Eu prefiro pensar numa safra normal. Mas, mesmo com uma safra normal, que vai ser 125 milhões de toneladas de soja e 360 milhões de milho, não é suficiente para recompor estoques globais e vai ficar ainda mais limitado o estoque global final de passagem para a próxima temporada e isso vai continuar criando um fortalecimento para as cotações futuras", afirma Cogo. 

O consultor completa dizendo que "uma safra do hemisfério norte, incluindo China, que não tem grandes capacidades expansão, ou o Canadá, que tem mais relevância no trigo, incluindo os EUA, não terá capacidade de recompor isso. Vamos ficar ainda na expectativa da próxima temporada da América do Sul, além desse risco adicional de termos que conviver pelo terceiro ano com um La Niña". 

Diante dessas preocupações é que o consultor de mercado Aaron Edwards, da Roach Ag Marketing, afirma que as cotações tanto da soja, quanto do milho podem alcançar e superar os recordes de 2012, com as realidades que se desenharem para a nova safra americana responsáveis pelo rumo que os preços tomarão. Ainda segundo ele, os próximos dez dias serão fundamentais. 

"O plantio está atrasado e eu não acho que os avanços do plantio desta semana, quando sair o relatório da segunda-feira, serão suficientes para alcançarmos a média dos últimos cinco anos. E até o dia 9 de maio, no milho, tem que estar 50% plantado, na minha concepção. Se não chegarmos a esse marco, aí começará a conversa de redução do potencial produtivo do milho nos EUA", diz. "Os EUA podem plantar rápido, mas o clima não está favorecendo, os mapas para os próximos dias é preocupante"

Para a soja, a janela de plantio se estende um pouco mais, com o período ideal chegando até a primeira semana de junho, como explica Edwards, mas que também precisa de condições melhores de clima para avançar com força e segurança. 

"O clima não favorece, é um ano que não pode ter problemas e em 10 dias podemos falar que o plantio está atrasado e que está perdendo potencial produtivo", afirma. "O mundo não pode ter falha, assim como na safrinha brasileira", completa. 

O QUE ESPERAR DO CLIMA NO CORN BELT?

O atual momento releva uma clara irregularidade das condições do tempo nas principais regiões produtoras do cinturão norte-americano. De um lado, há problemas no curto prazo, enquanto de outro há preocupações no médio e longo, situações que podem trazer condições diferentes para regiões diferentes. 

"Estamos vivendo no mercado climático norte-americano, no curto prazo, um cenário de excesso de umidade que tem impedido o progresso do plantio e esse é um grande problema no curto prazo. Porém, nossa maior preocupação aqui na Pátria é para a permanência de um padrão mais seco, em decorrência do La Niña, para junho, julho e agosto, quando a soja e o milho estarão transitando dos estágios vegetativo para reprodutivo. Então, estamos vendo sim um cenário preocupante para o verão norte-americano", explica Matheus Pereira, diretor da Pátria Agronegócios. 

Os mapas abaixo, disponibilizados pela consultoria, mostram que estados-chave na produção de grãos dos Estados Unidos, como Nebraska, Iowa, Illinois, Indiana, Missouri poderão sofrer com chuvas abaixo da média em um período bastante crítico para as lavouras, e quando a umidade é determinante para os campos. 

Mapas: Pátria Agronegócios

Para maio, os mapas sinalizam um excesso de chuvas, principalmente, para a região do Delta do Mississippi - o que pode ser um complicador - enquanto as demais áreas ainda não sinalizam preocupações ainda generalizadas. 

"Se tivermos um excesso de chuva agora no mês de maio para o cinturão agrícola teremos grandes complicações (...) Já os mapas de longo prazo trazem um padrão mais seco, e isso é, não só, um sinal favorável no curto prazo, mas também é a bala de prata para a safra dos EUA no longo prazo, uma vez que esse padrão estabelecido em maio pode perdurar por junho, julho e agosto, e aí sim teremos grandes problemas", complementa Pereira. 

CUSTOS X RESULTADOS

Assim como nos demais países produtores, nos Estados Unidos os elevados custos de produção - que estão nos mais altos patamares em mais de 20 anos - são uma enorme preocupação para os produtores. E ainda como já explicou Carlos Cogo, antes mesmo do início do plantio por lá, os produtores norte-americanos foram os primeiros a sentir esse momento dos valores historicamente altos dos insumos. 

Um levantamento feito pelo analista de fertilizantes da Agrinvest Commodities, Jeferson Souza, mostra que a relação de troca entre o milho e a ureia está bastante alto, fora do intervalo histórico, o que, inclusive, pode ajudar no entendimento das mais recentes estimativas do USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos) de um expressivo aumento na área de soja em detrimento do cereal.

O gráfico abaixo mostra, na linha mais escura, a atual relação de troca entre milho e ureia:

Gráfico: Agrinvest Commodities

"A área de milho poderá ter uma redução de 3,9 milhões de acres, enquanto a soja crescerá 3,8 milhões, a maior mudança entre soja e milho desde a temporada 2007/08. Para a soja, este é o maior aumento anual desde 2019/20, e para o milho, a maior queda anual desde 2017/18", explica Souza.

Apesar dessa relação, o retorno financeiro do milho - e também da soja - melhorou nas últimas semanas, dada a puxada dos preços de ambos na Bolsa de Chicago. O atraso do plantio, a guerra entre Rússia e Ucrânia - que estimula uma demanda maior de milho dos EUA e do Brasil - deu espaço aos avanços, os futuros do cereal acumulam uma alta de quase 40% no ano na CBOT - e melhorou o retorno financeiro dos produtores americanos. 

Ainda de acordo com a Agrinvest, como explicou seu analista de mercado, Marcos Araújo, o lucro estimado para o milho nos EUA é de, aproximadamente, US$ 1297,90 por hectare, enquanto o da soja chega a US$ 541,24. 

O milho mostra agora números bem melhores do que os da soja, porém, essa relação já esteve invertida, com o cereal, inclusive, dando retorno negativo para o produtor americano. 

Por: Carla Mendes | Instagram @jornalistadasoja
Fonte: Notícias Agrícolas

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