Parceria entre consórcio de pesquisa do café, técnicos e produtores eleva produtividade no Sul de Minas
Os resultados dos dez anos de parceria do produtor Adolfo Vieira Ferreira, da Fazenda Passeio (Belo Monte-MG), com o Consórcio Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento do Café (CBP&D/Café), saltam aos olhos de quem visita os 170 hectares cultivados com café na região montanhosa de Belo Monte-MG, sul de Minas Gerais. A Fazenda Passeio é uma das unidades de validação de tecnologias do CBP&D/Café e também avança em produtividade graças ao conhecimento dos técnicos da região, formados pelo Instituto Federal do Sul de Minas Gerais (Muzambinho-MG), antiga Escola Agrotécnica Federal de Muzambinho, fundada em 1953.
O IF Sul de Minas sediou, em 25 de maio, o “Encontro de pesquisadores, estudantes, técnicos e produtores de cafés especiais”, oferecido em conjunto com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig) e Guy Carvalho Consultoria. Encontros com produtores e técnicos “retroalimentam a pesquisa, é ótima oportunidade de captar as necessidades do setor da cafeicultura”, salienta Gabriel Bartholo, chefe geral da Embrapa Café (Brasília – DF).
O produtor Adolfo Vieira, presidente da Associação Brasileira de Cafés Especiais, conta que nos últimos 10 anos, quando passou a adotar um conjunto de tecnologias transferidas pela Embrapa e parceiros, conseguiu reduzir o uso de defensivos químicos e fungicidas em 30% e viu a produtividade na fazenda saltar do patamar de 30 a 35 sacas de 60 kg por hectare para em torno de 45 sacas. A produtividade alcançada por Adolfo é quase o dobro da média nacional de 24,3 sacas por hectare, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). “Há 8 anos uso braquiária nas entrelinhas da lavoura de café, e o uso do fósforo também contribuiu para ter uma planta mais equilibrada”, ressalta.
O manejo com braquiária nas entrelinhas propicia reter mais água no solo e, por consequência, aumenta a proliferação de microorganismos benéficos para as plantas, explica o pesquisador Omar Rocha, da Embrapa Cerrados (Planaltina - DF), que apresentou no Encontro resultados de experimentos sobre uso da braquiária como planta de cobertura nas entrelinhas do cafeeiro. “É uma prática conservacionista que contribui para aumentar a colonização radicular por fungos micorrízicos arbusculares”, comenta Rocha.
Ênfase na qualidade sensorial do café
Para o produtor Adolfo Vieira, os ganhos com as tecnologias adotadas também são percebidos na qualidade da bebida. “A planta mais sadia também propicia grãos de melhor qualidade na xícara”, salienta. O produtor conta que, há três anos, instalou um laboratório de qualidade sensorial na própria fazenda, prática essencial para quem almeja focar no mercado de cafés especiais. “A qualidade, em termos de corpo, doçura e acidez da bebida, é muito importante. Hoje de 50 a 60% da minha produção é de cafés especiais”, comenta Adolfo.
Quem também segue o mesmo caminho é a produtora Carmem Lucia Brito, das Fazendas Caxambu e Aracaçu, em Três Pontas-MG. “Às vezes uma cultivar se sai muito bem no campo em termos de produtividade, mas não tem tanta qualidade na xícara”, salienta. Para avaliar melhor quais cultivares plantar, e também para testar novas técnicas de manejo, a produtora montou há 3 anos uma área experimental de 1 hectare em uma das fazendas.
“O microclima interfere muito na produtividade e qualidade. Materiais que não vão bem em áreas experimentais da Epamig, por exemplo, podem se sair muito bem na fazenda. E cada produtor diz uma coisa sobre cultivares, então estou diminuindo minha margem de erro”, destaca Carmem Lucia para justificar a importância de ter uma área experimental na própria fazenda.
A última novidade nas lavouras de café da produtora, resultante dos testes na própria área experimental, é a cultivar Arara da Fundação Procafé, introduzida neste ano. A produtora diz tomar a decisão do que plantar baseada no alinhamento das características da cultivar avaliada na fazenda com aspectos valorizados pelos compradores. “É óbvio que preciso de produtividade, mas às vezes tenho uma cultivar que me dá uma bebida única que meu cliente vai comprar”, ressalta.
A necessidade de preencher ao máximo os anseios dos compradores faz a produtora apostar no cultivo por microlotes nos 210 hectares cultivados com café nas duas fazendas. “Tenho cultivares de 100 procedências”, conta. Ao apostar em tamanha diversificação, a produtora oferece o diferencial de atender cada detalhe em termos de qualidade sensorial exigido pelos compradores de cafés especiais.
“A grande massa dos produtores ainda não faz avaliação física e sensorial do café. Quem faz é o comprador, mas avaliar dentro da fazenda é importante e deve ser incentivado para os pequenos e médios produtores”, destaca o professor José Marcos Mendonça, do Laboratório da classificação de café do IF Sul de Minas.
O professor ressalta que ao apresentarem a descrição sensorial para os compradores, os produtores de café podem conseguir ampliar a margem de lucro. Mendonça sugere potencializar as características das regiões produtoras de café do Brasil via descrição sensorial. A valorização das diferenças sensoriais de cada região permitiria ao País ir além do selo “Cafés do Brasil” e apresentar ao mercado consumidor global a riqueza da diversidade dos cafés nacionais.
A força do Sul de Minas
No primeiro quadrimestre de 2017 o Brasil exportou US$ 1,8 bilhão em café, conforme dados do Agrostat do Ministério da Agricultura. Minas Gerais, com US$ 1,19 bilhão exportado, respondeu por 65,8% das exportações brasileiras de café no primeiro quadrimestre.
“É uma região caracterizada pelo empreendedorismo dos produtores e técnicos. O conhecimento científico aplicado aqui se transforma em inovação. A melhor coisa da pesquisa é ver a casa pronta, o impacto concreto da pesquisa na vida das pessoas”, salienta Antônio Guerra, chefe de pesquisa da Embrapa Café.
Para a produtora Carmem Lucia, a força do sul de Minas está na união de diferentes agentes da cadeia do café. “É preciso o produtor acreditar na pesquisa, não podemos ficar só dentro da porteira. Tem que ir em busca da tecnologia e testar”.