Mercado de açucar: "Frágil no curto, robusto no longo", diz Arnaldo Luiz Correa
O mercado futuro de açúcar em NY encerrou a semana com o contrato para vencimento julho/21 negociado a 17.61 centavos de dólar por libra-peso, 10 pontos de queda em relação à semana anterior. O destaque é para os contratos futuros com vencimento mais longo cujos preços apreciaram durante a semana em até oito dólares por tonelada.
Interessante notar que a curva de preços começa a ceder lentamente nos vencimentos mais curtos e valorizar nos vencimentos mais longos. Penso que isso tem a ver com a perspectiva de melhores preços em centavos de dólar por libra-peso lá adiante e pressão nos vencimentos mais curtos por conta da rolagem dos fundos e da falta de atividade no físico.
Nada foge da lógica dos mercados. O Brasil maximizou a produção de açúcar que, mesmo com a seca, não vai trazer desconforto na disponibilidade do produto. Tudo indica que vamos ter um superávit mundial trazendo ligeira pressão para o curto prazo. Um exemplo disso: os spreads julho/outubro e outubro/março apresentam um carrego equivalente a 3% a.a. contrariando a narrativa de falta de produto no físico e acendendo um sinal de alerta para os fundos que estão comprados em 238,000 lotes, mas que raramente ficam assim posicionados num mercado em carrego.
O normal para os fundos é ficarem vendidos numa curva em carrego e comprados numa curva invertida. Em outras palavras, dependendo do andar da carruagem não me surpreenderia ver os fundos virarem a mão para vendidos à descoberto. A pergunta que não quer calar é: quem poderia dar liquidez para eles caso decidam sair da posição comprada, vendendo esse volume de lotes? É algo a se pensar e temer.
Então, temos um mercado com clara perspectiva neutra para ligeiramente baixista no médio prazo, mas notadamente altista no longo prazo. O preço médio do fechamento de NY para a safra 23/24 (maio/23 até março 24) é pouco abaixo de 15 centavos de dólar por libra-peso. Acreditamos que vamos subir pelo menos 150 pontos. O que dá respaldo a essa análise no longo prazo é que a Índia vai olhar cada vez mais para dentro e menos para o mercado externo, numa mudança de política que só traz benefícios àquele país.
O mercado pode sair do controle em um par de anos. Explico: temos uma demanda reprimida de combustíveis. O consumo (gasolina equivalente) caiu 5% em comparação com o acumulado de doze meses anteriores, 49.6 contra 52.2 bilhões de litros, representando um enxugamento de 2.6 bilhões de litros. Antes da pandemia, em fevereiro de 2020, o acumulado de doze meses apontava 54.2 bilhões de litros e a curva indicava um crescimento anual de 3.86%. Se não houvesse a pandemia, em tese, o consumo para abril/21 estava projetando 56.6 bilhões de litros, ou 7 bilhões de litros a mais do que hoje.
Alguém consegue imaginar o que causaria aos preços do etanol/açúcar se esse consumo se materializasse? E ainda assim, com consumo menor, o mercado de hidratado está no valor nominal mais alto de todos os tempos. O ponto que gostaria de firmar é que temos real possibilidade de preços muito firmes em função de uma eventual recuperação da economia, um consumo reprimido que pode acelerar a demanda de combustíveis e quem sabe recuperar os níveis anteriores à pandemia em 2-3 anos, um setor cuja expansão de área é praticamente nula e ainda vai contar com a Índia enxugando a disponibilidade de açúcar para a exportação.
Não se trata aqui que desmesurado otimismo, mas de simples aritmética. O mundo do açúcar pode estar no limiar de passar para um outro estágio em termos de preço de suporte. O consumo crescente de 1% ao ano- uma taxa conservadora - para os próximos anos vai demandar 11 milhões de toneladas de açúcar a mais em 5-6 anos.
Mas, obviamente, temos que ficar de olho nos eventos exógenos. Naquilo que pode dar (muito) errado. Seria impossível esgotar a lista, mas como um exercício de futurologia podemos ter: a) uma terceira onda de covid-19; b) o derretimento dos preços do petróleo; c) a queda do consumo mundial; d) instabilidades políticas no Brasil em 2022; e) mudança na formação de preço da gasolina distorcendo a arbitragem com o etanol, para mencionar apenas algumas.
O mercado comenta que pelo menos 500,000 toneladas de açúcar de exportação, com preços fixados, não serão entregues na data acordada e foram roladas para o ano que vem. Em substituição, as usinas preferiram fabricar etanol que hoje a aproximadamente 17.25 centavos de dólar por libra-peso, quase 400 pontos a mais do que a média de fixações das usinas para a 21/22.
A preocupação com os efeitos da seca atual na próxima safra tem colaborado para que algumas usinas simplesmente decidissem parar de fixar os preços do açúcar para exportação para a safra 22/23. Aversão ao risco de eventual chamada de margem também contribuiu para a decisão. No entanto, um ponto merece observação: talvez o real continue se valorizando e as boas fixações em reais por tonelada vão necessitar preços em centavos de dólar por libra-peso mais altos para que compense o abandono da estratégia.
Nosso ponto de vista continua sendo o de fixar preços em reais por tonelada e concomitantemente comprar o volume fixado equivalente (ou pelo menos o % de cana de terceiros) em calls (opções de compra) com preço de exercício 200 pontos acima do nível de fixação.
O interior de SP teve algumas chuvas esparsas variando entre 6 e 30 mm, ainda insuficiente para fazer frente ao enorme déficit hídrico sofrido pelos canaviais. Nada para ficar muito otimista.
Estão abertas as inscrições para os nossos dois já consagrados Cursos: o Essencial de Futuros em Commodities Agrícolas (de 16 a 20 de agosto) e o Avançado de Opções em Commodities Agrícolas (de 20 a 24 de setembro). Não percam. Depois só em 2022.
Um bom final de semana a todos
Arnaldo Luiz Corrêa