Queda nos preços do açúcar e do petróleo minam recuperação de usinas endividadas

Publicado em 12/07/2017 17:59

Por Marcelo Teixeira

SÃO PAULO (Reuters) - Uma queda acentuada nos preços do açúcar e do petróleo nos últimos seis meses está diminuindo as esperanças de recuperação financeira para várias usinas brasileiras e pode dificultar negociações de aquisições de empresas no setor, segundo especialistas da indústria.

Os preços do açúcar bruto em Nova York estão pairando ao redor dos 13 centavos de dólar por libra-peso, uma queda de 40 por cento ante o quarto trimestre de 2016, em um nível que analistas e usineiros dizem ser próximo aos custos de produção no centro-sul do Brasil.

Ao mesmo tempo, a atual queda nos preços do petróleo levou a Petrobras a reduzir os preços da gasolina repetidamente no mercado interno, fazendo com que usinas também reduzam os valores do etanol, uma vez que os dois competem na bomba pela preferência do consumidor.

A pressão de valores menores para açúcar e etanol pode acabar com a incipiente recuperação financeira de muitas usinas brasileiras iniciada durante o déficit global de açúcar entre 2015 e 2016. Ela também pode desacelerar as negociações entre usineiros e potenciais investidores e levar a mais fechamentos de empresas endividadas no setor sucroalcooleiro.

"A queda no preço de fato afeta fortemente a nossa liquidez, isso é inegável", disse Tony Rivera, diretor da Renuka do Brasil, companhia controlada pela indiana Shree Renuka Sugars.

A Renuka tem quatro usinas no Brasil e é uma das dezenas de empresas que pediram recuperação judicial. A companhia planeja vender duas de suas usinas para pagar dívidas e aumentar o capital de giro, mesmo em uma escala menor. Mas Rivera diz que os preços do açúcar e do etanol também impactam esse plano.

"De um lado você afugenta quem ainda não está muito convencido em investir no negócio. E, de outro, você traz o lance para um valor geralmente mais baixo do que o desejado", disse ele à Reuters.

ESTRAGOS

A combinação de preços fracos do açúcar e do etanol no Brasil entre 2010 e 2014 causou estragos no setor sucroalcooeiro, levando ao fechamento de dezenas de usinas e levando muitas outras a buscar recuperação judicial, um processo que está em andamento.

Na época, o governo manteve os preços da gasolina artificialmente baixos para lutar contra a inflação, consequentemente reduzindo as margens nas vendas de etanol, enquanto um excesso global de açúcar, que durou por anos, depreciou o valor do produto no mercado internacional.

A Unica, associação do setor, estima que 80 usinas pararam de funcionar no Brasil desde aquele período.

Os fechamentos enxugaram a capacidade de processamento de cana no centro-sul do país, limitando o crescimento da indústria. De acordo com a Unica, a produção de açúcar de 35,6 milhões de toneladas na última temporada ficou apenas um pouco acima do volume visto na safra 2010/11, de 33,5 milhões de toneladas.

Algumas das empresas mais duramente atingidas foram adquiridas por players com estruturas de capital mais sólidas.

A Glencore Plc, por exemplo, adquiriu a usina Guararapes para acrescentar uma segunda instalação no Estado de São Paulo em novembro, em um leilão judicial.

A Raízen, joint venture entre Cosan e Royal Dutch Shell Plc, anunciou acordo para comprar duas usinas da Tonon Bioenergia no mês passado, em um leilão similar.

A Renuka tentará vender sua usina de Brejo Alegre (SP) também em um leilão em 4 de setembro. Rivera disse que há empresas que estão analisando dados disponíveis para interessados na compra, mas não quis identificá-las.

Dario Gaeta, presidente executivo da TietêAgroindustrial, empresa que administra duas usinas do endividado grupo Ruette adquiridas em 2015 pela Black River Asset Management, acredita que atualmente há dezenas de usinas à venda, mas poucos compradores interessados.

DÍVIDAS, BUSCA POR CRÉDITO

O banco Itaú BBA estima que 15 por cento das usinas de açúcar e etanol brasileiras estão lutando com dívidas excessivas. A Archer Consulting, de São Paulo, estima a dívida total do setor em 86 bilhões de reais ao final da última safra.

"Quem chegou agora em março de 2017 numa situação saudável, permanecerá saudável. Mas para quem chegou numa situação com grandes desafios que não sejam operacionais, o preço atual com certeza não ajudará", afirmou o diretor de Agronegócios do Itaú BBA, Pedro Barreto.

A agência de classificação de riscos Fitch Ratings questionou as chances de recuperação das usinas problemáticas, como as que estão em recuperação judicial.

"Os resultados positivos dependem amplamente de um ambiente de operações bem-sucedido, preços mais altos do açúcar e do etanol e livre acesso a financiamentos, dada a natureza de capital intensivo do negócio", disse a agência em nota.

Mercados internacionais de bônus não oferecem muitas alternativas para as usinas brasileiras e o financiamento no mercado de capital doméstico não é uma opção realista para a maior parte das empresas do setor, acrescentou a Fitch.

Barreto vê as negociações para fusões e aquisições se esfriando na atual situação, uma vez que a distância entre o que os vendedores querem pelos ativos e o que os compradores estão dispostos a pagar tende a aumentar se os preços do açúcar caem.

(Reportagens adicionais de Luciano Costa e José Roberto Gomes)

Fonte: Reuters

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