Clima na Argentina e impactos sobre os preços do farelo deverão ser foco em dezembro para o mercado da soja
Dezembro começou com boas altas sendo registradas pelos preços do farelo de soja no mercado futuro norte-americano, com os traders já precoupados com algumas condições de clima chamam a atenção para a safra da América do Sul. São esperados dias sem chuvas em partes do Sul do Brasil e na Argentina e, no caso do segundo país há ainda atenção, uma vez que trata-se do maior produtor e exportador mundial não só de farelo, mas também de óleo de soja.
Respondendo por 45% das exportações totais de farelo de soja do globo, o país deverá terminar o plantio da safra 2021/22 com sua menor área plantada com a oleaginosa em 16 anos.
"Dezembro será o mês da soja", afirmou o risk managera da Hedge Point Global Markets, Victor Martins. Somente no acumulado de 1 a 30 de novembro, a posição dezembro do farelo saltou 5,99%, passando de US$ 329,10 para US$ 348,850 por tonelada curta, enquanto para o março/22 a alta acumulada foi de 3,74%, com o valor passando de US$ 328,80 a US$ 341,10/ton. De 30 de novembro a 1 de dezembro, altas de 2,21% e 1,64%, respectivamente.
A primeira sessão do mês já foi de ganhos expressivos e mais dias como estes deverão ser registrados, como explicou o executivo. Martins afirma que o retrato da Argentina será o grande fiel da balança para o farelo, ao menos por agora. o que ajuda a consolidar ainda mais um cenário já sólido de fundamentos.
"Se em novembro o destaque foi o "short squeeze" do mercado americano e a escassez de aditivos sintéticos na formação de preço do farelo, agora o clima argentino será o principal driver dos futuros na CME", diz. Ele destaca os últimos mapas climáticos apontando para dias de tempo quente e seco, com chuvas abaixo da média ou até mesmo sem chuvas, principalmente em províncias como Buenos Aires e Córdoba. Juntas, as duas respondem por 35% da produção total de soja argentina.
Dados divulgados nesta quinta-feira (2) pela Bolsa de Cereales de Buenos Aires apontam que o plantio da soja avançou sete pontos percentuais na última semana e que chega agora a 46,3% da área, a qual é estimada pela instituição em 16,5 milhões de hectares.
O boletim da bolsa mostra ainda que 12% dos campos argentinos de soja estão em condições regulares e 88% em condições boas ou excelentes. A melhora foi evidente na semana, uma vez que o reporte anterior trazia, respectivamente, 26% e 87%. Todavia, o cenário climático para os meses de dezembro e janeiro são os mais preocupantes, ainda segundo Victor Martins.
O modelo climático do NOAA, o serviço oficial de clima dos EUA, mostrou nesta quinta-feira uma previsão indicando 15 dias de estiagem para a Argentina, além do Rio Grande do Sul e partes do Mato Grosso do Sul. Entre os dias 10 e 18 de dezembro, o NOAA começa a indicar chances de chuvas na região, mas ainda com volumes abaixo do ideal e que podem acontecer de forma irregular em toda área. Veja nos mapas a seguir:
"O que vemos é que dezembro realmente será mais seco na região Sul, sobretudo para o Rio Grande do Sul. Os sistemas se formam, mas passam muito rápido, favorecendo as chuvas no centro-norte do Brasil, mantendo esse padrão que estamos vendo hoje", explicou o meteorologista do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia), Heráclio Alves.
Nas previsões ainda mais alongadas, ainda como explica o executivo, também chamam a atenção com a possibilidade um "padrão ainda mais hostil" e que poderia castigar as lavouras argentinas e promover uma queda no índice de campos em boas ou excelentes condições.
"A probabilidade de bons rendimentos de soja na Argentina é de apenas 1 em 10 durante o La Niña. Baseado em dados dos últimos 35 anos, onde houve a ocorrência do fenômeno precedido de forte quebra no país. As áreas produtivas possuem apenas 25% de chance de chuvas acima do normal em dezembro, quando o La Niña deverá se intensificar", completa.
Assim, o que se espera, caso todas estas previsões se confirmem e a safra da Argentina de fato registre perdas expressivas é uma menor oferta do derivado disponível no mercado internacional.
"A concretização do La Niña e uma eventual redução na produtividade da soja argentina acarretará em uma expressiva escassez de farelo, deslocando demanda para países como o Brasil e os EUA, os quais não possuem vocação primeira de exportar farelo, aumentando a necessidade de esmagamento no país e, consequentemente, provocando uma redução dos estoques e fortalecimento dos futuros da soja na CBOT", conclui o analista de mercado.
Entretanto, uma nova variável entrou nas análises nesta semana, com o CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) fixando a mistura do biodiesel em 2022 nos 10%, ao contrário do aumento gradativo que estava previsto em lei. A mistura fixa deverá fazer com que pelo menos algo entre cinco e seis milhões de toneladas de soja a mais deixem de ser processadas pelo Brasil no ano que vem, de acordo com os cálculos da Abiove (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais).
"Isso significa que estamos deixando de produzir um volume de farelo de soja que estaria beneficiando, diretamente, o consumidor brasileiro por meio da proteína animal. E o preço do farelo estaria menor se tivessemos uma demanda maior por biodiesel, porque estaríamos gerando mais farelo ao processar soja para a produção do óleo", explica o presidente da instituição, André Nassar, ao Notícias Agrícolas.
Veja a íntegra:
Ainda segundo Nassar, só a notícia de que o mercado de biodiesel no Brasil, em 2022, será B10 e nçao B13, como está previsto, sinaliza que não haverá o crescimento que estava sendo esperado no esmagamento e por isso também não haverá um aumento no volume de farelo, o que já está mexendo com os preços do subproduto.
"O prêmio do farelo sobe, afinal o Brasil exporta metade de sua produção de farelo e o importador deste produto, que achava que teria uma produção maior, está enxergando que haverá uma produção constante, isso faz o prêmio subir, o preço do farelo aqui também vai subir, quando poderíamos estar em um movimento inverso", acredita o executivo.
A ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal) trouxe, nesta quarta-feira (2), uma nota oficial sobre a medida do governo em fixar a mistura do biodiesel e deixou claro sua preoucupação, justamente, com os efeitos disso sobre a oferta de farelo.
"Menor oferta do produto poderá significar em alta de preços, gerando perda de competitividade e inflação ainda maior para o consumidor, em meio ao momento de maior alta de custos de insumos da história da avicultura e da suinocultura do Brasil. Cabe ressaltar que o farelo de soja já acumula mais de 60% de elevação nos preços praticados ao longo deste ano, em relação ao mesmo período do ano passado", diz a nota.
E para Vlamir Brandalizze, consultor da Brandalizze Consulting, os preços do farelo de soja tendem a continuar elevados diante de uma demanda forte e que deverá ser maior no ano que vem por parte das indústrias de ração. "E enquanto isso, o que se espera é um esmagamento parecido com o que se viu no ano passado", explica.
O levantamento da consultoria já mostra, inclusive, que o valor de referência do derivado para exportação - R$ 2009,73 por tonelada nesta quarta-feira (1) - era mais baixo do que a referência do mercado interno - R$ 2023,35/t.