Soja: China ainda precisa comprar volumes até final de 2021, mas demanda esbarra na crise energética e na suinocultura
O que virá do comportamento chinês para a demanda do país por soja está tomando boa parte das atenções do mercado da oleaginosa nos últimos dias. Os traders esperavam ansiosos pela volta da China às compras depois do feriado de sete dias da semana passada e a nação asiática parece ter, finalmente, reaparecido nesta quarta-feira (13). O USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos) informou uma nova venda de soja de 528 mil toneladas, sendo 330 mil para a China e 198 mil para destinos não revelados, o que se especula também ter sido comprado pelos chineses. Este é o primeiro movimento de compra da China no mercado norte-americano desde o último 27 de setembro.
Como relatou o analista de mercado Victor Martins, da Hedge Point Global Markets, a estatal Sinograin tem se mostrado "bem agressiva para compras nos embarques janeiro e fevereiro", tendo garantido ao menos dez navios de soja entre os portos do Golfo e do Pacífico, nos EUA, pelo menos cinco no Brasil para embarque março de 2022.
O mapa abaixo, da Refinitiv Eikon, mostra as embarcações de soja deixando os portos norte-americanos com direção à China. "Isso foi muito esperado. É possível identificar os navios saindo do PNW e do Golfo em direção à China e alguma coisa também para a Europa", diz a analista internacional de commodities, Karen Braund.
A notícia chega no mesmo dia, porém, dos dados sobre as importações de soja da China para setembro que mostram um volume 30% menor do que do mesmo mês de 2020. De acordo com dados da Administração Geral das Alfândegas, as compras do mês passado foram de 6,88 milhões de toneladas, contra 9,79 milhões de setembro do ano passado. Para o mês, este é o menor volume desde 2014.
Apesar da redução na comparação anual, o total ficou em linha com as expectativas do mercado, uma vez que as margens de esmagamento no país asiático, apesar da recente melhora, estão bastante comprometidas e a capacidade de processamento menor diante das limitações impostas pela crise energética. E os problemas com a energia já impõem desafios ao governo sobre a regulação deste mercado, o que também deverá refletir no complexo soja, ainda como explica Martins.
"Como o consumo de energia no país é superior a capacidade de geração, reguladores mudarão a política e flutuação de preços da energia elétrica para as empresas ao permitir o ajuste a livre mercado das tarifas, de forma a racionar a demanda de energia elétrica via preços, aumento que será repassado para as indústrias chinesas inevitavelmente em um primeiro ponto", diz o analista da Hedge Point.
Nos primeiros nove meses do ano, as importações chinesas de soja somam 73,97 milhões de toneladas, 0,7% em relação ao mesmo período do ano passado. E para outubro, as expectativas do mercado ainda apontam para embarques menores do que no mesmo mês do ano passado em função do atual cenário para as margens.
E este aumento, inevitavelmente, teria desdobramentos também sobre um aumento das margens de processamento nas indústrias locais, podendo ainda neutralizar a melhora recente das margens de esmagamento, "ao passo que quanto maior o processamento de soja, maior será o custo energético a ser repassado nas margens", complementa. E confirmado este cenário, a originação de soja poderia ser menor, uma vez que o custo logístico já representa mais de 77% do custo de originação.
LOGÍSTICA MAIS CARA
Ainda na análise de Victor Martins, é preciso colocar na conta uma logística mais cara também pesando no bolso dos compradores chineses, o que pode deixar as compras ainda mais cadenciadas. E não só o impacto será sentido pelo comprador, mas também pelo vendedor ao observar prêmios mais fragilizados. Somente em setembro, uma rota Santos - Qindao subiu mais de 7%, passando de US$ 65 para US$ 70,00 por tonelada.
"O aumento no custo de originação por parte do importador de soja foi transferido, quase em sua totalidade, para prêmios mais fracos FOB portos, o que, mais cedo ou mais tarde, pode ser absorvido pelo produtor, ao passo que a margem da originação começará a ser comprimida pelo aumento sazonal nos fretes marítimos somado ao aumento no custo do diesel", explica o analista.
E o encarecimento da logística parece estar longe de terminar. Afinal, as altas fortes do carvão e do gás natural puxam, imediatamente, os preços do petróleo, mantendo elevados os custos com transporte marítimo. Somente desde a metade de agosto até agora, a commodity já subiu mais de 30%, pode seguir sua trajetória de alta e mantém acesos os sinais de alerta.
"A maior necessidade de importação de carvão pela China tende a trazer competitividade no mercado de fretamento marítimo, competindo com graneleiros tipicamente voltados ao embarque de soja como os Panamax. Com a disparada na importação de carvão, o mercado de fretamento teve uma escassez em cargos Capesizes, tipicamente utilizados no transporte de minério de ferro e carvão, levando demanda a cargos alternativos para o escoamento dessa sobredemanda. O reflexo foi a disparada dos fretes marítimos ao longo de setembro", conclui Martins.
Em setembro, as importações chinesas de carvão já mostram um incremento de 76% na comparação anual e totalizaram 32,88 milhões de toneladas. No mês, o aumento das compras foi de 17% e marca, portanto, o maior volume importado neste ano. Em agosto, as importações da matéria-prima foram 35% superior a 2020. Nesta quarta-feira, os preços do carvão renovaram suas máximas históricas.
SUINOCULTURA EM MOMENTO DELICADO
Além dos problemas causados pela crise energética, o momento delicado sofrido pela suinocultura chinesa também pesa sobre o mercado local da soja. A demanda menos intensa pela oleaginosa começou a aparecer diante das margens mais estreitas observada entre os preços dos suínos.
De acordo com informações apuradas pela Reuters Internacional, Sichuan, uma das principais regiões produtoras da China, viu as margens despencarem cerca de 3 mil yuans neste ano, ou chegarem a menos de 285 yuans - US$ 44,22 - por animal na última terça (12). Com essa pressão, as margens da suinocultura chinesa marcaram suas mínimas desde junho.