Exportador de grãos do Brasil vê fracos negócios por câmbio e preço até o fim do ano
Por Gustavo Bonato
SÃO PAULO (Reuters) - O mercado exportador de grãos do Brasil se prepara para meses de uma virtual paralisação nos negócios fechados com produtores, com o país perdendo competitividade diante da queda do dólar e do recuo nos preços internacionais, que praticamente tira vendedores das negociações.
Dessa forma, a comercialização do que resta da safra passada e os negócios da futura devem ficar travados até o final do ano, disse um operador de grãos em São Paulo.
"Já comprei passagens de férias para setembro em função disso", afirmou ele, pedindo para não ser identificado.
O operador ressaltou que terá muito mais trabalho em janeiro, quando começa a colheita da nova safra brasileira.
O Brasil é o maior exportador de soja do mundo e na temporada passada foi o segundo maior de milho. Mas deverá enfrentar grande concorrência dos Estados Unidos nos próximos meses, com produtores norte-americanos esperando colher safras recordes, o que já se reflete nos contratos futuros da bolsa de Chicago, referência global.
Com o mercado em baixa, o produtor acaba optando por esperar, comentou o diretor da corretora Confiança Agrícola, Vanderlei Angonese, de Sinop (MT), importante região de soja e milho de Mato Grosso, o maior produtor brasileiro de grãos.
"Pode dar um pico (de preço) em novembro, dezembro, de repente em 10 dias faz um volume monstruoso (de vendas), mas tudo indica que não vai ocorrer esse pico", acrescentou ele, ressaltando que os preços oferecidos aos produtores despencaram.
Segundo o corretor, há algumas semanas os negócios com soja disponível na região de Sinop (safra 2015/16) ocorriam na faixa de 83 e 84 reais por saca. Atualmente, as ofertas são para 63 reais, com baixíssimo interesse dos vendedores.
Para negócios de venda antecipada da soja da safra 2016/17, as ofertas estão entre 57 e 58 reais por saca, para entrega em fevereiro e março de 2017.
"Mas a grande maioria dos negócios já fechados foi entre 68 a 70 reais", disse ele, referindo-se a contratos fechados em meados do primeiro semestre, quando as exportações brasileiras foram volumosas.
No acumulado do ano até julho, o Brasil exportou 44,5 milhões de toneladas de soja, alta de cerca de 10 por cento ante o mesmo período de 2015, ajudado pelo câmbio no início de 2016 --as projeções da indústria apontam para exportações anuais de 53 milhões de toneladas, com recuo de mais de 1 milhão ante a temporada passada.
CONCORRÊNCIA DOS EUA
Agora, as cotações no mercado interno têm sofrido pressão dupla, da queda do dólar e de recuos do milho e da soja na bolsa de Chicago, em antecipação à grande safra norte-americana a ser colhida nos próximos meses.
O dólar tocou nesta quarta-feira a menor cotação desde julho de 2015, a 3,11 reais, em linha com o exterior e após a aprovação no Senado da continuidade do processo de impeachment contra a presidente afastada Dilma Rousseff.
Já a soja vem sendo negociada abaixo de 10 dólares em Chicago, acumulando uma perda de mais de 15 por cento desde o início de junho, quando chegou oscilar perto de 12 dólares por bushel. Já o milho é negociado perto da mínima de 22 meses no mercado norte-americano.
"No caso da soja, se confirmando as projeções de safra dos EUA, não haverá necessidade de o importador pagar prêmio forte aqui, se a soja nos EUA poderá custar mais barato", disse um operador da mesa de originação de soja de uma trading asiática no Sul do Brasil.
No caso do milho, acrescentou ele, a situação é semelhante. As indústrias locais estão pagando um alto valor pelo produto neste momento, após uma forte quebra de safra no Brasil. Isso não deixa competitivas as tradings que trabalham para a exportação.
Governo e consultorias estão revisando para baixo as projeções de embarques de milho do Brasil, após muitos volumes negociados anteriormente para o exterior estarem migrando para o mercado local.
Dados da consultoria França Júnior ilustram a lentidão do mercado de soja. A comercialização da safra 2015/16 pelos produtores chegou a 85 por cento em 5 de agosto, avanço de apenas 2 pontos percentuais em um mês, mas em linha com a média dos últimos cinco anos para esse período.
Já as vendas antecipadas da soja de 2016/17 estão em 20 por cento do total esperado, com evolução de 3 pontos percentuais ao longo de julho, e abaixo do índice de 26 por cento verificado 12 meses atrás, segundo França Junior.