Especialistas concluem que 2020 trouxe novo patamar de preços que permanecerá em 2021 para produtores e consumidores

Publicado em 15/01/2021 15:56 e atualizado em 17/01/2021 14:35

Entre os quinze itens que mais tiveram aumento de preços em 2020, quatorze são ligados ao agronegócio. Se olharmos para os 100 itens com mais aumentos de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), apenas 20 são de outros setores, deixando 80% das maiores valorizações para a cadeia do agro.

O presidente da Federarroz (Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul), Alexandra Velho, conta que os preços pagos aos produtores pela saca de arroz saltaram de R$ 40,00 em fevereiro/março/abril para R$ 110,00 nos momentos de pico.

O presidente do Ibrafe (Instituto Brasileiro do Feijão e Pulses), Marcelo Eduardo Luders, também credita ao momento de isolamento social papel fundamental neste cenário, uma vez que estimulou as pessoas a consumirem mais produtos naturais em detrimento aos industrializados e fast foods.

“Na hora de se recolher as pessoas lembraram que o feijão é extremamente protéico, barato e passível de ser armazenado, seja em lata ou em grão. As pessoas estão entendendo que para ter saúde é preciso voltar a consumir produtos mais naturais”, pontua.

MAIOR ALTA NA SOJA E NO FEIJÃO

O INPC é elaborado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) com o objetivo de corrigir o poder de compra dos salários, através da mensuração das variações de preços da cesta de básica da população de mais baixa renda. As elevações do índice avaliam o quanto cada produto pesa no orçamento das famílias, abrangendo famílias com rendimentos de 1 a 5 salários mínimos.

Saiba mais sobre o INPC no site do IBGE

Entre os campeões de aumento no INPC durante o ano passado estão Óleo de Soja (1º com 104,08%), Feijão fradinho (2º com 81,44%), Arroz (3º com 75,36%) e Batata Inglesa (4º com 67,33). Ainda aparecerem nesta lista diversos itens nos setores de hortifrutis, carnes, cereais e grãos.

“O papel da pandemia para estes aumentos foi muito importante, principalmente pela questão do auxilio emergencial. Isso injetou muito recurso no mercado e boa parte dele foi usado para comprar alimentos”, explica o professor da Faculdade de Administração da USP e FGV, Marcos Fava Neves.

Além da pandemia do novo Coronavírus, outros fatores também influenciaram o mercado brasileiro e contribuíram para estas movimentações. Entre eles, está o câmbio.

-- “Você teve uma desvalorização muito grande do real e aumento do apetite importador em boa parte do ano. Isso retira um pouco de produto do mercado interno e encarece a entrada de produtos importados, o que reflete também na questão dos preços internos”, diz Neves.

Questões da economia internacional também contribuíram com este setor, especialmente para as commodities que são comercializadas mundialmente.

-- “A economia mundial voltou a crescer após os primeiros meses da pandemia e a China demandou muita ração para aves e suínos (soja e milho), houve quebra de produção de arroz no sudeste asiático. Houve também aumento de preços nas proteínas como carne suína, bovina de segunda, aves e ovos. Até sardinha e salsicha em lata ficaram mais caros”, ressalta o professor de economia da FGV, Alberto Ajzental.

MOVIMENTO DE ALTA CONTINUARÁ EM 2021

A grande pergunta que fica agora é: esses aumentos dos preços no Brasil estabeleceram um novo patamar de cotações ou poderemos retornar aos valores pré-pandemia novamente em 2021?

Na opinião de Fava Neves, este ano deve ser mais uma vez de preços elevados. Isso porque, a oferta e a demanda mundial de grãos seguem muito justas e o câmbio permanece pendendo para a moeda americana ante à brasileira.

-- “Esses aumentos de preços estabeleceram sim um novo patamar para os produtos. Os Estados Unidos acabaram de fazer novos cortes de produção de grãos e isso elevou ainda mais os preços internacionais. Como o real não está se valorizando da maneira com que a gente esperava, com o dólar ainda ao redor de R$ 5,30, é provável que os preços permaneçam como estão em 2021”, afirma o professor.

“Para voltarmos aos patamares anteriores estes produtos teriam que sofrer deflação na mesma intensidade, mas estes caminhos não ocorrem nas mesmas velocidades, o aumento é sempre muito mais rápido e mais instantâneo do que a volta. Além disso, a China deve continuar a demandar muito por ração para criação de proteína, a área plantada não vai crescer tão rápido na mesma proporção e o dólar deverá continuar apreciado”, opina Ajzental.

Essa também é a expectativa do presidente da Federarroz, que espera a manutenção dos preços em 2021 para, enfim, dar condições de lucratividade aos arrozeiros brasileiros. “Nós temos uma conjuntura de problemas estruturais não resolvidos ainda na lavoura de arroz. O produtor vem, ao longo dos últimos 4 anos, tendo prejuízo ao plantar arroz, se endividando e saindo da atividade”, diz Velho.

O diretor técnico do Irga (Instituto Rio-Grandense do Arroz), Ricardo Kroeff, relata que a expectativa dos produtores é vender a produção desta safra, que será colhida a partir do meio de fevereiro e ganhar força em março e abril, entre R$ 70,00 e R$ 80,00, índices que serão remuneradores.

Do lado do consumidor final, Velho avalia que, mesmo com estes aumentos nos preços do arroz, o brasileiro acabou sentindo pouco esta movimentação, uma vez que o quilo passou, em média, de R$ 3,50 para R$ 4,50, representando um gasto mensal médio de R$ 25,00 para uma família de quatro pessoas e se mantendo como um dos itens mais baratos no prato básico do país.

O professor Ajzental ressalta ainda que, nem mesmo um aumento no índice de desemprego no Brasil e o término do pagamento do auxilio emergencial serão suficientes para devolver os preços aos patamares anteriores.

“No primeiro trimestre vão entrar safras de arroz e feijão que vão ajudar a segurar os preços e a demanda interna pode recuar um pouco pelo desemprego e término do auxilio, mas aquilo que subiu não vai voltar aos patamares anteriores. Houve uma transferência de renda com a maior parte do orçamento das famílias sendo utilizado para alimentação e isso irá se intensificar.

-- "Os preços vão continuar maiores do que eram antes e as pessoas vão ter que usar uma parte maior da renda familiar na compra de gêneros alimentícios”, diz.

Para o analista de mercado da Germinar Corretora, Roberto Carlos Rafael,  perspectiva é de manutenção do cenário positivo e dos preços altos e extremamente remuneradores ao produtor brasileiro. Especificadamente para o milho (que teve aumento de 61,74% no ano juntamente com outros cereais, leguminosas e oleaginosas), o analista explica que os estoques de passagem serão muito apertados e que a entrada de uma safra verão que teve problemas de desenvolvimento no Sul do país irá contribuir para a sustentação das cotações.

Essa questão da rentabilidade aos produtores é outro ponto que merece atenção nessa situação, uma vez que os produtos do agro se valorizaram, mas insumos e componentes da cadeia também registraram elevações ao longo de 2020.

De acordo com o professor Fava Neves, a rentabilidade foi sentida sim, especialmente para os produtores de grãos, mas ficou mais comprometida em setores do agro que utilizam estes itens como matéria prima.

“Quem precisa de ração e grãos teve um impacto de custos importante, mas principalmente o produtor de grãos, que compra parte dos seus insumos em dólar e parte em real, e vende com cotações em dólar teve aumento de margem sim”, pontua.

Por: Guilherme Dorigatti
Fonte: Notícias Agrícolas

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