Biden vence eleição, dizem redes de TV: Trump responde que apuração "está longe do fim"

Publicado em 07/11/2020 18:10 e atualizado em 08/11/2020 12:43

WASHINGTON (Reuters) - Joe Biden conquistou a presidência dos Estados Unidos neste sábado, disseram as principais redes de televisão, com os eleitores rejeitando por pouco a turbulenta liderança do atual presidente Donald Trump e abraçando a promessa do democrata de lutar contra a pandemia de coronavírus e consertar a economia de um país dividido.

Trump imediatamente acusou Biden de "se apressar para posar falsamente como ganhador". "Esta eleição está longe de acabar", disse ele em um comunicado.

A projeção de vitória de Biden ocorreu após quatro dias de um suspense de dar nos nervos em relação ao resultado da eleição de terça-feira, com a contagem de votos em alguns poucos Estados disputados ainda em andamento, devido a uma enxurrada de votos por correio.

"Estou honrado e me sinto muito humilde diante da confiança que o povo norte-americano depositou em mim e na vice-presidente eleita Harris. Enfrentando obstáculos sem precedentes, uma quantidade recorde de norte-americanos votou", disse Biden no Twitter.

"Com o fim da campanha, está na hora de colocar a raiva e a retórica rude de lado e nos unir como país. Está na hora de os Estados Unidos se unirem. E se curarem."

Gritos de comemoração surgiram nos corredores do hotel onde a equipe de Biden estava e em todo o país, após a projeção realizada pelos órgãos de imprensa.

"Valeu cada minuto" de espera, disse um auxiliar de Biden, enquanto a equipe trocava cumprimentos com o cotovelo e abraços no lobby do hotel.

Em Park Slope, Brooklyn, multidões se reuniam nas ruas, irrompendo em vivas, pulando e batendo panelas.

Em Takoma Park, Maryland, uma cidade liberal perto da capital, vivas surgiram e algumas pessoas batiam panelas nas varandas.

Quando o ex-vice-presidente entrar na Casa Branca em 20 de janeiro, a pessoa mais velha a ocupar o cargo, aos 78 anos, ele provavelmente enfrentará uma tarefa difícil para governar em uma Washington polarizada, ressaltada por um comparecimento recorde em uma luta que durou até o final.

Biden disse na sexta-feira que esperava vencer, mas não fez um discurso de vitória.

Um conselheiro de Trump reconheceu na sexta-feira que a corrida havia se inclinado contra o republicano, mas disse que o presidente não estava pronto para admitir a derrota.

Biden ganhava por 273 a 214 no colégio eleitoral que determina o vencedor, após obter os 20 votos da Pensilvânia, que o colocaram acima do patamar de 270 necessários para vencer a presidência, de acordo com Edison Research.

Para assegurar a vitória, Biden enfrentou desafios sem precedentes. Isto incluiu esforços liderados por republicanos para limitar a votação por correio em um momento em que um número recorde de pessoas votaram por correio devido à pandemia, que matou mais de 235 mil pessoas nos Estados Unidos.

Ambos os lados consideraram as eleições de 2020 como uma das mais importantes na história do país, tão importante quanto as votações durante a Guerra Civil de 1860 e a Grande Depressão de 1930.

Por meses, representantes dos dois lados levantaram a possibilidade de que os EUA não seriam capazes de ter uma eleição justa.

No fim, no entanto, a votação nas urnas ocorreu com poucas interrupções, com milhões de pessoas aguardando pacientemente para votar.

Milhares de observadores eleitorais dos dois partidos trabalharam durante quatro dias para garantir que os votos fossem contados.

O drama da eleição deve continuar por semanas, ou meses. Trump, de 74 anos, está contestando a votação nos tribunais, mas especialistas disseram que seus desafios têm pouca chance de alterar o resultado.

A vitória de Biden foi guiada por forte apoio de grupos incluindo mulheres, negros, eleitores brancos com curso superior e habitantes de centros urbanos.

Ele tinha mais de 4 milhões de votos a mais que Trump no voto popular em nível nacional.

Biden, que passou metade de um século na vida pública dos Estados Unidos como senador e depois vice-presidente na administração do antecessor de Trump, Barack Obama, vai herdar uma nação tumultuada pela pandemia de coronavírus e a desaceleração econômica que ela causou, assim como protestos disruptivos contra o racismo e brutalidade policial.

Biden disse que sua primeira prioridade será desenvolver um plano para conter a pandemia e promover uma recuperação, prometendo melhorar o acesso a testes e, ao contrário de Trump, seguir o conselho de autoridades de saúde pública e cientistas.

Ele também prometeu restaurar um senso de normalidade na Casa Branca após uma presidência em que Trump elogiou líderes estrangeiros autoritários, desdenhou alianças globais duradouras, recusou-se a repudiar supremacistas brancos e lançou dúvidas sobre a legitimidade do sistema eleitoral dos EUA.

Apesar da vitória, Biden não vai promover o repúdio contundente a Trump que os Democratas esperavam, refletindo o profundo suporte que o presidente tem, apesar de seus turbulentos quatro anos de mandato.

Isto pode complicar as promessas de campanha de Biden de reverter partes importantes do legado de Trump. Isto inclui as grandes reduções de impostos que Trump promoveu e que beneficiaram corporações e os ricos, as políticas linha-dura de imigração, esforços para desmantelar a lei de saúde Obamacare de 2010 e a saída de acordos internacionais, como o acordo climático de Paris e o acordo nuclear com o Irã.

Se os republicanos mantiverem o controle do Senado dos EUA, eles provavelmente vão bloquear uma grande parte de sua agenda legislativa, incluindo o aumento dos cuidados de saúde e a luta contra as mudanças climáticas.

Esta perspectiva pode depender do resultado de quatro corridas ao Senado que ainda não estão decididas, incluindo duas vagas na Georgia.

Biden, que vai se tornar o 46º presidente dos EUA, já havia concorrido à presidência sem sucesso em 1988 e 2008.

Sua companheira de chapa, senadora Kamala Harris, deverá ser a primeira mulher, primeira negra e primeira descendente de asiáticos a ser vice-presidente, o segundo cargo mais importante do país.

Biden atualiza perfis de redes sociais como presidente eleito

Logo após ser anunciado como vencedor da corrida presidencial americana pelas projeções de rede de televisão americana, o democrata Joe Biden atualizou a descrição de suas redes sociais como "Presidente eleito". No mesmo movimento, a candidata à vice-presidência, Kamala Harris, também atualizou os perfis nas redes, como "Vice-presidente eleita para os Estados Unidos".

Campanha de Trump promete iniciar batalha legal na segunda-feira

A campanha do presidente Donald Trump não reconhece a vitória do democrata Joe Biden, projetada por redes de televisão americana, incluindo a CNN e a Fox News, disseram advogados do republicano em pronunciamento à imprensa há pouco.

Os advogados acusaram a eleição e a apuração de terem uma série de fraudes e prometem iniciar uma batalha legal contra os resultados já a partir da próxima segunda-feira (09).

"A partir de segunda-feira, nossa campanha começará a processar nosso caso na Corte para garantir que as leis eleitorais sejam totalmente mantidas e o vencedor legítimo esteja sentado", afirma comunicado distribuído pela campanha de Trump. Na entrevista coletiva, os advogados levaram até um fiscal de apuração do partido para alegar que houve fraudes.

O comunicado fala que a disputa eleitoral "está longe do fim".

Planalto vê manifestação sobre vitória de Biden como afobação

O presidente Jair Bolsonaro silenciou sobre a eleição do democrata Joe Biden à presidência dos EUA, resultado projetado pela imprensa norte-americana. Mais de uma hora depois de divulgado o resultado, nem o Palácio do Planalto nem o Ministério das Relações Exteriores se pronunciaram. A decisão isola o Brasil no plano internacional, depois que outros chefes de Estado e governo já reconheceram a vitória de Biden e o congratularam nas redes sociais.

De acordo com fontes do Planalto, Bolsonaro reagiu com "tranquilidade" ao resultado e reforçou que vai esperar um "quadro concreto" para se pronunciar. Ainda segundo integrantes do governo, o presidente considera qualquer pronunciamento uma afobação e vai aguardar o término dos processos judiciais movidos por Trump, que não reconhece a derrota e contesta o resultado alegando, sem provas, que há fraude no processo judicial.

A postura de Bolsonaro segue recomendações de sua assessoria para um dos cenários previstos, uma vitória com margem apertada de votos e a contestação judicial por parte do aliado, o republicano Donald Trump. Esse era o conselho dado ao presidente nessa hipótese para que não se precipitasse na comunicação virtual, como antecipou o Estadão na manhã da última segunda-feira (2).

Integrantes do Planalto argumentam que nenhum Estado encerrou oficialmente a apuração, e, portanto, a vitória do democrata está sendo declarada pela imprensa. O silêncio de Bolsonaro, porém, não está atrelado a uma expectativa de reviravolta nas urnas, mas a uma "prudência" de que a imprensa, alvo frequente de ataques de Trump e Bolsonaro, tenha errado. A militância bolsonarista, por sua vez, segue reproduzindo que há fraude no processo eleitoral, o que não tem respaldo das autoridades americanas.

O silêncio de Bolsonaro contrasta com o estilo do presidente, que costuma usar as redes sociais para rebater ou felicitar adversários. Foi o que ocorreu, por exemplo, em 30 de setembro, quando Biden fez críticas à preservação da Amazônia e ameaçou sanções econômicas sobre o governo brasileiro. Bolsonaro não demorou a rebater o democrata nas redes.

O Estadão entrou em contato com o Ministério das Relações Exteriores e o Palácio do Planalto sobre o resultado das eleições nos EUA, mas o governo não se pronunciou.

As primeiras autoridades do Brasil a reconhecerem o triunfo do democrata foram o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o vice, Marcos Pereira (Republicanos-SP), num indicativo de que o caminho para aproximação entre os países pode ser o parlamento.

"A vitória de Joe Biden restaura os valores da democracia verdadeiramente liberal, que preza pelos direitos humanos, individuais e das minorias. Parabenizo o presidente eleito e, em nome da Câmara dos Deputados, reforço os laços de amizade e cooperação entre as duas nações", publicou Maia, minutos após o anúncio pela imprensa dos EUA.

"Parabenizo Joe Biden pela vitória. O democrata é o 46º presidente dos Estados Unidos da América. Faço votos que seu mandato seja frutífero e benéfico para todos. A beleza da democracia é a alternância no poder", escreveu Pereira.

É comum que chefes de governo se manifestem logo após um país chegar ao resultado das eleições presidenciais. Alguns dos primeiros foram os primeiros-ministros do Canadá, Justin Trudeau, da Alemanha, Angela Merkel, e das Ilhas Fiji, Frank Bainimarama, que parabenizou Biden antecipadamente, nas primeiras horas deste sábado, dia 7, antes mesmo da projeção do resultado. Adversário de Bolsonaro, o presidente da França, Emmanuel Macron, também felicitou Biden. Todos usaram suas redes sociais.

O momento de falar é uma decisão de política externa do Palácio do Planalto. E costuma variar de presidente para presidente. Em 2000, quando a eleição americana também passou por contestação na Justiça e recontagem de votos, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) só enviou carta ao republicano George W. Bush, vencedor, 36 dias após a votação, em dezembro. Bush derrotara Al Gore, democrata na sucessão de Bill Clinton, de quem FHC era amigo.

Agora, o tucano já abriu uma exceção e se manifestou porque, segundo ele, "vivemos nestes últimos dias um momento decisivo para a democracia". Ele fez crítica incisiva aos últimos pronunciamentos de Trump, que cita insistentemente ilegalidades na votação sem apresentar provas.

"Em dois séculos e meio, nenhum presidente americano havia buscado deslegitimar o processo eleitoral, um dos alicerces fundamentais da democracia. O atual o fez sistemática e deliberadamente. Sua reeleição representaria, portanto, um grave risco à democracia, e não só nos Estados Unidos. Por isso, pelo que não aconteceu, vivemos um momento histórico, que merece ser celebrado", afirmou FHC, em comunicado.

A missão da Organização dos Estados Americanos (OEA), que acompanha o pleito, divulgou não ter encontrado irregularidades graves na votação. Neste sábado, o presidente da OEA, Luís Almagro, parabenizou Biden e a vide Kamala Harris em publicação no Twitter. "Esperamos continuar trabalhando em estreita colaboração com os Estados Unidos pela democracia, direitos humanos, desenvolvimento e segurança no hemisfério", escreveu.

Segundo o Estadão apurou, assim que Bolsonaro decidir, a Presidência está pronta para fazer contato com o vencedor. Porém, não está descartado que Bolsonaro se manifeste apenas pelo Twitter. O chefe do Executivo também pode determinar que o contato seja feito pelo embaixador brasileiro nos Estados Unidos, Nestor Foster.

Já Luiz Inácio Lula da Silva, em 2008, telefonou para Barack Obama no mesmo dia do anúncio do resultado. O presidente eleito americano retornou dias depois e eles conversaram por 15 minutos Por sua vez, Michel Temer, em 2016, preferiu parabenizar com um telegrama.

 

Biden, um conhecedor do Brasil e da América Latina, diz o Estadão

Joe Biden chega à Casa Branca como um conhecedor do Brasil e da América Latina. Há mais de 40 anos na vida pública norte-americana, ele é reconhecido como um político conciliador e dedicado ao relacionamento internacional. Liderou, como vice-presidente a diplomacia de Barack Obama na América Latina. Presidiu e foi membro do Comitê de Relações Exteriores do Senado dos EUA por 12 anos. E dá nome a um centro de pesquisa na Universidade da Pensilvânia, o Centro Penn Biden para a Diplomacia e o Engajamento Global.

Em 2013, o democrata atuou diretamente na relação com o Brasil. Numa visita a Brasília, Biden ajudou a abrir caminho para uma visita de Estado que Dilma faria, a contragosto de próceres petistas, aos Estados Unidos para melhorar o patamar das relações. Dilma, no entanto, abortaria a viagem. O motivo foi a revelação de que comunicações da presidente e da Petrobras haviam sido bisbilhotadas pela Agência de Segurança Nacional (NSA) norte-americana.

Coube a Biden voltar ao Brasil, durante a Copa do Mundo de 2014, para apaziguar a relação. Eles já haviam conversado em Santiago meses antes, na posse da presidente chilena Michelle Bachelet. O pretexto era assistir ao jogo em que os Estados Unidos venceram Gana por 2 a 1 na Arena das Dunas, em Natal (RN).

Mas Biden não tinha assim tanto interesse no jogo - ele chegou atrasado ao estádio e perdeu o primeiro gol do atacante Dempsey, antes do primeiro minuto. Logo depois do futebol com a neta e um sobrinho, decolou a Brasília. No dia seguinte, conversou a sós longamente com Dilma. Biden usou da simpatia que conquistou - a presidente disse que ele era "sedutor" - para tentar convencê-la de que Obama ordenou uma "revisão imediata" no programa de vigilância. E que mudaria a abordagem com o Brasil.

Na ocasião, Biden trouxe um presente sob medida para a presidente. O vice de Obama entregou a Dilma um lote de documentos até então secretos dos arquivos dos EUA sobre violações na ditadura militar. Os papéis reforçariam a coleta de provas da Comissão Nacional da Verdade, para irritação de oficiais brasileiros.

Após superar o choque de espionagem, Biden voltaria a Brasília em janeiro de 2015, por ocasião da posse de Dilma no segundo mandato. Numa carta de agradecimento com linguagem diplomática, a presidente registrou que os "laços de amizade e apreço" uniam não só os dois povos, mas "a nós pessoalmente".

Dois anos depois, Biden foi encarregado de receber em Washington o presidente Michel Temer (2016-2018), empossado com o afastamento de Dilma, e dar o sinal de reconhecimento americano a sua legitimidade na presidência. No auge da Operação Lava Jato, Biden criticou escândalos de corrupção no continente e respaldou a transição de poder.

Ele afirmou que "o Brasil seguiu sua Constituição para navegar um momento econômico e político difícil". O embaixador Paulo Roberto de Almeida, ex-diretor do Instituto Brasileiro de Relações Internacionais (Ipri), estudioso da história da diplomacia e crítico da atual gestão do Itamaraty, destaca que as diferenças entre republicanos e democratas são mais de "aparência" na relação com o Planalto.

Ele observa que houve períodos áureos e baixos nas relações entre os dois partidos. "Os Estados Unidos são um império, buscam segurança em primeiro lugar e abertura em segundo. Mas para eles, abertura é quando outros países se abrem para os investimentos e o comércio, os produtos americanos", analisa o embaixador, também adversário de gestões petistas no Itamaraty. "Depois eles impõem restrições, espionam a qualquer um, inimigos ou aliados."

A relação com Brasília sempre passou, nas gestões democratas afeitas ao multilateralismo, pela posição de influência regional do Brasil na América do Sul. Atualmente, Jair Bolsonaro vive em conflito político com a Argentina de Alberto Fernández e a Bolívia, de Luis Arce, ambos de esquerda. De imediato, ele tentará se reconectar aos socialistas bolivianos, ao enviar o chanceler Ernesto Araújo à posse de Arce. Analistas e diplomatas dos dois lados concordam que caberá a Bolsonaro mostrar abertura ao diálogo e moderação para acessar Biden.

 

 

 

Fonte: Reuters/Estadão Conteúdo

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