Governo quer alterar Lei de Falências neste semestre para derrubar spread, diz secretário de Fazenda
Por Isabel Versiani e Marcela Ayres
BRASÍLIA (Reuters) - A atualização da Lei de Recuperação Judicial e Falência será uma das principais linhas de ação do Ministério da Economia neste semestre para tentar lidar com a questão dos spreads bancários no país, que o governo considera excessivamente elevados, afirma o secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues.
A equipe econômica vê como prioridade aumentar o poder dos credores nos processos de recuperação, de forma a abrir espaço para a redução dos juros cobrados pelas instituições financeiras na ponta. Para tanto, está concluindo, em parceria com o Congresso, formulação de um novo projeto sobre o assunto.
“A versão que tramitará reequilibrará o poder do credor diante de uma empresa que esteja em recuperação judicial”, afirmou Rodrigues em entrevista à Reuters na noite de terça-feira, pontuando que esta é a principal diferença do projeto em relação ao texto sobre o tema apresentado pelo ex-presidente Michel Temer.
“Essa agenda tem data, e nós esperamos que seja procedida neste semestre.”
Ele destacou que o país tem hoje 7.200 empresas em recuperação judicial que juntas acumulam um estoque de 283 bilhões de reais em dívidas. A média de recuperação dessas dívidas é de 25 centavos por real, frente a uma média na América Latina de 45 centavos por real.
O governo Temer também tentou alterar a Lei de Falências, em esforço capitaneado por Rodrigues, que foi assessor especial dos ex-ministros da Fazenda Henrique Meirelles e Eduardo Guardia. A proposta, contudo, não avançou no Congresso, em meio a críticas de juristas ao texto.
Segundo Rodrigues, a nova versão vem para tratar desses pontos.
"O projeto que está em comissão especial na Câmara dos Deputados nós o aperfeiçoamos em discussões internas, então há convergência muito grande de quais são as áreas a serem atacadas em relação ao sistema de recuperação judicial, extrajudicial e falências", disse.
A ideia foi promover melhorias ligadas a questões como recuperações ligadas a grupos econômicos, não sucessão de passivos, insolvência transnacional e uso de créditos tributários associados a empresas em recuperação judicial.
"São dez frentes ligadas ao sistema recuperacional e falimentar que entendemos que podem ser substancialmente alteradas", afirmou Rodrigues.
A equipe econômica tem feito várias reuniões com o deputado Hugo Leal (PSD-RJ), que foi designado pelo presidente da Câmara para tratar do projeto de reforma da lei, e o secretário afirmou que o plano é buscar com isso um texto conjunto, que represente tanto o Poder Executivo quanto o Legislativo.
Rodrigues ressalta que o Banco Central é o principal responsável no governo pela agenda da redução do spread, mas que o Ministério da Economia também tem um papel a cumprir.
Na véspera, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, sustentou que a recuperação de créditos no Brasil é muito mais baixa do que no restante do mundo, respondendo por parte do problema dos altos spreads bancários.
"O Brasil leva uma média de três anos e meio, quatro, enquanto a média de países emergentes é entre um ano e meio, dois", disse.
"Então no Brasil nós recuperamos menos e demora muito mais tempo. O que acontece com isso? Quando você traz o que você recupera a valor presente, basicamente você não recupera muito. Como eu não recupero muito, eu cobro mais caro", sintetizou.
MAIS MEDIDAS
Enquanto Campos Neto ressaltou que para atacar o spread o BC também conta com a vigência do cadastro positivo, depois de finalizada todas as etapas regulatórias, e com a implementação futura do chamado open banking --arquitetura que dá aos usuários finais o poder de acesso e manipulação de seus dados bancários--, Rodrigues sinalizou que o ministério ajudará no trabalho em outras frentes.
O governo espera que a iniciativa recente de autorizar o uso dos recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) na modalidade de saque-aniversário como garantia na tomada de empréstimo tenha efeito positivo sobre os spreads, ainda que a medida não tenha sido formulada com esse objetivo específico, afirma Rodrigues.
A expectativa é que os empréstimos lastreados nesses recebíveis tenham taxas similares aos do crédito consignado, oferecido hoje principalmente a servidores públicos e aposentados do INSS com custos significativamente inferiores aos do crédito pessoal tradicional.
O secretário diz que sua equipe também estuda o peso da estrutura tributária sobre os spreads. “Não há no 'pipeline', do ponto de vista tributário, nenhuma medida para ser anunciada nos próximos dias, semanas ou meses, mas estudos há.”