Agropecuária e indústria criticam proposta de tabelamento de fretes (Agência Brasil)

Publicado em 03/07/2018 19:35
Representantes dos setores agropecuário e industrial voltaram a criticar a proposta de tabelamento de preço dos fretes (Por Débora Brito - Repórter da Agência Brasil)

Em audiência pública realizada nesta terça-feira (3) pela comissão mista de deputados e senadores que analisam a medida provisória (MP) que cria uma política de preços mínimos para o transporte rodoviário de cargas, entidades do setor produtivo pediram que seja estabelecido apenas um valor de referência, mas que o preço final seja definido pelo mercado.

O parecer pela aprovação da MP 832/2018 estava programado para ser votado ainda hoje na comissão no Congresso Nacional. A medida foi encaminhado pelo governo como parte das negociações para acabar com a paralisação dos caminhoneiros em maio. Mas, a definição de uma tabela mínima foi rejeitada por vários setores, e a Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT) ainda negocia uma tabela que atenda a diferentes demandas.

Comissão mista debate MP que estabelece tabela de preços mínimos de fretes do transporte de cargas(Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Frete diferenciado

Entre os setores com demandas mais diversas está o da agropecuária, que transporta desde rações, ovos, alimentos refrigerados e grãos até animais.

Segundo a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), o frete da agropecuária é muito específico e trabalha geralmente com pequenos transportadores locais ou regionais que firmam contrato com os produtores, perfil que não se enquadra nos profissionais autônomos da medida provisória.

“A gente pede que o preço seja apenas de referência e que o setor participe, junto à ANTT, na eventual definição de uma tabela face a essas especificidades”, disse o diretor de relações institucionais da ABPA, Ariel Antônio Mendes.

O economista Flávio Castelo Branco, da CNI, diz que tabelamento pode gerar insegurança jurídica e desequilíbrio na estrutura do mercado (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

O setor da indústria apontou algumas implicações do tabelamento para a economia do país. Segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), o uso do sistema de tabela “é uma forma equivocada” de solucionar o problema de transporte rodoviário de cargas no país e fere o principio de livre iniciativa do mercado.

“Estes princípios da lei de mercado, ao serem alterados, desorganizam o sistema de produção com consequências bastante danosas”, alertou o gerente executivo de Políticas Econômicas da CNI, Flávio Castelo Branco.

O economista ressaltou que, se o preço do frete subir, a demanda por produtos pode diminuir, o que afetaria a produtividade econômica e até o volume de cargas a ser transportada no país. Ele disse ainda que o tabelamento pode trazer insegurança jurídica e desequilíbrio na estrutura do mercado, com possíveis perdas nos investimentos, empregos e na eficiência da economia.

“Quando você fixa um preço arbitrariamente você fere contratos. Ao colocar um preço mínimo, você está imputando um custo maior para os usuários daquele sistema. Isso significa que, para a sociedade, você vai levar esse custo para os preços finais dos produtos. A sociedade, no fundo, é que vai pagar o aumento do custo”, completou.

A entidade reiterou que a grande dimensão geográfica do país impede a definição de uma tabela razoável de preços mínimos e qu,e diante dos riscos, seria mais viável adotar uma tabele de referência que não seja “mandatória e que preserve a possibilidade de acordo entre as partes privadas”, “com o valor que bem entenderem”.

Para a Associação das Empresas Cerealistas do Brasil (Acebr), o problema do transporte rodoviário de cargas não será resolvido com uma medida que beneficia somente caminhoneiros autônomos, pois todos os atores envolvidos na cadeia produtiva estão passando por dificuldades.

A tabela de fretes vai resolver ou ampliar o problema? O que pode acontecer é que vai gerar mais assimetria ainda, questionou o diretor-presidente da Acebr

Para Frasson, o tabelamento não enfrenta os problemas estruturais do país, nem as questões de legislação que regulam o setor. Ele defendeu o estabelecimento de um fórum interministerial com todos os envolvidos para discutir, inclusive, a carga tributária do transportador autônomo e uma forma alternativa de definir um custo mínimo para o frete sem afetar a autonomia do mercado.

ANTT

O representante da ANTT, Marcelo Vinaud Prado, reconheceu que a definição de uma tabela única para o Brasil não é uma tarefa “simplista”. Prado disse que a agência vem discutindo o tema com vários setores e está contratando uma consultoria para tentar solucionar o desafio.

“A ANTT identificou pelo menos 54 setores de cadeia produtiva que deveriam ter um tratamento específico em nível de custo – não estou falando nem de preço final. E isso tudo tem que ser levado em consideração para que a gente possa ter na verdade uma viabilidade da proposta técnica”, acrescentou.

Segundo Prado, só o estabelecimento de um piso mínimo de preço para os fretes não seria a solução adequada para a questão do problema do "ciclo vicioso" do transporte rodoviário de cargas, com as dificuldades inerentes ao setor, como problemas nas estradas, baixa remuneração dos motoristas autônomos, entre outros problemas.

De acordo com Prado, o país tem hoje cerca de 640 mil transportadores, a maioria formada por autônomos e outra parte por empresas e cooperativas, com 790 mil veículos. “O que é preciso deixar claro é que, ao se fazer a política pública do preço mínimo do frete, é preciso definir também que público será beneficiado com isso e garantir que o benefício realmente alcance esse público”, ressaltou.

Ele alertou ainda para a necessidade de criação de barreiras para evitar a entrada de transportadores atraídos apenas pelo controle dos custos e destacou que o governo tem trabalhado para cumprir o que foi prometido durante as negociações com os caminhoneiros.

Edição: Nádia Franco
 

ANTT defende tabelamento do frete, mas diz que pode rever iniciativa

Em ofício entregue hoje (18) ao Supremo Tribunal Federal (STF), a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) defendeu a legalidade de criação de uma tabela com valores mínimos a serem cobrados pelo frete do transporte rodoviário de cargas, mas disse que a iniciativa pode ser revista.

“A tabela se presta a estabelecer preços mínimos, que evidentemente cobrem os custos da atividade”, afirmam os representantes da ANTT no documento. O órgão regulador destaca que as negociações ainda não estão encerradas e que a adoção do tabelamento pode ser “reavaliada”.

Apesar de admitir a eventual  flexibilização da tabela, a ANTT argumenta que, caso a MP 832 e a Resolução 5.820 sejam declaradas inconstitucionais ou mesmo suspensas até o julgamento final da ação “lançará o país no mesmo caos em que se encontrava dias atrás”.

A agência também reafirma que a tabela não fere a livre concorrência na economia. “A fixação de preço mínimo vinculativo em nada afronta os princípios da concorrência e da livre iniciativa”, dizem os signatários do documento, entre eles o procurador-geral federal Leonardo Silva Lima Fernandes,  no ofício endereçado ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux.

Para os representantes da ANTT, o estabelecimento de um valor mínimo para o frete garante uma política de preços de mercado, levando em conta princípios constitucionais como o regramento econômico, a dignidade humana e os valores sociais do trabalho.

De acordo com o documento, os valores já divulgados foram definidos a partir de estudos que visam a “promover a saúde econômico-financeira das empresas, cooperativas e motoristas autônomos” e a segurança da sociedade como um todo. “A prática de fretes com preços aviltados tem se tornado fator impeditivo para uma adequada manutenção dos veículos.” Também foi destacada a missão da agência de regular a atividade e fiscalizar a execução da Política de Preços Mínimos do Transporte Rodoviário de Cargas.

Outro argumento é que “a execução do transporte rodoviário remunerado de cargas em valores inferiores aos definidos pela ANTT pode mostrar-se prejudicial à sustentabilidade do setor, ensejando aumento no número de sinistros [acidentes] envolvendo veículos utilizados no transporte de cargas”.

Editada pela ANTT em maio deste ano, a Resolução 5.820 regulamenta a Medida Provisória (MP) 832, publicada pelo governo federal com o intuito de atender às principais reivindicações dos caminhoneiros que cruzaram os braços e paralisaram o transporte de cargas por 11 dias, afetando vários segmentos econômicos. Segundo a ANTT,  a MP 832 foi promulgada em caráter de urgência, para “reduzir imediatamente os riscos da greve [de caminhoneiros] que desencadearia em sucessivos problemas de infraestrutura”.

A manifestação da agência é uma resposta ao pedido de informações feito pelo ministro Luiz Fux, relator das três ações que questionam, no Supremo Tribunal Federal (STF), a legalidade do tabelamento do frete. Na quinta-feira (14), Fux atendeu à solicitação da Advocacia-Geral da União (AGU) e determinou a suspensão das 53 ações contestatórias ajuizadas em diferentes instâncias até que o STF julgue as três ações de inconstitucionalidade protocoladas pela Associação do Transporte Rodoviário de Carga Do Brasil, pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e pela Confederação Nacional da Indústria (CNI).

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) também enviou ao ministro Luiz Fux seu posicionamento a respeito das críticas ao tabelamento do frete. Ao contrário da ANTT, o conselho vinculado ao Ministério da Justiça se manifestou contrário à iniciativa de fixar um valor mínimo. Para o Cade, o tabelamento do frete limitará a concorrência, prejudicando a sociedade e criando uma espécie de cartel no setor.

Tabelamento do frete

O tabelamento do frete foi uma das reivindicações de caminhoneiros atendidas pelo governo federal, no fim do mês passado, para tentar pôr fim à paralisação que durou 11 dias e afetou diversos setores da economia. Desde então, o governo já editou duas tabelas de frete. A primeira foi publicada no Diário Oficial da União de dia 30 de maio e vigorou até 7 de junho, quando foi editada a segunda versão da tabela. Esta, no entanto, permaneceu válida por apenas algumas horas, já que, na prática, acabou sendo suspensa pela ANTT no mesmo dia.

As duas primeiras tabelas são alvos da disputa de interesses entre caminhoneiros e representantes do setor produtivo. De um lado, donos de transportadoras rodoviárias e caminhoneiros autônomos se queixam de que os valores atualmente pagos pelo frete mal cobrem os custos das viagens, como combustível, pedágio, alimentação e manutenção do veículo. De outro lado, empresários de outros segmentos, principalmente o agropecuário, alegam que o estabelecimento de um valor mínimo para o frete limita a concorrência e aumenta os custos de transporte de cargas.

A primeira versão contemplava os interesses dos caminhoneiros ainda em greve, estabelecendo um valor mínimo de frete a partir do qual os autônomos pudessem negociar com as empresas transportadoras o valor dos serviços. Já a segunda versão, ao reduzir o valor do frete, agradou mais ao setor produtivo. Nos últimos dias, várias entidades entregaram aos técnicos da ANTT suas sugestões para a elaboração de uma terceira tabela.

Edição: Maria Claudia
Fonte: Agência Brasil

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