Dólar: Com tendência de volatilidade, repiques devem ser aproveitados, diz analista

Publicado em 21/11/2016 16:25

O novo patamar assumido pelo dólar frente ao real nas últimas semanas, apesar das baixas pontuais, chamou a atenção do produtor brasileiro de soja e fez com que alguns, inclusive, revissem suas estratégias de comercialização da safra 2016/17. Embora o ritmo das vendas tenha exibido alguma melhora, consultores e analistas de mercado ainda alertam para a necessidade de cautela diante da volatilidade prometida pelo câmbio daqui em diante. 

Há uma conjunção de fatores que ainda deverá influenciar o direcionamento da moeda norte-americana - não só no Brasil, mas no quadro externo, frente a uma cesta de principais moedas - e isso também deve entrar na conta do produtor rural que ainda está fechando suas contas, formando seus preços e garantindo sua renda. E será preciso, portanto, entender e acompanhar cada um desses elementos. 

Dólar x Real

No Brasil, como explica Steve Cachia, diretor da Cerealpar e também consultor do Kordin Grain Terminal, de Malta, na Europa, o recente fortalecimento do dólar foi o reflexo de uma conjunção de dois principais fatores: a eleição de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos e as incertezas políticas causadas pelo fortalecimento da Operação Lava-Jato. 

"E, de lá pra cá, voltamos a ceder um pouco. Talvez o mercado já tenha absorvido o efeito Trump", diz o executivo, acreditando que ele não irá iniciar, ao menos no início de seu governo, uma guerra comercial ou militar, trazendo mudanças tão profundas nas políticas econômicas norte-americanas. Será preciso aguardar suas primeiras medidas, portanto. 

Cachia segue afirmando que "no Brasil, tudo indica que, antes do final do ano, nada deve acontecer com o presidente Michel Temer", referindo-se às especulações todas em relação ao peemedebista dos impactos que a Lava-Jato poderia ter sobre em ele, incluindo a possibilidade de cassação da chapa Dilma Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral. 

As incertezas todas que se instalaram no mercado, portanto, deverão continuar a dar o tom dos negócios. "Muitos investidores não gostam das incertezas e, por isso, é muito normal os vermos migrando para o dólar como forma de garantir os recursos e se proteger", explica o diretor da Cerealpar. 

No último Boletim Focus, divulgado nesta segunda-feira (21), os economistas ouvidos mantiveram sua projeção para o final de 2016 para a taxa de câmbio em R$ 3,30, contra os R$ 3,22 esperados anteriormente. Na contramão, a consultoria Apexsim acredita que a moeda norte-americana possa chegar aos R$ 3,60.

"O dólar, no governo Temer, caíram de R$ 4,00 para algo entre R$ 3,20 / R$ 3,15, para as mínimas do ano, e após a eleição de Trump, no dia seguite, voltou aos R$ 3,40. E nas nossas estimativas, esse patamar poderia ser de até R$ 3,60. Tem espaço tanto para uma questão econômica ligada ao Trump, como outra em relação à elevação dos juros (nos EUA) e isso vai fazer o dólar subir", diz Guilherme Zanin, economista da Apexsim. 

No cenário doméstico, há ainda o acompanhamento dos movimentos do câmbio e as eventuais intervenções do Banco Central, os quais, segundo explica seu presidente, Ilan Goldfajn, têm o objetivo de fortalecer uma flutuação da moeda. E já nesta segunda, como noticiou a Reuters, a instituição já reduziu sua atuação, realizando apenas o leilão de swaps tradicionais para rolar os vencimentos em 1º de dezembro. Na semana anterior, novos swaps foram ofertados. 

"O BC tem monitorado de perto esses desenvolvimentos dos mercados internacionais e atuado tempestivamente para não permitir que os efeitos dos choques externos se transformem numa ameaça para a estabilidade macroeconômica", afirmou Goldfajn, durante um evento realizado no Rio de Janeiro. 

Se considerado o intervalo de 9 de novembro - dia seguinte às eleições norte-americanas - até o último dia 18, o dólar comercial subiu 5,60% frente ao real, como mostra o gráfico a seguir. 

Dólar x Cenário Externo

No cenário externo, apesar de um enfraquecimento recente e ainda pouco expressivo do dólar, a divisa frente a uma cesta de moedas ainda se mantém em seu mais elevado patamar em cerca de 14 anos. Segundo explicam analistas internacionais, há um certo otimismo - apesar das incertezas - em relação à economia dos EUA com a presidência de Donald Trump, além das expectativas - cada vez mais acentuadas - de uma elevação da taxa de juros no país podendo acontecer ainda neste ano. 

O gráfico a seguir, mostra a movimentação do dólar index de fevereiro de 2007 até a última sexta-feira (18) e o ganho acumulado se aproxima de 20%.

"Há um otimismode que Trump nos colocará em um eixo econômico mais rápido do que Hillary Clinton poderia ter feito. As eleições têm algo a ver com isso, e acredito ainda que há também alguma cobertura de posições mais próximas acontecendo. Pessoas que estavam efetivando alguns movimentos de proteção frente às eleições tiveram de correr para cobrir suas posições depois das notícias. E eu acredito que há uma percepção geral de que a economia está começando a se recuperar na medida que vemos o Fed sinalizando sua uma alta nos juros em dezembro", diz Terry Morris, gerente de ações da internacional BB&T Institutional Investment Advisors em entrevista à agência internacional de notícias Bloomberg. 

Especialistas ouvidos pela Bloomberg acreditam ainda há 98% de chance de que essa alta nas taxas poderia acontecer. "Caso isso não se confirme e o Federal Reserve não agir como vem sendo esperado, a ação pode trazer outro tumulto ao mercado", diz o executivo Ben Kumar, da Seven Investment, também à agência estrangeira. 

Enquanto esse movimento se desenvolve, o mercado financeiro acompanha ainda um cenário inverso do que vinha sendo registrado antes das eleições, com a saída de investimentos em dólares de economias emergentes. "Juros mais altos nos Estados Unidos naturalmente pioram a atratividade de mercados emergentes", afirmou Mirza Baig, diretora de câmbio e juros do BNP Paribas em Cingapura em entrevista à agência Dow Jones Newswires.

Dólar x Commodities

E entra na conta do dólar ainda sua relação como as commodities, como explica Steve Cachia. "O dólar é a moeda principal no mundo, e a maioria das commodities são negociadas em dólar. Além do mais, os EUA estão entre os principais produtores de muitas commodities, então, é certo afirmar que um dólar mais forte torna os produtos dos EUA menos competitivos no mercado mundial e vice-versa", alerta o executivo. 

Essa ligação, portanto, deverá ser um dos mais importantes pontos no caminho do câmbio para o produtor brasileiro. Afinal, não são somente os preços na Bolsa de Chicago que dão valor ao produto nacional. Além disso, ainda como explica Cachia, "é certo também dizer que o mercado de dólar também opera como muitos outros produtos, baseado na lei da oferta e demanda". 

Assim, a volatilidade da divisa, portanto, será inevitável e, dessa forma, os momentos de repique, como os quais foram recentemente registrados, devem ser aproveitados. "A tendência natural é de dólar sob pressão, ou seja, quando há algo pontual que o faz disparar, tem que aproveitar", explica o diretor da Cerealpar. "As oportunidades aparecem, ter que ter o sangue frio de puxar o gatilho e não especular demais", completa. 

Dólar x Soja no Brasil

E enquanto o dólar ainda se comporta carregando muita dúvida, Cachia alerta para os demais componentes que deverão direcionar as cotações da soja daqui em diante. E para ele, o maior risco de volatilidade na moeda americana deverá vir do Brasil, inclusive. 

"O quadro mundial de safra recorde nos Estados Unidos pelo terceiro ano consecutivo e uma possível safra recorde no Brasil e Argentina deixam o comprador confortável de que não vai faltar produto. Por isso, a pressão sobre soja, milho e trigo é nítida. Assim, dentro desse cenário, só uma quebra de safra poderia provocar um forte rally nos preços. E confiar tudo no clima é muito arriscado", diz. 

Assim, o analista acredita ainda que o ritmo da comercialização da soja no Brasil, que está bem abaixo do registrado na temporada anterior, deverá continuar ainda lento a não ser por uma expressiva e consistente disparada do dólar. Até o momento, há pouco mais de 25% da safra 2016/17 já comercializada e, a evolução desse índice irá depender se haverá novos rallies e qual será sua intensidade. 

Por: Carla Mendes e André Bitencourt Lopes
Fonte: Notícias Agrícolas

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