Dilma declara guerra a vice e chama Temer de um dos chefes do golpe

Publicado em 12/04/2016 14:49

Por Lisandra Paraguassu

BRASÍLIA (Reuters) - A presidente Dilma Rousseff declarou guerra aberta ao vice-presidente, Michel Temer, a quem classificou de conspirador e um dos chefes do que chamou de “golpe do impeachment”, em um duro discurso que marcou o fim de qualquer possibilidade de retomada das relações entre os dois.

“Ontem ficou claro que existem sim dois chefes do golpe que agem em conjunto e de forma premeditada... tomei conhecimento e confesso que fiquei chocada com a farsa do vazamento que foi deliberado, premeditado, vazando para eles mesmos”, discursou Dilma, referindo-se ao vazamento de um áudio de 14 minutos no qual o vice-presidente fala como se o processo de impeachment já tivesse sido aprovado pela Câmara dos Deputados.

Em entrevista, Temer afirmou na segunda-feira que o áudio foi enviado por engano a um grupo de líderes peemedebistas, mas que tudo o que dizia ali não era novidade.

Uma fonte palaciana revelou à Reuters que Dilma ficou “inconformada” não apenas com a pretensão de Temer ao gravar o discurso como pelo que classificou de “pretenso vazamento” --o Planalto não acredita que a divulgação tenha sido feita sem querer.

A ordem agora, disse a fonte, é “guerra total e absoluta”.

O discurso de Dilma, feito em mais um evento no Palácio do Planalto de apoio ao governo e sem citar Temer nominalmente, não deixou dúvidas de que o governo queimou os navios na relação com o vice e sua parte do PMDB.

“Se ainda havia alguma dúvida sobre o golpe, a farsa e a traição em curso, não há mais. Se havia alguma dúvida sobre a minha denúncia que há um golpe de Estado em andamento, não pode haver mais. Os golpistas podem ter chefe e vice-chefe assumidos, não sei direito qual é o chefe e qual é o vice-chefe”, afirmou.

No discurso, Dilma liga Temer e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, até então seu maior desafeto político, e responsável por dar andamento ao processo de impeachment, no que o governo sempre tratou como uma vingança por não tê-lo ajudado a se livrar do processo de cassação no Conselho de Ética. Cunha é do PMDB e Temer, presidente licenciado do partido.

“Um deles é a mão, não tão invisível assim que conduz com desvio de poder e abusos inimagináveis o processo de impeachment. O outro esfrega as mãos e ensaia a farsa do vazamento de um pretenso discurso de posse”, disse.

O discurso ocorre um dia depois de a comissão especial da Câmara ter aprovado parecer favorável ao impeachment e num momento em que o governo luta voto a voto para tentar derrotar em plenário a abertura do processo contra Dilma.

Neste cenário, o vazamento do áudio foi visto pelo Planalto como uma forma de provar que Temer age para derrubar a presidente e reforçar a colagem da imagem de golpista no vice-presidente. “É uma semana de tudo ou nada para o Planalto. Mais tudo do que nada”, disse a fonte palaciana.

Logo depois do vazamento do áudio, na segunda-feira, ministros palacianos passaram a bater na tecla do golpismo do vice. O ministro-chefe do gabinete da Presidência, Jaques Wagner, defendeu que, sendo derrotado o impeachment, Temer teria de renunciar.

“Cai a máscara dos conspiradores. O Brasil e a democracia não merecem tamanha farsa. O fato é que os golpistas que se arrogam a condição de chefe e vice-chefe do gabinete do golpe estão tentando montar uma fraude para interromper no Congresso o mandato que me foi conferido pelos brasileiros. No entanto, trata-se da maior fraude jurídica e política de nossa história. Sem ela, o impeachment sequer seria votado”, disse Dilma.

A presidente aproveitou ainda para criticar parte do conteúdo do discurso vazado de Temer, no qual o vice diz que será necessário impor sacrifícios ao povo e fala de união nacional.

"Pergunto eu: com que legitimidade fará isso? É uma atitude de arrogância e desprezo pelo povo, do qual certamente tentará retirar direitos que sem o golpe seriam inalienáveis", disse Dilma. "Como acreditar em um pacto de salvação e unidade nacional sem sequer uma gota de legitimidade democrática de quem propõe?"

Apesar do discurso duríssimo, a presidente tentou evitar um incitamento à violência dizendo que seu governo e aliados não perseguem pessoas. "Não divergimos de nossos adversários com gestos de ódio."

"Este não será o país do ódio, definitivamente este não será o país do ódio, por isso quero dizer que nós estamos aqui para que este não se torne o país do ódio e não se construa o ódio como uma forma de se fazer política no nosso país."

Ao lado de Dilma durante a cerimônia, estava um dos ministros peemedebistas que se recusaram a deixar o cargo quando o partido rompeu com o governo no final do mês passado, Celso Pansera, da Ciência e Tecnologia.

O ministro aproveitou para anunciar que ele, Marcelo Castro (Saúde) e Mauro Lopes (Secretaria de Aviação Civil) deixarão os cargos provisoriamente esta semana para ir a Câmara dos Deputados votar contra o impeachment da presidente.

“Vamos encerrar o terceiro turno da eleição de 2014, vamos ganhar. E espero que agora respeitem o resultado. Esse país precisa trabalhar”, afirmou Pansera em discurso. “Qual é o sentido do impeachment se não é a disputa da política pela política? Vamos insistir. Vamos ganhar e queremos respeito ao resultado do terceiro turno.”

(Reportagem de Lisandra Paraguassu)

Fonte: Reuters

NOTÍCIAS RELACIONADAS

Cerca de 80 países chegam a acordo sobre comércio eletrônico, mas sem apoio dos EUA
Brasil terá bandeira verde para tarifa de energia em agosto, diz Aneel
Wall Street termina em alta com apoio de dados de inflação e ações de tecnologia
Ibovespa avança mais de 1% impulsionado por Vale e quase zera perda na semana; Usiminas desaba
Dólar acumula alta de quase 1% na semana em que real foi pressionado pelo iene
Podcast Foco no Agronegócio | Olho no mercado | Macroeconomia | Julho 2024