Lula no governo e a economia, por Vinicius Torres Freire (da Folha)

Publicado em 16/03/2016 06:48
edição desta 4a.-feira

Lula no governo e a economia

Por VINICIUS TORRES FREIRE

Suponha-se que Lula seja o ministro do governo de Dilma Rousseff. Suponha-se que reste governo desta confusão que parece irremediável. Parece tristemente cômico ou louco perguntar, mas: o que será feito da política econômica?

Nem dentro da Fazenda imaginava-se ontem o que fará Lula, caso assuma de fato a regência do governo.

Lula tem fritado, com amor, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa. Os colegas de Barbosa, ministros do Palácio do Planalto, cozinham Barbosa ou, pelo menos, os seus planos já bastante modestos de reforma e contenção do desastre econômico. O PT propõe um plano de "dobrar as metas" do governo Dilma 1, que nos trouxe a esta ruína.

Lula no governo esqueceria imediatamente o que tem dito nos últimos meses? Deixaria de lado as ideias que o levaram, com apoio do PT e seus ministros diletos, a fritar Joaquim Levy e a cozinhar Nelson Barbosa? Recorde-se: Lula derrubou todos os ministros próximos de Dilma Rousseff, neste segundo governo. Agora, falta apenas Barbosa, que talvez não venha a ser decapitado, mas corre o risco de se tornar decorativo tanto em caso de "virada à esquerda" ou "à direita";

Como se sabe, Lula tem pregado ao menos para sua galera a adoção de medidas como aumentar o crédito, relaxar gastos públicos, baixar juros e qualquer coisa que, ele acha, "dê esperança". Talvez Lula até queira arriscar o uso das reservas "em dólar" do Banco Central a fim de bancar um aumento de despesa, medida que, no entanto, equivale a algo assim como tentar não morrer de fome bebendo o próprio sangue.

Esse Lula não chegaria a ser a "virada vermelha", como pretendem economistas do PT. Ainda assim, haveria sangue na praça financeira, do que tivemos amostra-grátis neste início de semana.

Quanto mais vermelha a virada, mais tumulto haveria, "business as usual", dólar e juros em alta etc.

Pode-se objetar que não se esperava quase mais nada de Dilma Rousseff além de um esparadrapo fiscal. A presidente já mandara a reforma da Previdência para longe, depois da eleição de outubro. No Brasil de hoje, longe é um lugar que não existe, para fazer uma citação sarcástica. Ainda assim, o arroz com feijão da política econômica dilmiana provocaria, nos próximos meses, "apenas" uma ruína lenta, gradual e segura. Com a "virada", o risco seria de explosão.

Lula poderia rasgar a fantasia esquerdista que vestiu nos últimos meses? Dizer "às bases", outra vez, que seria necessário algum sacrifício, pois "o milagre do crescimento" logo começaria, como o fez até mais ou menos 2006? Vai mandar prender, metaforicamente, as tropas rebeladas dos movimentos sociais?

Pode até ser, talvez Lula acredite que o apoio das "suas ruas" não seja mais relevante para conter a queda de Dilma. Importante seria tentar um acordão no Congresso, com o PMDB restante, chamando [Henrique] Meirelles outra vez para um governo "provisoriamente" ortodoxo.

Seja como for, as opções da economia de um Lula 3 são estas: arroz com feijão e, alucinadas ou improváveis, "virada vermelha" e "chama o Meirelles" (o ex-presidente "ortodoxo" do Banco Central do governo Lula).

Enfim, a gente esquecia: que tipo de confusão pode dar com Lula e Dilma no mesmo balaio?

 

Avalanche, EDITORIAL DA FOLHA

Cambaleando como iniciante na corda bamba, o governo Dilma Rousseff (PT) ainda tentava se reequilibrar depois do chacoalhão representado pelas manifestações de domingo (13) quando se viu atingido por dois novos golpes nesta terça-feira (15).

Como revelou a revista "Veja", o senador Delcídio do Amaral (MS) –que pediu desfiliação do PT– entregou à Procuradoria-Geral da República gravações de conversas comprometedoras travadas entre um de seus assessores e Aloizio Mercadante, ministro da Educação.

Mercadante, um dos ministros mais próximos de Dilma, encontrou-se mais de uma vez com José Eduardo Marzagão em dezembro, quando Delcídio estava preso. Nos encontros, mostrou-se preocupado com a situação do senador e, naturalmente, com a possibilidade de ele fechar acordo de delação premiada com os investigadores.

A ideia, nas palavras de Mercadante, era que Delcídio não fosse um agente que desestabilizasse tudo. A fim de evitar tal cenário, ofereceu ajuda financeira, jurídica e política, incluindo eventuais tratativas com Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado, e Ricardo Lewandowski, presidente do Supremo Tribunal Federal.

Delcídio não parece ter dúvidas sobre a atitude do ministro da Educação: "Agiu como emissário da presidente da República e, portanto, do governo". Dilma e Mercadante negam; teria sido uma iniciativa pessoal, movida por sentimentos de solidariedade.

Já não seria pouco, para um governo esfacelado como este, precisar se defender da acusação de ter tentado comprar o silêncio do senador; mas não era tudo.

A tão falada delação premiada de Delcídio enfim foi homologada pelo STF. Seu conteúdo, agora livre do sigilo judicial, aumenta de forma considerável o volume já impressionante de provas e indícios colhidos pela Operação Lava Jato.

Vale lembrar que, na esfera jurídica, essa forma de colaboração serve antes como ponto de partida do que de chegada. As palavras do delator auxiliam os investigadores, mas elas não tornam desnecessária a apresentação de provas sólidas de tudo o que foi dito.

As menções incriminadoras que Delcídio fez aos petistas Dilma e Lula, aos peemedebistas Michel Temer, Renan Calheiros e Eduardo Cunha e ao tucano Aécio Neves, entre tantos nomes, ainda precisam passar por um processo de depuração no Judiciário.

No campo político, porém, as acusações circulam em outro ritmo e com pouco respeito ao princípio da isonomia. Descartando o que houver de incômodo na delação de Delcídio, a oposição não hesitará em selecionar os melhores trechos para reforçar o pedido de impeachment –do qual a presidente Dilma parece ter cada vez menos condições de se defender.

 

Fonte: Folha de S. Paulo

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